Download DISSERTAÇÃO Patrícia de Miranda Alves Pereira VERSÃO FINAL
Transcript
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Direito Patrícia de Miranda Alves Pereira A EFETIVIDADE DOS DIREITOS INDIVIDUAIS CONSTITUCIONAIS DOS TRABALHADORES, ATRAVÉS DAS TUTELAS DE URGÊNCIA E EVIDÊNCIA: UMA VISÃO COMPARATÍSTICA DO TEMA. Belo Horizonte 2012 Patrícia de Miranda Alves Pereira A EFETIVIDADE DOS DIREITOS INDIVIDUAIS CONSTITUCIONAIS DOS TRABALHADORES, ATRAVÉS DAS TUTELAS DE URGÊNCIA E EVIDÊNCIA: UMA VISÃO COMPARATÍSTICA DO TEMA. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Vitor Salino de Moura Eça. Belo Horizonte 2012 FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais P436e Pereira, Patrícia de Miranda Alves A efetividade dos direitos individuais constitucionais dos trabalhadores, através das tutelas de urgência e evidência: uma visão comparatística do tema / Patrícia de Miranda Alves Pereira. Belo Horizonte, 2012. 296f. Orientador: Vitor Salino de Moura Eça Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Direito. 1. Direitos sociais. 2. Tutela antecipada. 3. Princípio da efetividade. I. Eça, Vitor Salino de Moura. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Direito. III. Título. CDU: 342.7 Patrícia de Miranda Alves Pereira A EFETIVIDADE DOS DIREITOS INDIVIDUAIS CONSTITUCIONAIS DOS TRABALHADORES, ATRAVÉS DAS TUTELAS DE URGÊNCIA E EVIDÊNCIA: UMA VISÃO COMPARATÍSTICA DO TEMA. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito. __________________________________________ Vitor Salino de Moura Eça (Orientador) – PUC Minas __________________________________________ Taísa Maria Macena de Lima – PUC Minas __________________________________________ Milton Vasques Thibau de Almeida (convidado) - UFMG Belo Horizonte, 31 de janeiro de 2012. A meus pais e noivo, pelo incentivo e carinho. AGRADECIMENTOS A todos que contribuíram para a concretização deste estudo, fica aqui expressa a minha eterna gratidão. Ao professor e doutor, Vitor Salino de Moura Eça, pela orientação e apoio, em todos os momentos imprescindíveis à realização desse trabalho. Aos meus pais, Welson Nilo Alves Pereira e Delma Elizabeth de Miranda Alves Pereira, amados, por toda dedicação e carinho, nos momentos mais delicados. Ao meu noivo, Túlio Magalhães Silva, pela compreensão, esforço e precioso auxílio, contribuindo sobremaneira para a elaboração desta dissertação. Precisamos dar um sentido humano às nossas construções. E, quando o amor ao dinheiro, ao sucesso nos estiver deixando cegos, saibamos fazer pausas para olhar os lírios do campo e as aves do céu. (ÉRICO VERÍSSIMO, 1938). RESUMO Nessa dissertação, primeiramente, realizou-se uma prospecção dos direitos e garantias fundamentais, enraizados no ordenamento jurídico constitucional brasileiro, concomitante às normas infraconstitucionais. No primeiro capítulo, efetivou-se um estudo de teorias dos juslaboralistas de destaque no cenário científico-trabalhista, do século passado, sendo as mesmas transportadas para a realidade atual. Inicialmente, instituiu-se a ideia basilar acerca do que são e qual o histórico dos Direitos Sociais, no mundo e no Brasil. Passou-se, então, à descrição objetiva desses direitos, normatizados no artigo 7º e seus vinte e três incisos, iniciando o estudo pelo comentário sobre a proteção contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa, tema de extrema envergadura e, finalizando com explicitações acerca do parágrafo único, consoante aos trabalhadores domésticos. Na segunda fase do estudo, as Tutelas de Urgência e Evidência no Processo do Trabalho do Ordenamento jurídico Brasileiro foram apresentadas e discutidas. Em sequência, apontou-se acerca das diversas questões dentro da temática abordada, tais como: o princípio da fungibilidade, os pressupostos, as finalidades, os requisitos e limites de cada meio urgente de efetivação dos direitos sociais laborais. Finalizando-se o trabalho com o terceiro capítulo, consentâneo às tutelas de urgência no Direito Comparado. Elaborou-se uma pesquisa nos seguintes ordenamentos jurídicos: alemão, espanhol, francês, italiano e português. Ao encerrar essa fase, especificou-se acerca das tendências do Direito Estrangeiro. Palavras-chave: Direito Social. Tutelas de Urgência e Evidência. Efetividade. ABSTRACT In this dissertation, first, there was a prospect of fundamental rights and guarantees, rooted in Brazilian constitutional law, accompanying rules infra. In the first chapter, a study was accomplished researchers of labor law prominent theories in the scientific and labor of the past century, and were transported to the current reality. Initially, we established the first lines of what is and what the history of Social Rights, in the world and in Brazil. Passed to the objective description of these rights, regulated in Article 7 and its XXXIV sections, beginning to study for the comment to protection against arbitrary dismissal or dismissal without just cause, the subject of extreme scale today, and ending with clarifications about the single paragraph, according to domestic workers. In the second phase of the study were presented to the Emergency Guardianships and Evidence Labour Process of Brazilian law. Initial considerations were exposed, the right line evident. And in response, explained to the wards of urgency about the existing legal order. Several relevant issues within this theme were mentioned, such as the principle of fungibility, the assumptions, purposes, requirements and limitations of each medium urgent fulfillment of social rights at work. Finishing up work with the third chapter, the line tutelage of urgency in Comparative Law. We developed a survey of jurisdictions: German, Spanish, French, Italian and Portuguese. In closing this phase, it was specified on the trends of foreign law. Keywords: Social Law. Emergency Guardianship and Evidence. Effectiveness. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................23 2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS INDIVIDUAIS TRABALHISTAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA BRASILEIRA E A NORMATIVIDADE INFRACONSTITUCIONAL.................................................................................................27 2.1 Considerações Iniciais Acerca dos Direitos Constitucionais Trabalhistas.............27 2.2 Direitos Sociais Normatizados no Artigo 7º da Constituição da República...........30 2.2.1 Proteção Contra a Dispensa Arbitrária ou Sem Justa Causa.................................30 2.2.2 Seguro-Desemprego........................................................................................................36 2.2.3 Fundo de Garantia do Tempo de Serviço ......................................................................37 2.2.4 Salário Mínimo ...............................................................................................................39 2.2.5 Piso Salarial Proporcional à Extensão e à Complexidade do Trabalho ......................44 2.2.6 Irredutibilidade Salarial .................................................................................................46 2.2.7 Garantia de Salário, Nunca Inferior ao Mínimo, para os que Percebem Remuneração Variável ....................................................................................................................................49 2.2.8 Décimo Terceiro Salário ................................................................................................50 2.2.9 Remuneração do Trabalho Noturno Superior à do Diurno .........................................53 2.2.10 Proteção do Salário na Forma da Lei, Constituindo Crime sua Retenção Dolosa ...57 2.2.11Participação nos Lucros ou Resultados, Desvinculada da Remuneração, e, Excepcionalmente, Participação na Gestão da Empresa, Conforme Definido em Lei ........59 2.2.12 Salário-família ..............................................................................................................64 2.2.13 Duração do Trabalho Normal não Superior a Oito Horas Diárias e Quarenta e Quatro Semanais, Facultada a Compensação de Horários e a Redução da Jornada, Mediante Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho .........................................................68 2.2.14 Jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva..................................................................................75 2.2.15 Repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos .............................79 2.2.16 Remuneração do Serviço Extraordinário Superior, no Mínimo, em Cinquenta por Cento à do Normal...................................................................................................................84 2.2.17 Férias Anuais Remuneradas com, pelo Menos, Um Terço a mais do que o Salário Normal .....................................................................................................................................88 2.2.18 Licença à Gestante, sem Prejuízo do Emprego e do Salário, com a Duração de Cento e Vinte Dias ..............................................................................................................................93 2.2.19 Licença-Paternidade, nos Termos Fixados em Lei.....................................................96 2.2.20 Proteção do Mercado de Trabalho da Mulher, Mediante Incentivos Específicos, nos Termos da Lei ..........................................................................................................................97 2.2.21 Aviso Prévio Proporcional ao Tempo de Serviço, Sendo no Mínimo de Trinta Dias, nos Termos da Lei..................................................................................................................103 2.2.22 Redução dos Riscos Inerentes ao Trabalho, por Meio de Normas de Saúde, Higiene e Segurança............................................................................................................................108 2.2.23 Adicional de Remuneração para as Atividades Penosas, Insalubres ou Perigosas, na Forma da Lei .........................................................................................................................116 2.2.24 Aposentadoria .............................................................................................................119 2.2.25 Assistência Gratuita aos Filhos e Dependentes Desde o Nascimento até 5 (cinco) Anos de Idade em Creches e Pré-escolas..............................................................................121 2.2.26 Reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho ...........................122 2.2.27 Proteção em face da automação, na forma da Lei ....................................................127 2.2.28 Seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa..........................128 2.2.29 Ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho ......................................................................132 2.2.30 Proibição de diferenças de salário, de exercícios de função e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos e; igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso.......................................................................................135 2.2.31 Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos .........................................................................................................................141 2.2.32 Trabalhadores Domésticos. ........................................................................................145 3 AS TUTELAS DE URGÊNCIA E EVIDÊNCIA NO PROCESSO DO TRABALHO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO..........................................................147 3.1 Tutela de Evidência (Noções de Direito Evidente) ......................................................147 3.2 Tutelas de Urgência no Ordenamento Jurídico Brasileiro.........................................150 3.2.1 Considerações Iniciais..................................................................................................150 3.2.2 O Princípio da Fungibilidade frente às Tutelas de Urgência .....................................151 3.3 Bases fundamentais da Tutela Antecipatória e o Processo do Trabalho ..................152 3.3.1 Pressupostos da Tutela Antecipatória..........................................................................154 3.3.2 Requerimento da Parte.................................................................................................154 3.3.3 Prova Inequívoca Capaz de Fazer Surgir a Verossimilhança....................................155 3.3.4 Verossimilhança das Alegações ...................................................................................155 3.3.5 Identificação dos efeitos a serem antecipados com o provimento final .....................156 3.3.6 Fundado Receio de Dano Irreparável ou de Difícil Reparação .................................156 3.3.7 Caracterização do Abuso de Direito de Defesa ou o Manifesto Propósito Protelatório do réu......................................................................................................................................157 3.3.8 Irreversibilidade dos efeitos da Antecipação de Tutela...............................................159 3.4 A efetividade da Tutela Antecipada – Técnicas legais que permitem a eficácia desse instrumento ...........................................................................................................................160 3.5 A Impugnação da Medida que aprecia a Tutela Antecipada no Processo do Trabalho ................................................................................................................................................163 3.6 Execução da Tutela Antecipada no Processo do Trabalho.........................................164 3.7 Tutela Antecipada das Obrigações de Fazer, Não Fazer e Dar no Processo do Trabalho ................................................................................................................................164 3.8 Medidas Antecipatórias de Caráter Satisfativo...........................................................165 3.9 Tutela Inibitória e sua aplicação no Processo do Trabalho Brasileiro......................166 3.9.1 Âmbito de Atuação........................................................................................................170 3.9.2 A Importância da Tutela Inibitória para a Efetividade da Tutela dos Direitos .........171 3.9.3 Fundamento da Tutela Inibitória ................................................................................173 3.9.4 Acesso à Justiça (como fundamento da Tutela Inibitória) e Instrumentalidade do Processo .................................................................................................................................174 3.9.5 O artigo 461 do CPC e 84 do CDC como fonte da Ação Inibitória ............................176 3.9.6 O uso distorcido da Ação Cautelar e a Ação Inibitória a partir dos artigos 461 do CPC e 84 do CDC ...........................................................................................................................176 3.9.7 A Tutela Inibitória e a Questão do Ilícito ....................................................................177 3.9.8 Finalidade e Classificação (Espécies) da Ação Inibitória ..........................................178 3.9.9 Requisitos da Ação Inibitória.......................................................................................181 3.9.10 Limites da Tutela Inibitória .......................................................................................182 3.9.11 A Ação Inibitória que tem por objetivo prevenir tout court o ilícito e a Tutela Inibitória que visa a impedir a sua continuação ou repetição - A questão probatória.......183 3.9.12 Atuação do Juiz frente à Tutela Inibitória ................................................................184 3.9.13 Meios de Coerção e de Efetividade da Tutela Inibitória / Multa inibitória / Meios Sub-rogatórios / Prisão..........................................................................................................186 3.9.14 Provimento Executivo lato sensu e/ou mandamental / Ação Inibitória x de Remoção do Ilícito .................................................................................................................................191 3.9.15 Tutela Inibitória Antecipatória ..................................................................................191 3.9.16 Momento de concessão do Provimento Antecipado ..................................................192 3.9.17 A Fungibilidade da Medida Antecipada e a Fungibilidade da Proteção Inibitória.194 3.9.18 As demais Tutelas que podem ser prestadas a partir dos artigos 461 do CPC e 84 do CDC ........................................................................................................................................195 3.9.19 Quando a Tutela Inibitória recai sobre a Fazenda Pública .....................................196 3.9.20 Multa ordenada pelo Estado-juiz ...............................................................................197 3.9.21 Comissões de Conciliação Prévia x Tutela Inibitória ...............................................199 3.10 Tutela Cautelar .............................................................................................................200 3.10.1 Teoria Geral do Processo Cautelar............................................................................200 3.10.2 Características da Tutela Cautelar ............................................................................201 3.10.3 Elementos Jurídicos da Proteção Cautelar ...............................................................202 3.10.4 Satisfatividade da Medida Cautelar ...........................................................................203 3.10.5 Poder Geral de Cautela do juiz do trabalho ..............................................................205 3.10.6 Ação Cautelar Inominada ..........................................................................................205 3.10.7 Tutela Cautelar concedida de ofício pelo juiz ...........................................................206 3.10.8 Espécies de Medidas Acautelatórias (cabíveis no Processo do Trabalho) ...............208 3.10.9 Procedimento das Cautelares no Processo do Trabalho...........................................208 3.10.10 Das Medidas Cautelares em espécie (consentâneas ao Processo do Trabalho) ....209 3.11 Tutelas de Urgência nas Ações Coletivas - meios eficazes de proteção dos direitos individuais trabalhistas da Constituição da República ........................................................215 4 TUTELAS DE URGÊNCIA NO DIREITO COMPARADO ........................................217 4.1 Considerações Iniciais ....................................................................................................217 4.2 Medidas de Urgência no Direito Alemão .....................................................................219 4.2.1 A Tutela de Urgência no Direito Processual Alemão .................................................220 4.3 Medidas de Urgência no Direito Espanhol...................................................................223 4.3.1 Considerações Iniciais / Organização Judiciária Espanhola.....................................223 4.3.2 Antecipação de Tutela no Ordenamento Espanhol.....................................................226 4.3.3 Processo Cautelar Espanhol ........................................................................................227 4.3.3.1 Natureza jurídica da tutela cautelar.......................................................................229 4.3.3.2 Características e Pressupostos.................................................................................229 4.3.3.3 As medidas cautelares no âmbito do Direito do Trabalho espanhol (Ley de Procedimento Laboral) ........................................................................................................230 4.3.4 Medidas Cautelares Inespecíficas (indeterminadas)...................................................234 4.3.5 O Processo Cautelar na “Ley Reguladora de la Jurisdicción Social - Ley 36/2011, de 10 de Octubre” .......................................................................................................................235 4.3.6 A Estabilização da Demanda de Urgência no Direito Espanhol................................237 4.4 Medidas de Urgência no Direito Francês .....................................................................240 4.4.1 Considerações Iniciais / Organização do Poder Judiciário Francês ........................240 4.4.2 Medidas de Urgência na França – A Estabilização da Tutela de Urgência – Référé prud'homal.............................................................................................................................242 4.5 Medidas de Urgência no Direito Italiano .....................................................................244 4.5.1 Considerações Iniciais / Organização Judiciária Italiana .........................................244 4.5.2 Tutela Antecipada e a Tutela Inibitória / Poder Geral de Cautela do Juiz................246 4.5.3 Procedimento Cautelar no Direito Italiano.................................................................250 4.5.4 Procedimento Cautelar Específico no Ordenamento Jurídico Italiano .....................251 4.5.5 Medidas Cautelares (procedimentos específicos) ........................................................254 4.5.6 A ordem de reintegração do trabalhador ilegitimamente dispensado ........................257 4.5.7 A ordem para pagamento de somas não contestadas ..................................................258 4.5.8 Procedimento Monitório (de Injunção) no Direito Italiano .......................................259 4.5.9 Ordem de reintegração no posto de trabalho de dirigentes sindicais quando dispensados sem justa causa .................................................................................................260 4.6 A Estabilização da Demanda de Urgência no Direito Italiano...................................260 4.7 Medidas de Urgência no Direito Português .................................................................265 4.7.1 Considerações Iniciais / Organização Judiciária do sistema português ....................265 4.7.2 Processo do Trabalho Português .................................................................................268 4.7.3 Tutelas de Urgência em Portugal.................................................................................271 4.7.3.1 A Suspensão de Despedimento Individual .............................................................273 4.7.3.2 A Suspensão de Despedimento Coletivo .................................................................275 4.7.3.3 Proteção da segurança, higiene e saúde no trabalho.............................................276 4.7.4 Ações Cautelares Nominadas do Processo Comum ....................................................276 4.7.5 Condenação extra vel ultra petitum .............................................................................278 4.8 Tendências acerca do Direito Estrangeiro ...................................................................279 5 CONCLUSÃO....................................................................................................................282 REFERÊNCIAS .......................................................................... Erro! Indicador não definido. 23 1 INTRODUÇÃO O tema abordado concerne à efetivação dos Direitos Individuais Sociais dos trabalhadores, garantidos na Constituição da República Federativa do Brasil, através das tutelas de urgência, constantes no ordenamento jurídico brasileiro. Primeiramente, estabeleceu-se uma prospecção dos direitos e garantias fundamentais enraizados no ordenamento constitucional brasileiro, concomitante às normas infraconstitucionais (legislação esparsa). Nessa primeira fase, foi realizado um estudo de teorias de juslaboralistas de destaque no cenário científico-trabalhista, do século passado, sendo as mesmas transportadas para a realidade atual. Inicialmente, foram instituídas as primeiras linhas acerca do que são e qual o histórico dos Direitos Sociais, no mundo e no Brasil. Passou-se, então à descrição objetiva desses direitos, normatizados no artigo 7º e seus XXXIV incisos, iniciando o estudo pelo comentário à proteção contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa, tema de extrema envergadura na atualidade e, finalizando com explicitações acerca do parágrafo único, consoante aos trabalhadores domésticos. Na segunda fase do estudo, foram apresentadas as Tutelas de Urgência e Evidência no Processo do Trabalho do ordenamento Jurídico brasileiro. Fundamentalmente, foram expostas certas considerações iniciais, consentâneas ao direito evidente. E, em sequência, explanou-se sobre as tutelas de urgência existentes na ordem jurídica. Para tanto, foram apontadas diversas questões de relevo dentro dessa temática, tais como: o princípio da fungibilidade, os pressupostos, as finalidades, os requisitos e limites de cada meio urgente de efetivação dos direitos sociais laborais. Sinteticamente, finalizou-se o trabalho com o terceiro capítulo, consentâneo às tutelas de urgência no Direito Comparado. Os ordenamentos jurídicos pesquisados foram: o alemão, o espanhol, o francês, o italiano e o português. Ao encerrar essa fase, especificou-se acerca das tendências do Direito Estrangeiro. O método comparatístico de estudo foi utilizado para reafirmar os acertos legislativos e jurisprudenciais, objetivando, ainda, o apontamento das contradições internas do sistema brasileiro que possui um dos ordenamentos laborais mais significativos e elogiados do mundo, no entanto, urge uma efetivação atinente aos direitos sociais individuais. Ademais, consoante ao exposto no artigo 8º, da Consolidação das Leis do Trabalho, as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na ausência de normatividade legal ou contratual, decidirão, conforme o caso: pela jurisprudência, por analogia, por equidade e demais princípios e normas gerais de direito, mormente, do Direito do Trabalho, e, ainda, de acordo 24 com os usos e costumes e o Direito Comparado. Desse modo, o legislador pátrio consagrou o Direito Estrangeiro como fonte do Direito e do Processo do Trabalho. Na Constituição da República Federativa do Brasil, existe “um projeto” de bem-estarsocial, incluindo as disposições no artigo 6º e 7º, clamantes por efetivação. A concretude da tutela jurisdicional legitima a própria existência do processo. Frente ao atual movimento instrumentalista ou teleológico processualista, na busca por um fim comum, o processo não pode mais ser visto sob o prisma apenas externo, mas, sobretudo, sobre a ótica sistêmica. O processo somente é válido na medida em que, no plano real, seja capaz de produzir resultados objetivos, como se a norma não tivesse sido descumprida. Os meios (ou instrumentos) adequados a essa teleologia corroboram com os escopos processuais. Nesse contexto, têm-se os ideais do movimento pós-positivista. No mundo pósmoderno, hoje vivenciado, busca-se a rápida e justa resolução dos conflitos postos sob a égide do Poder Jurisdicional. A aplicação positiva das Leis (positivismo), largamente utilizadas na solução dos litígios, vai contra a plena realização de efetividade das normas. O póspositivismo representa, fundamentalmente, a concretização da principiologia (de direito material e instrumental) existente no ordenamento jurídico, elegida pelo Estado como sendo de suma importância para a sociedade. É um movimento que transcende o positivismo. No Brasil, exemplificadamente, têm-se os artigos 5º, 6º e 7º, da Constituição da República, sendo elencados, nesses, princípios sociais basilares. Conquanto, fale-se muito sobre a efetividade do direito processual, tema de notória importância no mundo moderno, não se pode olvidar que esse ramo jurídico constitui instrumento de efetivação do direito material. Assim, é de suma importância o estudo pormenorizado dos direitos sociais, para se chegar à justa concretização dos mesmos, em uma sociedade democrática. Primordial é o entendimento acerca do que são e quais são os direitos que necessitam de efetivação in concreto. Na propedêutica dos estudos jurídicos, certamente é necessária a compreensão da dependência existente entre o direito substancial e o direito processual. Na Teoria Geral do Processo, essa correlação é um dos pilares da disciplina, tendo relevância na vida acadêmica e profissional. O Direito Material do Trabalho possui a função de contrabalançar e re(estruturar), na medida em que esse é um movimento cíclico (além de dependente do momento histórico), a relação capital versos trabalho. Legitimamente, o Direito do Trabalho (incluindo os direitos sociais individuais, impostos na Constituição da República) só existe e somente terá lógica, em ser efetivado, no contexto desse capital. A celeridade processual é uma, dentre as várias 25 pedras de toque, da efetividade processual, existindo, ainda, outros elementos, tais quais o acesso à justiça e o retorno ao sincretismo processual, que cooperam para a materialização do Direito Substancial. E, na medida em que as tutelas de urgência possuam, sobremaneira, no contexto laboral, tramitação mais célere, capaz de dar àquele com razão, de forma mais imediata, o seu direito, devem ser amplamente discutidas e estudadas, no âmbito acadêmico, além de requeridas, pelo procurador da parte, e outorgadas, pelo magistrado, até mesmo exofício, quando considerar prudente. É exatamente essa correlação lógica que gera a efetividade tão almejada na pós-modernidade. O ideal é que o Processo Trabalhista seja, além de rápido, justo. Para tanto, é de suma importância que a prestação jurisdicional seja efetiva, notadamente, em um país onde se impera uma espécie de síndrome do descumprimento da normatividade laboral. Esse descumprimento é corriqueiro e cotidiano, veem-se normas não cumpridas em diversos contratos de trabalho existentes, indo desde uma alteração de um cartão de ponto, ao gravoso inadimplemento de normas de saúde, segurança e higiene, no ambiente laboral, com o não fornecimento de equipamentos de proteção individual, exemplificadamente. As tutelas de urgência são uma significativa parcela do instrumental de efetivação das normas laborais, compostas por inúmeros meios de justa concretização de regras, institucionalizadas em diversos ordenamentos jurídicos. O Processo Laboral não pode ser um empecilho à efetividade de uma norma trabalhista, nesse sentido, é possível vislumbrar que em certos ordenamentos jurídicos existe necessidade de aprimoramento da norma e de sua aplicação. A diferenciação entre tutela de restituição e de inibição tem que estar plenamente delimitada, por exemplo, além da imprescindível existência de normas, regendo as tutelas de urgência. No entanto, detalhes como esses, ainda não foram percebidos por determinados sistemas europeus (países de primeiro mundo). O que colabora com a inefetividade do Direito Material. No Brasil, certas falácias, como essas duas, acima apontadas, há muito foram superadas. No entanto, para que a norma laboral tenha real efetividade, são necessários, ainda, aprimoramentos, ou seja, melhorias do Direito Processual (tanto legislativas, quanto práticas). O Processo do Trabalho carece ter uma base sólida e bem construída, com eficaz apoio na “ciência” da efetividade. Para tanto, o operador do direito tem que: compreender que a técnica processual não vai contra a efetividade, pelo contrário, essa tem que ser validada a partir dos seus resultados positivos; conscientizar-se do necessário estudo da hermenêutica, primordialmente da constitucional, na busca por um processo justo e célere; entender que a existência dos procedimentos especiais somente se justifica frente às características 26 específicas do Direito Substancial; ter noção da real necessidade de ampla utilização das tutelas de urgência; intensificar a represália aos que tentam, utilizando-se da estrutura estatal judicial, estorvar o regular andamento processual e; atentar para a ampliação do acesso à justiça. São esses fatores os exemplos na busca pela efetividade da ordem jurídica vigente. Dessa feita, o desígnio com a apresentação da pesquisa, aqui exposta, é demonstrar que é igualmente possível e necessário efetivar direitos sociais individuais, através das tutelas de urgência, constantes no ordenamento jurídico. 27 2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS INDIVIDUAIS TRABALHISTAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA BRASILEIRA E A NORMATIVIDADE INFRACONSTITUCIONAL 2.1 Considerações Iniciais Acerca dos Direitos Constitucionais Trabalhistas A origem dos direitos sociais remota à Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 1948 (logo após a II Grande Guerra Mundial), precisamente no dia 10 de dezembro, pela Assembleia Geral da ONU. No artigo XXIII, desse importante documento, está estabelecido um rol de direitos concernentes ao trabalho. No primeiro item, está firmado que “toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, às condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948). No segundo item, foi estabelecido o princípio da igualdade remuneratória. Subsequentemente, está descrito que toda pessoa tem direito a uma remuneração, e não apenas isso, mas que essa seja justa e satisfatória, que lhe proporcione uma existência digna. No último item, dessa norma internacional, foi estabelecido o direito à sindicalização, na defesa dos interesses categoriais. Jorge Luiz Souto Maior (2008) demonstra que a formação do Direito Social adveio também com a ocorrência dos acidentes do trabalho, em meio à Revolução Industrial, século XVIII (expandindo-se para o século XIX), uma vez que o direito comum, não conseguia solucionar os impasses sociais (com as mudanças na relação capital versos trabalho-humano). Na verdade, esse direito não suportava tamanha mudança no processo produtivo, econômico e socialmente relacionado. Dessa forma, a necessidade de estabelecer uma ordem normativa, ou melhor, uma nova lógica jurídica, de prevenção e reparação, nas relações laborais, primordialmente frente aos acidentes do trabalho, gerou o impulso para os Direitos Sociais e o próprio Estado de Providência (Welfare State – Estado do Bem-Estar-Social). Nesse sentido assinalou Souto Maior: A construção da ideia de responsabilidade pelo risco profissional, que se consagrou com o tempo, forma a base do direito social, como alternativa ao direito civil, abalando sua base liberal no aspecto do contrato e da responsabilidade civil, para dar uma resposta efetiva à questão do acidente do trabalho. Finca-se na base do direito social outro valor, com repercussões obrigacionais inimagináveis na esfera do direito liberal, que é o direito à vida. “A instituição do direito à vida marcava o fim da herança liberal das obrigações.” (MAIOR, 2008, p. 18 e 19). 28 Efetivamente, os direitos sociais advieram das lutas entre oprimidos e opressores, seriam, portanto, fruto das conquistas sociais, como uma resposta ao Estado Liberal - a reconstrução da ordem jurídica. Por isso, que o direito social não pode ser apenas taxado como de dimensão ou geração específica. O novo modelo jurídico, subsequente à II Grande Guerra, traz, em seu bojo, um aspecto primordial para a convivência harmônica entre os povos: a solidariedade social, que passa a integrar a ordem jurídica de muitos países. A prioridade passa a ser a geração de paz e justiça, impondo-se à solidariedade, para fazer valer a dignidade humana. Por isso, da nova regulação frente ao Direito do Trabalho, como limitação aos efeitos econômicos e sociais do capitalismo (modo de produção que gera riquezas, mas se baseando na exploração máxima do trabalho humano). Na Constituição da República Federativa do Brasil, precisamente no Título II, Capítulo II, tem-se a positivação dos Direitos Sociais, nos artigos 6º ao 11º. O Direito Social materializa-se no Direito do Trabalho e no Direito Previdenciário, porém, não se circunscreve, com absolutividade, nesses dois ramos do Direito. Por via reflexa, regula ainda: a educação, a saúde, a vida, a alimentação, a habitação, a assistência aos necessitados, o lazer, a igualdade, a liberdade à propriedade e dentre outros direitos, que integram um patamar mínimo civilizatório, que podem se insurgir tanto no ramo do Direito Privado, quanto no do Direito Público. Conforme os ensinamentos de Alexandre de Morais (2003, p. 204), essas normas, de cunho social (do Capítulo II, Título II), na Constituição da República, são enumeradas “exemplificativamente”, não esgotando “os direitos fundamentais constitucionais dos trabalhadores, que se encontram também, difusamente previstos na própria Constituição Federal”. Ou seja, a Constituição vigente está pautada, em todos os seus artigos do 1° ao 250º, nos direitos sociais. A gênese do fundamentalismo normativo, bem como, sua imposição à sociedade, através da atuação da máquina legislativa estatal, discutida, essencialmente, através de duas notáveis teorias: a positivista e a jusnaturalista, sempre foi tema complexo e controvertido. Os direitos, postos aos cidadãos de um Estado, são frutos do pensamento, moral, social e ético, ou seja, convergem os interesses da sociedade como um todo. São direitos elegidos como de indispensáveis existências no ordenamento jurídico “daquele grupo” de pessoas. O legislativo, poder supremo, representante do povo de uma nação, elege certos direitos como sendo de suma importância para a coesão e o convívio sociais. Nesse sentido, tem-se, no direito pátrio, o artigo 6º da Constituição da República. As normas constantes nesse artigo são de cunho 29 social (direitos fundamentais) e de tamanha importância que, além de elevadas ao patamar constitucional, são consideradas como direitos supra-legais. A incidência dos Direitos Sociais reflete-se não apenas frente à existência da hipossuficiência econômica, mas também diante de qualquer relação de sujeição, mesmo que momentânea. Nesses casos, existem meios processuais a efetivar as normas relacionadas à proteção social; como exemplo, a técnica de inversão do ônus da prova, a obrigar que a parte “mais forte” da relação a produza. Os Direitos Sociais possuem caráter transcendental (vão além do Direito do Trabalho e Previdenciário) de imposição à cultura de um povo, através da ordem constitucional, de valores mínimos que retratam a condição humana na sociedade. Impõem às pessoas (físicas e jurídicas) a obrigação de praticar determinados atos, ou abster-se de praticá-los. Quanto à materialidade dos direitos sociais, a doutrina brasiLeira é dividida em três correntes, como abaliza José Tarcízio de Almeida (2008, p. 436): a primeira aponta à imediata aplicação dos direitos sociais; outra entende que os de aplicação imediata concernem apenas aos que possuem carga de negação contra o Estado e; os que reputam que esses direitos são aplicáveis, imediatamente, mas apenas àqueles que refletem o mínimo existencial (há, nessa corrente, total limitação aos direitos sociais). Essa classificação é de alta subjetividade, presentemente, consideram-se que os direitos sociais são imediatamente aplicáveis, pois todos refletem o mínimo existencial digno em uma sociedade democrática. A efetivação dos Direitos Sociais não pode depender do arbítrio do Estado, mas para sua implementação, em muitos casos, depende de políticas públicas (ou seja, verba). Muitos estudiosos afirmam que as possibilidades financeiras, ou melhor, a falta de recursos daria margem à ampla discussão sobre a cláusula da reserva do possível. Em que o judiciário não poderia dispor sobre políticas públicas, pois, em respeito ao princípio do checks and balances (separação dos poderes), essa seria uma função precípua do Executivo e do Legislativo. Direitos, que são de preeminência social, não podem ser prejudicados sob o argumento de proteção ao erário. A cláusula da reserva do possível não pode limitar a eficácia de um direito, o que o judiciário deve buscar, consentâneo ao princípio da unicidade constitucional, é extrair a máxima eficácia de um direito social e não restringi-lo, como vem acontecendo, frente ao atual entendimento do artigo 7º inciso I da CR/88. Contraditório, porém, é o fato de doutrinadores “reconhecerem” que os Direitos Sociais são direitos de ordem fundamental e de aplicação imediata, nos termos do artigo 5º, § 1º, da Constituição da República, mas que esse 30 núcleo existencial mínimo está condicionado à reserva do possível ou a outras argumentações limitativas à aplicação (prática/cotidiana) do direito social. Os Direitos Sociais não podem ser alterados para pior, ou seja, no Congresso Nacional, nenhuma Lei pode ser votada com o intuito de “empobrecer” essa ordem normativa (princípio da proibição do retrocesso). Além do mais, aqueles direitos que “dizem respeito à sobrevivência, à integridade e à dignidade da pessoa são prontamente exigíveis. Jorge Luiz Souto Maior assevera: [...] a forma como as gerações dos direitos humanos tem sido disposta quase que agrega aos direitos sociais indevidas limitações dispostas pelos direitos individuais – mais especificamente o direito de propriedade, que, no sistema capitalista, passa a ser tido como princípio (princípio da propriedade) e a ser tratado, indevidamente e quase que sempre, como sobreprincípio ou postulado fundante do sistema constitucional. (MAIOR, 2007, p. 15). Examinando o tema, sob o enfoque exclusivamente do Direito do Trabalho, os valores primordiais desse ramo, residem nas seguintes perspectivas: a) o trabalho humano não pode ser considerado uma mercadoria (em que homens e mulheres vendem sua força de trabalho ao empregador); b) as normas trabalhistas, e suas consequentes eficácias e validades, devem ser aplicadas de forma progressiva e imediata, e sua interpretação consentânea à nova hermenêutica constitucional. 2.2 Direitos Sociais Normatizados no Artigo 7º da Constituição da República 2.2.1 Proteção Contra a Dispensa Arbitrária ou Sem Justa Causa No artigo 7º, existe um rol de Direitos Fundamentais, a começar pela proteção contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa, do inciso I. Conforme a redação do artigo: “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social” (BRASIL, 2011): inciso “I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de Lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos” (BRASIL, 2011). Essa temática é por demais polêmica na doutrina e jurisprudência brasileiras. Por motivos óbvios, presentemente, não se pretende esgotar as possibilidades discursivas, mas apenas pontuar, de forma geral, argumentos importantes. A resolução acerca da interpretação desse inciso envolve questões transcendentais de ordem econômica, políticas e sociais. 31 Na Constituição de 18 de setembro de 1946, no artigo 157, estava estabelecido que: “a legislação do trabalho e a da previdência social obedecerão aos seguintes preceitos, além de outros que visem à melhoria da condição dos trabalhadores [...] ” (BRASIL, 2011); no inciso XII: “estabilidade, na empresa ou na exploração rural, e indenização ao trabalhador despedido, nos casos e nas condições que a Lei estatuir [...]” (BRASIL, 2011). Na Constituição de 1967, no inciso XII, do artigo 165, estava prevista a “estabilidade, com indenização ao trabalhador despedido ou fundo de garantia equivalente” (BRASIL, 2011). Mesmo diante de situações político-sociais distintas da atual realidade (recente fim da populista Era Vargas – 1930 a 1945 – e início do regime militar no Brasil), essas redações eram mais progressistas que as da atual Constituição. Questão esta paradoxal! Não eram textos exemplares, ideais, mas é lamentável que, após tantas conquistas, em matéria de garantias sociais, individuais e coletivas, a Constituição “cidadã”, de 1988, tenha regredido. À época da formulação da constituinte de 1988, as discussões acerca desse tema tão conflitante, que envolvia tantos lobbies e dinheiro, muita propaganda (rádio e televisão) negativa foi feita, contrariamente à estabilidade, na verdade ocorreu verdadeiro “massacre desinformativo” (CHIARELLI, 1989, p. 15), nos meios de comunicação. Não se chegou, nem mesmo, a votar sobre a estabilidade (prevista na CLT) propriamente dita, mas apenas, discutiu-se acerca da garantia provisória de emprego. Ou seja, o constituinte de 1988 não cogitou a constitucionalização da estabilidade, não houve, em nenhum momento de elaboração da atual Lei Maior, proposta desse tema. Na realidade, tentou-se substituir a real garantia de emprego por uma fórmula milagrosa de dispensa com indenização, nos moldes da década de 30 (início da Era varguista) “em que as garantias do operário trocam-se por valores indenizatórios simples, numa operação mercantil, em que a pecúnia direta – deteriorável facilmente pela indenização corrosiva – substituiria a proteção social do vínculo” (CHIARELLI, 1989, p. 21). Assiste muita razão a esse brilhante autor! Houve uma inversão de valores na atual Constituição, ao invés do legislador elevar ao patamar constitucional a proteção contra a dispensa arbitrária (valorando a continuidade da relação laboral), abriu margem para uma indenização substitutiva 1. Esse mesmo autor acusa a toda a sociedade pelo retrocesso, afirmando que houve um “pecado coletivo”, “insensibilidade de toda uma geração”. 1 Esta “técnica” legislativa concerne àquela velha máxima: “dar os anéis para não se perderem os dedos”. Foi concedida a indenização (40% do FGTS na dispensa) e retirada a segurança de um dos maiores direitos do trabalhador que é o seu trabalho. 32 Acredita-se que, na sociedade democrática, exista uma preocupação geral de todos os membros sociais, de uns para com os outros, residindo na distribuição equânime da renda, na boa educação para todos, lazer, saúde, dentre outros elementos essenciais para a digna sobrevivência. Na relação capital-trabalho, precisa haver, para a parte hipossuficiente, uma contrapartida; não adiantando, a uma sociedade capitalista, apenas explorar, oprimir a massa, impedindo que o trabalhador usufrua os benefícios e riquezas gerados pela evolução do sistema capitalista. É o que vem acontecendo no Brasil, hoje, uma grande parte da sociedade é explorada sem ao menos ter consciência dessa condição; concomitantemente, um ínfimo grupo de pessoas enriquece; nunca se viram tantos carros importados nas ruas, os imóveis estão cada vez mais caros, os alimentos inflacionados, os preços praticados são absurdos e a instabilidade no emprego (rotatividade) são exemplos marcantes dessa alta exploração! O capitalismo reside no trabalho e, mesmo com a grande evolução tecnológica ocorrida nos últimos anos, nunca se trabalhou tanto nesse país! O trabalho precisa ser valorizado, e não é isso o que vem acontecendo, pelo contrário, os direitos sociais têm sua eficácia cada vez mais reduzida, no âmbito prático. Dessa forma, a sociedade não tolera mais! A grande controvérsia, relacionada ao tema: “Proteção contra a Dispensa Arbitrária”, concerne à eficácia dessa norma constitucional. No Brasil, a doutrina e jurisprudência majoritárias afirmam que esse comando depende de uma norma complementar, ou seja, sua eficácia estaria suspensa até que o Congresso Nacional editasse uma lei, complementando o preceito constitucional. No entanto, alguns doutrinadores demonstram que a proteção contra a dispensa arbitrária teria eficácia plena e que a complementação, exigida pelo constituinte, concerne aos efeitos do descumprimento da garantia constitucional. Na atualidade, argumenta-se que, devido à facilidade de se promover a dispensa do empregado, vem acontecendo uma grande rotatividade no mercado, gerando insegurança na relação laboral e, consequentemente, a precarização da mesma. Ocorrendo a garantia de emprego, constitucionalmente assegurada, pressupõe-se que haja um mínimo de moralidade nas rescisões contratuais; em outras palavras, que a dispensa, sem justa causa, tenha uma sensata justificativa. Como ensina Chiarelli (1989, p.5), seria, a garantia de emprego, “uma vacina contra o arbítrio”, que, no mínimo, a dispensa sem justa-causa seja ética. A inércia do legislador não poderia negar efeitos concretos e imediatos a um comando constitucional. 2 A garantia provisória de emprego diferencia-se da estabilidade. Nesse caso, para que um empregado “possa” ser dispensado, existe a necessidade de prévio inquérito avaliativo da 2 Nesta linha de raciocínio tem-se, por exemplo, Jorge Luiz Souto Maior (2008, p. 434-449). 33 sua conduta, quando, devidamente, comprovada a falta grave. A falta grave é o motivo justificável, conforme José Martins Catarino (1972, p.768) “é a causa justíssima de resolução do contrato de emprego estável [...]”. Havia, na CLT, a figura do empregado estável (artigos 492 a 500, da CLT), atualmente, alijada da prática jurídica laboral. Conforme a norma celetista, o empregado que contasse com mais de dez anos de serviço, na mesma empresa, não poderia ser dispensado, salvo o cometimento de falta grave ou circunstância de força maior, devidamente comprovada. Atualmente, esse instituto foi considerado como não recepcionado pela Constituição vigente, cujo supedâneo passou a ser a indenização de 40% do FGTS, a onerar as dispensas sem justa causa. O cometimento de falta grave pelo empregado encerra a dispensa por justa causa, conforme as hipóteses legalmente previstas. Justa causa seria o “lastro objetivo para a despedida de empregado estável” (CATHARINO, 1962, p. 769) e a falta grave seria a causa resolutiva da relação de emprego, do qual esse empregado seja parte. No presente estudo, não se coaduna com esse entendimento. A extinção do instituto da estabilidade, bem como a barreira criada, no entorno do artigo 7º, inciso I, facilitou, sobremaneira, as dispensas sem motivação. O entendimento exposto na 1ª Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho, ocorrida em novembro de 2007, no TST, em Brasília, organizada pela ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), voltou-se para a eficácia plena do preceito constitucional. 3 1. DIREITOS FUNDAMENTAIS. INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO. Os direitos fundamentais devem ser interpretados e aplicados de maneira a preservar a integridade sistêmica da Constituição, a estabilizar as relações sociais e, acima de tudo, a oferecer a devida tutela ao titular do direito fundamental. No Direito do Trabalho, deve prevalecer o princípio da dignidade da pessoa humana. 2. DIREITOS FUNDAMENTAIS – FORÇA NORMATIVA. I – ARTIGO 7º, INC. I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. EFICÁCIA PLENA. FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO. DIMENSÃO OBJETIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E DEVER DE PROTEÇÃO. A omissão legislativa impõe a atuação do Poder Judiciário na efetivação da norma constitucional, garantindo aos trabalhadores a efetiva proteção contra a dispensa arbitrária. (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO, 2007). Para quem defende a eficácia plena desse inciso, a cessação arbitrária, proibida pela Constituição da República, geraria a nulidade do ato, dando ao empregado o direito de retornar ao status quo ante (à reintegração) e, quando não for possível, é dado a ele o direito a uma indenização substitutiva (aplicação analógica do artigo 496 da CLT). Quanto à fixação 3 Ressalta-se, apenas, que esse entendimento não é vinculativo, mas meramente informativo. 34 da indenização, nos casos da cessação ser considerada arbitrária (desmotivada 4), sendo a reintegração desaconselhável, utilizar-se-ia, por analogia, o artigo 186, do Código Civil. Dessa forma, seriam aplicados os fundamentos de fixação de indenização da responsabilidade civil (do dano moral, por exemplo). A dispensa seria considerada como lícita caso fosse motivada, e relativamente a essa motivação, no artigo 165, da CLT, existe um rol de fundamentos que poderiam ser utilizados pelo empregador, quais sejam: os motivos de ordem disciplinar, técnico e/ou financeiro. A justificação (clara, justa e objetiva) do ato de dispensar o empregado “é o reconhecimento realista das oscilações, às vezes duradouras, outras vezes bruscas e furiosas do mercado” (CHIARELLI, 1989, p. 16). Assim, a aplicação imediata desse direito social não é incompatível com um mercado respaldado na livre iniciativa e na concorrência empresarial. O empregado, com certa segurança no emprego, não está a agredir o Capital, pelo contrário, irá ser mais produtivo para a empresa. Circunstâncias exógenas existem, como a redução da capacidade competitiva de um produto em razão da diminuição de sua procura, por exemplo. Caso ocorra a necessidade de dispensa do empregado, considerando circunstâncias, o empregador poderá fazê-lo, esse é um fator real, determinante da causa justificadora. Há, ainda, normas da Convenção 158 da OIT, que regulam o término da relação de trabalho, por iniciativa do empregador. Conforme o artigo 4º da seção A (“justificação do término”), não se dará término à relação de trabalho de um empregado, a menos que exista, para isso, uma causa justificada, relacionada com a capacidade do trabalhador ou seu comportamento. A justificação pode ainda ser baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço. Mesmo com todas as atecnias e imperfeições, até mesmo em relação à tradução no Brasil, houve a ratificação dessa Convenção, através do Decreto de número 1.855/96. De acordo com as regras da Convenção 158 5, doze meses após o depósito de ratificação, efetuado na Repartição Internacional do Trabalho (RIT), as normas convencionais passam a integrar o ordenamento interno do Estado-membro. Dessa forma, desde janeiro de 1996, a 4 A cessação desmotivada ou imotivada seria a iniciativa do empregador de cessação da relação laboral que não se baseia em um motivo relevante, juridicamente considerado. 5 Conforme os artigo 16 e 17 dessa norma internacional: 2. “entrará em vigor 12 (doze) meses após a data em que as ratificações de 2 (dois) Membros tiverem sido registradas pelo Diretor-Geral. 3. A partir desse momento, essa Convenção entrará em vigor, para cada Membro, 12 (doze) meses após a data em que sua ratificação tiver sido registrada. Artigo 17: 1. Todo Membro que tiver ratificado a presente Convenção poderá denunciá-lo no fim de um período de 10 (dez) anos, a partir da data da entrada em vigor inicial, mediante um ato comunicado, para ser registrado, ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho. A denúncia tornar-se-á efetiva somente 1 (um) ano após a data de seu registro.” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1982). 35 norma estaria vigente no país, segundo diversos doutrinadores. No entanto, o Poder Executivo, em 20 de dezembro de 1996, publicado em 23 de dezembro do mesmo ano, denunciou, através do Decreto 2.100/1996, a Convenção, o que retiraria a eficácia interna das regras. De acordo com alguns estudiosos, a denúncia só poderia ter sido realizada até 22 de novembro de 1996, ou seja, essa Convenção já estaria inválida, considerando-se a análise desses doutrinadores. Além disso, tem-se ainda a Convenção 144, relativa às consultas tripartidas, destinadas a promover a execução das normas internacionais do trabalho, aprovada na 61ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho (Genebra - 1976), entrando em vigor, no plano internacional, em 16 de maio de 1978. No Brasil, concerne ao Decreto Legislativo n. 6, de 1º de junho de 1989. Não participaram da discussão, por exemplo, as confederações nacionais dos diversos ramos profissionais, o que por si só, já invalidaria a denúncia, da Convenção 158, junto à OIT, pois esse organismo internacional já decidiu que, para a validade desse ato, é necessário que o Governo consulte representantes dos trabalhadores e dos empregadores. Conforme o artigo 1º da Convenção 144: “[...] a expressão ‘organizações representativas’ significa as organizações mais representativas de empregadores e trabalhadores, que gozem do direito de liberdade sindical” (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 1978). Sendo que o procedimento adotado nessa convenção deverá ser observado sempre que houver a proposta de denúncia à Convenção ratificada (conforme o artigo 5º, dessa mesma norma internacional). O objetivo da Convenção 144 é muito simples: evitar abusos nas denúncias. Relembra-se, ainda, o preceito estabelecido no parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição, que é um forte argumento a favor da vigência da Convenção 158. Dessa forma, parte da doutrina brasileira possui contundentes argumentos para a imediata aplicação do artigo 7º, inciso I, da Constituição. É necessário que haja harmonia entre Capital e Trabalho. Aquele precisa “aprender” que a dignidade humana necessita ser preservada. O constituinte de 1988 deu notório exemplo de insensibilidade humana, a privilegiar a extração da mais valia a todo custo, quando sequer se deu ao trabalho de discutir sobre a estabilidade, e ainda, inserir na Constituição, no artigo, ora em estudo, palavras subterfugiosas já com a intenção de retirar a plena eficácia desse direito social, afastando o Brasil, dos excelentes moldes do Estado de Bem-Estar Social 6. 6 Esperar muito de um Estado, dito democrático, que permite, que os governantes locais, desviem verbas das merendas escolares, deixando que milhares de crianças, por todo país, comam comida com validade vencida, baratas e sapo, é desesperador! É de se indignar com a insensibilidade de uma geração, que fecha os olhos 36 O caminho recomendável, sem demagogia barata e populismo insensato, para as normas trabalhistas, é progressivamente contribuírem para a harmonia entre o Capital e o Trabalho, estimularem o incremento do processo produtivo, consolidarem a vida da empresa, mas, sobretudo, ensejarem a distribuição justa de renda, visando à construção de uma sociedade em que se tenha por objetivo maior o bem-comum, a liberdade individual, o direito de associação, o respeito à pessoa e a valorização da competência pela competição digna, garantidos pelo Estado – que não desestimulará a livre iniciativa nem atropelará o cidadão – pisos mínimos e dignidade social, em matéria de salário, educação, saúde, habitação, alimentação, transporte coletivo, etc. (CHIARELLI, 1989, p. 20). A incoerência entre a legislação constitucional e a prática é notória. O realismo e os ideais reformistas, embutidos nas normas trabalhistas, necessitam alcançar as vidas humanas, o cotidiano laboral. Nota-se que, em se tratando de proteção contra a dispensa arbitrária, não é necessário ficar apenas discutindo a validade da Convenção 158, pois o próprio ordenamento jurídico vigente possui elementos, de sobra, para validar e efetivar tal direito social do trabalhador. Não adianta discutir isso ou aquilo! Tem é que aplicar, dar eficácia aos direitos sociais! Sem demagogias. 2.2.2 Seguro-Desemprego O direito constitucional ao seguro-desemprego, apesar de norma de cunho eminentemente previdenciário, guarda estrita relação, assim como as demais normas desse ramo jurídico, com o Direito do Trabalho. Merece, portanto, comentário, no presente estudo, seguindo a ordem de direitos fundamentais estabelecida pelo constituinte no artigo 7º. O seguro-desemprego é um benefício previdenciário integrante do sistema de seguridade social, que tem como finalidade promover assistência financeira e temporária ao trabalhador desempregado, em virtude de ter sido dispensando sem justa causa. Não obstante ter sido previsto na Constituição de 1946, foi inserido, no Brasil no ano de 1986, por intermédio do Decreto-Lei n.º 2.284, de 10 de março de 1986 e regulamentado pelo Decreto n.º 92.608, de 30 abril de 1986. Após a Constituição de 1988, o benefício do SeguroDesemprego passou a integrar o Programa do Seguro-Desemprego (Lei n.º 7.998, 11 de janeiro de 1990). com as atrocidades de seus governantes, a ceifar os direitos básicos das crianças, dos trabalhadores, das crianças que trabalham, daqueles que estão, agora nesse momento, sofrendo de exaustão no labor, em meio a canaviais, limpando as ruas, em carvoarias, em meio ao lixo, catando restos, reciclando, atendendo... Valores sociais precisam ser revistos, urgentemente, antes que a sociedade sucumba diante de suas próprias ignorâncias! (Reportagem exibida pelo programa Fantástico, da Rede Globo, no dia 8 de maio de 2011). 37 2.2.3 Fundo de Garantia do Tempo de Serviço O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço constitui recolhimentos pecuniários realizados mensalmente pelo empregador, frente à Caixa Econômica Federal, em favor do empregado, podendo esse sacar o valor quando da ocorrência de uma das hipóteses legalmente previstas. É um instituto de caráter jurídico complexo e “multidimensional” (DELGADO, 2007, p. 1.259). O saque pode ser realizado tanto quando da cessação da relação laboral (na dispensa imotivada e na rescisão indireta, por exemplo), como na vigência do contrato (basicamente em prol da aquisição habitacional concedida, no âmbito do SFH – Sistema Financeiro habitacional). O instituto, ora em estudo, é direito trabalhista devido a todo trabalhador urbano e rural, até mesmo o avulso, que não possui vínculo empregatício, mas, conforme a própria constituição, tem os seus direitos igualados aos demais (artigo 7º, inciso XXXIV). Criado pela Lei nº 5.107/66 (hoje a regulamentação básica consiste na Lei n° 8.036/90), o FGTS instituiu um sistema alternativo ao modelo celetista/constitucional (o da estabilidade decenal e o da indenização crescente por tempo de serviço), sujeito a uma opção expressa no instante da celebração do contrato (ou a opção retroativa). A Constituição de 1988 universalizou, formalmente, o sistema7, sendo respeitado o direito adquirido de quem já possuía mais de dez anos de serviço, em 05/10/88, e não tinha aderido ao regime do FGTS anteriormente. O FGTS possui um Conselho Curador que estabelece normas e diretrizes, sendo composto por membros representantes dos empregadores, trabalhadores, órgãos e entidades governamentais. A incidência do FGTS recai sobre a remuneração mensal do obreiro, inclusive horas extras e adicionais. Incide sobre o aviso prévio (Súmula 305 do TST) e são devidas nas hipóteses de interrupção do contrato de trabalho. Existe, ainda, a obrigação dos depósitos nas seguintes hipóteses de suspensão contratual: prestação de serviço militar, acidente de trabalho e licença-maternidade. Existe, ainda, a obrigatoriedade desses depósitos no trabalho realizado no exterior (OJ 232 da SDI-1). A jurisprudência majoritária entende que a aposentadoria espontânea não é causa de extinção do contrato de trabalho, assim, se o empregado permanece prestando serviços ao empregador após ter aposentado por tempo de serviço, caso haja, dispensa imotivada, fará jus 7 Esse diploma excetuava a imperatividade do recolhimento do empregado doméstico. Atualmente, existe a possibilidade de inserção voluntária dessa categoria de trabalhadores, conforme a Lei 10.208/01. 38 à multa de 40% do FGTS sobre a totalidade dos depósitos efetuados no curso do contrato de trabalho. 8 A multa prevista no ADCT, 10, CR/88, quando da rescisão contratual (cessão sem justa causa), de 40%, sobre o saldo constante do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada, durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros. Na culpa recíproca, o importe é de 20%. O instituto de FGTS é compatível com o regime de estabilidade ou de garantia provisória, contratualmente prevista, sendo incompatível com o regime de estabilidade decenal previsto na CLT. 9 Prescreve, o direito de reclamar contra o não-recolhimento da contribuição para o FGTS, em trinta anos, no entanto, deve ser observada a prescrição bienal. Assim, findo o contrato de trabalho o empregado tem dois anos, para cobrar os últimos trinta. Presentemente, será objetivo de crítica a prescrição trabalhista (bienal e quinquenal). Esse é o entendimento firmado na Súmula 362 do TST. O instituto da prescrição necessita de existir, para dar segurança às relações jurídicas, mas não para fulminar o direito. É discrepante um prazo tão exíguo, dois anos, para cobrar um déficit empregatício de 30 (trinta) anos. No caso concreto, quando estiver definido, pelo reclamante, o período em que não houve depósito do FGTS, ou se houve, em valor inferior, caso a reclamada alegue a inexistência de diferença nos recolhimentos de FGTS, atrai para si o ônus de provar, demonstrando o fato extintivo do direito do autor, incumbindo-lhe apresentar as guias respectivas (conforme as regras estabelecidas nos artigos 818 da CLT e 333, II, do CPC). Esse era o entendimento consubstanciado na OJ 301 da SDI-1, no entanto, cancelada em 2011, especificamente no mês de maio, pela Resolução 175 do TST. Na Lei Completar 110/01, foi instituída a contribuição social, devida pelos empregadores a cada trabalhador, com uma alíquota de cinco décimos por cento sobre a remuneração do mês anterior. O valor que era de 8% passou a 8,5%. Nessa norma, em caso de despedida de empregado sem justa causa, foi criada a alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas. 8 9 Entendimento consubstanciado na OJ 361, SDI-1 do TST. (BRASIL, 2008). Esse é o entendimento firmado na Súmula 98 do TST (BRASIL, 98). Na Súmula 299 (BRASIL, 2005), do TST, SDI 1, hoje cancelada, entendia-se como compatível. 39 2.2.4 Salário Mínimo O salário mínimo ou, para alguns, o salário mínimo legal, é o menor patamar pecuniário que deve, por força de lei, ser pago à pessoa obreira, individualmente, como contraprestação ao trabalho prestado ao seu empregador. Constitui um direito social e um efetivo instrumento de proteção da classe-que-vive-do-trabalho de baixa rentabilidade. José Martins Catharino (1972, p. 453.) descreve o “salário mínimo vital”, ao se referir às necessidades do trabalhador e de sua família. Na OIT, existe previsão acerca desse tema, tal como, a Convenção 26 sobre os “Métodos de Fixação de Salários Mínimos”, cuja aprovação nacional deu-se através do Decreto Legislativo n. 24, de 29.5.65. Com a promulgação da Lei nº 185, datada de janeiro de 1936 no Brasil, surgiu o salário mínimo, não unificado, ou seja, existia variação de valores entre os estados brasileiros (valores esses estabelecidos pelo Decreto-Lei nº 2.162, de 1º de maio de 1940). À época existiam 14 importâncias, impostas em conformidade às peculiaridades de cada região. A unificação legal apenas ocorreu na década de 1980, em legislação ordinária (Decreto-Lei nº 2.351/87), mas, constitucionalmente assegurado, apenas em 1988, vetando a utilização do salário mínimo como referência para o cálculo de outros valores e estipulando a atualização periódica do mesmo. Frente ao plano Real, o salário mínimo passou a ser ajustado anualmente no mês de abril de cada ano. Desde 1994, com a criação da moeda real, o Brasil teve 19 reajustes do salário mínimo 10. Para o direito social ao salário mínimo, descrito no inciso IV, do artigo 7º, existe a previsão de que esse salário deva ser capaz de atender às necessidades vitais básicas da pessoa e de sua família com: moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social; considerando reajustes periódicos a preservar o poder aquisitivo do trabalhador. Notoriamente, a atual valoração do salário é incompatível com as necessidades vitais do cidadão brasileiro. Segundo pesquisa do DIEESE, de dezembro de 2010, o salário mínimo nominal era de R$ 510,00 e o salário mínimo necessário R$ 2.227,53. Fazendo uma básica regra de três da matemática: sendo o valor de R$ 622,00 dever-se-ia receber, aproximadamente: R$ 2.716,71 (seguindo a lógica da pesquisa do DIEESE). Considerando que é possível que os preços praticados no mercado em geral aumentam, em função do acréscimo do salário mínimo, conclui-se que para atender às necessidades básicas, 10 No atual governo, o salário mínimo foi reajustado de acordo com a Inflação (INPC/Índice Nacional de Preços ao Consumidor) mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto). 40 no Brasil, o cidadão deveria receber o valor encontrado pela pesquisa do DIEESE, que, frente à atual conjuntura econômica, seria insustentável. Mas, afinal o que seriam essas necessidades vitais básicas? Considerando, exemplificadamente, que a alimentação normalmente é feita em quatro etapas do dia, duas maiores, almoço e janta, e duas menores, café-da-manhã e o lanhe da tarde, o gasto médio dos brasileiros é de R$ 421,72, segundo dados que fazem parte da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF – “mostra desigualdades e transformações no orçamento das famílias brasileiras”) 2008/2009, divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em junho de 2010. O IBGE divulgou que a família brasileira gasta, em média, R$ 2.626,31 por mês. Dessa forma, o valor do salário mínimo necessário, de R$ 2.227,53, estaria fora desse padrão médio de vida, sem falar nos antigos R$ 545,00, atuais R$622,00. Dessa forma, o conceito de “necessidades vitais básicas” é relativo. Na Constituição, existe um rol (acredita-se que exemplificativo) do que seriam as necessidades: moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social. Levando-se em consideração o cálculo do gasto médio com alimentação (o de R$ 421,72) para uma família que gasta R$ 2.626,31 (considerando, hipoteticamente que a família gasta exatamente o que ganha, para facilitar o cálculo), o trabalhador que ganha R$ 622,00 (e sustenta a sua família) só poderia gastar, com a necessidade vital mais básica de todas que é a alimentação, míseros R$ 99,87 (por todo o mês e para toda a família). O constituinte estabeleceu, ainda, a proibição de vinculação do salário mínimo para qualquer fim. Esse preceito já era objeto de legislação ordinária, mas ganhou força de norma constitucional, apenas em 1988. Essa proteção pressupõe a proibição de se vincular a prestação do salário mínimo a contratos de aluguéis, contratos comerciais, honorários advocatícios, dentre outras infindáveis possibilidades, no sistema jurídico-comercial brasileiro. No artigo 76, da Consolidação das Leis Trabalhistas, está definido o salário mínimo como: [...] a contraprestação mínima devida e paga diretamente pelo empregador a todo trabalhador, inclusive ao trabalhador rural, sem distinção de sexo, por dia normal de serviço, e capaz de satisfazer, em determinada época e região do País, as suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte. (BRASIL, 2011). Nota-se que a redação assemelha-se à constitucional, no entanto, o legislador celetista expôs que o salário mínimo deveria ser capaz de atender determinadas épocas e 41 regiões do país. Com a unificação, essa parte da redação não foi recepcionada pela Constituição. À época da promulgação da Lei Maior, diversos doutrinadores criticaram os possíveis resultados desse comando constitucional. Falou-se que cada região do país possuía suas peculiaridades e níveis de vida diferentes, portanto, a unificação seria injusta e utópica 11. Outros, com razão, ensinaram que a unificação contribuiria (o que relativamente solidificouse 12) com esses desajustes regionais dos níveis sócio-econômicos. Conforme o novo estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), intitulado “Relatório Mundial Sobre Salários 2010/2011 – Políticas Salariais em Tempos de Crise” 13, a crise econômica reduziu à metade o crescimento mundial de salários. De acordo com o texto, o crescimento médio dos salários mensais caiu de 2,8%, em 2007 (antes do início da crise econômica mundial) para 1,5% em 2008 e 1,6% em 2009. Em relação a diversos países, tais como: Alemanha, Austrália, Estados Unidos, Itália, Japão, México e República da Coréia, o Brasil teve melhores desempenhos, com aumentos salariais reais de 3,4% em 2008 e 3,3% em 2009. Esses resultados, no Brasil, ocorreram em virtude dos breves efeitos da crise econômica internacional ocorridos no país, bem como, ao aumento significativo do salário mínimo no país, realizados pelo presidente Lula, durante o período 2008-2009. Dilma Rousseff, presidente brasileira, sancionou, no dia 25 de fevereiro de 2011, a lei que reajustou o salário mínimo para R$ 545, seguindo a tendência mundial de reajustes de salários, da pós-crise. Com a nova lei, Dilma passou a poder editar por meio de Decreto (conforme o artigo 3º) o valor do mínimo até o ano 2015, levando-se em consideração a fórmula de reajuste com base na inflação do período e na variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. No entanto, mesmo a proposta do governo tendo sido aprovada 11 Nessa linha, por exemplo, tem-se Cretella Júnior que afirma, acerca da unificação: “Sem razão a regra jurídica constitucional, porque o território constitucional não é ilha, mas variadíssimo arquipélago socioeconômico, de tal modo que o custo de vida é diferente, em casa região. Os trabalhadores radicados em regiões, onde o custo de vida é menos elevado, recebem exatamente o mesmo quantum, em dinheiro dos que residem em pontos como Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo, onde o mesmo salário mínimo compra os mesmos bens, mas pelo menos cinquenta por cento mais caros do que os adquiridos em outras regiões do país”. (CRETELLA JUNIOR, 1989 pag. 926). 12 Os desníveis regionais, no Brasil, ainda são latentes. A região sudeste é, sem sombra de dúvida, a mais rica do país, no entanto, acredita-se que, caso não houvesse a unificação, a situação seria demasiadamente pior. As diferenças regionais, de renda e cultura, por exemplo, são fatores que inibem o crescimento do país. 13 No Prefácio do Relatório citado, relatora Manuela Tomei, diretora do “Programa de Trabalho e Emprego” que: “o presente relatório fornece aos decisores políticos alguns exemplos práticos de como a negociação coletiva, salário mínimo e políticas de rendimentos podem ajudar a enfrentar o desafio da justiça, com que se confrontam os decisores políticos de hoje. Esperamos que estas ilustrações possam ajudar os decisores políticos e os parceiros sociais a fazerem avançar os objetivos do trabalho digno e contribuir para levar à prática a Declaração da OIT sobre Justiça Social para uma Globalização Justa e o Pacto Global para o Emprego, internacionalmente acordados e que receberam um forte apoio de governos, de organizações de empregadores e organizações de trabalhadores de todas as regiões do mundo”. (ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, 2011). (Grifou-se). 42 integralmente pelo Congresso Nacional, a fixação do valor do salário mínimo, por Decreto, pode vir a ser objeto de questionamento no Supremo Tribunal Federal, uma vez que no inciso IV, do artigo 7º da Constituição, existe a necessidade, para o reajuste, de lei (no sendo estrito, ou seja, elaborada pelo Poder Legislativo, indicando uma conduta abstrata, genérica, imperativa e coerciva, bem como a forma de sua feitura). Lembrando que Decreto do executivo não é lei em sentido restrito (ou estrito). 14 O salário mínimo diferencia-se de uma gama de terminologias que abarcam a palavra “salário”, tais como as abaixo comentadas. A palavra “salário” 15 difere-se de salário-mínimo e do salário básico. O salário lato sensu inclui inúmeras parcelas do contrato de trabalho, o salário básico está agregado junto ao salário, assim como o abono e os adicionais, por exemplo. Recai sobre o salário o “efeito expansionista circular” (DELGADO, 2007, p. 729), que é a necessária repercussão existente entre as verbas contratuais (os reflexos das parcelas sobre as próprias parcelas). O termo “remuneração” é diferente do termo “salário”, o primeiro é uma termologia mais ampla que, conforme ensinava Cesarino Junior (1980. p. 230), significa: “o conjunto dos proventos que o empregado recebe, direta ou indiretamente, em virtude do trabalho prestado”. A renumeração engloba o salário acrescido das gorjetas. O salário base (básico), diferentemente do salário mínimo, corresponde à contraprestação fixa basilar, paga pelo empregador ao empregado, que atrai para si todo o complexo de garantias, juridicamente existente no ordenamento laboral. Existe o instituto jurídico do salário mínimo profissional ou o piso salarial profissional. Esse é fixado em lei para “integrantes de uma determinada categoria, não encontra resistência constitucional na Constituição, artigo 7º, XXXII” (CARRION, 2007, p. 138). É o salário normativo judicial que corresponde àquele fixado em dissídio coletivo (aplicável à categoria participante do dissídio). O salário mínimo convencional é aquele constante no correspondente instrumento negocial coletivo, em convenção coletiva de trabalho e acordo coletivo de trabalho. 14 Em defesa de o reajuste ser feito por decreto, Michael Temer, vice-presidente, expôs que: "será apenas um decreto de natureza regulamentar", afirma ainda que: "vai cumprir o que a Lei estabeleceu, fazendo um simples cálculo aritmético a cada ano que passa. Isso, aliás, traz segurança jurídica para as relações sociais. As pessoas sabem o que vai acontecer em matéria de salário mínimo nos próximos 3 anos". (GAZETA DO POVO, 2011). 15 Sobre o salário, recaem inúmeras regras protetivas, até mesmo no artigo 7º da Constituição. O pagamento pelo trabalho é o que, grosso modo, destoa o trabalho livre do trabalho escravo, por isso justifica, que em um Estado Democrático de Direito, tenha, em seu ordenamento, uma gama de normas que o proteja. Diante dessa importância, tem-se a Convenção 95 da OIT, que possui regras de proteção do trabalho. 43 Como bem lembra Márcio Túlio Viana (2008, p. 123), o salário-mínimo deve, conforme a Constituição, atender a nove necessidades, como antes demonstradas, e, excetuando a Previdência Social, todas as necessidades básicas vitais, podem ser pagas em salário in natura. Mas, o salário mínimo não pode ser pago com outras utilidades. “Pode-se imaginar o salário-mínimo como uma espécie de muro, com tijolos de certas cores, que correspondem àquelas nove necessidades – que são insubstituíveis” (VIANA, 2008, p. 124). Esses “tijolos” são intocáveis, não podem ser substituídos por “tijolos” de outras espécies. O salário utilidade é a parcela salarial paga pelo empregador ao empregado, em bens ou serviços, de forma habitual (reiteradamente ao longo do contrato, todo dia, semana ou mês), fornecida com o intuito de retribuição (é a contraprestação pelo serviço prestado e não para o serviço, ou seja, não para a melhor execução do trabalho, tal como uniforme, ferramentas, equipamentos de proteção individual e dentre outros bens ou serviços). Notória é a diferenciação entre salário mínimo e salário-utilidade. Essa figura jurídica encontra-se no artigo 458, da CLT, o texto dessa norma é claro. Outra terminologia que, presentemente, merece destaque é o chamado salário condição, que se encontra, por exemplo, nos artigos 194 e 469, § 3º, da CLT. Na jurisprudência, têm-se como exemplos: as Súmulas 60, 80, 248, 265 e 291 do TST. Corresponde à parcela salarial que não se mantém vinculada ao contrato de trabalho ad eternum, podendo ser suprimida pelo empregador, caso seu fato gerador desapareça. É o caso dos adicionais, por exemplo, quando se faz hora-extra, tem-se o direito ao pagamento correspondente tão somente àquele período laborado como extraordinário. Caso o trabalhador não faça mais hora-extra, não justifica o pagamento de um trabalho não realizado. O salário isonômico está atrelado ao princípio da isonomia salarial, inciso XXX do artigo 7º, da Constituição, cujo assunto será adiante tratado. Salário complessivo ou “completivo” é uma terminologia utilizada para definir a prática de se congregar todo o complexo salarial (as parcelas salariais), sem fazer as devidas distinções dos valores pagos, por exemplo, a título de hora-extra ou quais os adicionais. Pagando-se uma importância fixa ao empregado. Essa é uma prática condenada pela jurisprudência 16 16 . Elenca Valentim Carrion (2007, p. 318) alguns fundamentos sobre uma Como exemplo tem-se a seguinte jurisprudência do TRT da 3ª Região, Minas Gerais: “EMENTA: SALÁRIO COMPLESSIVO - PRÉ-CONTRATAÇÃO DE HORAS EXTRAS - ILEGALIDADE. Se a prova oral do processo revela que a trabalhadora foi contratada para cumprir uma jornada de seis horas, acrescida de duas horas extraordinárias e nos recibos de salário verifica-se o pagamento habitual realizado sob a rubrica “horaextra fixa”, evidencia-se a pré-contratação de horas extras, repudiada pelo ordenamento jurídico, nos termos do entendimento já consolidado no Colendo TST, nas Súmulas 91 e 199, sendo de se considerar nula a contratação do serviço suplementar, quando da admissão da trabalhadora. Nesse caso, entende-se que os 44 possível nulidade desse pagamento: “a) a falta de nexo causa-efeito e transação com direitos futuros; b) descumprimento do mandamento constitucional de hora noturna superior à diurna; c) renúncia pelo empregado de horas extras; d) descumprimento do pagamento do descanso semanal”. Ressalta-se que essa prática visa burlar as normas de proteção ao salário, exemplificadamente, por prejudicar os cálculos dos reflexos das parcelas salariais, por isso é condenada 17 . No entanto, cada caso concreto deve ser analisado, enfocado e avaliado o possível prejuízo ao trabalhador. Diante das distinções acima demonstradas, deve-se ter em mente que o mínimo que deve ser pago ao trabalhador é o salário mínimo legal, enquanto meio de subsistência do ser humano. Apesar da flexibilização existente, na própria Constituição, da percepção de um salário mínimo proporcional. Argumenta-se que o salário mínimo é garantido àqueles que laborem a jornada constitucionalmente assegurada (8 horas diárias e 44 horas semanais – incisos XIII e XIV, do artigo 7º). A jurisprudência e a doutrina são quase que unânimes em aceitar essa proporcionalidade 18 . Considera-se constitucional a percepção do salário proporcional desde que ao trabalhador seja oportunizada a possibilidade de, no outro horário do dia, realizar mais um trabalho, por exemplo, a complementar sua renda. Sendo, portanto a jornada, realmente reduzida e não exaustiva, do contrário haveria ilegalidade. 2.2.5 Piso Salarial Proporcional à Extensão e à Complexidade do Trabalho O piso salarial é uma garantia remuneratória mínima definida para uma determinada categoria de trabalhadores. Essa é uma criação do constituinte originário que não desnatura o instituto do salário mínimo. Esse piso decorre de lei que o regulamente, de negociação coletiva ou da interferência da justiça laboral. Conforme os ensinamentos de Chiarelli: O piso salarial é plástico, variável. Ajusta-se à dinâmica da relação de produção, mensura e representa o vigor conjuntural de um setor, a força, maior ou menor, de representação reivindicatória, num determinado momento, numa certa região, de uma específica categoria. O Poder Público, quando faz lei ou oferece chancela judicial de sentença coletiva, assegura-lhe força homologatória, mas o sêmen original, a paternidade verdadeira, é a da realidade viva e vivida do mundo fático: valores ajustados apenas remuneram a jornada normal, sendo devidas as horas extras com adicional de, no mínimo, 50% (cinquenta por cento).”(MINAS GERAIS, 2009). 17 Nesse sentido, tem-se a Súmula 91 do TST. 18 Como exemplo, tem-se o seguinte acordo do TRT da 5ª Região, Bahia: “Ementa: SALÁRIO MÍNIMO PROPORCIONAL À JORNADA REDUZIDA. POSSIBILIDADE. "Havendo contratação para cumprimento de jornada reduzida, inferior à previsão constitucional de oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais, é lícito o pagamento do piso salarial ou do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado." (OJ 358 da SDI1 do TST)”. (BAHIA, 2010). 45 dos sindicatos, das empresas, da organização profissional. (CHIARELLI, 1989, p. 84). Existe piso salarial profissional, nacionalmente estabelecido por lei, como é o caso dos engenheiros, médicos e profissionais do magistério público da educação básica19; caso o piso não seja instituído em lei, sendo preestabelecido em resolução do representante da classe, não vincula o empregador 20 . Ou ainda, o regionalmente estabelecido, mediante norma coletiva negociada, como é o caso dos metalúrgicos de Betim, Igarapé e São Joaquim de Bicas, Sabará, Araguari e Lavras, em Minas Gerais 21. Quando o piso é estabelecido judicialmente, é válido para a categoria que é parte integrante no processo, na localidade de representação do sindicato. O empregador pode pagar mais que o piso, o próprio nome do instituto clarifica essa assertiva, sendo o mínimo a ser pago por determinado empregador a empregados de uma categorial profissional. Caso o empregador pague um valor a maior, essa situação passa a 19 20 21 Por exemplo, a Lei nº 11.738/2008 regulamenta a alínea “e” do inciso III do caput do artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a instituir o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica. Preconiza o artigo 2º que: “o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica será de R$ 950,00 (novecentos e cinquenta reais) mensais, para a formação em nível médio, na modalidade Normal, prevista no artigo 62 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.” No § 1º, desse mesmo artigo está descrito que: “o piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das Carreiras do magistério público da educação básica, para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais.” O § 2º, define quem seriam os profissionais a que a Lei se refere: “por profissionais do magistério público da educação básica entendem-se aqueles que desempenham as atividades de docência ou as de suporte pedagógico à docência, isto é, direção ou administração, planejamento, inspeção, supervisão, orientação e coordenação educacionais, exercidas no âmbito das unidades escolares de educação básica, em suas diversas etapas e modalidades, com a formação mínima determinada pela legislação federal de diretrizes e bases da educação nacional.”. (BRASIL, 2011). Nesse sentido, tem-se o seguinte caso julgado no TRT do Mato Grosso: RO - 00783.2007.007.23.00-5. 2ª Relator: Desembargadora Maria Berenice, 02/04/08 (MATO GROSSO, 2008). A Convenção Coletiva em que de um lado tem-se a FIEMG (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) e diversos outros; do outro lado, por exemplo, sindicatos dos trabalhadores nas indústrias metalúrgicas, mecânicas e de material elétrico das seguintes localidades: Betim, Igarapé e São Joaquim de Bicas, Sabará, Araguari e Lavras, vige desde 1º de outubro de 2009 até 30 de setembro de 2011. Na cláusula 3º (“Salário de Ingresso”), está prescrito que: “A partir da vigência da presente convenção, nenhum empregado, excetuando-se o aprendiz, o empregado aluno e o office- boy, contínuo ou mensageiro, terá o salário de ingresso inferior ao adiante especificado: a. Para cada estabelecimento que contava em 30/09/2009 com até cinquenta empregados, R$ 545,60 (quinhentos e quarenta e cinco reais e sessenta centavos), por mês correspondente à jornada de trabalho de 220 (duzentos e vinte) horas mensais. b. Para cada estabelecimento que contava em 30/09/2009 com mais de 50 (cinquenta) e até 400 (quatrocentos) empregados, R$ 589,60 (quinhentos e oitenta e nove e sessenta centavos), por mês, correspondente à jornada de trabalho de 220 (duzentos e vinte) horas mensais. c. Para cada estabelecimento que contava em 30/09/2009 com mais de 400 (quatrocentos) e até 1000 (mil) empregados, R$644,60 (seiscentos e quarenta e quatro e sessenta centavos) por mês, correspondente à jornada de trabalho de 220 (duzentos e vinte) horas mensais. d. Para cada estabelecimento que contava em 30/09/2009 com mais de 1000 (mil) empregados, R$800,80 (oitocentos reais e oitenta centavos) por mês correspondente à jornada de trabalho de 220 (duzentos e vinte) horas mensais”. (CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE DE MINAS GERAIS, 2011). 46 aderir ao contrato de trabalho, não podendo mais ser revertida, salvo em negociação coletiva (lembrando da disposição do artigo 468, da CLT). Insta salientar, que não é unânime na doutrina a integração do valor das gorjetas ao piso salarial 22 . Com relação às comissões, a jurisprudência majoritária mostra-se, atualmente, contrária ao fato de essas parcelas ingressarem no cômputo do piso. 23 Também majoritariamente, entende-se que é cabível o pagamento de um piso salarial proporcional à jornada laborada. 24 2.2.6 Irredutibilidade Salarial A irredutibilidade salarial é um princípio concernente ao sistema de garantias salariais. Consiste em um dos mecanismos de proteção, quanto ao valor do salário. Essa norma constitucional pressupõe que ao empregador é vedado alterar o valor do salário (ao longo do contrato laboral), e desdobra-se em outro princípio que é o da inalterabilidade contratual lesiva, salvo nos caso de haver norma coletiva autônoma negociada (convenção ou acordo coletivo). O constituinte estabeleceu essa norma como única exceção a reduzir o salário do trabalhador, ou seja, não se pode reduzir por lei, medida-provisória e nem outro ato estatal, por exemplo. O princípio da irredutibilidade, como bem lembra Cretella Junior (1998, p. 932) tem como corolário outras importantes regras: da impenhorabilidade, da intangibilidade e da inalterabilidade contratual lesiva. A inalterabilidade contratual lesiva é princípio que remota à teoria civilista, substanciado no pacta sunt servanda (relativizado pela cláusula rebus sic standibus). No Direito do Trabalho, sofreu adaptações significativas, acabou por tomar rumos diferentes do 22 23 24 No TRT de Santa Catarina, já foi decidido que não computa o valor das gorjetas no piso salarial. “DIFERENÇAS SALARIAIS – GORJETAS – PISO SALARIAL – INTEGRAÇÃO – Não devem ser computados na remuneração do piso salarial da categoria os valores referentes às gorjetas, devendo aquele ser representado por salário fixo, não podendo ser somado à parte variável.” (SANTA CATARINA, 2002). No TST, foi assim decidido: Ementa: “AGRAVO DIFERENÇAS SALARIAIS PISO SALARIAL ESTABELECIDO EM CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO A decisão agravada foi proferida em estrita observância aos artigos 896, § 5º, da CLT; 557, caput, do CPC; e 5º, LXXVIII, da Constituição, razão pela qual é insuscetível de reforma ou reconsideração. Agravo a que se nega provimento.” [...] “É que o salário fixo não pode ser inferior ao piso salarial estabelecido pelos instrumentos normativos. Também, é inaceitável que o quantum recebido a título de comissão complete ou supere o valor do piso salarial.” (BRASIL, 2011). Noutros termos, a soma do valor do salário fixo e do salário variável não afasta os reajustes normativos sobre a parte fixa do salário. Nesse sentido, tem-se a Súmula 358 do TST, em que está exposto que: “SALÁRIO MÍNIMO E PISO SALARIAL PROPORCIONAL À JORNADA REDUZIDA. POSSIBILIDADE (DJ 14.03.2008). Havendo contratação para cumprimento de jornada reduzida, inferior à previsão constitucional de oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais, é lícito o pagamento do piso salarial ou do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado”. (BRASIL, 2008). 47 viés cível. Consiste em não poder, o empregador, modificar cláusulas contratuais, lesionando os direitos do trabalhador. Salienta Cesarino Junior (1980, p.275) que “salário, uma vez fixado no contrato de trabalho, é inalterável para pior, seja qualitativa, seja quantitativamente”. Esse ilustre autor exemplifica demonstrando que, existe uma redução do patamar qualitativo do empregado que passa a receber apenas comissão, em detrimento do salário fixo. Desdobra-se no princípio da intangibilidade contratual objetiva, assim, que o conteúdo do contrato empregatício não pode ser modificado, mesmo que aconteça mudança efetiva do sujeito empresarial, ou seja, mesmo que ocorra sucessão trabalhista (ou alteração subjetiva do contrato de trabalho). O princípio da intangibilidade salarial preconiza que a ordem jurídica estabeleça todo um arcabouço protetivo do salário, como um todo, e não apenas do seu valor, na medida em que a natureza jurídica do complexo salarial tenha caráter alimentar. Uma das facetas dessas garantias envolve os descontos no salário do trabalhador (por exemplo, as disposições do artigo 462, da CLT); existem ainda, as proteções contra os credores do empregador e do empregado; proteções contra a discriminação na relação de emprego (aplicação do princípio da isonomia, por exemplo, contra as diferenciações salariais entre homens e mulheres) e; a existência do instituto da equiparação salarial (cujos requisitos estão consubstanciados no artigo 461 da CLT, e Súmula 6, do TST). A impenhorabilidade do salário é uma garantia de que as verbas salariais não possam sofrer constrição judicial e nem extrajudicial. Assim, o salário do trabalhador não pode ser penhorado (segundo o artigo 649, IV, do CPC). A redução salarial ilícita pode ocorrer de forma direta, quando o empregador reduz o próprio valor do salário, ou indireta, quando, ao reduzir a causa geradora do valor, por reflexo, reduz o salário. A supressão da jornada de trabalho e, consequente redução do valor do salário, é ilícita. A transferência do trabalhador para o período diurno, sendo-lhe suprimido o respectivo adicional, não constituiu redução salarial ilícita (conforme o entendimento do TST na Súmula 265), pelo contrário, representa um ganho em saúde e qualidade de vida para o obreiro. A supressão do horário noturno de trabalho é “de interesse social” (CARRION, 2007, p. 342). No artigo 468, da CLT, está previsto que é lícita a alteração das cláusulas contratuais, por mútuo consentimento (que pode ser verbal ou escrito), desde que não gere prejuízos ao empregado, nem mesmo indiretamente. Os “prejuízos” a que estão sendo referidos no artigo podem ser de ordem econômica ou não. Mesmo havendo a concordância do empregado, caso esse sofra um prejuízo, o ato será nulo. A alteração será lícita, na hipótese de haver o 48 exclusivo interesse do empregado a justificar a alteração, por exemplo, ao solicitar a redução de sua jornada para fazer uma faculdade. Sendo considerada nula a alteração, o empregado fará jus à volta do status quo ante, bem como o pagamento pelos prejuízos causados, ou a rescisão indireta (por culpa do empregador). No parágrafo único, do artigo supracitado (considerado, pela doutrina e pela jurisprudência, como recepcionado pela Constituição), o legislador infraconstitucional excetuou a regra de irredutibilidade salarial, prescrevendo que não será considerada alteração unilateral ilícita a reversão do empregado do exercício de função de confiança, para o cargo efetivo anterior (percebendo um salário a menor). Os motivos para que o empregado seja “promovido” ao cargo de confiança são de ordem subjetiva (do empregador), por isso essa é uma relação facilmente exaurível, frágil. Os casos mais comuns de alteração no valor do salário (latu sensu) ocorrem frente às parcelas salariais condicionais (o chamado pela doutrina de salário condição), que podem ser supridas, caso desapareça a causa ensejadora da parcela salarial, como é o caso, por exemplo, do adicional de insalubridade (exemplos de disposições acerca do tema estão nos artigos: 194 e 469, §3º, da CLT e Súmulas: 60, 76, 80, 248, 265, e 291 25 e OJ da SDI-1 396). Nesses casos, em princípio, não haverá afronta ao princípio, ora estudado. O posicionamento da irredutibilidade salarial, na conjuntura econômica de um país subdesenvolvido, é “formal” em função das variações inflacionárias, que desvalorizam os salários, reduzindo o poder de compra do trabalhador. Ao empregador, é vedado reduzir o salário do empregado, no entanto, esse pode ter diminuído o seu valor real, frente às atuações da máquina administrativa pública. O direito social à irredutibilidade salarial recai, ainda, em um importante e atual tema: a aplicação do princípio da estabilidade econômica ou financeira do trabalhador. O TST incorporou a aplicação dessa principiologia na Súmula n.º 372, item I 26 . O caso específico ocorre frente à supressão de gratificação de função, após dez anos de recebimento 27. A lógica na qual se reveste essa teoria é a que, ao longo dos dez anos, o empregado passou a incorporar 25 26 27 Outro interessante exemplo é o entendimento da OJ 244 da SDI-1: “PROFESSOR. REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA. POSSIBILIDADE. Inserida em 20.06.01 A redução da carga horária do professor, em virtude da diminuição do número de alunos, não constitui alteração contratual, uma vez que não implica redução do valor da hora-aula.” (BRASIL, 2001). Súmula 372, I: “GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUPRESSÃO OU REDUÇÃO. LIMITES (conversão das Orientações Jurisprudenciais nos 45 e 303 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 I - Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. (ex-OJ nº 45 da SBDI-1 - inserida em 25.11.1996)”. (BRASIL, 1996). No TRT de Minas Gerais, vêm-se assim decidindo, aplicando a Súmula 372, I, do TST: Data de Publicação: 03-11-2010. (Processo: 0000198-34.2010.5.03.0016 RO. Relator: Bolívar Viégas Peixoto, 03-11-2010). 49 a gratificação ao seu patrimônio, ao seu orçamento familiar, conforme diversos julgados do TST 28 . O recebimento desse valor por tanto tempo adere ao contrato de trabalho, enquanto condição mais benéfica. Esse período não necessita ser contínuo. Como bem decidiu o ministro Maurício Godinho Delgado, (TST AIRR-2064/2003-001-21-40.2) caso a gratificação não sofra um período de interrupção relevante, a sua supressão pode comprometer a estabilidade financeira do trabalhador. O empregador, amparado pelo artigo 468, da CLT, pode dispor do cargo de confiança, revertendo o empregado ao cargo efetivo, sem, contudo, minorar o salário, retirando-lhe a gratificação. 2.2.7 Garantia de Salário, Nunca Inferior ao Mínimo, para os que Percebem Remuneração Variável A garantia, atualmente existente, no inciso VII, do artigo 7º, da Constituição da República, garantindo pelo menos o salário mínimo, ao trabalhador que labore percebendo remuneração variável, era objeto de norma infraconstitucional. Na CLT, artigos 117 e 118, o legislador celetista já previa a impossibilidade de pagamento a menor do salário mínimo, mesmo que tal cláusula fosse objeto de estipulação em diploma coletivo negociado. Os trabalhadores que percebem remuneração variável são os chamados comissionistas. A comissão é definida como o valor pago sobre as transações efetuadas pelo empregado, que pode ser em percentagem ou em valor fixo. O salário percebido em comissões é modalidade de salário tarefa (CESARINO JUNIOR, 1980, p. 241), para outros doutrinadores, seria percentagem. Constituem parcelas salariais “contraprestativas pagas pelo empregador ao empregado em decorrência de uma produção alcançada pelo obreiro no contexto do contrato, calculado variavelmente, em contrapartida a essa produção” (DELGADO, 2007, p.744). Como é uma parcela paga, conforme o montante produzido pelo trabalhador, a natureza dessa seria de “salário produção”. O comissionista puro é aquele que possui, na base de seu complexo salarial, apenas a comissão. O comissionista misto é o que percebe uma remuneração parte fixa e parte variável. O empregador em nenhum dos casos pode diminuir o parâmetro de cálculo das comissões, aplicando-se a regra constitucional da irredutibilidade salarial (indireta). 28 AIRR - 22040-65.2006.5.03.0063. Data de Julgamento: 11/06/2008 e; AIRR - 112740-80.2003.5.21.0002 Data de Julgamento: 10/09/2008. 50 O comissionista puro, portanto, possui um salário inteiramente variável, razão pela qual sujeita à regra do artigo 7º, inciso VII. Essa modalidade de pagamento é usualmente percebida pelos trabalhadores que laboram no comércio: vendedores, viajantes e pracistas. 29 As atividades dos empregados vendedores, viajantes ou pracistas são reguladas pelos preceitos da Lei nº 3.207/57. Em princípio, a comissão é devida em função da ultimação do negócio, e não do seu efetivo cumprimento. Lembrando que a ultimação não é, necessariamente, o pagamento. Conforme o artigo 3º dessa Lei: “a transação será considerada aceita se o empregador não a recusar por escrito, dentro de 10 (dez) dias, contados da data da proposta [...]” (BRASIL, 2011). O pagamento das comissões e percentagens, via de regra, é feito mês a mês, no entanto, pode ser realizado trimestralmente pelas partes interessadas, contado da aceitação do negócio. Nesse caso, a empresa é obrigada a expedir a conta respectiva, com as cópias das faturas correspondentes aos negócios concluídos, como comprovante daquilo que foi vendido pelo empregado (conforme o artigo 4º e parágrafo único da Lei nº 3.207/56). Averiguada a insolvência do comprador, pertence ao empregador o direito de estornar a comissão que houver pagado (disposição do artigo 7º, da lai supracitada). Lembrando que os riscos do negócio correm por conta do empregador (artigo 2º, caput, da CLT), devendo essa norma ser interpretada de forma restritiva. Maurício Godinho Delgado (2007, p. 747) propõe a seguinte solução: “[...] somente a insolvência do adquirente – e não seu mero adimplemento – é que autoriza o estorno mencionado pela lei especial”. 2.2.8 Décimo Terceiro Salário O décimo terceiro salário (13º) constitui uma gratificação salarial legal, paga pelo empregador ao empregado, independentemente, da remuneração a que fizer jus, que corresponde 1/12 avos da remuneração devida em dezembro, por mês de serviço, do ano correspondente. No inciso VIII, do artigo, da Constituição, presentemente estudada, está descrito que são direitos dos trabalhadores urbanos ou rurais “décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria” (BRASIL, 2011). Antes da Constituição de 1988, como afirma José Martins Catharino (1972, p. 460), “a mal chamada ‘gratificação natalina’, nem gratificação nem integralmente natalina, foi criada pela Lei nº 4.090, de 29 As normas concernentes a esse tipo de trabalho são os artigos 457, 478, §4º, 142 §3º e 466 da CLT e Lei 3.207/57(Lei dos valores comissionados). 51 13.07.1962, lacônica, defeituosa e deficiente, aprovada às pressas”. E, é exatamente a mesma lei que, na atualidade, rege o instituto, com algumas alterações frente à Lei nº 9.011, de 1995. A regulamentação da referida lei, é feita pelo Decreto nº 57.155/65. Frente à legislação infraconstitucional, posterior à lei base de 1962, houve a ampliação do campo de incidência dessa parcela, vindo a ser constitucionalizada apenas em 1988. As normas que regem o instituto foram consideradas, pela doutrina e jurisprudência majoritárias, como recepcionadas pela Constituição, pois não colidem com o texto da Lei Maior. É uma parcela que adquiriu natureza salarial através dos costumes. Alguns empregadores outorgavam esse valor, no período natalino, de forma aleatória, como bem lembra Chiarelli (1989, p. 95), ao se referir à Lei de 1962: algumas empresas, de forma isolada e “por ato espontâneo, por política de pessoal decorrente da orientação específica da organização, beneficiavam seus empregados com uma gratificação coincidente com a época de Natal”. Essa vantagem remuneratória, outorgada pelo empregador, geralmente, estava vinculada a um resultado exitoso, o que elevava, ainda mais, o viés de aleatoriedade da concessão. Inicialmente, a primeira lei regulamentadora do instituto referia-se apenas aos empregados em geral (“todo empregado”), apenas mais tarde os avulsos passaram a ter esse direito. Em 1973, com a Lei nº 5.889, ao rurícola essa parcela foi estendida. Atualmente, todo empregado tem o direito ao 13º, inclusive o empregado doméstico (conforme o parágrafo único da Constituição da República). O pagamento do 13º será efetuado pelo empregador até o dia 20 de dezembro de cada ano, tomando-se por base a remuneração devida nesse mês, de acordo com o tempo de serviço do empregado no ano em curso (o pagamento pode ser feito em salário in natura, ou seja, em utilidades). Existe uma interessante peculiaridade: entre os meses de fevereiro e novembro de cada ano, o empregador deverá pagar, como adiantamento da gratificação, de uma só vez, metade do salário recebido pelo empregado no mês anterior (de acordo com o Decreto 57.155/65, artigo 2º e 3º). A segunda metade, normalmente é paga em dezembro, pouco antes do período natalino. O décimo terceiro integra o salário do trabalhador para todos os fins, gerando reflexos em outras parcelas. É o chamado “efeito expansionista circular” (DELGADO, 2008). Entretanto, não vem sendo considerado base de cálculo para o repouso semanal remunerado 30 30 . A OJ 394 da SDI-1 possui a seguinte redação: “REPOUSO SEMANAL REMUNERADO - RSR. INTEGRAÇÃO DAS HORAS EXTRAS. NÃO REPERCUSSÃO NO CÁLCULO DAS FÉRIAS, DO 52 Nas hipóteses em que o empregado for admitido no curso do ano, ou, durante esse, no entanto, não permanecer à disposição do empregador durante todos os meses, o adiantamento corresponderá à metade de 1/12 avos da remuneração, por mês de serviço ou fração superior a quinze dias (essa é a disposição do § 4º, artigo 3º, do Decreto). O adiantamento, no ensejo das férias do empregado, poderá ser realizado, caso esse o requeira no mês de janeiro do correspondente ano (disposição do artigo 4º do Decreto). É uma faculdade do empregado. Para os empregados que recebem salário variável, a qualquer título, a gratificação será calculada na base de 1/11 avos da soma das importâncias variáveis, devidas nos meses trabalhados até novembro de cada ano. A essa gratificação se somará a que corresponder à parte do salário contratual fixo (conforme o Decreto 57.155/65, artigo 2º). O 13º salário sempre será devido no caso de cessação da relação laboral, independentemente da causa ensejadora da ruptura (exceto justa causa 31 ) e do tempo do contrato de trabalho (é devido em contratos a prazo determinado e indeterminado). Cessado o contrato antes de dezembro, o 13º será pago proporcionalmente ao tempo trabalhado. O TST sumulou 32 o entendimento de que é devido o 13º nos casos de cessação da relação de trabalho, no importe de 50% do valor total, caso haja comprovada culpa recíproca. Havendo a rescisão do contrato de trabalho, salvo na hipótese de cessação por justa causa, o empregado receberá o 13º devido, calculado sobre a remuneração do respectivo mês. Lembrando que, o FGTS incide sobre as parcelas do 13º (conforme a Súmula 148 do TST 33). Dúvidas de interpretação, acerca da matéria, remontam à edição da primeira lei, em 1962. Alguns desses problemas já foram resolvidos pela jurisprudência, outros ainda não. Afinal, a rapidez das situações cotidianas supera a evolução legislativa e jurisprudencial. 31 32 33 DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO, DO AVISO PRÉVIO E DOS DEPÓSITOS DO FGTS. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010) A majoração do valor do repouso semanal remunerado, em razão da integração das horas extras habitualmente prestadas, não repercute no cálculo das férias, da gratificação natalina, do aviso prévio e do FGTS, sob pena de caracterização de “bis in idem”. (BRASIL, 2010). O fato de o trabalhador ter laborado ao longo do ano e, caso seja dispensando por justa causa, não receba o décimo terceiro salário é uma penalidade exacerbada, criada em legislação infraconstitucional. Os motivos determinantes para a rescisão direta do contrato de trabalho (que devem estar provados nos autos do processo), que assista a uma das hipóteses culminadas no artigo 482 da CLT, geram a pena capital de rescisão do contrato. A perda do 13º salário constitui bis in idem, mais uma penalidade pela falta cometida, infringindo a dignidade humana. Conforme a Súmula 14: “CULPA RECÍPROCA (nova redação) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Reconhecida a culpa recíproca na rescisão do contrato de trabalho (artigo 484 da CLT), o empregado tem direito a 50% (cinquenta por cento) do valor do aviso prévio, do décimo terceiro salário e das férias proporcionais”. (BRASIL, 2002). Súmula 148: “GRATIFICAÇÃO NATALINA (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. É computável a gratificação de Natal para efeito de cálculo de indenização (ex-Prejulgado nº 20).” (BRASIL, 2003). 53 Por ser uma parcela salarial que pode ser dividida em duas vezes, ao longo do ano, na forma acima explicada, pode haver a dúvida, na prática, sobre qual período recairá eventual prescrição. Como a gratificação natalina é exigível a partir do dia 20 de dezembro de cada ano, somente estará abrangida pela prescrição a que for decretada após essa data. Ao trabalhador temporário é devido o décimo terceiro salário. Essa era uma dúvida da jurisprudência e da doutrina, que foi sanada por boas interpretações 34 . A quitação, mês a mês, do décimo terceiro é ilegal, segundo a lei vigente, ou outra forma de pagamento que não siga as determinações legalmente impostas. 35 No trabalho intermitente, ou de jornada inferior à normal expressamente contratada, é devido o 13º, que deve ser calculado de forma proporcional ao número de dias laborados 36. 2.2.9 Remuneração do Trabalho Noturno Superior à do Diurno O trabalho noturno, por ser mais gravoso à saúde do trabalhador está sujeito às regras gerais estabelecidas na CLT, especificamente, no artigo 73, além de outras normas protetoras restritivas, tal como, frente ao trabalho do menor. A remuneração do trabalho noturno superior à do diurno é direito social estabelecido no inciso IX, do artigo ora enfatizado. José Martins Catharino (1972, p. 551) advertia que: “três fatores principais justificam a disciplina do trabalho noturno: a ausência de luz natural; sua prestação em horas normalmente destinadas a descanso e a repouso pelo sono; a diminuição de ruídos durante a noite”. Apesar de toda tecnologia atual em favor da iluminação artificial, o resultado ainda não se compara à luz natural. E, além do mais, diversos malefícios são apontados pela medicina moderna, acerca da iluminação artificial (por exemplo, o desenvolvimento de câncer). A “poluição sonora” diminui à noite, o que contribui para o descanso noturno. O cérebro e o resto do corpo necessitam desse “desligamento” à noite para repor suas energias. 34 Como por exemplo, o seguinte julgado do TRT de Minas Gerais: “EMENTA: DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO. TRABALHADOR TEMPORÁRIO. O trabalhador temporário tem direito ao décimo terceiro salário, por força do artigo 7º da CF que estendeu a parcela a todos os trabalhadores indistintamente. Ref.: Lei 6019/74 Artigo 479, CLT.” (MINAS GERAIS, 1992). 35 Nesse sentido: Processo n.:00460-2006-146-03-00-0 RO.Data de Publicação: 29-11-2006. Órgão Julgador: Segunda Turma. Relator: Convocado João Bosco Pinto Lara. Revisor: Márcio Flávio Salem Vidigal (MINAS GERAIS, 2006). 36 Como relatora, no TRT mineiro, Alice Monteiro de Barros já decidiu nesse sentido: Processo: RO 17456/95, data de Publicação: 26-04-1996 (MINAS GERAIS, 1996). 54 Ao laborar no período noturno, o homem abstém-se de diversos benefícios de uma noite bem dormida, diminuindo, consideravelmente, sua qualidade de vida. É à noite, o momento em que a pele se regenera, com mais facilidade; é o tempo de regeneração da rodopsina, pigmento dos olhos que é sensível à luz, ou seja, é o período de descanso dos olhos; ao dormir, o homem respira de forma mais profunda, oxigenando as células do corpo. Um corpo, verdadeiramente descansado, evita o acúmulo de células gordurosas, facilitando o emagrecimento (ou o controle do tecido adiposo), pois ao dormir, o corpo produz muito pouco o hormônio grelina, que é o responsável pelo aumento da vontade comer. Uma boa noite de sono descansa o sistema imunológico e evita infecções. Quando não se dorme bem, corre-se o risco de se desenvolver hipertensão, em função do risco do aumento da pressão arterial; não dormir bem aumenta o risco de doenças cardiovasculares, já que o corpo passa a produzir mais cortisol, hormônio que causa o stress. A frequência cardíaca, durante a noite, é retardada pelo organismo, assim as células coronárias e os tecidos passam a se consertar, evitando doenças cardíacas. Dormir e descansar bem a noite controla a diabetes tipo2, uma vez que aumenta os níveis de açúcar no sangue, em decorrência do cortisol. O cérebro necessita do descanso à noite para processar as informações acumuladas durante o dia, o que contribui para o aumento da capacidade intelectual. Os sonhos controlam as emoções, na medida em que à noite essas são liberadas inconscientemente. Uma noite mal dormida inibe a plena capacidade motora do ser humano. Esses são alguns motivos apresentados pelos cientistas, a justificar a necessidade de uma noite bem dormida. Da Constituição de 1967 para a Constituição da República atual, a redação foi alterada, de “salário de trabalho noturno superior ao diurno” para “remuneração do trabalho noturno superior a do diurno”. Houve um aprimoramento técnico da redação constitucional, lembrando que o salário está englobado na terminologia remuneração (salário mais gorjeta). O respectivo adicional, pelo labor noturno, é devido quando o empregado urbano trabalhou no período entre 22h00min às 05h00min. Nota-se que o horário noturno, juridicamente considerado, não coincide com as leis naturais (da efetiva diferença entre dia e noite). No caso do trabalhador rural, existe uma diferença, o horário noturno é de 21h00min às 05h00min (na lavoura) e 20h:00min às 04h:0min (na pecuária), conforme a Lei nº 5.889/73. Existem, ainda, casos especiais, tal como o dos advogados em que a hora noturna é de 20h00min às 05h00min (artigo 20, §3º, da Lei nº 8.906/94), fazendo jus a um adicional de 25%. 55 O horário de trabalho que começa de dia e termina à noite é chamado de horário 37 misto . Existe, ainda, outra hipótese de horário de trabalho: regime de revezamento semanal (uma semana em horário noturno e a outra em diurno) ou quinzenal, como demonstra Valentin Carrion (2007, p. 133). Mesmo nessas hipóteses haverá, para o empregador, a obrigatoriedade do pagamento do adicional, pelo período laborado dentro do horário noturno. 38 Ao menor de idade, é vedado o trabalho noturno (conforme a dicção do artigo 404, da CLT), o que é plenamente compatível com o viés constitucional de total proteção da saúde do menor. Anteriormente à vigente Constituição, o trabalho noturno era proibido à mulher 39. Essa disposição não foi recepcionada pela Constituição de 1988, em virtude do princípio da isonomia (constante no caput do artigo 5º), além dos motivos sócio-econômicos atuais (da sociedade moderna, ou pós-moderna). O valor desse acréscimo será o de 20 % sobre a hora diurna. E para o empregado rural é de 25% (artigo 7º da Lei do rurícola). Como vantagem adicional tem-se a consideração, para o trabalhador urbano, da hora noturna minorada, de 1hora (60 minutos) para 52 (cinquenta e dois) minutos e 30 (trinta) segundos 40 . Essa minoração é uma ficção jurídica (chamada de hora ficta noturna), o empregado urbano trabalha sete horas e “ganha” uma hora. Em se tratando de atividades exploratórias do petróleo: perfuração, produção e refinação, industrialização do xisto, indústria petroquímica, transporte de petróleo e seus derivados, a regulamentação é feita pela Lei nº 5.811/72, não sendo aplicada a hora ficta (OJ 112 d SDI-1). Essa exceção é desarrazoada, pois frente a essas atividades, que são altamente perigosas à saúde do trabalhador, assiste ainda mais razão a proteção social. Argumenta-se, ainda, que a Constituição, em nenhum momento faz essa ressalva. Portanto, normas em contrário não foram recepcionadas pela Lei Maior. Por ser salário condição, nos moldes, antes exposto, com a transferência do horário noturno para diurno, o empregado perde o adicional. O adicional noturno integra o salário do 37 A obrigatoriedade do pagamento do adicional noturno mesmo no horário misto encontra-se no artigo 73 § 4º da CLT. 38 Esse entendimento está exposto na Súmula 213 do TST (BRASIL, 1994). 39 Na antiga redação celetista, estava disposto que: “Artigo 379. É vedado à mulher o trabalho noturno, considerado esse o que for executado entre as vinte e duas (22) e as cinco (5) horas do dia seguinte. Parágrafo único. Estão excluídas da proibição desse artigo, alem das que trabalham nas atividades enumeradas no parágrafo único do artigo 372: a) as mulheres maiores de dezoito (18) anos, empregadas em empresas de telefonia, rádio-telefonia ou radiotelegrafia; b) as mulheres maiores de dezoito (18) anos, empregadas em serviços de enfermagem; c) as mulheres maiores de vinte e um (21) anos, empregadas em casas de diversões, hotéis, restaurantes, bares, e estabelecimentos congêneres; d) as mulheres que, não participando de trabalho contínuo, ocupem postos de direção.” (BRASIL, 1943). 40 Essa ficção jurídica não foi revogada pela atual Constituição, conforme predispõe a OJ 127 da SDI-1 (BRASIL, 1998). 56 trabalhador para todos os efeitos, são os chamados reflexos (integra o cálculo das férias, 13º salário, FGTS, etc. 41 ). Caso a jornada seja cumprida inteiramente no horário noturno, sendo prorrogada para além desse período, a jurisprudência majoritária, entende que para essa prorrogação também incide a obrigação (para o empregador) do pagamento do adicional. 42 O texto constitucional possui uma linguagem restrita, apenas anuncia o direito social à remuneração do trabalho noturno ser superior à do diurno. Ficou confiada à jurisprudência e à doutrina a criatividade acerca da matéria. Na Súmula 140, do TST, foi estipulado que o vigia noturno tem direito ao respectivo adicional, e ainda, à hora ficta (Súmula 65 desse mesmo tribunal). A função específica de vigilante diferencia-se do trabalho do vigia noturno. O serviço do vigilante está regulamentado pela Lei nº 7.102/83 (com alterações das normas: Lei nº 8.863, de 1994; Lei nº 9.017, de 1995 e da; Medida Provisória nº 2.184, de 2001). O vigia é aquele que meramente observa, fiscaliza, o local, fazendo rondas, por exemplo. O porteiro é aquele que toma conta da portaria, controlando a saída e entrada de pessoas. O vigia é um guarda patrimonial e o porteiro é o atendente da portaria. Assim, vigilante diferencia-se de vigia e porteiro. No tocante à atividade de vigilante, o empregado é contratado, por exemplo, por estabelecimentos financeiros ou por empresa especializada em prestação de serviços, vigilância e transporte de valores. Para tal, existem alguns requisitos legais especiais. Essa profissão requer que a pessoa: seja brasileira; tenha idade mínima de 21 (vinte e um) anos; tenha instrução correspondente à quarta série do primeiro grau; tenha sido aprovado em curso de formação de vigilante, realizado em estabelecimento com funcionamento autorizado, nos termos da Lei nº 7.102/83; seja aprovado em exame de saúde física, mental e psicotécnico; não tenha antecedentes criminais registrados; e esteja quite com as obrigações eleitorais e militares. Para tanto, é assegurado ao vigilante uniforme especial e porte de arma (a responsabilidade pelas armas é do estabelecimento ou empresa protegida). Conforme a lei, o exercício da profissão de vigilante requer prévio registro no Departamento de Polícia Federal. Assim, o serviço de vigilante é uma atividade profissional mais complexa do que a do vigia ou do porteiro. Como bem afirma o desembargador relator Júlio Bernardo (TRT 3ªR. RO. 012712006-047-03-00-3, 2006): a atividade de vigilante compõe o exercício de uma função de 41 Como exemplos, existem as orientações jurisprudenciais: 97 (BRASIL, 1997) e 259 (BRASIL, 2002), ambas da SDI-1. 42 Lembrando da Súmula 60 do TST (BRASIL, 2005). 57 “natureza parapolicial”, já o vigia/porteiro “desenvolve atividades de modo menos ostensivo, precipuamente, de guarda do estabelecimento que se encontra fechado”. 2.2.10 Proteção do Salário na Forma da Lei, Constituindo Crime sua Retenção Dolosa A Constituição de 1988, ao evidenciar a essencialidade do salário, previu a proteção na forma da lei, constituindo crime a retenção dolosa do salário. No crime de retenção do salário, a conduta tem que ser dolosa. Essa constitui a vontade livre e consciente do empregador (autor) em não efetuar o pagamento salarial devido ao empregado. No tocante à execução do crime, não existe a modalidade de crime culposo, ou seja, reter salário sem a intenção de fazê-lo. A conduta dolosa evidencia a intenção criminosa do empregador, em, conscientemente, prejudicar o empregado, retendo o seu meio de subsistência. A modalidade culposa do crime não é admitida. A incompetência gerencial ou a não satisfação da obrigação de pagar salário, por falta de caixa, não implicaria na punição penal, no entanto, ensejaria a responsabilização civil, já que os riscos do empreendimento correm por conta do empregador e não do empregado. Esse não pode ser penalizado pela falta de organização do empreendimento de quem o emprega. Novamente, o legislador infraconstitucional peca em desconsiderar o comando constitucional, ao não editar norma que estabeleça critérios objetivos para o crime de retenção. Ignorando a importância da principal fonte de subsistência do trabalhador e de sua família: o salário. Não raro, certos empregadores agem dessa forma a penalizar seus empregados. A doutrina vem entendendo que, como não existe norma especifica definidora do crime, mesmo havendo o comando constitucional: “nullum crime, nulla poena sine praevia lege”, ou seja, não há crime sem lei anterior que o defina. Mesmo não havendo a responsabilização penal do empregador, quando do cometimento do ato ilícito de retenção do salário, a jurisprudência trabalhista vem majoritariamente decidindo, que esse ato enseja evidente responsabilização civil, e, consequente dano moral, de per si. O Tribunal Superior do Trabalho 43, vem decidindo que o 43 A confirmar essa assertiva, tem-se, por exemplo, o seguinte julgado do TST: “DANOS MORAIS - ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS 1. A Corte de origem consignou a ocorrência de atrasos frequentes no pagamento dos salários. 2. O atraso no pagamento dos salários, gerando incerteza ao trabalhador acerca da disponibilidade de sua remuneração, causa-lhe sofrimento suficiente à caracterização de prejuízo ao seu 58 dano moral, nesses casos, é presumido, pela insegurança e exacerbado constrangimento (de não poder honrar com suas dívidas, por exemplo) em que é posto o empregado sem o seu salário. A principal obrigação do empregador, na relação laboral, é o pagamento do salário, a retenção dolosa desse, causa um abalo na honra e na imagem daquele que sobrevive do seu trabalho, o que gera a obrigação do pagamento de indenização por dano moral e material, a minonar os efeitos desse dano. O Decreto 368, editado em 19 de dezembro de 1969, não apenas foi recepcionado pela Constituição de 1988, como é norma que regula o inciso X do artigo 7º (“Proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa”). Esse Decreto dispõe sobre efeitos de débitos salariais e dá outras providências. No artigo primeiro, está definido que a empresa, em débito salarial, com seus empregados não poderá: I - pagar honorário, gratificação, pro labore ou qualquer outro tipo de retribuição ou retirada a seus diretores, sócios, gerentes ou titulares da firma individual; II - distribuir quaisquer lucros, bonificações, dividendos ou interesses a seus sócios, titulares, acionistas, ou membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos; III - ser dissolvida. (BRASIL, 2011). Outra questão importante seria saber se: os descontos salariais ilícitos seriam considerados crime de retenção dolosa. O constituinte originário referiu-se à proteção do salário, querendo referendar a tutela ao complexo salarial, incluindo, portanto, toda e qualquer parcela. Ao ler, isoladamente a norma constitucional, em princípio, poderia haver a dúvida de inclusão das gorjetas. Leciona Márcio Túlio Viana que: [...] distinguir salário e remuneração pode ser importante para efeito de cálculos. Em princípio, quando a lei se refere a ‘remuneração’, e não a ‘salário’, as gorjetas devem integrá-lo – como acontece nas férias. Só não se costuma entender assim no caso dos repousos semanais remunerados. As gorjetas não entram no seu cálculo, segundo o TST (VIANA, 2008, p. 109). Fazendo uma interpretação extensiva da norma constitucional, acredita-se que o legislador tenha se referido ao salário lato sensu, enquanto remuneração, incluído, portanto, as gorjetas na proteção ao salário contra o crime de retenção dolosa. patrimônio moral. 3. A Constituição de 1988 bem evidencia a essencialidade do salário ao prever a proteção na forma da Lei, constituindo crime a retenção dolosa (artigo 7º, X)”. (BRASIL, 2010). 59 2.2.11 Participação nos Lucros ou Resultados, Desvinculada da Remuneração, e, Excepcionalmente, Participação na Gestão da Empresa, Conforme Definido em Lei Está disposto no inciso XI, do artigo 7º, da Constituição vigente, que é direito do trabalhador urbano e rural a “participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei” (Brasil, 2011). Esse instituto não passou a ser novidade na Lei Maior, de 1988, foi objeto de estipulação nas Constituições dos anos de 1946 e 1967. A primeira norma a regulamentar a matéria foi uma medida provisória que adveio em 1994. Conforme o dicionário da Academia Brasileira de Letras (2008), participação consiste no ato de “fazer parte de”. “Parte” significa “cada fração de um todo”. Participação nos lucros de uma empresa enseja o direito de o empregado receber um valor conforme a lucratividade do empreendimento capitalista. Aquele passa a ser co-partícipe dos resultados da empresa, por ser, também, por ela responsável, no sentido de ser parte integrante da produção. É a participação no empreendimento capitalista, do trabalho no capital, no que é produzido por esse. Essa noção comutativa é a que deveria embasar a prática da participação nos lucros ou resultados. Já a terminologia “resultados”, que não faz parte do vocábulo econômico, tem amplo significado. É provável que a imprecisão terminológica do constituinte tenha sido proposital, a possibilitar a amplitude de incidência da participação. Os “resultados” não constituem faturamento, esse é o que se obtém após a venda dos bens ou serviços no mercado Os resultados são obtidos em momentos diferentes, decorre do que foi investido e do que foi posteriormente obtido. Esses incidem sobre o volume de lucros obtidos pela empresa, em certo período de tempo. A participação (PLR) não adveio com a ideia de socializar os lucros ou resultados do empreendimento. Chiarelli enfatiza que: A participação é a ideia símbolo. É mais do que mera cooperação integrativa de Capital e Trabalho na empresa, vista esta, não como simples centro econômico de produção de bens e serviços, para gerar lucros, para uns, e salários para outros, como dois corpos estanques. Vista a empresa como agência de formação profissional, como centro coletivo e comunitário de educação, como meio de realização pessoal “homo faber”, na sua atividade preponderantemente manual ou intelectual (na medida em que se possam separar tais componentes). Vista a empresa, enfim, como resultado de entendimento de partícipes que representam as forças de produção e tem compromisso com a própria comunidade, da qual provém, da qual dependem e que, ela também, às vezes, desse tipo de entendimento – onde devem ser mais coparticipes do que contrapartes – depende, e, por isso, precisa que se realize ordinariamente. (CHIARELLI, 1980, p. 112). 60 A noção de empresa enquanto “agência de formação profissional” é idealista. A realidade se difere bastante da teoria. Para os sindicatos, a PLR é uma forma de quebrar a solidariedade entre os trabalhadores, a enfraquecer o movimento sindical, diante da realidade de as classes dos trabalhadores estarem cada vez mais heterogêneas. Acabou por se tornar um verdadeiro desafio para os sindicatos, e seu poder de negociação, já que os programas de participação são objeto de diploma coletivo negociado (acordos ou em convenções coletivas). A ideia de PLR causa um impacto no imaginário dos trabalhadores, de uma suposta importância de ser partícipe do processo de produção. Paira no imaginário do trabalhador, a noção de também ser “dono” do empreendimento, e estar ainda mais comprometido com o seu trabalho. Lembrando que a PLR adveio para atender às necessidades do capitalista, mas acaba por minorar a realidade de subordinação e exploração do trabalho pelo capital. Márcio Túlio Viana (2008, p. 210) ensina que para alguns, a participação seria “o primeiro passo para democratizar a empresa”, mas, na verdade, não o é, pelo contrário, “talvez nem seja um passo à frente”, na medida em que pode minar a identidade coletiva. É uma forma de maquiar reajustes salariais, prova disso, são as metas de participações preestabelecidas. Atualmente, o que é pago a título de participações nos lucros, ou resultado, são verdadeiras verbas salariais 44. Pela aplicação do princípio da isonomia, quando o contrato de labor é cessado, não sendo ainda, efetivamente paga a PLR, essa parcela deverá ser proporcional ao tempo de trabalho do empregado, já que esse contribuiu para os lucros empresariais. 45 44 45 Mantêm-se esse entendimento, no presente estudo, apesar da Súmula, 251 do TST (BRASIL, 2003), que rechaçava essa noção ter sido cancelada. Conforme a OJ 390 da SDI-1do TST: “OJ-SDI1-390. PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS. RESCISÃO CONTRATUAL ANTERIOR À DATA DA DISTRIBUIÇÃO DOS LUCROS. PAGAMENTO PROPORCIONAL AOS MESES TRABALHADOS. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010) Fere o princípio da isonomia instituir vantagem mediante acordo coletivo ou norma regulamentar que condiciona a percepção da parcela participação nos lucros e resultados ao fato de estar o contrato de trabalho em vigor na data prevista para a distribuição dos lucros. Assim, inclusive na rescisão contratual antecipada, é devido o pagamento da parcela de forma proporcional aos meses trabalhados, pois o ex-empregado concorreu para os resultados positivos da empresa.” (BRASIL, 2010). Em sede de Orientação Jurisprudencial Transitória, da SDI-1 do TST, já se decidiu, no caso concreto (pois havia previsão em norma coletiva), entre a Volkswagen e os metalúrgicos do ABC que a parcela possuía natureza indenizatória, contrariando o entendimento sumulado, do próprio TST: “OJ-SDI1T-73VOLKSWAGEN DO BRASIL LTDA. PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS. PAGAMENTO MENSAL EM DECORRÊNCIA DE NORMA COLETIVA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010). A despeito da vedação de pagamento em periodicidade inferior a um semestre civil ou mais de duas vezes no ano cível, disposta no artigo 3º, § 2º, da Lei n.º 10.101, de 19.12.2000, o parcelamento em prestações mensais da participação nos lucros e resultados de janeiro de 1999 a abril de 2000, fixado no acordo coletivo celebrado entre o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e a Volkswagen do Brasil Ltda., não retira a natureza indenizatória da referida verba (artigo 7º, XI, da CF), devendo prevalecer a diretriz constitucional que prestigia a autonomia privada coletiva (artigo 7º, XXVI, da CF).” (BRASIL, 2010). 61 Para os empregadores, a vantagem de se conceder PLR é a de não arcar com os reflexos de uma parcela salarial, além das contribuições habituais. Integra o conjunto estratégico das empresas. A PLR, assim como outras estratégias, tal como a terceirização, ou seja, a flexibilização das relações de trabalho, passou a fazer parte da racionalização produtiva empresarial. Na onda de flexibilizações neoliberais das relações de trabalho, a matéria foi regulamentada no ano de 2000 com a Lei nº 10.101. Nessa norma, está disposto que a PLR seria um instrumento de integração entre o capital e o trabalho, a incentivar a produtividade. Necessitando obrigatoriamente,, para que seja implementada, de instrumento negocial coletivo (convenção ou acordo coletivo) ou comissão escolhida pelas partes, integrada, também, por um representante indicado pelo sindicato da respectiva categoria de trabalhadores. O instrumento de implementação da PLR, que será arquivado na entidade sindical dos trabalhadores, deverá ser claro e possuir normas objetivas, acerca dos direitos substantivos de participação e das regras adjetivas. É obrigatório que esse documento contenha os mecanismos de aferição das informações pertinentes ao cumprimento do que foi acordado, periodicidade da distribuição, período de vigência e prazos para revisão do acordo. Como critérios de aferição da participação podem ser utilizados: índices de produtividade, qualidade ou lucratividade da empresa, ou, ainda, programas de metas, resultados e prazos, pactuados previamente (na lei está assim exemplificado, no artigo 2º, §1º). A flexibilizar a norma laboral, está descrito no artigo 3º da lei que a: “participação de que trata o artigo 2º não substitui ou complementa a remuneração devida a qualquer empregado, nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista, não se lhe aplicando o princípio da habitualidade” (BRASIL, 2011). A Lei, portanto, traz exceção aos requisitos celetistas de caracterização do salário (e consequentes reflexos), enfatizando ainda, a questão da habitualidade. Mesmo que o empregador pague com habitualidade a participação nos lucros, não será assim considerado, já que a lei não foi dessa forma excetuada (interpretação exegética). Aos encargos trabalhistas, incluem-se as contribuições previdenciárias, estando o empregador, por essa norma, desobrigado a arcar com “essa despesa” 46 . Em se tratando de Imposto de Renda, sobre a Participação nos Lucros e Resultados recairá essa tributação, retida na fonte, sob responsabilidade da empregadora, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês. 46 Os empregadores, normalmente, consideram os empregados como mercadoria, sendo assim, os gastos oriundos da relação de emprego são “despesas”. Essa concepção desumaniza a relação laboral. 62 É proibido o pagamento de qualquer antecipação ou distribuição de valores a título de participação nos lucros ou resultados da empresa, em periodicidade inferior a um semestre civil, ou mais de duas vezes no mesmo ano. Salienta-se que no ano de 2007, a Lei, ora em estudo, sofreu uma alteração, através da Lei 11.603, a substituir a Medida Provisória de número 388, no mesmo ano. Nessa norma, está estipulado que: Artigo 6º-A. É permitido o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação municipal, nos termos do artigo 30, inciso I, da Constituição. Artigo 6º-B. As infrações ao disposto nos arts. 6º e 6º-A dessa lei serão punidas com a multa prevista no artigo 75 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1º de maio de 1943. (BRASIL, 2011). A inserção desses artigos na lei sobre PLR é fora de propósito, e estranhos à matéria objeto da norma. Outra norma deveria ter sido formulada para tratar da matéria, que é de extrema importância. Causa a impressão de ser subterfúgio legislativo, ou seja, utilizar uma lei já posta alterá-la, rapidamente, através de outra norma, para atender determinado segmento social. Essa conduta é, notoriamente, antidemocrática. A norma atual, em quase nada, difere-se da antiga Medida Provisória 388, mantendo as mesmas inconstitucionalidades, ambiguidades e contradições. Novas regras foram criadas quanto à fixação de alguns procedimentos, tal como a solução de conflitos, via mediação ou arbitragem. Normalmente, determinadas empresas não informam a real situação econômicofinanceira, o que inviabiliza a efetiva participação dos empregados nos lucros ou resultados do empreendimento. Essa necessidade de apresentação das contas não está na norma como uma obrigação da empresa. A pesquisa mais recente sobre a aplicação da Lei nº 10.101/2000 foi feita pelo DIEESE, utilizando como parâmetro, 123 instrumentos normativos de PLR (acordos e convenções coletivas), negociados em 2005 e distribuídos pelas cinco regiões geográficas do Brasil. As regiões Sudeste e Sul representam 63,4% dos instrumentos analisados. Lembrando que para a negociação da PLR, os sindicatos não detêm o monopólio, já que uma comissão de empregados pode ser criada. Essa é uma questão complicada, na verdade é “uma faca de dois gumes”. Como foi apontada na própria pesquisa do DIEESE: Essa possibilidade sinaliza uma maior abertura à participação dos empregados na gestão da empresa, além de ser uma oportunidade de se poder contar, no processo de negociação, com a presença de pessoas com alto grau de conhecimento sobre o processo produtivo. Por outro lado, pode resultar na formação de uma comissão de 63 empregados muito identificada com os interesses da gerência, já que a lei não garante estabilidade provisória no emprego aos membros integrantes da comissão e nem fixa nenhum mecanismo que garanta a participação efetiva do sindicato no processo de escolha dos representantes dos empregados. [...] Em 2005, mais de 60% dos 123 documentos analisados foram negociados pelos sindicatos, federações ou confederações profissionais diretamente com as empresas ou com as respectivas representações patronais de suas categorias. Em 25% dos casos, os acordos e convenções coletivas foram negociados por comissões de empregados, integradas também por representantes das entidades profissionais e, em menos de 14% dos casos, houve contratação coletiva da PLR apenas com as comissões de empregados, sem a participação direta das entidades de representação dos trabalhadores (DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS, 2005, p. 5). (Grifou-se). A lei não trata dos critérios de escolha dos membros da comissão de empregados, o que leva a crer que, muito provavelmente, os interesses desses coincidam com os da gerência, como foi apontado pela própria pesquisa. Outra importante questão, regulamentada na lei, circunscreve o mecanismo de solução de possíveis litígios, durante o processo de negociação. “Caso a negociação, visando à participação nos lucros ou resultados da empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes mecanismos de solução do litígio: I - mediação; II - arbitragem de ofertas finais” (BRASIL, 2011). A esclarecer o que seria “arbitragem de ofertas finais” o legislador expôs, no parágrafo 1º da referida lei, que: “considera-se arbitragem de ofertas finais aquela em que o árbitro deve restringir-se a optar pela proposta apresentada, em caráter definitivo, por uma das partes.” (BRASIL, 2011). Nos parágrafos seguintes, existem mais duas regras de, no mínimo, constitucionalidade duvidosa: “Firmado o compromisso arbitral, não será admitida a desistência unilateral de qualquer das partes” (BRASIL, 2011). No parágrafo 4º: “o laudo arbitral terá força normativa, independentemente de homologação judicial”. Dessa forma, afastou-se a intervenção do Estado, e do consequente poder normativo da justiça do trabalho, de tal litígio. 47 A greve é um dos instrumentos mais eficazes a pressionar o setor empregatício, frente às negociações acerca da PLR. Na pesquisa, os metalúrgicos (62%) foram apontados como maioria absoluta, a paralisar a execução de seus trabalhos. 47 Na pesquisa do DIEESE, nos instrumentos analisados, constatou-se que: “Entre os documentos que preveem algum mecanismo de solução de conflitos, o mais frequente é recorrer à Justiça do Trabalho, que aparece em 57% dos registros, seguido da própria comissão, com uma frequência de 21%. Os recursos às alternativas de mediação e arbitragem de ofertas finais são minoritários, com frequências de apenas 16,7% e 5% dos registros, respectivamente.” (DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS, 2005). 64 Existem casos em que as participações nos lucros e resultados vêm acompanhadas de metas condicionantes ao seu recebimento. Em outros, a empresa deve lucrar um mínimo, do contrário os empregados nada recebem. 2.2.12 Salário-família O salário-família é um benefício (direito) previdenciário, cujas cotas são pagas pela empresa empregadora, mensalmente, junto com o salário, ao segurado empregado (exceto aos domésticos e aos avulsos 48 ), em função da proporção do respectivo número de filhos ou equiparados, conforme as peculiaridades legais. A empresa empregadora efetivará a compensação do valor pago a título de salário-família, quando do recolhimento das contribuições previdenciárias. Cesarino Junior (1980, p. 261) expôs que “salário familiar é também um salário mínimo: é aquele que tem por finalidade satisfazer as necessidades mínimas, não só do empregado como de sua família.” Apesar da denominação “salário”, o salário família não é pago diretamente pelo empregador ao empregado, em virtude da prestação de serviço, ou do trabalho fornecido pelo empregado. Márcio Túlio Viana (1997, p. 253) afirma que, na realidade, seria um “instrumento (precário) de redistribuição de riquezas, dependente do vínculo empregadoempregador, mas que não deriva da troca trabalho-salário”. Conforme a norma previdenciária, Lei nº 8.213/91, o enteado e o menor tutelado podem se equiparar ao filho, mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica (artigo 16, §2º). O salário mínimo, como antes estudado, concerne ao valor mínimo que o trabalhador ganha com o intuito de atender (hipoteticamente) às necessidades vitais básicas estabelecidas na Lei Maior. O patamar mínimo, constitucionalmente asseverado, não pode ser complementado por outro valor, o do salário-família. Aquele não deveria referir-se aos encargos apenas individuais. Mesmo porque, o texto constitucional, precisamente, o artigo 7º, inciso IV, é claro: que seja capaz de atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e às 48 Na Súmula 227 do TST, hoje cancelada, consubstanciava-se que: “SALÁRIO-FAMÍLIA. TRABALHADOR RURAL (cancelada) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O salário-família somente é devido aos trabalhadores urbanos, não alcançando os rurais, ainda que prestem serviços, no campo, à empresa agroindustrial.” Essa limitação é desarrazoada, sem nenhum respaldo constitucional. Acertada a decisão de cancelamento desse entendimento. Atualmente, tem-se a Súmula 344: “SALÁRIO-FAMÍLIA. TRABALHADOR RURAL (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O salário-família é devido aos trabalhadores rurais somente após a vigência da Lei nº 8.213, de 24.07.1991.” (BRASIL, 2001). 65 de sua família. Esse viés de complementariedade acaba por fazer com que ambos percam sua razão de ser. Salário “família” não é a acepção mais coerente para designar o benéfico, como, sabiamente, expõe Chiarelli (1989), melhor seria “salário-filho”, pois o valor a ser pago está diretamente ligado ao número de filhos do trabalhador, o que reduz, consideravelmente, seu campo de abrangência. As cotas são ilimitadas, não importa a quantidade de filhos dependentes (dois, três, dez). Em verdade, não constitui “salário” (conforme o Direito do Trabalho), pois não é um valor recebido pela pessoa em função do seu trabalho. No texto constitucional, existe a previsão do salário-família aos dependentes, no entanto, de forma estranha, a lei Previdenciária, apensar de possuir uma seção específica para a conceituação de dependentes (do segurado), mais adiante, ao definir “salário-família”, estende essa dependência a apenas ao filho (ou ao equiparado). Dessa forma, como bem preceitua Márcio Túlio Viana (1996, p. 261) “o comando constitucional não foi totalmente observado”, já que, na norma previdenciária, o legislador utilizou a palavra “dependente” como sinônimo de filho (ou equiparado), restringindo o campo de incidência do direito social. Conforme o Decreto 611/92 artigo 13, § 3º, inciso IV: equiparam-se aos filhos, na condição de dependente, mediante declaração escrita do segurado: o enteado; o menor que, por determinação judicial, esteja sob sua guarda e; o menor que esteja sob sua tutela e não possua bens suficientes para o próprio. No artigo 85, desse Decreto, existe a previsão de que o direito, ao recebimento do salário-família, possa ser transferido àquele que esteja sustentando o menor. Tendo havido divórcio judicial ou de fato dos pais, ou em caso de abandono legalmente caracterizado ou perda do pátrio-poder, o salário-família poderá passar a ser pago diretamente àquele a cujo cargo ficar o sustento do menor, ou a outra pessoa, se houver determinação judicial nesse sentido. (BRASIL, 2011). Cretella Júnior (1994, p. 945) aponta um posicionamento diferente, em relação à complementação de um salário pelo outro: “o objetivo do salário-família é o de atender às necessidades normais – diga-se, agora, vitais básicas – da família do trabalhador e não às suas pessoais e particulares.” Seguindo-se, é demonstrado que existem autores que afirmam que o salário-família: “com isso, atende à necessidade de amparar adequadamente o trabalhador com família, completando-se o sistema do salário-mínimo” 49. 49 Ressalta-se que essa posição foi apontada por Cretella Junior baseando-se em Manuel Gonçalves Ferreira Filho. Em sua obra, afirma que é relevante o problema existente entre salário-família e salário-mínimo, apontando algumas importantes considerações acerca do tema. 66 Do direito social ao recebimento do salário-família, estão excluídos, pela lei previdenciária 8.213/91, os avulsos e os domésticos. No Decreto 611/91 especial (em exceção) acerca do avulso 51 50 , existe uma regra . Será devido o salário, ora em estudo, aos trabalhadores avulsos aposentados com 65 (sessenta e cinco) anos, se do sexo masculino ou 60 (sessenta) anos, se do sexo feminino, sendo reduzido a idade em 5 (cinco) anos quando se tratar de segurado trabalhador rural, pelo INSS, juntamente com a aposentadoria. Notadamente, na atualidade, é importante o debate sobre a equiparação em direitos dos trabalhadores domésticos aos demais. Existe uma prevalência de mulheres negras e adultas, nessa categoria de trabalhadores (o que denota o preconceito racial latente no Brasil). A grande maioria dos trabalhadores domésticos trabalha sem a carteira assinada, são os denominados “mensalistas” ou as chamadas “diaristas”. Outra característica desumana dessa atividade é a jornada elevadíssima, em relação aos demais trabalhadores. Segundo recentes dados do DIEESE (na Pesquisa de Emprego e Desemprego) as maiores jornadas são verificadas na região do Nordeste, com 54 horas semanais, em média. Em Belo Horizonte, foi verificado que a jornada média é de 42 horas semanais. Estima-se que, no Brasil, existem mais de 6,7 milhões de trabalhadores domésticos. Essas pessoas, que compõem um grupo de necessitados e assalariados (quando muito), correspondentes a grande parte da população, não recebem salário-família. Essa situação é “inexplicável”! Em verdade, essa atitude legislativa reflete uma cultura marcada por uma extensa e cruel escravidão, que ainda paira no pensamento brasileiro. O valor da cota do salário-família é atualizado por portaria da Previdência. Pela Portaria Interministerial MF/MPS 568/2010 a partir de 01/01/2011, para quem recebe até R$ 573,58 o salário-família será de R$ 29,41, para aqueles que percebem de R$ 573,59 a R$ 862,11 o valor será de R$ 20,73 (segundo a portaria, houve um reajuste que aumentou o valor 50 51 O Decreto 611/92 dá nova redação ao Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 357, de 7 de dezembro de 1991, e incorpora as alterações da legislação posterior. No decreto 611/92, inciso VI do artigo 6º, existe a classificação de quem seria o trabalhador avulso: “aquele que, sindicalizado ou não, presta serviço de natureza urbana ou rural, sem vínculo empregatício, a diversas empresas, com a intermediação obrigatória do sindicato da categoria, assim considerados: a) o estivador, inclusive o trabalhador de estiva em carvão e minério; b) o trabalhador em Alvarenga; c) o conferente de carga e descarga; d) o consertador de carga e descarga; e) o vigia portuário; f) o amarrador de embarcação; g) o trabalhador em serviço de bloco; h) o trabalhador de capatazia; i) o arrumador; j) o ensacador de café, cacau, sal e similares; l) o trabalhador na indústria de extração de sal; m) o carregador de bagagem em portos; n) o prático de barra em portos; o) o guindasteiro; p) o classificador, o movimentador e o empacotador de mercadoria; q) outros assim classificados pelo Ministério do Trabalho e da Administração - MTA.” Essa norma não é considerada como exemplificativa, o que acaba por excluir figuras típicas, que não se enquadram em outras categoriais laborativas, tais como, os “chapas”. Disponível em: www.tst.jus.br. Acessado em 22 de abril de 2011. Parte da doutrina trabalhista, a qual presentemente se filia, entende que essa norma seria inconstitucional, por ferir o princípio da isonomia (constitucionalizado no caput do artigo 5º da Constituição da República). Nesse mesmo sentido, ensina o ilustre professor Márcio Túlio Viana (1997, p. 256). 67 em 6,41%). Conforme o entendimento firmando pelo STF, o termo inicial do direito social, ao salário ora em comento, “coincide com a prova da filiação e se feita em juízo, corresponde à data de ajuizamento do pedido, salvo se comprovado que anteriormente o empregador recusara-se a receber a respectiva certidão”. 52 O fato de a relação de emprego ter sido reconhecida perante a justiça do trabalho, garante ao trabalhador litigante a obtenção do direito às cotas do salário-família. 53 Quando da perda do benefício, o empregado é obrigado a comunicar à empresa essa circunstância, esse comprometimento é firmado através de um termo de responsabilidade. Caso não o faça, estará sujeito, às sanções penais e trabalhistas (artigo 87 do Decreto 611/92). Conforme o artigo 88 desse mesmo Decreto: A falta de comunicação oportuna de fato que implique cessação do salário-família, bem como a prática pelo empregado de fraude de qualquer natureza para o seu recebimento, autoriza a empresa, o INSS ou o sindicato, conforme o caso, a descontar dos pagamentos de cotas devidas com relação a outros filhos ou, na falta delas, do próprio salário do empregado ou da renda mensal do seu benefício, o valor das cotas indevidamente recebidas, sem prejuízo das sanções penais cabíveis, observado o disposto no § 2º do artigo 243. (BRASIL, 2011). A falta de comunicação, a que alude o artigo, possui além das sanções penais cabíveis, a possibilidade do INSS descontar, mensalmente, do trabalhador, pagamento de benefício além do devido. Conforme o artigo 243, § 2º, o desconto será feito em parcelas não superiores a 30%, do valor da renda mensal do benefício, salvo má-fé. Assim, mesmo o trabalhador estando de boa-fé, poderá ver no seu salário descontos, por pagamentos a maior de benefícios. Entende-se, em juízo, que o trabalhador tem direito, caso não tenha agido de má-fé (dolo, ou a intenção de fraudar a previdência), a negociar os pagamentos das parcelas, para que o desconto em seu salário não cause prejuízos à sua subsistência. Caso o empregado esteja recebendo outro benefício previdenciário, por exemplo, auxílio-doença, não perderá o direito ao salário-família. Essa assertiva decorre da aplicação do artigo 90, do Decreto 611/92, em que está previsto que: “as cotas do salário-família não serão incorporadas, para qualquer efeito, ao salário ou ao benefício.” (BRASIL, 2011). Por não ter natureza salarial, sobre o salário-família, não incide o FGTS. Cessada a relação de emprego, o empregado perde o direito ao salário-família. O direito a esse salário termina quando, o dependente completa 14 anos (salvo se inválido), a contar do mês 52 53 Súmula 254 do STF (BRASIL, 2003). Esse entendimento já foi adotado em decisões do TRT de Minas Gerais: 00257-2007-077-03-00-5 RO. Relator: Convocado Danilo Siqueira de Castro Faria, 11-08-2007 (MINAS GERAIS, 2007). 68 subsequente à data do aniversário; quando o filho (ou o equiparado) inválido recupera sua capacidade, a contar do mês seguinte à perda da incapacidade ou; por morte do filho ou equiparado. 2.2.13 Duração do Trabalho Normal não Superior a Oito Horas Diárias e Quarenta e Quatro Semanais, Facultada a Compensação de Horários e a Redução da Jornada, Mediante Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho A duração, a jornada e o horário de trabalho são expressões correlatas, não sinônimas, referentes ao lapso temporal de labor. A duração do trabalho corresponde ao tempo efetivamente trabalhado ou o lapso temporal de disponibilidade do empregado diante de seu empregador, cujos parâmetros podem ser: dia, semana, mês ou ano. O tempo diário em que o empregado coloca-se à disposição do empregador, conforme as peculiaridades do contrato laboral, corresponde à jornada de trabalho. “A jornada normal é o lapso de tempo durante o qual o empregado deve prestar serviço ou permanecer à disposição, com habitualidade, excluídas as horas extraordinárias [...] (CARRION, 2008, p. 107)”. O horário de trabalho aduz o tempo entre o início e o fim de cada jornada laboral. O Capítulo II da CLT, intitulado “Da Duração do Trabalho”, circunscreve diversos artigos que vão do número cinquenta e sete aos setenta e cinco). A limitação da jornada semanal de quarenta e quatro horas foi uma novidade no ordenamento jurídico brasileiro. Frente às acirradas negociações políticas, entre as entidades patronais e de trabalhadores, para aqueles haveria grandes perdas, caso a jornada semanal fosse reduzida, reivindicaram a implementação da jornada de quarenta e oito, e para esses a de quarenta horas. Chegou-se, então, a um meio termo. Certas tentativas de negociações acabaram desviando as atenções dos principais focos, um exemplo: a garantia de emprego. O constituinte Chiarelli, apesar da importância desse tema de jornada, afirma brilhantemente que: Pessoalmente, não foi dos temas que, como constituinte, mais me empolgou. Assim como defendi com entusiasmo, convicção e certeza de que tinha a melhor fundamentação doutrinária jurídico-social na trincheira da garantia de emprego, sempre coloquei a mera redução da jornada semanal de trabalho numa hierarquia inferior. Prefiro mais empresas saudáveis e lucrativas com muitos empregos; e esses, oferecidos aos trabalhadores que neles se integrarão com a indispensável e solidária garantia que não será só jurídica, mas também social, política e economicamente respaldada; e que tais empregos paguem salários justos e equitativos para que passe por aí, e pela participação – nos lucros, no capital e na gestão, conforme se ajustar em cada situação, via ação negocial – o processo crescente de entendimento entre 69 Capital e Trabalho. Se tudo isso se fizer e, após, ensejar, que se reduza progressivamente a jornada de trabalho, sacrifício e obrigação, mas da qual sai a riqueza a ser, com justiça distribuída, então chegaremos ao ideal. (CHIARELLI, 1989, p. 131). A jornada laborativa e o salário pago, por aquele período, não podem ser reduzidos pelo empregador, salvo autorização negociada em convenção ou acordo coletivo. A redução da jornada, sem a diminuição do salário é cabível, por ser condição mais benéfica para o trabalhador. A jornada de trabalho está ligada diretamente à saúde do trabalhador. Dependendo do ambiente e condições de trabalho, quanto mais tempo o empregado efetivamente laborar maiores serão os riscos da infortunística do trabalho. Aponta Maurício Godinho: Efetivamente, os avanços dos estudos e pesquisas sobre a saúde e segurança laborais têm ensinado que a extensão do contrato do indivíduo com certas atividades ou ambientes é elemento decisivo à configuração do potencial efeito insalubre de tais ambientes ou atividades. (DELGADO, 2008, p. 833). Outra importante questão, apontada por Maurício Godinho Delgado (2008), concerne à relação direta existente entre a jornada e o emprego (ou o seu contraponto: o desemprego). A evolução do sistema capitalista nos países mais desenvolvidos tem evidenciado que os meios de redução de jornada e/ou duração semanal de trabalho têm se revelado compatíveis e até mesmo funcionais ao avanço da economia. A redução da jornada laborativa permite a redistribuição do trabalho no âmbito social, na medida em que permite a incorporação de novas pessoas ao mercado de trabalho. O que se tem percebido, frente às medidas políticolegislativas, é exatamente o contrário, ou seja, não se incentiva a redução da jornada de trabalho nos contratos já existentes. Prova dessa assertiva foi a regulamentação do contrato de trabalho provisório, Lei nº 9.601/98, que incentivou a precarização das relações laborais, legitimando a prática da realização de horas suplementares, sem o devido pagamento. Existem critérios de fixação da jornada laborativa. Primeiramente, fala-se em tempo efetivamente trabalhado, como a própria terminologia demonstra, seria aquele lapso temporal em que o trabalhador esteja gastando sua força de trabalho, sendo desconsiderada qualquer tipo de paralisação, tal como, o intervalo intrajornada. Esse critério é adotado, no Brasil, em um único caso: no cálculo salarial estritamente por peça (artigo 78, da CLT). O tempo à disposição compõe o período efetivamente trabalhado e mais o tempo em que o trabalhador, mesmo não prestando seus serviços, continua à disposição de seu empregador (esse critério encontra-se regulamentado no artigo 4º da CLT). Esse tempo à disposição, não condiz 70 estritamente com o local de trabalho (centro de trabalho), podendo o empregado estar em outra localidade. A jornada de trabalho, quando efetivamente fiscalizada pelo empregador, caracterizase como controlada. Nesse caso, o sobrelabor enseja o pagamento de horas extraordinárias. Quando não há essa fiscalização, por parte do empregador, a jornada denomina-se “não controlada”. Nessa hipótese, duas categorias foram criadas pelo legislador celetista (artigo 67): a) os trabalhadores que exerçam a atividade externa, incompatível com a fixação de horário de trabalho (por exemplo, os carreteiros e viajantes) 54; e a dos gerentes, esses desde que exercentes de cargo de gestão. A melhor doutrina aponta, ainda, outra categoria que seria a dos trabalhadores com jornadas que carecem de tipificação legal, o que impossibilita o pagamento das horas extras trabalhadas. Essa categoria foi criada especialmente para os trabalhadores domésticos. 55 No tempo de deslocamento, o trabalhador não labora, mas desloca-se de sua residência para o “local” (aqui considerado lato sensu) de trabalho, e vice-versa. Nesse interregno pode haver a caracterização das chamadas horas in itinere. Essas horas são aquelas gastas no deslocamento (casa-trabalho-trabalho-casa) que integram a jornada laboral, passando a ser remunerado o tempo excedido a esse lapso temporal, conforme os critérios legais e jurisprudenciais estabelecidos. O excesso é remunerado como se fosse hora-extra trabalhada. 54 55 Acredita-se que, atualmente, com os avanços tecnológicos, essa possibilidade reduziu-se, consideravelmente. No caso concreto, tem que ficar evidente a inexistência de controle e fiscalização por parte do empregador. O empregador pode controlar o empregado de forma direta, sob “seus olhos”, no local de trabalho. Ou ainda de forma indireta, quando o empregado não se encontra no ambiente de trabalho, mas, o empregador mesmo assim o controla por tecnologia. Mesmo que a natureza da atividade pareça ser incompatível com o controle, notadamente, com as novas tecnologias (computadores com modem, notebooks – com internet - softwares interligados – celulares com internet – Smartphones, sistema de rastreamento por satélite, computador de bordo, no carro, dentre outros viabilizam a fiscalização do tempo laborado). Nesse sentido, tem-se a recente modificação do artigo 6º da CLT, pela Lei 12.551 de 15 de dezembro de 2011, cuja redação prevê: “Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. Parágrafo único: Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.” (BRASIL, 2011). (Grifou-se). Causa estranheza essa classificação “que carece de tipificação legal”, sendo que existe uma norma constitucional, em que está estabelecido um padrão geral de jornada (oito horas diárias e quarenta e quatro semanais). Controlar a jornada de um trabalhador doméstico não é algo surreal, como alguns insistem em dizer. Existe, no trabalho doméstico, uma relação de absurda aproximação, afinal, o empregador possui apenas, na maioria dos casos, um empregado, o que viabiliza demais o controle sobre o indivíduo. Cada objeto que é retirado do lugar, o que é dito, a forma como foi dita, as vestes usadas, os minutos ao telefone, cada passo, dentro do ambiente de trabalho, é controlado. Talvez, não haja trabalho em que o empregado não seja mais controlado que o doméstico. A forma como se poderia controlar a jornada laborativa do empregado doméstico poderia ser o mais simples possível, tal como um “cartão de ponto” padrão, manual, comprado em banca de revista. 71 O pagamento dessas horas consiste em exceção, extraída pela jurisprudência, do artigo 4º, da CLT, que deu origem ao artigo 58 do mesmo diploma, através da nº 10.243/2001. Regra geral, o tempo gasto pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, independente do meio de transporte (próprio ou não), não será computado na jornada de trabalho, exceto quando, tratar-se de local de difícil acesso (meio urbano, presunção relativa) 56 ou não servido por transporte público e o empregador fornecer a condução. Outros critérios, que foram criados pela jurisprudência dominante a clarificar melhor o tema, encontram-se na Súmula 90, do TST. Frente a algumas situações específicas do contrato de trabalho, certos critérios são adotados: acerca do tempo de sobreaviso, o tempo de prontidão e o tempo residual à disposição. O primeiro consiste em uma categoria intermediária entre o tempo efetivamente laborado e o tempo à disposição; dessa forma, passa a hora a ser remunerada no importe de 1/3 do salário normal 57. O tempo residual à disposição do empregado perante o empregador consiste nas pequenas variações, entre cinco e dez minutos, que não possuem qualquer finalidade. 58 Sobre os períodos temporais, durante a jornada de trabalho, existem diversas fraudes que são cometidas por empregadores. A impositividade das normas relativas à jornada e o rigorismo jurisprudencial caracterizam-se como o “divisor de águas” entre trabalhador assalariado e o trabalho escravo. Por isso da importância de tais regras. A norma constitucional, em análise, prevê a compensação da jornada. A Lei nº 9.601/98 modificou a disciplina compensatória, já prevista na CLT, precisamente frente ao 56 57 58 A jurisprudência considera que o meio rural possui zonas de difícil acesso, já nos locais urbanos, os acessos são fáceis, nem mesmo no turno da madrugada é considerado difícil. Sendo uma presunção relativa, existem decisões que divergem. Como exemplo tem-se a seguinte decisão do TRT de Minas Gerais: “EMENTA: EMENTA - HORAS "IN ITINERE" - LOCAL DE DIFÍCIL ACESSO - CARACTERIZAÇÃO - Considerase de difícil acesso o local de trabalho que dista, aproximadamente, 07 km do ponto de passagem do transporte público existente. Com efeito, não se pode exigir do trabalhador que vença 14 km a pé, diariamente, apenas para alcançar e deixar o local da efetiva prestação de serviços. Tratando-se, pois, de local de difícil acesso, e comprovada a incompatibilidade entre os horários do transporte público regular e aqueles cumpridos pelo reclamante, são devidas, como extras, as horas itinerantes apuradas (aplicação do Enunciado nº. 90, do Col. TST).” (MINAS GERAIS, 2001). No artigo 244, § 3º, da CLT, está disposto que: “Considera-se de "prontidão" o empregado que ficar nas dependências da estrada, aguardando ordens. A escala de prontidão será, no máximo, de doze horas. As horas de prontidão serão, para todos os efeitos, contadas à razão de 2/3 (dois terços) do salário-hora normal. (Restaurado pelo Decreto-Lei n º 5, de 4.4.1966)” (BRASIL, 2011). Em princípio, o tempo de sobreaviso aplicava-se apenas à categoria dos ferroviários, (por isso da palavra “estrada”), mas, ao longo do tempo, foi estendido a outras categorias, com trabalhos semelhantes, assim como os eletricitários (conforme a Súmula 229 do TST, cuja redação pressupõe: “Por aplicação analógica do artigo 244, § 2º, da CLT, as horas de sobreaviso dos eletricitários são remuneradas à base de 1/3 sobre a totalidade das parcelas de natureza salarial.”). Prova dessa assertiva encontra-se no artigo 58 § 1º da CLT, além da interpretação do TST, afirmada na Súmula 366 (BRASIL, 2005). 72 artigo 59, que hoje conta com nova redação. Com a Medida Provisória 2.164-41 de 2001, a CLT passou a prever que: poderá ser dispensado o acréscimo de salário (ou seja, o pagamento das horas suplementares) se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de um ano, a soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas diárias. O legislador, dessa forma, criou a chamada compensação anual (mais conhecida como Banco de Horas). A intervenção sindical é obrigatória para que haja a implementação da compensação de jornada. Apenas os representantes da categoria podem defender os interesses dos seus sindicalizados. O mero acordo bilateral, entre empregador e empregado, não tem o condão de flexibilizar a jornada, sendo, então, devidas as horas extras. O texto constitucional é claro! Na Súmula 85, do TST 60 59 , é permitida a transação bilateral para a compensação. Entende a melhor doutrina e jurisprudência que essa permissão apenas concerne à compensação semanal de horas extras laboradas. A compensação, por meio do Banco de Horas, estabelecida no artigo 59, §2º, da CLT, é altamente prejudicial à saúde do trabalhador, flexibiliza ainda mais a jornada, e as horas extras trabalhadas podem ser compensadas até um ano. É incabível a compensação em jornadas não controladas. Nesse caso, não há o pagamento de horas extras, pois a natureza da atividade impossibilita o controle das horas trabalhadas. A Lei nº 9.601/98 dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado e dá outras providências. Dentre essas, está disposta no artigo 6º, dessa lei, a mudança da redação do artigo 59, da CLT, que passou a vigorar com o seguinte texto: 59 60 Concisa e objetiva a seguinte decisão do TRT/MG: “EMENTA: COMPENSAÇÃO POR MEIO DE BANCO DE HORAS - NECESSIDADE DE NORMA COLETIVA - O sistema de compensação de jornada, chamado de "Banco de Horas", previsto no artigo 59, § 2º, da CLT, só é válido se instituído por meio de negociação coletiva. Assim, não havendo pactuação, com a participação do sindicato profissional, para compensação de jornada além do limite da semana, deve haver pagamento das horas extras excedentes à 44ª semanal, com o adicional devido, salvo quando àquelas destinadas à compensação e efetivamente compensadas, sobre o que será devido apenas o adicional de horas extraordinárias.” (MINAS GERAIS, 2010). A redação da Súmula 85 do TST é: “COMPENSAÇÃO DE JORNADA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 182, 220 e 223 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005. I. A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva. (ex-Súmula nº 85 - primeira parte - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003). II. O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido contrário. (ex-OJ nº 182 da SBDI1 - inserida em 08.11.2000). III. O mero não-atendimento das exigências legais para a compensação de jornada, inclusive quando encetada mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária, se não dilatada a jornada máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional. (ex-Súmula nº 85 - segunda parte - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003). IV. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nessa hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário. (exOJ nº 220 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)” (BRASIL,2001). 73 § 2º Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que não exceda, no período máximo de cento e vinte dias, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o Iimite máximo de dez horas diárias. § 3º Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho sem que tenha havido a compensação integral da jornada extraordinária, na forma do parágrafo anterior, fará o trabalhador jus ao pagamento das horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão. (BRASIL, 2011). O lapso temporal permitido pela lei (cento e vinte dias), como limite, passou a ser anual a partir da MP 1.709/98. Essa, por sua vez, foi reeditada em diversas oportunidades, pelas medidas provisórias que vão do número 1.779-5a à 2.164-41, de agosto de 2001 61. Com tanto empenho do Congresso em reeditar subsequentes Medidas Provisórias, seria mais fácil se leis (claras e objetivas) fossem criadas para regerem as respectivas matérias. Aos menores de 18 anos é vedada a extrajornada, salvo mediante autorização de convenção ou acordo coletivo, conforme o artigo 413, inciso I, da CLT 62. Em se tratando de atividades insalubres, quaisquer prorrogações só poderão ser acordadas mediante licença prévia das autoridades competentes em matéria de higiene do trabalho, conforme o preceito do artigo 60, da CLT. Essa norma, no entanto, foi flexibilizada pela Súmula 349, do TST 63, ficando decido pelo Egrégio Tribunal que: ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE HORÁRIO EM ATIVIDADE INSALUBRE, CELEBRADO POR ACORDO COLETIVO. VALIDADE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. A validade de acordo coletivo ou convenção coletiva de compensação de jornada de trabalho em atividade insalubre prescinde da inspeção prévia da autoridade competente em matéria de higiene do trabalho (artigo 7º, XIII, da CF/1988; artigo 60 da CLT). (BRASIL, 2003). Nota-se que, no próprio corpo da Súmula, foi citado o artigo 7º, inciso XIII, como fundamento constitucional para a validade. Duvidosa é a constitucionalidade dessa Súmula, pois diversas outras normas constitucionais elevam, a matéria de saúde, segurança e higiene do trabalho, a um patamar bem mais elevado do que os interesses patronais em compensar jornada, em atividades insalubres, como exemplos: o próprio artigo 7º, inciso XXII e o 194, da Lei Maior. 61 Essa MP não modificou apenas o artigo 59 da CLT, mas também diversas outras normas tais como: 143, 628, 643 e 652. Além da criação de outras regras: 58-A, 130-A, 476-A, 627-A. Essa medida não parou por aí, existe ainda, alterações em Leis esparsas tal como na 5.889/73. 62 No inciso II, está definido que: “excepcionalmente, por motivo de força maior, até o máximo de 12 (doze) horas, com acréscimo salarial de, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) sobre a hora normal e desde que o trabalho do menor seja imprescindível ao funcionamento do estabelecimento”. Esta redação foi incluída pelo Decreto-Lei nº 229, de 28.2.1967, no entanto, por força da Lei Maior, atual, não foi recepcionada. 63 Acredita-se que a permissão de que em atividades insalubres seja realizada a compensação beira a insensibilidade humana. 74 Em suma, esse regime de compensação anual de horas faz com que o trabalhador labore mais, sem receber. Na relação de reciprocidade entre capital e trabalho, com essa possibilidade, apenas o primeiro ganha. Adverte, sabiamente, Maurício Godinho Delgado (2007, p. 866) que o equilíbrio entre as partes contratuais destoou ainda mais com a eliminação das vantagens do regime, em sua antiga forma clássica, sendo fixado “indisfarçável marco diferenciador na evolução sócio-jurídica do regime compensatório no país”. A forma clássica do regime era: trabalhava-se a mais da jornada padrão, pagava-se por isso, ao final de cada mês. Essa forma, flexibilizatória do regime, gera inevitáveis danos à saúde e à segurança no trabalho, existindo registros de inúmeros casos, no Brasil, de acidentes, muitos deles fatais, em função de exaustão do trabalhador 64 . Pela jornada padrão constitucional, o trabalhador labora oito horas por dia (efetivamente, permanece nove horas, muitas vezes, no próprio ambiente de trabalho, pois são oito horas laborando e mais uma hora de intervalo, quando respeitado). Caso faça duas horas extras, ficará onze horas no “local” de trabalho, mais o tempo que gasta no deslocamento (sem considerar horas in itinere). Nos grandes centros urbanos, o transporte público é precário, os trabalhadores passam pelo menos duas horas no trânsito. Ou seja, não se deve considerar o fator compensação, de forma isolada. Cada “pequena questão” ou instituto flexibilizado, deve ser analisado diante de todo contexto de labor e da vida social. A compensação soma-se, ao intervalo intrajornada mal feito, as horas em trânsito, a má alimentação, noites mal dormidas, ao medo do desemprego (à empregabilidade), a falta de dinheiro para suprimir as necessidades básicas da família. Com esse modelo de vida, em alguns anos de trabalho, o indivíduo adoece, ficando à mercê da “subterfugiosa” Previdência Social. 64 Como exemplo, tem-se o caso do trabalhador da Vale que, convocado a laborar no seu dia de folga, falece, em um acidente de trabalho. Segue a reportagem a respeito: “O Trabalhador Gilson Quaresma de Souza, 40, morreu após ser atingido por uma barra de ferro, quando realizava manutenção de uma máquina no pátio da Usina III, em Tubarão (ES). O acidente aconteceu na tarde do último domingo. A usina, com aproximadamente 3 mil funcionários, pertence à mineradora Vale. O trabalhador, contratado há três meses pela companhia, não estava em sua jornada comum de trabalho. Foi convocado para trabalhar em seu dia de folga. De acordo com o diretor do Sindicato dos Ferroviários do Espírito Santo e Minas Gerais (Sindfer), Joel Pereira Gomes, cerca de 75% dos trabalhadores da usina são novatos. Ele afirmou que a Vale não tem uma política de prevenção para evitar acidente de trabalho com os novos contratados. Ele ainda reforçou que os trabalhadores estão com excesso de trabalho. ‘A Vale precisa melhorar muito. Precisa investir em segurança e treinamento. Precisa massificar esse trabalho que não é bem feito. O funcionário não estava em horário de turno, ele estava fazendo hora-extra. No domingo ele foi convocado para trabalhar, isso quase sempre é feito de forma ilegal. Aqui na Vale esse excesso de trabalho é rotina.’ Ainda segundo Joel, o acidente pode estar relacionado ao cansaço do trabalhador, fato que gera desatenção na hora do serviço. O sindicato está acompanhando o caso e cobra explicações da Vale.[...] De São Paulo, da Radio agência NP, Danilo Augusto.” (RADIOAGENCIANP, 2011). 75 2.2.14 Jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva O constituinte de 1988 sobrelevou, no inciso XIV, ao patamar de direito social uma jornada minorada, aos que laboram em turnos ininterruptos de revezamento. A jornada é de seis horas diárias, e consequentes trinta e seis horas semanais, não podendo, esse lapso temporal, ser alterado, salvo permissão em negociação coletiva. Esse permissivo revelou a importância da ação negociada dos sindicatos, assegurando a liberdade e o direito de ação entre empregados e empregadores. Quando da discussão legislativa acerca do tema, havia, no projeto constitucional, apenas a expressão “jornada máxima de trabalho de seis horas”, sem a possibilidade de negociação, o que tornaria o direito estanque. À época das negociações sobre o texto constitucional, as partes interessadas, o setor empregador e os sindicatos, demonstraram argumentos irreais: Os empregadores do setor tentavam demonstrar, com onerosa propaganda, que se fosse adotado o preconizado pelos trabalhadores, o Brasil iria à falência, não haveria um só motivo para investimento no país, todos os capitais estrangeiros fugiriam e o Brasil estaria desértico de indústria de base. (CHIARELLI, 1989, p. 136). Mais de duas décadas de promulgação da constituinte atual mostraram que essa previsão estava fora da realidade. O parque siderúrgico, no Brasil, é composto, atualmente, por vinte e sete usinas administradas por oito grupos empresariais, quais sejam: ArcelorMittal Brasil, Gerdau, CSN, Usiminas, SINOBRAS, V&M do Brasil, Villares Metals e Votorantim Siderurgia (Minas Gerais concentra boa parte desse parque industrial). No início da década de 90, o governo brasileiro iniciou o processo de privatização das siderúrgicas. Em 1993, oito das principais empresas estatais, com capacidade para produzir 19,5 milhões de toneladas (70% de toda a produção nacional), haviam sido privatizadas. Segundo esse setor, a privatização trouxe significativo afluxo de capitais. Os objetivos dos interessados, à época da promulgação da nova Constituição, eram proibir a prática abusiva dos turnos ininterruptos, somando-se oito horas diárias de labor. Um exemplo é o que está disposto na Lei nº 5.811/72, assinada pelo então presidente, do regime militar, Emílio Garrastazu Médici. Essa norma dispõe sobre o regime de trabalho dos empregados nas atividades de exploração, perfuração, produção e refinação de petróleo, industrialização do xisto, indústria petroquímica e transporte de petróleo e seus derivados por meio de dutos. Essa norma merece alguns comentários, primordialmente, em razão de 76 notórias divergências frente à atual constituição. No artigo 2º, parágrafo 1º, está disposto que o regime de revezamento em turnos de oito horas será adotado nessas atividades, que estão previstas no artigo 1º da referida lei, ficando a utilização de turnos de doze horas restrita às seguintes situações especiais. Essa regra não foi recepcionada pela Constituição, por infringir não apenas o inciso, ora em estudo, mas também o inciso XIII. As normas constitucionais acerca da saúde, segurança e higiene no ambiente laboral são de cunho social e não podem ser derrogadas em função de interesses, exclusivamente financeiros, do setor que emprega. No parágrafo 2º, do artigo 1º, dessa lei, é permitida a supressão do intervalo destinado a repouso e alimentação, a “garantir a normalidade das operações ou para atender aos imperativos de segurança industrial” (Brasil, 2011). Poderá ser exigida a disponibilidade do empregado no local de trabalho ou nas suas proximidades, sendo o valor da hora normal paga em dobro Acredita-se que essa regra também não foi recepcionada pela Constituição. No artigo 73, da CLT está previsto que a hora noturna será acrescida de 20%, sobre a hora diurna, exceto para os casos de revezamento quinzenal ou semanal. Essa ressalva discriminatória, não foi recepcionada pela atual Constituição da República. Antes mesmo d da promulgação da Lei Maior a jurisprudência já havia consolidado em sentido contrário ao texto celetista 65. A categoria definida no inciso, ora em estudo, foi restringida pelo legislador. Na CLT, a expressão utilizada, no já citado artigo 73, é “revezamento” enquanto que no inciso constitucional, “turnos ininterruptos de revezamento”. Conforme o dicionário da Academia Brasileira de Letras (2008), ininterrupto significa aquilo que “não é interrompido” é “contínuo, constante, incessante”, no entanto, esse não é o conceito jurídico da expressão “ininterruptos”, exposto na Lei Maior. Estará enquadrada, no tipo constitucional, a forma de organização laboral do empregado que trabalha cobrindo 24 horas, alternadamente, em contato com as diversas fases do dia e da noite, em cada semana, quinzena ou mês. As atividades que exigem esse tipo de turno são, por exemplo, fornos siderúrgicos, refinaria petrolífera e áreas petroquímicas. Faz jus à jornada especial prevista no artigo 7º, XIV, da CR/88, o trabalhador que exerce suas atividades em sistema de alternância de turnos, ainda que em dois turnos de trabalho, que compreendam, no todo ou em parte, o horário diurno e o noturno (podendo ser 65 Prova dessa assertiva encontra-se no antigo Enunciado 130 do TST e Súmulas 213 (BRASIL, 1963) e 214 (BRASIL, 1963) do STF. A interpretação afirmada nesse antigo Enunciado pautava-se pela redação da Constituição de 1946, precisamente no artigo 157, item III (como direito da ordem econômica e social, o pagamento a maior do trabalho realizado em horário noturno). 77 utilizado o artigo 73, da CLT como parâmetro, para estabelecer esse horário – inclusive no que concerne à hora ficta, no parágrafo 1º 66). Sendo, o trabalhador, submetido a essa troca de horário, tão prejudicial à saúde, será irrelevante que a atividade da empresa desenvolva-se de forma ininterrupta. O pressuposto de caracterização dos turnos ininterruptos é simples e objetivo: trabalho realizado com alternância de horário, nas fases do dia/noite. Como afirmou o ministro Carlos Alberto Reis de Paula: O que caracteriza o turno ininterrupto de revezamento, previsto no artigo 7º, inciso XIV, da Constituição Federal, é a alternância de horário, pois ela passa a ser um óbice à manutenção de um mínimo de harmonia entre o obreiro e sua família, assim como a organização do seu cotidiano. A proteção especial dispensada aos empregados que labutam em regime de revezamento tem relação justamente com essa desorganização da vida particular do trabalhador e com o prejuízo à saúde, resultante da variação contínua de horário de trabalho, acarretada pela mudança de turnos. [...] A jurisprudência dessa Corte, portanto, é de que se o empregado trabalhar alternadamente em pelo menos dois horários, um diurno e outro que adentre o período noturno, caracteriza-se turno ininterrupto de revezamento. (BRASIL, 2009). O trabalhador terá sua jornada de revezamento garantida como especial mesmo que existam paralisações totais ou parciais da empresa 67 . Como excele Maurício Godinho Delgado (1997, p. 339) “seria artificial imaginar-se que a própria empresa é que teria de ter uma sistemática ininterrupta de funcionamento [...]” Assim, o empregado labora um dia à noite, no outro pela tarde, no seguinte pela manhã, por exemplo, sendo notória a agressão que similar sistemática de organização laborativa comina ao organismo do trabalhador. A jornada a menor dessa categoria é protegida pela Constituição exatamente em virtude do desgaste causado ao empregado. Esses turnos revezados causam sérios transtornos ao relógio biológico do trabalhador. A jornada especial dos turnos ininterruptos não exclui outros direitos, tal como, a existência de intervalo intrajornada. Sobre esse assunto o STF, no Recurso Extraordinário nº 205.815-7, já entendeu que tais intervalos não descaracterizam a tipificação da jornada de 66 67 Nesse sentido, ensina Maurício Godinho Delgado, in Jornada Especial de Trabalho: Turnos Ininterruptos de Revezamento, extraído da obra Curso de Direito do Trabalho, Estudos em Memória de Célio Goyatá, volume II, 3a. edição, Ed. LTr, São Paulo, 1997, pág. 333. Na OJ 360 da SDI-1, está consubstanciado o seguinte entendimento: “ TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. DOIS TURNOS. HORÁRIO DIURNO E NOTURNO. CARACTERIZAÇÃO. DJ 14.03.2008 Faz jus à jornada especial prevista no artigo 7º, XIV, da CF/1988 o trabalhador que exerce suas atividades em sistema de alternância de turnos, ainda que em dois turnos de trabalho, que compreendam, no todo ou em parte, o horário diurno e o noturno, pois submetido à alternância de horário prejudicial à saúde, sendo irrelevante que a atividade da empresa se desenvolva de forma ininterrupta”. (BRASIL, 2008). 78 revezamento. Atualmente, a matéria está resolvida na Súmula 360 68 do TST e Súmula 675 do STF 69: EMENDA: CONSTITUCIONAL. TRABALHISTA. TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO (CF, ARTIGO 7ª,XIV) (1) A expressão "ininterrupto" aplica-se a turnos, pois são eles que podem ser ininterruptos. Intraturno não há interrupção, mas suspensão ou, como nomidado pela CLT, intervalo. A interrupção do texto constitucional diz com turnos entre si. Nada com as suspensões ou intervalos intraturnos. (2) São os turnos que devem ser ininterruptos e não o trabalho da empresa. Circunscreve-se a expressão "turno" aos segmentos das 24 horas, que se tem como relevante à paralisação coletiva do trabalho aos domingos. O trabalhador, por texto constitucional, tem direito ao repouso semanal remunerado. Se a empresa, tendo em vista as condições operacionais de suas máquinas, pode paralisar no domingo, cumpre uma obrigação constitucional. Preferencialmente no domingo, diz a Constituição. (3) Considera-se os intervalos, que são obrigações legais, como irrelevantes quanto a obrigação de ser turno de 6:00 horas, quando (a) forem grupos ininterruptos entre si, (b) houver revezamento e (c) não houver negociação coletiva da qual decorra situação diversa. Não é duração de intervalo- se de 0:15 minutos, de uma ou duas horas- que determina a duração da jornada. É o intervalo: se o de 0:15 minutos, de uma hora ou mais. Recuso não reconhecido. (BRASIL, 1997). A negociação coletiva, que concerne ao aumento da jornada de trabalho de seis para oito horas diárias, desafia o princípio de justiça social. Esse aumento de jornada não é ilimitado, deve haver em contrapartida, para o empregado, a concessão de outras vantagens (salariais e sociais), mesmo que essas não minimizem as perdas na saúde do trabalhador. Havendo esse aumento, a tipificação da atividade continua sendo a de turnos ininterruptos de revezamento. A norma autônoma não poderá prever uma ampliação semanal da jornada, devendo haver o respeito às trinta e seis horas semanais. Interessante é a redação da Súmula 423, do TST, em que foi consubstanciado que: “estabelecida jornada superior a seis horas e limitada a oito horas, por meio de regular negociação coletiva, os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não têm direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas como extras.” Aqui cristalizou-se um entendimento restritivo do comando constitucional. Fixou-se uma “regra”, sem amparo na Lei Maior, estabelecendo verdadeira renúncia do direito fundamental do trabalhador, ao pagamento de horas extras. Em contrário movimento político-ideológico, tem-se a OJ-SDI1, do ano de 2010, em que o labor, nos turnos, ora estudados, não retira o direito à hora noturna reduzida, 68 69 Súmula 360: “TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. INTERVALOS INTRAJORNADA E SEMANAL - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 A interrupção do trabalho destinada a repouso e alimentação, dentro de cada turno, ou o intervalo para repouso semanal, não descaracteriza o turno de revezamento com jornada de 6 (seis) horas previsto no artigo 7º, XIV, da CF/1988." (BRASIL, 2003). Súmula 675: "Os intervalos fixados para descanso e alimentação durante a jornada de seis horas não descaracterizam o sistema de turnos ininterruptos de revezamento para o efeito do artigo 7º, XIV, da Constituição." (BRASIL, 2003). 79 não havendo incompatibilidade entre as disposições contidas nos artigos. 73, § 1º, da CLT e 7º, XIV, da Constituição da República. Pelo descumprimento do preceito constitucional, existem, em geral, duas linhas de condutas jurisprudenciais: a) a aplicação da interpretação estampada na Súmula 85, item III, do TST, de forma analógica; sendo devido o respectivo adicional de horas extras, calculadas sobre as duas horas excedentes (caso o empregado trabalhe oito horas diárias, quarenta e quatro horas semanais) e; b) como o valor do horário trabalhado, pelos integrantes dessa categoria foi “supervalorado” pela Constituição, aplicar-se-á a Súmula 199, I, do TST: sendo a pré-contratação de horas suplementares nula, passando a serem devidas as horas extras com o adicional de, no mínimo, 50% (cinquenta por cento). Acredita-se que esta última corrente corresponda mais aos anseios protetivos constitucionais, a garantir a efetividade da norma de cunho social. 2.2.15 Repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos O repouso semanal consiste no lapso temporal de 24 horas, contínuas e infracionáveis, coincidindo preferencialmente aos domingos, destinado ao descanso pela semana trabalhada. Preleciona Cesarino Junior (1980, p.369) que o repouso semanal remunerado “é o período de folga a que tem direito o empregado após um determinado número de dias ou de horas de trabalho por semana, com o fim de proporciona-lhes um descanso higiênico, social e recreativo”. O descanso, em estudo, somente passou a vigorar no Brasil a partir da Constituição de 1946, artigo 157, VI, além da Lei do Repouso Semanal Remunerado (605/49), mesmo que na CLT já houvesse disposição a respeito (artigo 67). Doutrinadores mais conservadores denominam o repouso semanal remunerado de repouso hebdomadário. O constituinte de 1988 não trouxe uma matéria inédita. No entanto, em relação à Constituição de 1969, acresceu o “preferencialmente aos domingos” e tratou a matéria de forma apartada dos feriados civis e religiosos. A preferencialidade aos domingos não é aleatória. Essa norma constitucional consagra a necessidade imperiosa de o trabalhador, que labora a semana toda, descansar, afora questões de cunho religioso, juntamente com seus familiares e aos demais concidadãos, preservando a saúde não somente física, mas também mental de quem trabalha. O repouso, em outro dia da semana, mesmo sendo legal e permitido pela Constituição, não gera os mesmos benefícios. A vida atual esgota, diariamente, a classe trabalhadora. É uma realidade, 80 na forma de organização de produção atual, que determinados tipos de trabalho sejam sedentários, que é causa de angústias (doenças psicológicas) ao trabalhador. Muitas vezes, não é fácil descansar no período interjornada de 11 horas, no mínimo, “entre a jornada de hoje e a de amanhã”, ainda mais, quando não se tem “um bom domingo”. Um domingo, verdadeiramente descansado é aquele em que, pela manhã, o trabalhador vai à igreja, tem um almoço em família (e não, em chão de fábrica), vê um pouco de televisão, joga “uma bolinha” com os filhos e dorme mais sedo, para no dia seguinte recomeçar a jornada semanal. O repouso semanal é regido pela Lei nº 605/49 e regulamentado pelo Decreto 27.048/49, com alteração do Decreto 83.842/79 70 . Todos os empregados têm o direito ao repouso semanal remunerado, de 24 horas contínuas, preferencialmente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local, exceto quando houver disposição em contrário no regulamento (Decreto 27.048/49) 71 . As exigências técnicas, para os efeitos do regulamento, são aquelas que, em razão do interesse público, ou pelas peculiaridades das atividades da empresa ou da localização onde as mesmas se exercitarem, tornam indispensável o prosseguimento do trabalho em todos ou alguns dos respectivos serviços. A Lei nº 605/49, ao longo do tempo, foi alterada pelas Leis: 2.761, de 1956; 7.415, de 1985; 9.093, de 12.09.95 e; 11.324, de 2006. As normas que regulam a matéria de repouso estendem-se aos trabalhadores rurais, salvo os que laboram em regime de parceria agrícola, meação ou forma semelhante de participação na produção; aos trabalhadores autônomos, desde que trabalhem agrupados, por intermédio de sindicato, caixa portuária ou entidade congênere, assim como estivadores, conservadores, conferentes e assemelhados e; aos trabalhadores das entidades autárquicas, da Administração Pública, das empresas por essas administradas ou incorporadas, desde que não estejam sujeitas ao regime dos funcionários ou extranumerários ou não tenham regime próprio de proteção ao trabalho. 72 O regime lei da de repouso aplica-se aos domésticos, contrariamente estava definido no artigo 2º, “c”, do Decreto regulamentador. Essa norma não foi recepcionada pela Constituição atual. O artigo 7º, inciso XV está englobado no rol do parágrafo único, desse 70 Esse Decreto delega competência ao Ministro do Trabalho para autorizar o funcionamento de empresas aos domingos e feriados civis e religiosos. 71 Conforme a Súmula 91 do TST (BRASIL, 2003), é devida a remuneração correspondente ao repouso semanal e as dos dias de feriados ao empregado que receba comissão, mesmo sendo pracista. 72 A pacificar o entendimento acerca da classe dos professores, o TST editou a Súmula 351: “PROFESSOR. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. ARTIGO 7º, § 2º, DA LEI Nº 605, DE 05.01.1949 E ARTIGO 320 DA CLT (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. O professor que recebe salário mensal à base de hora-aula tem direito ao acréscimo de 1/6 a título de repouso semanal remunerado, considerando-se para esse fim o mês de quatro semanas e meia.” (BRASIL, 2003). 81 mesmo artigo, em que o legislador enumerou quais direitos “são aplicáveis” à categoria dos domésticos. Em 2006, através da Lei nº 11.324, esse dispositivo foi revogado. No artigo 4º, está previsto um repouso semanal de 20 horas, o que também não foi recepcionado. Em se tratando de serviços que exijam trabalho aos domingos, excetuando os elencos teatrais e congêneres, será estabelecido, previamente, um quadro organizado de escala de revezamento entre os trabalhadores (preceito insculpido no artigo 386, da CLT. Nessa regra, está determinado que seja feita uma escala de revezamento quinzenal, bem como, na Lei nº 605/49). Existem serviços em que é permitido o trabalho nos feriados civis e religiosos, nesse caso, a remuneração dos empregados que trabalharem nesses dias será paga em dobro, salvo a empresa que determinar outro dia de folga. O Ministério do Trabalho e Emprego é competente para autorizar o funcionamento de empresas aos domingos e feriados civis e religiosos. Afora esse caso, é admitido o trabalho no dia de repouso quando ocorrer motivo de força maior. Nesse caso, a empresa terá que justificar a motivação da ocorrência, frente à autoridade regional no prazo de dez dias ou ainda; quando, houver a necessidade da execução ou conclusão de serviços inadiáveis ou se a não realização, acarretar manifesto prejuízo. Para tanto, a empresa deverá obter, da autoridade regional, autorização prévia, com a delimitação do período autorizado, considerando que, de cada vez, não excederá sessenta dias, cabendo, ainda, a remuneração em dobro, para o trabalho realizado nos feriados civis ou religiosos 73. A remuneração do repouso tanto o semanal remunerado, quanto frente a trabalho realizado nos feriados civis ou religiosos, integrará o salário para todos os fins (reflexos 73 74 ) Os feriados civis e religiosos, a partir da Lei 605/49, passaram a ser remunerados. No entanto, antes dessa Lei, a matéria, pelo fato de depender apenas da “tradição local” e não possuir regulação específica, era algo flexível. Com a decretação de diversos feriados nacionais e a colocação de datas “encaixadas”, de forma a evitar os feriadões (por exemplo, feriado na segunda-feira, ao invés, de quinta-feira), assegurou-se a intensificação da atividade laborativa. Como exemplo dessa assertiva, tem-se o artigo 11 dessa Lei, em que está exposto que: “são feriados civis os declarados em Lei federal. São feriados religiosos os dias de guarda, declarados por Lei municipal, de acordo com a tradição local e em número não superior a quatro, neste incluída a Sexta Feira da Paixão” (BRASIL, 2011). Como se vê, essa norma outorgou poderes para o município, de forma limitada, a declarar, por meio de Lei, no máximo quatro feriados. A evitar ainda, o descompasso entre o serviço público e a iniciativa privada, na Lei 7.320/85, alguns critérios de antecipação ou postergação de comemoração da data, declarada como feriado, foram criados. Essa matéria, por haver duplicidade legislativa (competência da União em relação aos feriados civis e competência municipal, em relação aos feriados religiosos), ocorreram alguns choques competenciais. Desta forma, permaneceu, em virtude do comando constitucional, o direito social ao repouso semanal remunerado, conjuntamente ao direito de folga nos feriados. A Lei 605/49 foi, em parte, recepcionada pela Lei Maior. 74 Nesse sentido: “SUM-354 - GORJETAS. NATUREZA JURÍDICA. REPERCUSSÕES (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. As gorjetas, cobradas pelo empregador na nota de serviço ou oferecidas espontaneamente pelos clientes, integram a remuneração do empregado, não servindo de base de cálculo para as parcelas de aviso-prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado.” (BRASIL, 2003). 82 cabíveis 75 . Independentemente da forma de pagamento do salário, a remuneração do dia de repouso corresponderá: a) para os contratados por semana, dia ou hora à de um dia normal de trabalho, não sendo computadas as horas extraordinárias. Em se tratando de contratados por tarefa ou peça, a remuneração corresponderá ao salário consentâneo às tarefas ou peças, executadas durante a semana, no horário normal de trabalho, dividido pelo dias de serviço, efetivamente prestados ao empregador. No caso dos trabalhadores rurais, que laboram por tarefa pré-determinada, a remuneração consistirá no cociente da divisão do salário convencionado pelo número de dias fixado para a respectiva execução. Assim, a remuneração corresponde a um dia normal de labor. Em 2010, a SDI-1 do TST lançou a seguinte OJ, de número 394: REPOUSO SEMANAL REMUNERADO - RSR. INTEGRAÇÃO DAS HORAS EXTRAS. NÃO REPERCUSSÃO NO CÁLCULO DAS FÉRIAS, DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO, DO AVISO PRÉVIO E DOS DEPÓSITOS DO FGTS. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010). A majoração do valor do repouso semanal remunerado, em razão da integração das horas extras habitualmente prestadas, não repercute no cálculo das férias, da gratificação natalina, do aviso prévio e do FGTS, sob pena de caracterização de “bis in idem”. (BRASIL, 2010). Novamente, a Suprema Corte Trabalhista retira direito constitucional do trabalhador: a repercussão da base salarial nas férias, aviso prévio, décimo terceiro e FGTS. Se o aviso prévio, por exemplo, é a extensão do contrato de trabalho, por que não integrar o repouso, nessa parcela salarial? Independentemente da assiduidade e pontualidade do trabalhador, havendo ou não o trabalho regular durante a semana (seis dias), o direito ao repouso semanal remunerado subsistirá. No entanto, poderá haver a perda da remuneração correspondente ao dia de repouso, salvo a ocorrência de faltas justificadas, que são remuneradas, por exemplos, as hipóteses do artigo 473 da CLT. Essa matéria não está pacificada pela jurisprudência atualmente. O comércio varejista tem permissão para funcionar aos domingos, sendo respeitadas as normas municipais, desde que coincida o repouso semanal com um domingo no mês laborado (aplicação analógica do parágrafo único, do artigo 5º, da Lei nº 10.101/00 além da portaria do Ministério do Trabalho 417/66). Alguns autores entendem, acertadamente, que, 75 Exceto em se tratando de gratificações por tempo de serviço, conforme o TST. Causa estranheza essa decisão, já que a Constituição não faz ressalvas nesse sentido: “SUM-225 - REPOUSO SEMANAL. CÁLCULO. GRATIFICAÇÕES POR TEMPO DE SERVIÇO E PRODUTIVIDADE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 As gratificações por tempo de serviço e produtividade, pagas mensalmente, não repercutem no cálculo do repouso semanal remunerado.” (BRASIL, 2003). 83 mesmo o município tendo autonomia competencial para regulamentar o funcionamento do comércio local, as normas que autorizam a abertura do comércio em dias não autorizados pela legislação trabalhista, são ilegais76. Acredita-se que o artigo 6º, da referida norma, não é autoaplicável, devendo haver previsão em acordo ou convenção coletiva 77. Além do mais, não se deve estender o conteúdo da referida regra aos feriados, que coincidam com os domingos. Do contrário seria sobrecarregar, demasiadamente, o empregado! 78 No Decreto 27.048/49, que regulamentou a Lei nº 605/49, está disposto no artigo 7º, que a empresa que comercializa os gêneros alimentícios no varejo, previstos na relação anexa II, tem permissão permanente para o trabalho aos domingos. A jurisprudência vem considerando que nessa norma estão incluídos os supermercados. Usualmente, não raro, os supermercados, shoppings centers, pets shops, padarias, dentre outros diversos empreendimentos, funcionam indiscriminadamente aos domingos. Na verdade, a demanda de procura por produtos, vendidos nesses estabelecimentos, é altíssima, conforme afirma o setor empresarial. A maioria da população quer o comércio aberto aos domingos. A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) e outras entidades patronais encomendaram uma pesquisa, capitaneada pelo IBOPE, entre 4 (quatro) e 15 (quinze) de abril de 2003, foram entrevistadas 3.150 pessoas, nas seguintes capitais: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Recife e Curitiba Constatou-se que 59% dessas pessoas eram favoráveis à abertura do comércio aos domingos. Em 2007, a pesquisa foi repetida e esse número cresceu para 79%. 76 No entanto, grande parte da população entrevistada não Nesse sentido preleciona Valentim Carrion. In Comentários à Consolidação das Leis d Trabalho. 32ª ed. atual. por Eduardo Carrion – São Paulo: Saraiva, 2007. 77 Existe decisão do TRT de Minas Gerais, nesse sentido: “EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA FUNCIONAMENTO DE SHOPPING CENTER NOS DIAS DESTINADOS AO REPOUSO E FERIADOS COMPETÊNCIA MUNICIPAL PARA LEGISLAR SOBRE ASSUNTOS DE INTERESSE LOCAL AUTORIZAÇÃO MUNICIPAL CONDICIONADA À ANUÊNCIA EXPRESSA DOS SINDICATOS REPRESENTATIVOS DAS CATEGORIAS INTERESSADAS - AUSÊNCIA DO PRESSUPOSTO ESPECÍFICO - POSSIBILIDADE DE ATUAÇÃO MINISTERIAL - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 4O DA LEI N. 5.913/91 C/C ARTIGO 30, I/CR 88 E SÚMULA 645/STF. Considerando que a Lex Legum conferiu ao ente municipal competência para legislar sobre assuntos de interesse local, submeteu os operadores do direito à observância das condições dos diplomas legais por ele editados. A Lei Municipal n. 5.913/91, que rege o horário de abertura e encerramento do comércio de Belo Horizonte, criou um pressuposto específico condicionante ao fornecimento da autorização para funcionamento nas datas tradicionalmente comemoradas, bem como em relação aos domingos e feriados, revelado pela chancela expressa dos sindicatos de classe e com indicação do horário pretendido. Nesse diapasão, é forçoso reconhecer que a ausência de concordância de uma das entidades representativas obsta a abertura do estabelecimento comercial, sendo legítimo o ato fiscalizatório da autoridade competente, inexistindo direito líquido e certo à ausência de atuação ministerial, o que evidencia a denegação da segurança pretendida.” (MINAS GERAIS, 2005). 78 Sensata a seguinte decisão da SDI-1: “OJ-SDI1-410 - REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. CONCESSÃO APÓS O SÉTIMO DIA CONSECUTIVO DE TRABALHO. ARTIGO 7º, XV, DA CF. VIOLAÇÃO. (DEJT divulgado em 22, 25 e 26.10.2010). Viola o artigo 7º, XV, da CF a concessão de repouso semanal remunerado após o sétimo dia consecutivo de trabalho, importando no seu pagamento em dobro.” Do contrário, em pouco tempo, haveria a possibilidade de “compensação” de repouso semanal (BRASIL, 2010). 84 labora aos domingos, e não comungam com o pesar do labor nos dias de descanso. Dos indivíduos pesquisados, dentre as vantagens trazidas pela pesquisa, foi apontado: melhor atendimento, trânsito mais fluido, menos filas nos caixas dentre outros. 2.2.16 Remuneração do Serviço Extraordinário Superior, no Mínimo, em Cinquenta por Cento à do Normal A sobrerremuneração da hora-extraordinária trabalhada somente foi elevada ao patamar constitucional em 1988 79 . Com a aceitação das propostas das entidades sindicais, a regulamentação constitucional da hora-extra, tornou-se um instituto objetivo. O detalhamento do percentual elevando-o ao valor, de no mínimo 50%, permitiu que o piso pudesse, através de diploma coletivo negociado, ser ainda aumentado como o é em convenções e acordos por todo país, a cooperar com o movimento principiológico constitucional de desburocratização das relações trabalhistas (as partes envolvidas podem, de forma equilibrada e autônoma, criar normas). Anteriormente, à Constituição da República atual, a disciplina era tratada pela CLT (especificamente, no artigo 59), no entanto, essa norma não foi recepcionada pela Lei Maior. As horas suplementares são os lapsos temporais que excedem a jornada normal, sejam elas pertinentes à jornada padrão de quarenta e quatro horas semanais, e oito horas diárias, ou às jornadas especiais, que são calculadas à base da hora-normal (constituindo a divisão, por exemplo, do salário-dia por oito horas, conforme o preceito estabelecido no artigo 65, da CLT). A percepção do valor das horas extras é cabível apenas quando o empregado, efetivamente, realizar sobrejornada, constituindo, assim, o chamado salário-condição (não adere de forma definitiva ao contrato de trabalho). O valor da hora-extra é a soma do que é pago pela hora normal acrescido de 50%, podendo ser realizado por homens e mulheres, sem discriminação. 80 Anteriormente a 2003, o TST entendia que o valor das horas extras prestadas com habitualidade, por mais de 2 (dois) anos, ou durante todo o contrato, se suprimidas, integra-se 79 Na Constituição da República, está garantido a todo empregado o direito à percepção do respectivo sobrelabor, à margem de 50 % sobre a hora norma, não havendo ressalvas quanto a esse direito. Em interpretação limitativa da norma social, a SDI-1 editou a seguinte Súmula: “SUM-61 - FERROVIÁRIO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Aos ferroviários que trabalham em estação do interior, assim classificada por autoridade competente, não são devidas horas extras (artigo 243 da CLT).” (BRASIL, 2003). 80 Conforme o entendimento sumulado pelo TST: “SUM-264 - HORA SUPLEMENTAR. CÁLCULO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. A remuneração do serviço suplementar é composta do valor da hora normal, integrado por parcelas de natureza salarial e acrescido do adicional previsto em Lei, contrato, acordo, convenção coletiva ou sentença normativa.” (BRASIL, 2003). 85 ao salário para todos os efeitos legais (conforme a Súmula 76 do TST). No entanto, essa Súmula foi cancelada, abrindo margem para divergências jurisprudenciais. Existe uma polêmica matéria acerca da chamada: “semana espanhola”. Essa praxe pressupõe que haja a alternação da prestação de 48 horas em uma semana e 40 horas em outra, sendo essa possibilidade ajustada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho, desde que não haja violação dos artigos 59, § 2º, da CLT e 7º, XIII, da CR/88. A jurisprudência majoritária aceita essa matéria, conforme a Orientação Jurisprudencial 323, da SDI-1/TST. Sendo salário condição, o empregador pode suprimir a realização do serviço suplementar (trabalho/produção). Conforme o entendimento majoritário do TST, se esse empregado realiza, durante pelo menos um ano horas extras, prestadas com habitualidade, fará jus à uma indenização correspondente ao valor de um mês das horas suprimidas, para cada ano ou fração igual ou superior a seis meses, de prestação de serviço acima da jornada normal. O cálculo observará a média das horas suplementares efetivamente trabalhadas nos últimos doze meses, multiplicada pelo valor da hora-extra do dia da supressão (Súmula 291, do TST). A jornada diária de trabalho dos empregados pode ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente a duas, no máximo, para efeito de sobrelabor, mediante acordo individual, acordo coletivo, convenção coletiva ou sentença normativa. Ou ainda, no caso de ocorrer necessidade imperiosa, podendo a jornada ser prorrogada, além do limite legal. Ao trabalhador que percebe o salário por produção e trabalha em sobrejornada faz jus à percepção apenas do adicional de horas-extras (Orientação Jurisprudencial 235 da SDI1/TST). Já o empregado comissionista, sujeito ao controle de horário, tem direito ao adicional de horas-extras, calculado sobre o valor-hora das comissões recebidas no mês, considerandose, como divisor, o número de horas efetivamente laboradas (Súmula 340 do TST). O adicional noturno integra a base de cálculo das horas-extras, que efetivamente forem prestadas no período noturno (Orientação Jurisprudencial 97 da SDI-1/TST). A prova do horário de trabalho na justiça laboral é tema controvertido na processualística. Na maior parte dos casos, prova-se o horário laborado através dos cartões de ponto (quando a entidade empregadora tem mais de dez empregados 81). A partir dessa prova, 81 Conforme o artigo 72, parágrafo segundo, da CLT: “Para os estabelecimentos de mais de dez trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, 86 o magistrado fixa os horários de trabalho, que servirão de cálculo para os respectivos adicionais. Na Súmula 338, o Colendo TST trata a matéria de ônus probatório de forma mais detalhada. É ônus do empregador, que conta com mais de dez empregados, o registro da jornada de trabalho, nos moldes do artigo 74, § 2º, da CLT. Caso a parte não apresente e nem justifique a falta de apresentação dos cartões de ponto (ou controles de frequência), gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho 82. Os cartões de ponto que marcam horários, de entrada e saída, de forma uniforme, são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas-extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada declarada na petição inicial, se dele não se desincumbir. Normalmente, essa é a hipótese fraudulenta: a prática da chamada anotação em “hora britânica”, em que, certas empresas, usualmente, por via eletrônica, marcam os horários que lhes convier, e apenas exige que o empregado assine. O intervalo intrajornada, para repouso e alimentação, nos moldes do artigo 71, da CLT, parágrafo 4º, não usufruído pelo empregado gera a obrigatoriedade, para o empregador, ao pagamento da remuneração do período correspondente, com um acréscimo de no mínimo 50% (cinquenta por cento), sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. Acredita-se que esse valor insere-se no complexo salarial do empregado, não constituindo verba indenizatória e sim salarial, gerando reflexos em outras parcelas 83. Tratase de horas-extras e não verba indenizatória de no mínimo 50%. Esse patamar segue as peculiaridades das horas-extras, sendo, portanto, um valor mínimo a ser pago. Caso haja estipulação, a maior, do valor das horas suplementares, o período não cumprido (total ou parcialmente) de intervalo intrajornada, para repouso e alimentação, seguirá o valor mais favorável dessas horas-extras (fictas – como se realmente fosse tempo trabalhado e acrescido de horas-extras). 84 82 83 84 conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré-assinalação do período de repouso.” (BRASIL, 2011). No final do item I dessa Súmula, está disposto que “[...] a qual pode ser elidida por prova em contrário” (BRASIL, 2005). Ora! A hipótese é de “presunção relativa”, que, por óbvio, cabe prova em contrário, o que é, ainda, reforçado no item II. Nesse aspecto, a Súmula é redundante. Esse entendimento, em 2008, foi pacificado na instância maior trabalhista, através da: “OJ-SDI1-354 INTERVALO INTRAJORNADA. ARTIGO 71, § 4º, DA CLT. NÃO CON-CESSÃO OU REDUÇÃO. NATUREZA JURÍDICA SALARIAL. DJ 14.03.2008. Possui natureza salarial a parcela prevista no artigo 71, § 4º, da CLT, com redação introduzida pela Lei nº 8.923, de 27 de julho de 1994, quando não concedido ou reduzido pelo empregador o intervalo mínimo intrajornada para repouso e alimentação, repercutindo, assim, no cálculo de outras parcelas salariais.” ((BRASIL, 2008). Anteriormente à edição da Lei 8.923/94 (que acrescentou o parágrafo 4º do artigo 71 da CLT) a matéria era tratada como mera infração administrativa, sob a égide do entendimento do antigo Enunciado 88 do TST. A jurisprudência majoritária expõe da seguinte forma, após julho de 1994: “OJ-SDI1-307 INTERVALO INTRAJORNADA (PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO). NÃO CONCESSÃO OU CONCESSÃO PARCIAL. LEI Nº 8.923/1994. DJ 11.08.03. Após a edição da Lei nº 8.923/1994, a não-concessão total ou 87 Para alguns juristas o valor, a título de horas-extras, que será pago corresponderá ao período que efetivamente não for cumprido, ou seja, o lapso temporal que o empregado deixou de descansar ou realizar sua refeição. Parte da doutrina e da jurisprudência entende que mesmo que a supressão do horário de descanso tenha sido parcial, ao empregado será devida a hora-extra sobre a totalidade da hora e não sobre os minutos não gozados. Na realidade, “o objetivo da lei, ao sobrevalorizar esse tempo desrespeitado, foi garantir efetividade (isto é, eficácia social) às normas jurídicas assecuratórias do essencial intervalo intrajornada para refeição e repouso” (GODINHO, p. 932, 2007). Afinal, essa proteção trata-se de norma de segurança e medicina no âmbito laboral. Sem intervalo, para um breve relaxamento e alimentação, corre o risco de o empregado ser conduzido a um estado de exaustão, o que, comumente, é causa de diversos acidentes de trabalho, muitos deles fatais. Convenção ou acordo coletivo de trabalho que prevê a supressão ou a redução do intervalo intrajornada previsto no artigo 71, da CLT, será considerado como inválido, em regra, excetuando os condutores e cobradores de veículos rodoviários coletivos e urbanos. No caso dessa categoria, é válida a cláusula de instrumento negocial coletivo de trabalho, que preveja a redução do intervalo intrajornada, desde que, seja garantida a redução da jornada para, no mínimo, sete horas diárias ou quarenta e duas horas semanais. Estão pacificadas pelo TST outras peculiaridades: a jornada não poderá ser prorrogada; deverá ser mantida a mesma remuneração e; que sejam concedidos intervalos, para descanso, menores e fracionados ao final de cada viagem, não descontados da jornada (conforme a Orientação Jurisprudencial 342 da SDI-1/TST, com nova redação a partir de 2009). A justificativa para essa exceção concerne à peculiaridade da natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho, que são submetidos especificamente os condutores e cobradores de veículos rodoviários, empregados em empresas de transporte público coletivo e urbano. Acredita-se que essa concessão é antidemocrática. O serviço dos condutores e cobradores de ônibus é, por demais, desgastante e perigoso, colocando em risco a própria população. O interesse coletivo e da dignidade da pessoa humana não podem ser suprimidos em virtude dos interesses da categoria econômica. Submeter o empregado a um nível de estresse tão elevado, diminuindo o intervalo para repouso e descanso, fere as normas constitucionais de medida de higiene, saúde e segurança do trabalho. 85 parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (artigo 71 da CLT).” (BRASIL, 2003). 85 Não raro, os ônibus são objeto de ataques de bandidos, primordialmente nas grandes capitais. 88 Na jornada extraordinária, não serão descontadas nem computadas as variações de horário, constantes no registro de ponto, que não excedam cinco minutos, observando-se o limite máximo de dez minutos diários. Caso seja ultrapassado esse período limítrofe, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal. 86 Analisando o disposto na Orientação Jurisprudencial 97, da SDI-1/TST: o adicional noturno integra a base de cálculo das horas-extras prestadas. Na Súmula 60, inciso II, do TST, está estabelecido que: cumprida, de forma integral, a jornada, no período noturno, e prorrogada esta, devido é também o adicional noturno quanto às horas dilatadas. Assim, o adicional noturno integra a base de cálculo das horas-extraordinárias. O reflexo das verbas laborais é algo complicado tanto para o advogado, quanto para o acadêmico. Pagas com habitualidades, as horas-extras refletem nas seguintes verbas: aviso prévio, férias e 13º (décimo terceiro) salários, calculados pelas respectivas médias (basta a análise dos artigos: 487, § 3º, da CLT, artigo 142, §§ 5º e 6º, da CLT e artigo 2º do Dec. Nº 57.155/65) e ainda, nas gratificações semestrais (Súmula 115 do TST), nos 14º (décimos quartos) salários (quando existentes), FGTS, compreendidos os depósitos do FGTS sobre os reflexos, exceto nas férias indenizadas (conforme a Orientação Jurisprudencial 195 da SDI1/TST). O trabalhador não é obrigado a prestar as horas-extras, salvo nos limites do artigo 61 da CLT. O problema é que, na realidade, essa “faculdade” é utópica, pois sendo negada pelo empregado a feitura de horas suplementares, esse correrá sérios riscos de ser dispensado pelo empregador ou, no mínimo, desagradá-lo. Recai aqui, a grande questão, o tênue liame entre o ius resistente e o ius variandi. Onde começa o direito do empregador de cobrar e onde começa o direito de o empregado negar? Acredita-se que o direito do empregador sempre se esbarrará na obrigação constitucional de respeitar os direitos sociais do trabalhador. 2.2.17 Férias Anuais Remuneradas com, pelo Menos, Um Terço a mais do que o Salário Normal As férias constituem um direito social do trabalhador, possibilitando, anualmente, ao indivíduo, a forma mais ampla de descanso e repouso, das forças físicas e mentais, sem 86 Conforme a Súmula 366, do TST (BRASIL, 2005), que se encontra consentânea à regra estabelecida no artigo 58, § 1º, da CLT. 89 prejuízo de seu salário. Frente ao estilo e ritmo de vida atual, o corpo humano necessita intensamente de um repouso prolongado. 87 O dever às férias calca-se na dupla obrigação das partes contratantes: o de descansar e o de conceder (natureza jurídica dúplice). Ou seja, o empregador é obrigado a conceder o período de férias, bem como a remuneração correspondente, e o empregado, além de poder exigi-las, tem o dever de descansar, de se recuperar das perdas sofridas pelo organismo, ao longo do ano produtivo. Cesarino Junior (1980, p. 380) ensina que a concessão d as férias remuneradas é obrigação do empregado e do empregador, mas para aquele “constituem uma necessidade para a conservação da saúde, o que aproxima esse direito de uma obrigação, de um dever.” Como bem resume esse respeitável estudioso, existe uma finalidade social das férias: [...] porque o homem não é apenas máquina, mas um ser com necessidades espirituais, intelectuais; não vive isolado, mas é parte de uma família, da coletividade e, atualmente, são os dias de descanso que lhes permitem o estreitamento das relações familiares, favorecendo-lhe a oportunidade de cuidar dos aspectos intelectual, espiritual, cívico, moral e social de sua existência, que não deve limitar-se à vida de trabalho. (CESARINO JUNIOR, 1980, p. 381). No entanto, a realidade atual é diferente dos brilhantes ensinamentos acima citados. Na empresa moderna, o empregado é polivalente, labora em dois empregos, “veste a camisa da empresa”, leva trabalho para casa, dorme e acorda pensando nos problemas do labor, ou seja, hoje, a vida resume-se no trabalho e para o trabalho. Não raro, o empregado está no gozo do período de férias, em contanto direto com seu empregador. As férias relacionam-se, fundamentalmente, à política de saúde pública, na medida em que favorece o bem-estar social, proporcionando a inserção do indivíduo no âmbito familiar, social e político. O aumento do turismo, por exemplo, é, ainda, um resultado positivo gerado pelas férias. O direito às férias constitui norma cogente, não sendo possível sua transação, nem mesmo frente a diploma coletivo. A única exceção é o “abono”, ou a “venda” de certo período. Na CLT, existe um extenso rol de regras acerca da matéria, dos artigos 129 a 145, incluindo a normatização das férias coletivas. A cada período de doze meses de vigência do 87 Na Súmula 10 do TST, firmou-se o seguinte entendimento: “PROFESSOR (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. É assegurado aos professores o pagamento dos salários no período de férias escolares. Se despedido sem justa causa ao terminar o ano letivo ou no curso dessas férias, faz jus aos referidos salários.” (BRASIL, 2003). Outro entendimento não poderia existir, já que, na Constituição da República, não existe nenhuma ressalva que retire esse direito social de qualquer trabalhador. 90 contrato laboral, o empregado tem direito a férias, concedidas pelo empregador, conforme seus interesses (a concessão das férias independe da vontade do empregado), normalmente, na proporção de 30 (trinta) dias, sendo interrompida a prestação do trabalho. É possível que esse lapso temporal seja menor 88 frente às faltas injustificadas, ocorridas, durante o período aquisitivo (período de doze meses contratuais). Passados os doze meses, será verificado o período concessivo que é o período de fruição das férias. Caso o empregador não tenha, no período concessivo, concedido as férias ao empregado, essas serão devidas em dobro. Dessa forma, passado o período aquisitivo e vencido o período concessivo, as férias serão vencidas e indenizadas (multiplicadas por dois), sendo, ainda, somado o terço constitucional. 89 A remuneração das férias consiste no valor percebido pelo empregado na data da sua concessão. Caso o salário seja pago por hora, com jornadas variáveis, apurar-se-á a média do período aquisitivo. Para o salário pago por tarefa, será tomada por base a média da produção, no período aquisitivo. No caso de percentagem, comissão ou viagem, será apurada a média percebida pelo empregado nos 12 (doze) meses que precederem à concessão das férias. Os adicionais por trabalho extraordinário, noturno, insalubre ou perigoso serão computados no salário, que servirá de base ao cálculo da remuneração das férias (reflexos) 90 . Caso o empregado não esteja percebendo o mesmo adicional do período aquisitivo, ou quando o valor desse tiver sido variável, será computada a média duodecimal recebida naquele período 91 . Essa regra da dobra vale para qualquer trabalhador urbano ou rural 92. Igualmente será devido o pagamento em dobro da remuneração de férias (ou do abono), abrangendo o terço constitucional, conforme o artigo 137, da CLT, quando, ainda que gozadas na época própria, o empregador não tenha pagado a remuneração correspondente até dois dias antes do início do respectivo período. 93 Quando da cessação da relação de emprego, antes de finalizado o período aquisitivo de férias, na rescisão contratual, essas serão pagas de forma proporcional ao tempo laborado 88 É exatamente o que se infere da Leitura do artigo 130 da CLT, com modificação datada de 1977, através do Decreto 1.535. 89 Acerca do cálculo das férias indenizadas, tem-se a seguinte Súmula do TST: “SUM-7 - FÉRIAS (mantida) Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. A indenização pelo não-deferimento das férias no tempo oportuno será calculada com base na remuneração devida ao empregado na época da reclamação ou, se for o caso, na da extinção do contrato”. (BRASIL, 2003). 90 No TST, tem-se o entendimento de que não incide a contribuição para o FGTS sobre as férias indenizadas. Lembrando, ainda, da já comentada OJ-SDI-1-394 do TST. 91 Súmula 81 do TST. (BRASIL, 2003). 92 Súmula 104 do TST (BRASIL, 2003).. Outra interpretação seria inconstitucional. 93 Leitura do 145 do TST concomitante à OJ-SDI1-386 do TST. 91 (são as chamadas férias proporcionais 94 ). O mesmo para o empregado demissionário 95 . Computando-se, para tanto, o terço constitucional (conforme a Súmula 328 do TST). Passado o período concessivo, pode, o empregado, ajuizar reclamatória trabalhista, pedindo a fixação das férias, em juízo, caso em que o magistrado poderá fixar multa diária (na CLT está prevista multa de 5% sobre o valor do salário mínimo), até que seja cumprida a decisão. Nessa hipótese, deve ser enviada cópia da decisão ao Ministério do Trabalho, para que aplique multa, de caráter administrativo, à empresa transgressora. No período de fruição das férias o empregado não pode prestar serviço para outra empresa. Essa obrigatoriedade não se perfaz quando o empregado possui contrato de trabalho com outra empresa. O período das férias deve ser ininterrupto, obrigatoriamente para os menores de dezoito e maiores de cinquenta, até mesmo perante as férias coletivas. Salvos esses casos taxativos, a norma celetista faculta a fração do lapso temporal, em no máximo duas vezes, sendo que um dos tempos não pode ser inferir a dez dias 96 . A concessão das férias será avisada, por escrito, ao empregado, com antecedência de, no mínimo, trinta dias, para que possa planejá-la. Devendo ser, obrigatoriamente anotada sua saída, na CTPS, bem como no livro ou nas fichas de registro dos empregados. Determinados fatores são prejudiciais à aquisição das férias 97, dentre esses: a) faltas injustificadas por mais de trinta dias (faltas justificadas não interferem no período de fruição das férias); b) quando o empregado deixar o emprego e não for readmitido dentro de sessenta dias subsequentes à sua saída; c) permanecer em gozo de licença remunerada por mais de trinta dias; d) deixar de trabalhar, com percepção do salário, por mais de trinta dias, em virtude de paralisação parcial ou total dos serviços da empresa e; e) tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente de trabalho ou de auxílio-doença por mais de seis meses, embora descontínuos (conforme o artigo 133, da CLT). Novo período aquisitivo recomeça quando o empregado, depois de cessado qualquer dos motivos, acima arrolados, retomar a prestação do serviço laboral. 94 Súmula 171 do TST (BRASIL, 2004). Súmula 261 do TST (BRASIL, 2003). 96 É cabível a aplicação analógica do artigo 61 da CLT, que aponta a necessidade imperiosa, a justificar a fração das férias (CARRION, 2006, p. 158). 97 Ressaltam-se que as faltas ou ausências, decorrentes de acidente do trabalho, não são consideradas prejudiciais às férias, tanto para efeito de duração, quando para o cálculo (o mesmo para a gratificação natalina). Essa é a interpretação dada pelo TST, pela Súmula 46 (BRASIL, 2003). 95 92 As faltas caracterizadas como justificadas não influenciam na contagem dos dias de 98 férias . São motivadas, conforme a CLT, as faltas: a) de dois dias, no caso de falecimento do cônjuge, ascendente, descendente, irmão ou pessoa declarada, em sua carteira de trabalho e previdência social, como dependente econômico; b) até três dias consecutivos, em virtude de casamento; c) por cinco dias, em caso de nascimento de filho, no decorrer da primeira semana; d) por um dia, em cada doze meses de trabalho, em caso de doação voluntária de sangue devidamente comprovada; e) até dois dias consecutivos ou não, para o fim de se alistar eleitor, nos termos da respectiva lei; f) no período de tempo em que tiver de cumprir as exigências do Serviço Militar (letra "c" do artigo 65 da Lei nº 4.375/64) 99; g) nos dias em que o empregado estiver, comprovadamente, prestando exame de vestibular, para inserção em estabelecimento de ensino superior; h) pelo tempo que se fizer necessário, quando tiver que comparecer a juízo (por exemplo, para ser testemunha ou preposto de uma empresa); i) por qualquer tempo, que seja necessário, quando, na qualidade de representante de entidade sindical, estiver participando de reunião oficial de organismo internacional do qual o Brasil seja membro 100 ; j) durante a licença-maternidade, de cento e oitenta dias 101 , ou no caso de aborto, conforme a legislação previdenciária; k) em razão de acidente do trabalho ou enfermidade, atestado pelo INSS, por até seis meses (passado esse prazo o empregado não faz jus às férias); l) as que são consideradas, pela empresa como justificadas. Nesse caso, a empresa não pode alterar o status de motivadas, das normas celetistas, ou seja, a empresa pode criar outras justificações, mas não alterar às já existentes, no ordenamento jurídico pátrio; m) no período de suspensão preventiva para responder a inquérito administrativo ou prisão preventiva, quando for impronunciado ou absolvido. Dessa forma, somente o que for considerado inocente, perante o Poder Judiciário, tem o seu período de afastamento considerado como justificado. Considera-se essa regra bis in idem, pois a “dívida” penal do indivíduo, perante a sociedade, é respondida diante da seara penal e não trabalhista. Existe, nessa norma, uma presunção de mal empregado, injustificável e; n) nos dias em que não houver serviço, por até trinta dias (por paralisação da empresa, por exemplo). 98 Inteligência da Súmula 89 do TST (BRASIL, 2003).. Nessa norma, está previsto que: “Dos Deveres dos Reservistas. Artigo 65. Constituem deveres do Reservista: c) apresentar-se, anualmente, no local e data que forem fixados, para fins de exercício de apresentação das reservas ou cerimônia cívica do Dia do Reservista.” (BRASIL, 1943) 100 Hipóteses previstas no artigo 473 da CLT. 101 Conforme a Lei 11.770 de 09 de setembro de 2008, que regulamentou o Programa Empresa Cidadã, destinado à prorrogação da licença-maternidade, através da concessão de incentivo fiscal, e altera, ainda, a Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991. No artigo 1º. Dessa nova Lei, está previsto que: “É instituído o Programa Empresa Cidadã, destinado a prorrogar por 60 (sessenta) dias a duração da licença-maternidade prevista no inciso XVIII do caput do artigo 7º da Constituição Federal” (BRASIL, 2011). 99 93 Perderá o direito às férias o empregado que, ao longo do período aquisitivo: a) desistir de seu emprego, e não sendo readmitido dentro de sessenta dias subsequentes à desistência; c) permanecer percebendo licença remunerada por mais de trinta dias; d) não laborar, recebendo salário, por mais de trinta dias, no caso de paralisação parcial ou total dos serviços da empresa e; e) tiver recebendo da Previdência Social benefício em função de acidente de trabalho ou o auxílio-doença por mais de seis meses, mesmo sendo em lapsos temporais descontínuos. A todo empregado, salvo os que trabalham sob regime de tempo parcial, é facultada a “venda” das férias, convertendo-se 1/3 (um terço) do seu período de descanso prolongado em abono pecuniário (é chamado abono de férias), remuneração, correspondente aos dias laborados. O empregado pode realizar essa requisição até quinze dias antes do término do período aquisitivo. No caso de férias coletivas, essa previsão tem que constar em diploma negocial coletivo. No artigo 144, da CLT, existe um dispositivo que prevê que esse valor convertido em abono de férias não integra o salário para os efeitos legais. Causa certa estranheza essa ressalva, já que o valor pago na conversão das férias, em pecúnia, tem natureza evidentemente salarial. As férias coletivas consistem na paralisação dos empregados, conforme os interesses do empregador, de toda a empresa, ou de setores específicos. Nessa hipótese, o empregador tem a obrigação de comunicar ao órgão local do Ministério do Trabalho (à DRT – Delegacia Regional do Trabalho), com antecedência mínima de quinze dias, as datas de início e fim das férias, especificando quais os estabelecimentos ou setores abrangidos pela paralisação coletiva, com cópia para o sindicato. Normalmente, a empresa expede, ao órgão competente, a carta de comunicação de férias coletivas, com a assinatura do responsável pelo empreendimento. Àquele empregado que for contratado a menos de doze meses fruirá a oportunidade, férias proporcionais, logo após, iniciará novo período aquisitivo. 2.2.18 Licença à Gestante, sem Prejuízo do Emprego e do Salário, com a Duração de Cento e Vinte Dias Preconiza a Constituição da República de 1988 que a empregada gestante tem o direito social à licença remunerada, no período de cento e vinte dias. 94 A licença-maternidade é o lapso temporal interruptivo 102 do contrato de trabalho, em que a mãe, biológica ou adotante 103, fica em casa para cuidar do recém-nascido. O legislador brasileiro recentemente, elasteceu esse lapso temporal, para cento e oitenta dias, conforme a Lei nº 11.770/2008 104 , criando, ainda, o chamado programa “Empresa Cidadã”. A prorrogação instituída, nessa norma, será garantida à gestante ou à adotante (proporcionalmente), empregada, da pessoa jurídica (e não pessoa física) que aderir ao Programa, desde que a trabalhadora a requeira até o final do primeiro mês após o parto. A prorrogação de sessenta dias será concedida, subsequentemente, à fruição da licençamaternidade de que trata o inciso XVIII, do caput do artigo 7º da Constituição da República (presentemente referendado). Dessa forma, aos cento e vinte dias serão somados mais sessenta, conforme as peculiaridades legais, abaixo citadas. Essa norma prevê, ainda incentivo fiscal para as empresas inscritas no programa. No período prorrogatório da licença-maternidade, tratado nessa lei, a empregada fica obrigada a não exercer nenhuma atividade remunerada. Fica vedada às mães, ainda, a inserção do menor em creche ou outra instituição similar. O objetivo da lei é o cuidado com a criança e a proximidade da figura materna, com o menor, contribuindo para o desenvolvimento do recém-nascido. Dessa feita, os requisitos objetivos para a aquisição do direito à prorrogação à licença-maternidade, são: a) que o empregador seja pessoa jurídica e; b) a empresa deve estar inscrita no programa “Empresa Cidadã”. Adverte a Sociedade Brasileira de Pediatria sobre a importância da proteção dos cuidados maternos com a criança, primordialmente, o recém-nascido. O aleitamento materno, exemplificadamente, é uma experiência físico-natural (biológica), cultural e social. A licença de cento e oitenta dias mais a criação, em instituições privadas e públicas, de salas de apoio à amamentação, são passos importantes para a proteção do menor amamentado. A licença-maternidade não se confunde com o benefício previdenciário do saláriomaternidade e a garantia provisória de emprego da gestante. O salário-maternidade é um benefício previdenciário concedido às seguradas empregadas, englobando, ainda: empregada 102 103 104 Configura-se caso de interrupção contratual, e não suspensão, conforme a doutrina majoritária eis que: a) conta-se o período de afastamento para todos os efeitos (por exemplo: 13ª e contagem das férias); b) a empregada recebe seu salário integralmente, salvo as parcelas que constituem salário-condição e; c) são, normalmente, realizados os depósitos do FTS. A extensão desse direito social à mãe adotante é novidade na norma celetista. O artigo 392-A foi incluído pela Lei nº 10.421, 15.4.2002. A regulamentação da Lei 11.770/2008 ocorreu no final de dezembro de 2009 por meio do Decreto 7.052 de 23 de dezembro de 2009, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2010. 95 doméstica 105, contribuinte individual e facultativa. É deferido em função do parto, da adoção ou da guarda judicial, para fins de futura adoção 106. A segurada empregada recebe o benefício por cento e vinte dias (tempo igual ao da licença-maternidade), vinte e oito dias antes e noventa e um dias após o parto. É prestado pela previdência, a partir do oitavo mês de gestação, devidamente comprovada através de atestado médico; da data do parto 107 , com apresentação da Certidão de Nascimento do menor e; da data do deferimento da medida liminar, nos autos da ação de adoção ou da data da lavratura da Certidão de Nascimento do recém-adotado. A garantia provisória de emprego está regulamentada, no artigo 10º, inciso II, alínea “b”, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, sendo deferido à empregada gestante, desde a confirmação da gravidez, até cinco meses após o parto. É direito social irrenunciável 108 . Nesse interregno, via de regra, a empregada fica protegida da dispensa patronal. A mulher gestante é, na sociedade atual, alvo de infindáveis discriminações, e, normalmente, o empregador dispensa a empregada grávida e “paga para ver” se, a mesma, terá coragem de ir à Justiça laboral. “Acostumados” com essa praxe, novamente, a síndrome do descumprimento de norma laboral, abarrota o judiciário trabalhista brasileiro, de empregadas dispensadas injustamente. 109 105 Por longos anos, mesmo com a promulgação da “Constituição Cidadã”, esse direito era negado à empregada doméstica. A interpretação do parágrafo único do artigo 7º, objeto de subitem apartado, no presente trabalho, impedia que a doméstica usufruísse desse direito social. Sem a possibilidade de fruir da licença, não recebia o benefício previdenciário do salário-maternidade. Dessa forma, a empregada gestante ficava totalmente desamparada, quando de sua gravidez. Normalmente, esperando uma criança no ventre, a mulher era dispensada de seus serviços domésticos e ficava desempregada! Estranha praxe, para um Estado democrático. 106 O valor do salário-maternidade corresponde à remuneração mensal integral, no mês de afastamento da gestante ou em caso de salário variável, igual à média dos 6 (seis) últimos meses de trabalho, apurada conforme a Lei salarial ou dissídio da categoria (conforme o artigo 393 da CLT). 107 É considerado parto o nascimento da criança, mesmo que natimorto, pelo menos na 23ª (vigésima terceira) semana, sexto mês. 108 Acertadamente a Sessão de Dissídios Coletivos do TST, pacificou no seguinte sentido: “OJ-SDC-30 ESTABILIDADE DA GESTANTE. RENÚNCIA OU TRANSAÇÃO DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. Inserida em 19.08.1998. Nos termos do artigo 10, II, "a", do ADCT, a proteção à maternidade foi erigida à hierarquia constitucional, pois retirou do âmbito do direito protestativo do empregador a possibilidade de despedir arbitrariamente a empregada em estado gravídico. Portanto, a teor do artigo 9º da CLT, torna-se nula de pleno direito a cláusula que estabelece a possibilidade de renúncia ou transação, pela gestante, das garantias referentes à manutenção do emprego e salário”. (BRASIL, 1998). 109 A pacificar o entendimento acerca da matéria, O TST publicou a Súmula 244 (BRASIL, 2003). 96 2.2.19 Licença-Paternidade, nos Termos Fixados em Lei Em 1967, através do Decreto 229, que incluiu hipóteses de afastamento do trabalho, sem prejuízo do salário (as chamadas faltas justificadas), no artigo 473, da CLT, surgiu o instituto da licença-paternidade. Estabeleceu o constituinte de 1988, precisamente, no inciso XIX, do artigo analisado, nesse capítulo, que o empregado, pai, tem direito à licença-paternidade de cinco dias (conforme a regra transitória constitucional 10, § 1º), a cargo do empregador e não da Previdência Social. Esse instituto não constitui direito previdenciário. Como bem lembra Valentin Carrion (2007), essa é a interpretação dada pelo Ministério do Trabalho (IN 1/88). Essa matéria, enquanto direito social do trabalhador, somente veio à baila constitucional na atual Lei Maior. Atualmente, no legislativo brasileiro, existem projetos para a ampliação do lapso temporal de cinco para, pelo menos, quinze dias, sem prejuízo do salário. Em 6 de agosto de 2008, foi aprovado o projeto de lei de autoria da Senadora Patrícia Saboya, a regulamentar a licença-paternidade, a que se refere o inciso XIX, do artigo 7º, da Constituição da República, com a ampliação do tempo para quinze dias. No último projeto, na Câmara dos Deputados (federal), de número 901 de 2011, foi proposto o aumento do lapso temporal para trinta dias. Esse projeto ainda aguarda parecer. Todo trabalhador (que tem vínculo empregatício), inclusive o doméstico, tem o direito à licença-paternidade, sendo, para sua concessão, necessário notificar o empregador, acerca do nascimento do filho. O período de licença inicia-se em dia útil, subsequente à data de nascimento do menor. Essa licença, de natureza remunerada e interruptiva da prestação do serviço permite que o homem auxilie a mulher, no estado puerperal feminino 110 111 111 110 , , bem como efetue o Na licença-paternidade, o FGTS será normalmente recolhido. Nesse sentido, já decidiu Alice Monteiro de Barros: “EMENTA: LICENÇA-PATERNIDADE. INCIDÊNCIA DO FGTS. O recolhimento do FGTS é obrigatório em todos os casos em que o trabalhador, por força de Lei ou acordo entre as partes, afaste-se do serviço, mas continue percebendo remuneração, como é o caso da licença-paternidade, a qual constitui interrupção do contrato; logo, a paga correspondente tem natureza salarial e não indenizatória, posto que remunera período de ausência justificada do trabalhador.” (MINAS GERAIS, 2011). O estado puerperal é considerado, pela Ciência Médica, como um transtorno afetivo, da mãe diante do nascimento do filho, podendo ocorrer nas primeiras 2 ou 3 semanas após o parto. Conforme pesquisa realizada por Carla Fonseca ZambaldiI, Amaury CantilinoII e Everton Botelho Sougey (profissionais especializados em Neuropsiquiatria), cerca de 13% das mulheres que acabam de ter uma criança, sofrem desse transtorno.Nesse período, pode, ainda, ocorrer o transtorno obsessivo-compulsivo, em que a mãe desenvolve pensamentos violentos em relação à criança (ZAMBALDII, CANTILINOII, SOUGEY, 2011). “Sintomas obsessivo-compulsivos na depressão pós-parto: relatos de casos”. Não raro, no Brasil e no mundo, crianças são assassinadas, nos primeiros dias de vida, em razão desse transtorno sofrido pela mãe, e 97 registro do nascituro. O trabalhador tem que ser, obrigatoriamente, pai, não necessitando estar casado com a mãe do recém-nascido. Se o empregado, na fruição de férias, requerer a licença-paternidade, após a primeira metade desse lapso temporal de descanso, o período concessivo da licença será contado a partir do primeiro dia útil subsequente ao término das férias. Caso seja requerida a licença-paternidade, antes da primeira metade, primeiramente conta-se a licença e, logo após, será concedido o período de férias. Na prática, o trabalhador é liberado com desconto no salário. Em verdade, poucos trabalhadores sabem que possuem esse direito. O ordenamento jurídico, mesmo diante da lacuna acerca da regulamentação da licença-paternidade, já possui respaldo, para que, analogicamente, sejam resolvidos casos, acerca do descumprimento do comando constitucional. Acredita-se que o empregado possa ajuizar reclamatória trabalhista, pleiteando o pagamento em dobro (indenização), pelo tempo laborado, quando deveria ter usufruído da licença-paternidade. Esse ato ilícito, praticado pelo empregador pode, ainda, gerar danos morais, e, consequente, pedido, via judiciário, de indenização, nos moldes da responsabilização civilista. Aproximadamente, já foi decidido em Santa Catarina, (RO-V 04245-2004-026-1200-5), sob os relatos da Juíza Ione Ramos, que: Ementa: Restando incontroversa a prestação de serviços no período destinado à licença-paternidade e tendo a empresa ciência do nascimento, ainda que em data posterior, é patente o direito à interrupção do contrato de trabalho ou o direito à conversão da licença-paternidade em pecúnia, ante a impossibilidade de gozo oportuno. (SANTA CATARINA, 2005). Dessa forma, o empregado tem o direito de ficar em casa com a mãe de seu filho, por, pelo menos cinco dias (lapso que pode ser prorrogado por diploma negocial coletivo), período exíguo, mas é direito social do trabalhador e deve ser cumprido. A norma constitucional não pode ter sua eficácia negada, em virtude da contumácia negativa legislativa. 2.2.20 Proteção do Mercado de Trabalho da Mulher, Mediante Incentivos Específicos, nos Termos da Lei normalmente, nesses casos, o pai, está ausente, a trabalho. Dessa forma, a presença paterna, no ambiente familiar, auxilia na superação desse processo depressivo, bem como, de outras tantas dificuldades, nos cuidados de uma criança, nos primeiros dias de vida. 98 Ana Terra, personagem da literatura clássica brasileira, como protagonista de uma história comum, do século XVIII, foi subjugada ao extremo; tendo, na própria família de sitiantes; constituída de pai, dois irmãos e mãe; seus principais opressores. Ao longo de sua humilde vida, Ana Terra era obrigada a exercer trabalho pesado no sítio em que morava, atender, sem questionar, ao pai e aos irmãos, foi impedida de continuar um relacionamento amoroso e o amante foi assassinado pelos irmãos, a mando do patriarca da família. Sofreu abuso sexual e outras violências inimagináveis, mas, conseguiu, com esforço descomunal, “dar a volta por cima”, trabalhar, e ajudar a construir o Rio Grande do Sul. 112 A história de Erico Veríssimo parece estar longe, “dos olhos”, das grandes capitais, e do convívio de muitos cidadãos, mas ainda, existem milhares de protagonistas, como a personagem, pelo Brasil. Violentadas, humilhadas e sem a sua dignidade garantida e reconhecida, no seio familiar e no trabalho. Milhares de mulheres são exemplos marcantes do preconceito histórico, ainda iminente. Ao longo de toda história da humanidade, a mulher sempre teve direitos restringidos. Na Grécia antiga, sua condição igualava-se a dos escravos (inimigos de guerra), que não eram considerados cidadãos, não podendo votar, por exemplo. A mulher, por centenas de anos, foi “juridicamente ignorada” (MAIOR, 2008, p. 354). Essa existência à margem da humanidade perdurou até o Renascimento, quando a mulher passou a ser objeto de arte. No entanto, o marco do desenvolvimento de ideias e concepções protetivas adveio com a Revolução Industrial. Nesse período, com a utilização, pelo Capital, da mão de obra infantil e da mulher, a “economizar”, e ainda mais explorar, as condições de trabalho eram precárias e acidentes fatais eram constantes 113. À época, século XIX, o Estado não intervinha nas relações de labor, não havia limitações como: jornada de trabalho, salários ou proteções especiais. As primeiras normas, de proteção eram apenas formais (não havia nenhuma efetividade), foram: na Inglaterra, em 1842, quando foi proibido o trabalho das mulheres em subterrâneos e, em 1844, havendo a limitação da jornada de trabalho para dez horas e meia; na França, em 1848, Leis protetivas do trabalho feminino foram postas à sociedade; o mesmo ocorreu na Alemanha, com o Código Industrial, de 1891 (MASCARO, 2009, p. 727). A criação da OIT trouxe para a mulher, assim como para qualquer trabalhador no mundo, recomendações de proteções específicas, sob o enfoque igualitário e de inclusão e 112 113 O livro “Ana-Terra” integrante da trilogia “O Tempo e o Vento” é obra-prima do escritor brasileiro Érico Veríssimo. Para ilustrar esse período, tem-se o filme “Germinal”, baseado na obra de Émile Zola, dirigido por Claude Berri, protagonizado também por Gérard Depardieu, retrata a realidade dos trabalhadores no período antecedente à Revolução Industrial, na França. A história passa-se na cidade de Montsou, grande exploradora da mineração. 99 justiça social. Quando da formação desse organismo internacional, nas primeiras convenções, de 1919, de número 3, foram garantidos direitos básicos como: a licença remunerada, antes e após o parto, o repouso para amamentação, além de uma remuneração (custeada pelos cofres públicos) à mulher, quando da fruição da dita licença. Na Convenção de número 4, do mesmo ano, o trabalho noturno da mulher foi proibido nas indústrias públicas ou privadas. Em 1953, adveio a convenção 103, em que se defende a maternidade. Na Convenção 111, existem disposições acerca da discriminação, em matéria de emprego e profissão. Atualmente, o mercado de trabalho da mulher é cercado de fatores discriminatórios que são prejudiciais à sua formação e a seu futuro profissional. A gravidez, a aparência (a beleza ou a ausência dela), comportamento, a cor da pele, ser ou não casada, querer ter ou não ter filhos, cor de cabelo, suposta fragilidade física (a precária noção de sexo frágil), a conduta social machista e mais uma infindável gama de minudências que alijam, mesmo no mundo pós-moderno, a mulher do mercado laboral. Esses fatores denotam a marcante desigualdade na sociedade brasileira. No Brasil, a proteção específica do mercado de trabalho da mulher foi inserida na Constituição, no inciso XX, a complementar o ideal protetivo, conjuntamente a todo contexto do artigo 7º da Lei Maior, primordialmente, aos direitos de licença-maternidade, e consequente garantia provisória de emprego e a licença-paternidade. Fatores, como esses apontados, demonstram a necessidade de proteção, ou seja, normas infraconstitucionais a garantir a efetividade do comando constitucional, de proteção ao mercado de trabalho da mulher. O constituinte originário deixou a cargo do legislador infraconstitucional a normatização da realidade, a tentar aplicar o princípio da igualdade, na disputa por espaço mercadológico, gerando aos poucos uma igualdade natural. O que esse ilustre legislador quis dizer foi que, a sociedade precisa de um “empurrão”, sobre sua conduta, para que aos poucos passe a agir de forma não forçada. Ideais igualitários, inseridos na norma, podem criar uma consciência de igualdade nos seres humanos. No entanto, não é o que decorre da norma infraconstitucional. Ao legislador ordinário, foi incumbido “o direito e o dever de oferecer, para viabilizar a proteção prevista e determinada, ‘incentivos específicos’” (CHIARELLI, 1989, p. 180), à mulher trabalhadora. Acredita-se que não basta “recepcionar” algumas normas celetistas, para cumprir esse dever. Há discriminação positiva na CLT, de forma precária, pois normas de proteção do trabalho da mulher, que vão do artigo 372 a 401, privilegiam sua situação no mercado laboral, apenas formalmente. Essas normas são alvo de inúmeras críticas, por acabarem causando 100 discriminação negativa (direta ou indireta), ou seja, afastando, ainda mais, as mulheres do mercado de trabalho. No artigo 372, da norma celetista, está previsto que: “os preceitos que regulam o trabalho masculino são aplicáveis ao trabalho feminino, naquilo em que não colidirem com a proteção especial instituída [...].” (BRASIL, 2011). No parágrafo único, existe uma exceção, não sendo aplicado o capítulo, que traz proteções especiais à mulher, ao trabalho exercido nas oficinas, que sirvam exclusivamente a pessoas da família da mulher e esteja esta sob a direção do esposo, do pai, da mãe, do tutor ou do filho. Assim, em princípio, onde trabalham apenas membros familiares, não se forma vínculo empregatício. Sem dúvida, para esse preceito, existe exceção, nas seguintes hipóteses, por exemplo: por deliberalidade do empresário (membro da família) em arcar com os riscos do negócio de forma isolada (por exemplo, com o ônus previdenciário) e; quando a família não estiver agindo com um “espírito verdadeiramente comunitário”, não havendo a redistribuição dos lucros por todos ou quando não exista a comunhão de interesses (CARRION, 2007, p. 257). A norma, presentemente comentada, é inaplicável, exegeticamente, para não dizer que constitui letra morta. Para entender essa assertiva, basta lembrar que a CLT é uma compilação de regras da década de 40, ou seja, com mais de setenta anos de existência, a retratar outra sociedade, diferente da de hoje. O princípio da primazia da realidade sobre a forma deve ser elevado nesses casos. O mais importante, sem sombra de dúvidas, é o reconhecimento do vinculo laboral. No artigo 373, da CLT, referendou-se acerca da jornada de trabalho da mulher que é de oito horas, salvo, fixação em contrário, como exemplo, norma coletiva que preveja tempo de labor inferior. Acerca dessa temática, a Lei nº 9.799, de 1999, acrescentou o artigo 373-A, na tentativa de coibir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho. Passando a ser vedado, expressamente na norma celetista: publicação ou anúncio de emprego que faça referência acerca do sexo, à idade, à cor ou situação familiar, exceto quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir. No entanto, na prática, jornais e demais meios de publicidade, diariamente, fazem referência à aparência “necessária” para o preenchimento de certas vagas. Outra possibilidade proibitiva, expressada no artigo 373-A, reside na recusa, pelo empregador, de contratação, promoção ou dispensa, fundada em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez, exceto quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível. Essa notoriedade pode ser visualizada no caso de trabalho árduo (em construção, por exemplo) exercido por uma mulher grávida. Nesse caso, o legislador está tentando preservar a integridade física da mulher o do nascituro. O termo “notório e 101 publicamente incompatível” refere-se a casos extremos, não podendo ser objeto de formas subterfugiosas de utilização dessa motivação. Nesse caso, correta será uma interpretação restritiva da norma. No inciso III, do artigo supracitado, será ilícita a atitude de um empregador que considerar o sexo, a idade, a cor ou a situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional. Será ilícita a exigência, feita pelo empregador, de atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, como critério de admissão ou permanência no emprego. Essa é, atualmente, uma das grandes situações em que a mulher é ostensivamente discriminada. Diversas empresas, quando da contratação, certificam-se se a mulher está grávida (questionando e verificando essa hipótese, através de exames laboratoriais e/ou atestado médico), acontecendo de, até mesmo, perguntarem se a candidata pretende ter filhos. Exames médicos adicionais são padronizados, mas considera-se que a empresa cometerá ato ilícito, caso exija exame de sangue, quando da contratação, por exemplo, para se verificar se o trabalhador é portador de alguma doença infecto-contagiosa. Devido à hipossuficiência técnica do candidato em relação à empresa, essa o discrimina de forma velada, diante dos resultados do exame médico, sem deixar provas contundentes de seu ato discriminatório. A palavra “comprovação” mencionada na norma, supracitada, não se refere a apenas questões de ordem técnica, tal como o exame de sangue. Há outras formas, inclusive a abordagem feita à candidata, que poderá posteriormente relatar o ocorrido, possibilitando a caracterização da exigência da empresa, como um ato ilícito. Na hipótese de o empregador impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos (para promoção, por exemplo), em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar (estar ou não casada, exemplificadamente) ou estado de gravidez, estará notoriamente cometendo ato ilícito discriminatório. Nota-se que os critérios para promoção, por exemplo, devem ser objetivos. A subjetividade, aqui, reside nos interesses egoísticos de quem emprega, ou seja, quando, por exemplo, um homem promove uma mulher, mais bem aparentada, ao invés de outra mulher, sendo que essa última possui melhor qualificação para exercer o cargo. O último inciso, do artigo, ora analisado, refere-se às revistas íntimas. Essas, quando realizadas em mulheres, devem ser feitas por mulheres, nunca por homens: empregador ou preposto. Como bem já decidiu Luiz Otávio Linhares Renault (2007) é: “legítimo ao empregador efetuar revistas aos pertences dos empregados, por motivo de segurança, desde 102 que a medida não seja utilizada de forma abusiva, de modo a causar constrangimento ao empregado.” (MINAS GERAIS, 2007). Por si só, a revista não é ato ilícito, em verdade, integra o poder fiscalizatório do empregador. No entanto, será ato ilícito caso o empregado seja submetido a qualquer tipo de constrangimento, de forma vexatória, por exemplo, se a revista íntima for realizada na vista de clientes 114. Acredita-se que, em qualquer caso exposto no artigo 373-A, da CLT ou outro semelhante 115 , é cabível o pedido, via judicial, de indenização por danos morais, em virtude do sofrimento e humilhação causados ao trabalhador discriminado, restando clara a intenção do empregador em prejudicá-lo. Conforme o artigo 377, da CLT: “a adoção de medidas de proteção ao trabalho das mulheres é considerada de ordem pública, não justificando, em hipótese alguma, a redução de salário” (BRASIL, 1943). Todas as normas, relativas ao Direito do Trabalho, possuem essa mesma natureza, são direitos sociais, cogentes, não podem ser revogados, por mera liberalidade das partes. Na Seção II, do capítulo acerca do trabalho da mulher, havia disposições que limitavam o trabalho noturno, no entanto, atualmente, pela igualação dos gêneros (caput do artigo 5º da CR/88), na sociedade, essas normas perderam a razão de ser. Na Seção III, “Dos Períodos de Descanso”, especificamente nos artigos 382 a 386, há uma repetição, das disposições já existentes, acerca do intervalo intrajornada e do repouso semanal remunerado, sendo aplicadas as mesmas regras gerais às mulheres. A única peculiaridade encontra-se no artigo 384, em que está previsto que: “no caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de 15 (quinze) minutos no mínimo, antes do início do período extraordinário do trabalho”. Analisando o princípio da igualdade, elencado como Direito Fundamental, no artigo 5º, caput, da Constituição, essa norma está em desconformidade com a Lei Maior. Considerando que o trabalho extraordinário é, por demais, prejudicial à saúde de qualquer trabalhador, essa regra deveria ser estendida a todos, e não apenas à mulher. “Dos métodos e locais de trabalho”, seção subsequente à acima mencionada, permanece a mesma ressalva antes exposta. O ambiente de trabalho, seguro, higiênico e saudável é direito de qualquer ser humano. Na redação do artigo 389, da CLT, existem importantes previsões a proteger o trabalho da mulher, quais sejam: a criação de vestuários 114 Nesse sentido, o mesmo jurista já decidiu de forma brilhante no seguinte acórdão: TRT/MG, Relator: Luiz Otávio Linhares Renault. RO: 01052-2006-062-03-00-7, 19-05-2007 (MINAS GERAIS, 2007). 115 As hipóteses apontadas no dito artigo são exemplificativas, delimitar taxativamente todas as formas ilícitas de discriminação, no âmbito laboral, é impossível. 103 apropriados e não coletivos, quando for necessária a troca de roupa no local de trabalho; a criação de salas de amamentação 116 , para empreendimentos com mais de trinta mulheres. Essa última exigência legal pode ser suprimida caso existam creches distritais mantidas, diretamente ou mediante convênios, com outras entidades públicas ou privadas, pelas próprias empresas, em regime comunitário, ou a cargo do SESI, do SESC, da LBA 117 ou de entidades sindicais. Interessante disposição é a limitação do esforço físico, da mulher, exposta no artigo 390 do diploma celetista, a vinte quilos para o labor contínuo e vinte e cinco ao ocasional, salvo quando o trabalho for realizado mecanicamente, eliminando o esforço. Essa norma foi recepcionada pela Constituição, pois, como bem lembra Souto Maior (2008, p. 363), o sistema muscular de homens e mulheres é notoriamente diferente. Concernente à proteção à maternidade, toda a seção foi recepcionada pela Lei Maior, contando, ainda, com importantes modificações realizadas pela Lei nº 10.421/2002, no artigo 392 e a criação do 392-A, já comentados. 2.2.21 Aviso Prévio Proporcional ao Tempo de Serviço, Sendo no Mínimo de Trinta Dias, nos Termos da Lei A evitar surpresas na ruptura do pacto laboral, a parte interessada deve, antecipadamente, avisar a outra desse desígnio. Dessa forma, o empregado pode tentar se recolocar no mercado de trabalho, ou o empregador, encontrar um novo empregado, que substitua esse, que está rompendo com o contrato de trabalho. O brusco fim dessa relação pode prejudicar a parte desprevenida, por isso da importância do instituto, ora estudado, reconhecido como garantia constitucional. Cesarino Junior (1980, p. 319) ensina que o 116 A reforçar a proteção, o TST, entendeu que: PN (Precedente normativo da SDC) “-6 - GARANTIA DE SALÁRIO NO PERÍODO DE AMAMENTAÇÃO. É garantido às mulheres, no período de amamentação, o recebimento do salário, sem prestação de serviços, quando o empregador não cumprir as determinações dos §§ 1º e 2º do artigo 389 da CLT.” (BRASIL, 2003). 117 O SESI foi fundado na era varguista, conceitua-se como: Serviço Social da Indústria. É voltado para atender os trabalhadores da indústria, garantindo-lhes saúde e bem-estar, fora do ambiente laboral, por exemplo, proporcionado lazer, oferecendo clubes e colônias de férias. Já o SESC, o Serviço Social do Comércio, tem sua manutenção garantida pelos empresários do comércio de bens e serviços. Os objetivos desse organismo é o bem-estar social da clientela que o mantém. Sua atuação calca-se nas áreas da educação, saúde, lazer, cultura e assistência; contando, até mesmo, com uma “legislação” (Resoluções) própria. A LBA, Legião BrasiLeira de Assistência, também fundada na era varguista, precisamente em 1942, presidida pela primeira dama, Darcy Vargas, com o objetivo de auxiliar as famílias dos soldados enviados à Segunda Guerra Mundial. Com o fim da guerra, seus objetivos tornaram-se mais amplos, passando a ajudar famílias necessitadas em geral, passando a ser presidida sempre pelas primeiras-damas. Em 1995, primeiro de janeiro, o presidente Fernando Henrique Cardoso extinguiu a LBA. 104 empregado pode ficar, de uma ora para outra, privado “de seu meio de subsistência” e; o empregador, “pode criar inesperadamente um claro na sua organização, nem sempre fácil de preencher sem prejuízo para o funcionamento regular de sua empresa”. O instituto do aviso prévio tem natureza jurídica de condição resolutiva, findo o prazo, extinguem-se as relações obrigacionais inerentes ao contrato laboral. Existe uma diferenciação doutrinária entre aviso prévio trabalhado e indenizado. O primeiro ocorre quando o empregado dispensado labora no período do aviso, no segundo, mesmo o trabalhador não prestando seus serviços a seu empregador, “ficando em casa”, recebe o valor respectivo. Em todos os casos, existe a projeção temporal do contrato. Em se tratando de aviso prévio cumprido em casa, apenas indenizado, o prazo para pagamento das verbas rescisórias é: até o décimo dia da notificação de dispensa (OJ 14 da SDI-1 do TST). Os preceitos pertinentes ao presente instituto encontram-se regulamentados na CLT, do artigo 487 ao 491. Por força dessa compilação, no contrato a prazo indeterminado, a parte que, sem justo motivo, almejar a cessação do contrato de trabalho, deverá avisar a outra da sua resolução, com uma antecedência mínima de: a) oito dias, se o pagamento for efetuado por semana ou tempo inferior ou b) trinta dias aos que perceberem por quinzena ou mês, ou que tenham mais de doze meses de serviço na empresa. As previsões do artigo 487, da CLT, como o prazo de aviso de oito dias e o aviso apenas para os contratos a prazo indeterminado (atualmente é cabível nos contratos a prazo determinado), foram fulminadas pela Constituição atual, cuja redação da norma social prevê como direito dos trabalhadores urbanos e rurais “o aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei”, ou seja, independentemente do tempo do contrato de trabalho. A norma constitucional é auto-aplicável, independe de qualquer complemento normativo posterior, além de não ter recepcionado os dispositivos celetistas em contrário. Interessante é que, na norma constitucional, do artigo 7º, inciso XXI, está exposto que o aviso é de no mínimo trinta dias, ou seja, norma heterônoma ou autônoma pode estabelecer prazo a maior. Nesse caso, a projeção do contrato de trabalho, conta o tempo estipulado. Nesse sentido, existe a previsão da OJ 367, da SDI-1. Para o empregado, o horário normal de sua jornada diária será reduzido em, duas horas, ou reduzir de seu mês, sete dias para os avisos de trinta dias e um dia de labor para os avisos de oito dias. Essa regra, prevista no artigo 488, da CLT, propicia ao empregado tempo para procurar um novo trabalho. Firmou-se, no TST, o entendimento de que é ilegal suprir o período redutivo da jornada de trabalho, no aviso prévio, pelo pagamento das horas suplementares correspondentes (inteligência da Súmula 230, do TST). 105 O valor do aviso corresponde a um salário, integral, inclusive computando as horas extras 118 . No interregno do período do aviso, pode ocorrer reajustamento salarial coletivo, nesse caso, o salário do empregado avisado também será reajustado. 119 É devido o aviso mesmo quando a empresa cessa suas atividades. 120 Na hipótese de o empregador ser desidioso, não avisando o empregado de sua saída, dá a esse o direito aos salários consentâneos ao prazo do aviso, bem como, a integração do período correspondente, no seu tempo de serviço. No caso de o empregado não avisar o empregador, a esse é garantido o direito de descontar os salários do respectivo prazo. Quando o salário for pago por tarefa, o cálculo, do aviso prévio, será feito de acordo com a média dos últimos doze meses de trabalho. Ocorrendo justa causa no período do aviso prévio dado ao empregado, salvo a de abandono de emprego, retira do mesmo, qualquer direito às verbas rescisórias de natureza indenizatória (Súmula 73, do TST). O empregador que, durante o período do aviso, cometer falta, que justifique a rescisão indireta e imediata do contrato, está obrigado a pagar o restante ao empregado. Cometida uma falta grave (justa causa) pelo empregado, nesse período, perde o direito ao valor restante, dando-se por encerrado o contrato. Havendo culpa recíproca, que enseje na cessação da relação laboral, no período do aviso, o empregado tem direito a 50% (cinquenta por cento) do valor correspondente 121. Ultimamente, a jurisprudência vem entendendo que é devido o aviso prévio, mesmo na despedida indireta. Esse não era o entendimento firmado na Súmula 31, do TST, hoje cancelado, pela mudança do entendimento. Nas rescisões antecipadas dos contratos de experiência, é cabível o aviso prévio, na forma do artigo 481, da CLT 122. O direito ao aviso prévio é irrenunciável, até mesmo se a renúncia partir do empregado. Essa é a afirmativa feita na Súmula 276, do TST, cuja redação segue: “[...] O pedido de dispensa de cumprimento não exime o empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador dos serviços obtido novo emprego.”. Nessa hipótese, 118 Recentemente, na norma celetista, essa regra foi alterada, antes não se computavam as horas extras no cálculo do aviso. A mudança adveio com a Lei nº 10.218, de 11.4.2001. Atualmente, a nova regra também possui entendimento firmado pelo TST, na Súmula 94 (BRASIL, 2003). 119 Essa regra encontra-se no parágrafo 6º do artigo 487 da CLT, incluído pela Lei nº 10.218, de 11.4.2001. O mesmo encontrava-se na redação da Súmula 5, hoje cancelada. 120 Inteligência da Súmula 44 do TST (BRASIL, 2003).. 121 Essa disposição está sumulada: “SUM-14 - CULPA RECÍPROCA (nova redação) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Reconhecida a culpa recíproca na rescisão do contrato de trabalho (artigo 484 da CLT), o empregado tem direito a 50% (cinquenta por cento) do valor do aviso prévio, do décimo terceiro salário e das férias proporcionais.” (BRASIL, 2003). 122 Esse entendimento está firmado na Súmula 163 do TST (BRASIL, 2003). 106 o empregado já sai do emprego com um novo trabalho, perdendo o aviso sua razão de ser. Nessa mesma linha lógica, é ilegal, que o período que se reduz da jornada de trabalho, no aviso prévio, seja substituído pelo pagamento das horas correspondentes 123. O tempo do aviso prévio, mesmo indenizado, conta-se para efeito da indenização adicional prevista no artigo 9º, da Lei nº 6.708, de 30.10.1979 (Súmula 182 e OJ 268, do TST). Essa lei dispõe sobre a correção automática dos salários. Ela modificou a política salarial no Brasil e foi alterada pela Lei nº 7238/84. O dito artigo dispõe que: o empregado que for dispensado, sem justa causa, “no período de 30 (trinta) dias que antecede a data de sua correção salarial, terá direito à indenização adicional equivalente a um salário mensal, seja ele, ou não, optante pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço” 124 (BRASIL, 2011). Essa norma instituiu uma indenização adicional, tornando mais onerosa a dispensa imotivada dos empregados, nos trinta dias que antecedem a sua data base 125 . Era comum que os empregadores dispensassem seus empregados, nesse período, com o intuito de pagar a menor os valores relativos à rescisão contratual. Mas, com o correto entendimento da Súmula 183, mesmo que, no aviso, o trabalhador não labore, existe a projeção, inclusive para o pagamento da indenização adicional prevista na lei supramencionada. 126 O objeto da regra constante na referida lei é o de compensar os possíveis prejuízos, ao empregado, pela não inserção desse, nas vantagens advindas com uma nova Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo. 127 128 Em se tratando de reflexos, o TST, sumulou o entendimento de que relativo à parcela de gratificação semestral, não repercute no cálculo das horas-extras, das férias e do aviso 123 Súmula 230 do TST (BRASIL, 2003).. A Lei é de 1979, por isso existe a referência à opção pelo FGTS, hoje, é unificado. 125 A chamada data-base é o período do ano em que os empregados e empregadores reúnem-se para celebrar os termos dos diplomas coletivos, fixando uma data para início de vigência do novo acordo ou convenção coletiva. Essas datas-bases (os períodos anuais) variam conforme a categoria profissional. 126 O entendimento firmado na Súmula 242 completa o raciocínio dessa matéria. 127 Súmula 314 do TST (BRASIL, 2003).. 128 O TRT de Minas Gerais, já decidiu que: “EMENTA: INDENIZAÇÃO ADICIONAL PREVISTA NO ARTIGO 9º DA LEI Nº 6.708/79, alterada pela Lei 7238/84, DESCABIMENTO. A indenização adicional é devida quando o trabalhador for dispensado dentro do período de 30 (trinta) dias que antecede a data-base de sua categoria profissional. Seu objetivo é compensar as possíveis perdas pela não inserção do laborista nas vantagens de uma nova Convenção Coletiva de Trabalho. A previsão legal da indenização adicional está no artigo 9.º da Lei nº 6.708/79, alterada pela Lei 7238/84, sendo que a Súmula nº 314 do c. Tribunal Superior do Trabalho também assegura este direito. E, nos termos da Súmula nº 182, também daquela colenda Corte, o tempo do aviso prévio, mesmo que indenizado, deve ser computado para efeito de pagamento da indenização prevista naquele dispositivo legal. No caso dos autos, considerada a projeção do aviso prévio (Súmula nº 182 do c. TST), verifica-se que o contrato de trabalho da autora teve fim em 17/09/2009, bem depois, portanto, da data-base da categoria, que, conforme informado pela própria trabalhadora, ocorreu em 01/09/2009. Por essa razão, não há que se cogitar do multicitado pagamento indenizatório.” (MINAS GERAIS, 2011). 124 107 prévio, mesmo que seja indenizado (Súmula 253 do TST). O aviso incide sobre o cálculo do FGTS (Súmula 305 e OJ 42 da SDI-1 do TST). Pela incompatibilidade entre os institutos, o aviso prévio não pode ser concedido em meio às hipóteses de garantia provisória de emprego.129 Acerca do dirigente sindical, o registro da candidatura desse empregado, o período de aviso prévio, mesmo que seja indenizado, não lhe assegura a estabilidade. Essa decisão encontra-se na Súmula 369, item V, cuja explicação assim aduz: “visto que inaplicável a regra do § 3º do artigo 543, da Consolidação das Leis do Trabalho” (BRASIL, 2011). Nesse artigo, está preconizado que: fica vedada a dispensa, salvo frente a cometimento de falta grave (conforme apuração prevista na CLT), do empregado sindicalizado ou associado, a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação de entidade sindical ou de associação profissional, até um ano do término de seu mandato, mesmo sendo eleito apenas como suplente. Na hipótese de, no período do aviso prévio indenizado, sobrevir a percepção de auxílio-doença, só se concretizam os efeitos da dispensa depois de consolidado o prazo final desse lapso temporal. Isso ocorre porque a projeção do contrato para o futuro e o valor do aviso indenizado limita-se às vantagens econômicas, obtidas no período de pré-aviso, ou seja, salários, reflexos e verbas rescisórias. Essa é a inteligência da Súmula 371 do TST. Acerca dos reflexos do aviso prévio: a gratificação semestral não repercute no cálculo do aviso (Súmula 253); o pagamento relativo ao período de aviso está sujeito à contribuição para o FGTS (Súmula 305), salvo em se tratando da multa de 40 %, em que é desconsiderada a projeção do aviso indenizado (OJ 42 da SDI-1); a majoração do valor do repouso semanal remunerado, em razão da integração das horas-extras, habitualmente prestadas, não repercute no cálculo aviso prévio (OJ 40 da SDI-1). O contrato laboral apenas se encerra com o fim do tempo do aviso prévio. Há, portanto, uma projeção do fim do pacto 130 . Esse dado é de extrema importância para a contagem de valores rescisórios. A prescrição somente começa a contar no final da data do término do aviso prévio (OJ 84 da SDI-1). Na contagem do prazo do aviso, segue-se a regra estabelecida no caput do artigo 132, do Código Civil, excluindo-se o dia do começo e incluindo o do vencimento 131. 129 Por mais lógica que pareça, na Súmula 348 do TST tratou-se dessa matéria (BRASIL, 2003).. Nesse sentido, está preconizado na OJ 82 da SDI-1 do TST que “a data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder a do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado” (BRASIL, 2000). 131 Essa regra encontra-se na Súmula 380 do TST (BRASIL, 2005). 130 108 Após a redação da Constituição da República de 1988, passou a ser prevista a proporcionalidade do aviso, com base no tempo de serviço, mas dependente de legislação regulamentadora, haja vista que o artigo 7º, inc. XXI, da CF/1988 não é considerado, nesse caso, auto-aplicável (OJ 84 da SDI-1do TST). Essa matéria voltou à baila de análise, frente à recente discussão feita pela Suprema Corte brasileira, no dia 22 de junho, na apreciação do Mandado de Injunção: 943, 1010, 1074 e 1090. O setor empregatício está a pressionar aquele órgão, a fixar um tempo de noventa dias. Nesses casos, os autores pleiteavam que seus avisos prévios fossem proporcionais ao tempo de serviço. Em verdade, o Supremo demonstrou coragem e vontade de, novamente, fazer às vezes do Poder Legislativo, diante da omissão, apesar de já existirem projetos de lei em tramitação sobre a matéria. Alguns ministros já até recomendaram que, para cada ano de serviço, sejam acrescidos dez dias ao aviso. A recente Lei nº 12.506, de 11 de outubro de 2011, sancionada pela presidente Dilma Rousseff, determina que a cada ano trabalhado para a mesma pessoa jurídica, o aviso prévio será acrescido de três dias, até o limite de sessenta dias, podendo o aviso prévio, portanto, perfazer um total de noventa dias. 2.2.22 Redução dos Riscos Inerentes ao Trabalho, por Meio de Normas de Saúde, Higiene e Segurança A tutela jurídica da redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança laborais não é novidade no ordenamento jurídico brasileiro. Havia correspondência normativa, frente ao artigo 165, precisamente, no inciso IX, da Constituição de 1969. Por motivos claros, no regime militar, essa norma não era efetivada, e continua longe a efetivação de sua finalidade protetiva. Na Constituição de 1988, esse direito social passou a ter mais força, sobretudo, em razão da elevação da pessoa humana e do valor social do trabalho como princípios fundamentais da República Federativa do Brasil (CF/88, artigo 1º, incisos III e IV, respectivamente). A saúde e a segurança são exemplos de direitos sociais, elencados no rol, não exaustivo, do artigo 6º, da Lei Maior. Nesse diapasão, no artigo 225, da Carta Magna, está disposto que: [...] todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988). (Grifou-se). 109 Está preconizado, ainda, que, a assegurar a efetividade desse direito, o Poder Público é competente para promover a educação ambiental, em todos os níveis de ensino e a conscientização pública, para a preservação do meio ambiente (CF, artigo 225, VI). A Constituição assegura a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança visando à integridade física do trabalhador e o controle dos agentes do ambiente do trabalho. No entanto, não há limitação para essa redução. O ordenamento prevê, como forma paliativa, o pagamento de adicionais, caso não sejam os riscos totalmente eliminados. Passou-se, na história da humanidade, a se monetarizar a saúde do trabalhador: trabalha-se em uma situação de perigo e se ganha um adicional respectivo. Em verdade, o que deve ser ressaltado é a real sustentabilidade. Não se pretende, no presente trabalho, a simples crítica ao desenvolvimento econômico, mas sim que seja equilibrado e sustentável. O meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como a sadia qualidade de vida, obviamente, são normas enquadrantes no ambiente laboral. A Revolução Industrial, no século XVIII, trouxe, em meio aos ideais liberais, a degradação do ambiente laboral, além do surgimento de diversas doenças nas fábricas e acidentes fatais no trabalho. Nesse contexto, surge o Direito do Trabalho, a proteger a dignidade e a saúde do trabalhador. Na década de 70, no Brasil, os óbitos de trabalhadores, no ambiente de trabalho, somavam-se a mais de cinco mil, por ano. Presentemente, a situação é gravíssima! Não obstante ser o direito a um meio ambiente de trabalho equilibrado, um direito fundamental, a OIT constatou que 2,2 milhões de pessoas vão a óbito a cada ano, no mundo, devido a acidentes e doenças consentâneas ao trabalho, o que supera o número de mortos em guerras. No Brasil, no ano de 2006, 2.717 (dois mil setecentos e dezessete) trabalhadores morreram, em função dos acidentes do trabalho (conforme dados da Relação Anual de Informações Sociais – RAIS – do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE). O setor de construção civil possui o maior índice de acidentes. Ressaltam-se que essas estatísticas atuais (outro exemplo, à base do Anuário Brasileiro de Proteção 2011, e dados obtidos a partir do RAIS/MTE/MPS) catalogam os casos de acidentes e de mortes de empregados, pela falta, das empresas, de emissão da CAT (Comunicação do Acidente do Trabalho). Essas estatísticas, portanto, levam em consideração os trabalhadores com a carteira assinada, desconsiderando os autônomos, os que laboram mediante contratos fraudulentos, cooperativas, estagiários, representantes comerciais e dentre outros. Dessa forma, existe um déficit na comprovação da quantidade de pessoas que morrem 110 ou adoecem em função do trabalho. Além do mais, as políticas de segurança, higiene e medicina, no trabalho, são rotineiramente desprezadas. Na Lei nº 8.213/91, está definido o que seria acidente do Trabalho. Segundo essa norma, são também consideradas acidentes de trabalho, as doenças profissionais produzidas ou desencadeadas pelo exercício de trabalho peculiar a determinada atividade; ou, as doenças do trabalho adquiridas ou desencadeadas em função de condições especiais em que o trabalho é realizado. O acidente de trabalho ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, ou ainda pelo exercício do trabalho dos segurados especiais, provocando lesões corporais ou perturbação funcional que cause a morte, perda ou redução da capacidade para o trabalho permanente ou temporária. Equiparam-se, ainda ao acidente de trabalho nos termos do artigo 21, da referida lei: I - o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação; II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de: ato de agressão, sabotagem ou terrorismo, praticado por terceiro ou companheiro de trabalho; ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho; ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho; ato de pessoa privada do uso da razão; desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior; III - a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade; V - o acidente sofrido pelo segurado, ainda que fora do local e horário de trabalho: na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa; na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito; em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por essa, dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado; no percurso da residência para o local de trabalho ou desse para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado. Está, ainda, previsto na legislação supracitada que igualmente será considerado acidente do trabalho: o evento ocorrido durante os períodos destinados à refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante esse e que causem lesões ou perturbações funcionais, já que o empregado é considerado no exercício do trabalho. 111 Para que o acidente seja considerado como laboral deverá haver nexo de causalidade entre o evento e a lesão provocada. Da mesma forma, a doença para ser considerada profissional ou do trabalho deve ter relação direta com a atividade exercida, não se podendo considerar aquelas decorrentes em função da idade ou condição específica da vítima. Já a doença do trabalho não é desencadeada em função da atividade propriamente dita, mas sim de determinada condição presente no ambiente laboral. Cite-se, como exemplo, o empregado que trabalha na indústria e desenvolve doença respiratória, pelo fato de o ambiente de trabalho não ter ventilação adequada e não possuir conforto térmico. A disciplina está preconizada na CLT, especificamente no Capítulo V, Título II, “Da Segurança e Medicina no Trabalho”. As disposições desse capítulo são de obrigatória observância, assim como as demais regulamentações, normas e diplomas negociais coletivos, com relação às condições de higiene, saúde e segurança, no ambiente laboral. Com efeito, deveres e direitos são impostos a todos àqueles relacionados com a atividade laborativa no Brasil, desde os órgãos da Administração Pública até o próprio empregado. A temática, ora comentada, circunscreve-se, primordialmente, a questões competenciais. Notadamente, em primeiro lugar, compete à Secretaria de Segurança e Saúde do Trabalho, órgão de âmbito nacional: 1) estabelecer normas sobre a aplicação dos preceitos do Capítulo V, da CLT, especialmente, os referidos no artigo 200; 2) coordenar, orientar, controlar e supervisionar a fiscalização e as demais atividades relacionadas com a segurança e a medicina do trabalho em todo o território nacional, inclusive a Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho e; 3) conhecer, em última instância, dos recursos, voluntários ou de ofício, das decisões proferidas pelas Superintendências Regionais do Trabalho, na matéria, presentemente objeto de comento. Às Superintendências Regionais do Trabalho compete: 1) a promoção e fiscalização do cumprimento da normatividade concernente à segurança e medicina do trabalho; 2) a adoção de medidas que se tornem exigíveis, em virtude das disposições celetistas, determinando as obras e reparos que, em qualquer local de trabalho, se façam necessários e; 3) a imposição das penalidades cabíveis frente ao descumprimento dessas normas protecionistas, nos termos do artigo 201, da CLT. Cabe ao empregador: 1) cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho; 2) informar aos empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a serem tomadas, no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais; 3) adotar as medidas que lhes sejam determinadas pelo órgão regional competente; 4) facilitar o 112 exercício da fiscalização pela autoridade competente. O empregado tem o dever, para sua própria segurança de: observar as normas de segurança e medicina do trabalho e obedecer às instruções emanadas e colaborar com seu empregador, na efetividade das normas celetistas. Existem trinta e quatro Normas Regulamentadoras vinculadas à CLT e previstas no Capítulo V da Portaria 3.214/78, consentâneo ao empregado urbano e à Portaria 3.067/88 que trata de cinco Normas Regulamentadoras Rurais, fundamentadas na Lei nº 5.889/73. Eis as Normas Regulamentadoras, no Brasil: Nº 1 (Disposições Gerais); Nº 02 (Inspeção Prévia); Nº 03 (Embargo ou Interdição); Nº 04 (Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho); Nº 05 (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes); Nº 06 (Equipamentos de Proteção Individual – EPI); Nº 07 (Programas de Controle Médico de Saúde Ocupacional); Nº 07 (Despacho SSST - Nota Técnica); Nº 08 (Edificações); Nº 09 (Programas de Prevenção de Riscos Ambientais); Nº 10 (Segurança em Instalações e Serviços em Eletricidade); Nº 11(Transporte, Movimentação, Armazenagem e Manuseio de Materiais); Nº 11 Anexo I (Regulamento Técnico de Procedimentos para Movimentação, Armazenagem e Manuseio de Chapas de Mármore, Granito e outras Rochas); Nº 12 (Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos); Nº 13 (Caldeiras e Vasos de Pressão); Nº 14 (Fornos); Nº 15 (Atividades e Operações Insalubres); Nº 16 (Atividades e Operações Perigosas); Nº 17 (Ergonomia); Nº 17 Anexo I (Trabalho dos Operadores de Checkouts); Nº 17 Anexo II - Trabalho em Teleatendimento / Telemarketing; Nº 18 (Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção); Nº 19 (Explosivos); Nº 19 Anexo I - Segurança e Saúde na Indústria de Fogos de Artifício e outros Artefatos Pirotécnicos; Nº 20 (Líquidos Combustíveis e Inflamáveis); Nº 21 (Trabalho a Céu Aberto); Nº 22 (Segurança e Saúde Ocupacional na Mineração); Nº 23 (Proteção Contra Incêndios); Nº 24 (Condições Sanitárias e de Conforto nos Locais de Trabalho); Nº 25 (Resíduos Industriais); Nº 26 (Sinalização de Segurança); Nº 27 (Registro Profissional do Técnico de Segurança do Trabalho no MTB); Nº 28 (Fiscalização e Penalidades); Nº 29 (Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho Portuário); Nº 30 (Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho Aquaviário); Nº 30 - Anexo I – (Pesca Comercial e Industrial); Nº 30 - Anexo II - Plataformas e Instalações de Apio) Nº 31 (Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária Silvicultura, Exploração Florestal e Agricultura); Nº 32 (Segurança e Saúde no Trabalho em Estabelecimentos de Saúde); Nº 33 (Segurança e Saúde no Trabalho em Espaços Confinados); Nº 34 (Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção e Reparação Naval). 113 Existem determinadas normas basilares celetistas de saúde e segurança, no meio ambiente de labor. É vedado aos estabelecimentos comerciais iniciar suas atividades sem a prévia inspeção e aprovação das instalações, pela autoridade competente; o superintendente regional poderá interditar estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, ou embargar obra, caso exista grave e iminente risco para o trabalhador, sob pena de medidas penais cabíveis, em caso de desobediência. As empresas, conforme as determinações do Ministério do Trabalho, estão obrigadas a manter serviço especializado, em segurança e medicina do trabalho. Será obrigatória a formação de Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), conforme as instruções emitidas pelo Ministério do Trabalho, nos estabelecimentos ou locais de obra nelas especificadas. Segundo a Norma Regulamentadora de número cinco: devem constituir a CIPA, com representantes dos empregados e do empregador, as empresas privadas, públicas, sociedades de economia mista, órgãos da administração direta e indireta, instituições beneficentes, associações recreativas, cooperativas, bem como outras instituições que admitam trabalhadores como empregados. Os membros da CIPA são eleitos para um mandato de um ano, havendo a possibilidade de apenas uma reeleição, possuindo garantia provisória no emprego, desde o registro de sua candidatura, até um ano após o final de seu mandato (artigo 165, da CLT e artigo 10, II, a, ADCT). Em todos os casos em que as medidas gerais de proteção não eliminem, por completo, os riscos de acidentes e/ou danos à saúde dos empregados, o empregador é obrigado a fornecer adequados equipamentos de proteção individuais, em perfeito estado de conservação e funcionamento. Quando da demissão, admissão e periodicamente é obrigatório que a empresa realize exames médicos, para atestar a saúde do trabalhador. O Ministério do Trabalho é competente para expedir instruções relativas aos casos em que serão exigíveis exames médicos e a periodicidade dos mesmos 132 . Exames complementares podem ser realizados para que a aptidão física e mental seja detectada, conforme a função exercida. Não raro, no Brasil, esses exames são utilizados como subterfúgios para o cometimento de atos ilícitos discriminatórios. 132 Atualmente, existe a NR7, em que está preconizada a obrigatoriedade de elaboração e implementação, por parte de todos os empregadores e instituições que admitam trabalhadores como empregados, do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – PCMSO – cujo objetivo é a promoção e preservação da saúde do conjunto dos trabalhadores desse empregador. No item 7.4.3.5, está estabelecido que o "exame médico demissional, será obrigatoriamente realizado até a data da homologação, desde que o último exame médico ocupacional tenha sido realizado há mais de: 135 (centro e trinta e cinco) dias para as empresas de grau de risco 1 e 2, segundo o Quadro I da NR-4; 90 (noventa) dias para as empresas de grau de risco 3 e 4, segundo o Quadro I da NR-4. (Alteração dada pela Portaria no 8, de 05-05-96 / DOU de 09-05-96, republicada em 13-05-96)" (BRASIL,1996). 114 Ao empregador é vedado dispensar o trabalhador, quando verificada a existência de alguma doença, seja de ordem ocupacional ou não, já que o estado de saúde do empregado, quando inapto para o trabalho, impede a rescisão do contrato de trabalho, devendo esse receber o benefício previdenciário correspondente, da Previdência Social. O artigo 168, da CLT tem por escopo a proteção do trabalhador e não abarcar dispensas, motivadas na incapacidade do empregado. As edificações ou construções correspondem aos locais de trabalho com a maior incidência em acidentes, batendo recordes diários. Essas edificações devem obedecer aos requisitos técnicos que nelas garantam perfeita segurança aos que trabalham, por exemplos: os locais de trabalho devem ter, pelo menos, três metros de pé-direito, assim considerada a altura livre entre o piso e o teto do empreendimento e; os pisos, dos locais de labor, não podem apresentar saliências, o que dificulta, sobremaneira, a circulação de pessoas e materiais. O local de labor, assim considerando piso, corredores, passagens, dentre outros, deverá obedecer às condições de segurança e higiene no trabalho, concernentes às normas estabelecidas pelo Ministério do Trabalho. Em todos os locais de trabalho, deverá haver iluminação natural ou artificial, adequada e apropriada, conforme a atividade realizada. A ventilação do local de labor pode ser artificial ou natural, desde que mantenha um clima que proporcione ao trabalhador conforto térmico. Acerca do árduo trabalho com instalações elétricas, somente profissionais qualificados podem operar, inspecionar ou reparar tais instalações, devendo, os mesmos, estarem, no mínimo, familiarizados com os métodos de primeiro socorros, em caso de acidentes com choque. A segurança acerca da movimentação, o armazenamento e o manuseio de materiais, por exemplo, tóxicos, depende de normas do Ministério do Trabalho. Nesses casos, é obrigatório que haja: indicação de carga máxima permitida nos equipamentos de transporte; avisos de proibição de fumar; advertência quanto à natureza perigosa ou nociva à saúde relativa às substâncias em movimentação ou em depósito; recomendações de primeiros socorros e de atendimento médico e; símbolos de perigo, nos rótulos dos materiais ou substâncias armazenadas ou transportadas, segundo padronização internacional. As máquinas e os equipamentos, utilizados pelos empregados, deverão possuir dispositivos de partida e parada, dentre outros, que se fizerem necessários para que se evite acidente de trabalho. Nesses instrumentos de trabalho são imprescindíveis dispositivos que possam evitar o acionamento acidental. Sobre esse tema, de tamanha complexidade, existe a 115 Convenção da OIT, 119, promulgada no Brasil através do Decreto 1.255/94, em que está previsto que: O empregador deverá tomar as medidas para por os trabalhadores ao corrente da legislação nacional relativa à proteção das máquinas e deverá informá-los, de maneira apropriada, dos perigos provenientes da utilização das máquinas, assim como das precauções a serem tomadas (BRASIL, 1994). Na hipótese de labor em caldeiras, equipamentos e recipientes em geral, operacionalizados sob pressão, carecerão de válvulas e outros dispositivos de segurança, que evitem que seja ultrapassada a pressão interna de trabalho, compatível com a sua resistência. Toda caldeira deve ser acompanhada de “prontuário”, com a documentação original do fabricante, contendo todas as informações necessárias para a segura utilização do equipamento, inclusive a pressão máxima de trabalho permitida (PMTP), bem como seu Registro de Segurança. Consentânea à prevenção de fadigas no ambiente laboral, o peso máximo que pode ser removido por um empregado, individualmente, salvo mulher e menor de idade, é de sessenta quilogramas. Essa medida não se enquadra aos casos em que haja utilização de equipamentos que exerçam a força, como supedâneo à humana, na tração (força que desloca algo - puxar ou empurrar – por exemplo: por meio de uma pá e empilhadeira s) e impulso (ação de impelir) mecânicos, quando da remoção do material (por exemplo, carrinho de mão, vagonetes sobre trilhos e dentre outros). Nesses casos, é obrigatório que o empregador atentese para a correta postura do trabalhador nos assentos, evitando-se posições incômodas ou forçadas, sempre que a execução da tarefa exija que o trabalhador labore sentado. Quando os serviços são executados em pé, o empregador deverá fornecer assentos, para serem usufruídos nos intervalos. Cabe, ainda, ao Ministério do Trabalho estabelecer normas complementares, a evitar danos à integridade física do trabalhador, sob diversos aspectos, por exemplo: proteção contra incêndio, profilaxia de endemias, fornecimento de água potável, tratamento de resíduos industriais, emprego de cores nos locais de trabalho, inclusive na sinalização de perigo, dentre outras medidas preventivas. Notadamente, a relação entre empregado e empregador desdobra-se em inúmeras atividades, que circunscrevem o delicado liame entre o comando (a ordem do empregador) e a obediência (o dever de cumprir do empregado). Não raro, essa estressante relação gera transtornos psicossociais ao empregado, por detrás das naturais divergências profissionais, 116 acaba por sobrevir desrespeito, a violência e, o mais comum, a perseguição. Para que o ambiente de trabalho seja saudável deve haver, de todos os lados da relação laboral, respeito. O abuso do poder, por parte do empregador, pode até não caracterizar um assédio moral, mas, notoriamente, o empregado fará jus a uma indenização respectiva, aos moldes da responsabilização civilista. 133 2.2.23 Adicional de Remuneração para as Atividades Penosas, Insalubres ou Perigosas, na Forma da Lei As atividades insalubres concernem àquelas que expõem os trabalhadores a agentes nocivos à saúde, extrapolantes dos limites legalmente permitidos. Juridicamente considerando, a insalubridade apenas é reconhecida quando a atividade ou operação for assim considerada pelo Ministério do Trabalho, sendo levados em consideração a natureza, as condições ou métodos de labor. Pela prática de um serviço considerado insalubre, conforme a intensidade do agente nocivo, bem como o tempo de exposição e efeitos, o obreiro (ou seu sindicato - OJ 121 da SDI-1) poderá requerer o direito social a um adicional em sua remuneração: cuja percepção circunscreve-se em 40 % (quarenta por cento), em grau máximo, 20 % (vinte por cento), grau médio e 10% (dez por cento), grau mínimo. O parâmetro para o cálculo do respectivo adicional é o salário básico, salvo critério mais benéfico, fixado em instrumento coletivo (Súmula 228 do TST, com nova redação 134). O adicional, ora em comento, integra a remuneração para todos os efeitos, no período em que for percebido pelo empregador 135 . O TST e a doutrina pacificaram esse entendimento, pois, tanto o adicional de insalubridade quanto o de periculosidade, constituem salário-condição, sendo devidos quando do efetivo labor, nas condições consideradas como insalubres ou perigosas. Quando executada a atividade, em uma dessas circunstâncias, em certo período, o adicional não integra o contrato de trabalho ad eternum. 136 Atualmente, não é pacífico na jurisprudência que a base de cálculo seja concernente ao salário básico do obreiro. O que melhor atenderia os anseios protetivos da norma constitucional seria a consideração da remuneração como base de cálculo do adicional de 133 Nesse sentido, já decidiu Luiz Otávio Linhares Renault, TRT, no Processo: RO: 0142200-75.2007.5.03.0131, 2009). (MINAS GERAIS, 2009). 134 Essa questão já foi objeto de em amplo debate, eis que de acordo com a Súmula Vinculante de número 04 (quatro), a Suprema Corte Federal, uniformizou o entendimento de que o salário mínimo não poderia mais ser utilizado como base de cálculo do adicional de insalubridade. Assim, o TST acabou por suprir a lacuna legislativa, aplicando, analogicamente, a própria norma constitucional que preconiza o direito em voga. 135 A Corte Maior trabalhista brasiLeira uniformizou esse entendimento na Súmula 139 (BRASIL, 2005). 136 A reforçar esse entendimento tem-se a Súmula 248 do TST (BRASIL, 2003). 117 insalubridade. Mesmo porque “remuneração” foi a sinonímia utilizada pelo próprio constituinte originário, não sendo recepcionado, dessa forma, o final do artigo 192 da CLT. Entendimento em contrário pode, inclusive, ser objeto de questionamento sobre a constitucionalidade, também por meio dos dissídios individuais. A classificar serviços que compõem essa categorização de insalubres, o Ministério do Trabalho editou um quadro de atividades e operações 137 : a Norma Regulamentadora 15, com seus anexos, (“Atividades e Operações Insalubre”), originada pela Portaria n.º 3.214, de 08 de junho de 1978. Para exemplificar: o limite de tolerância do ruído contínuo ou intermitente (o que não for considerado ruído de impacto), quando de 85 (oitenta e cinco) decibéis é de 8 (oito) horas diárias. Os agentes insalutíferos podem ser neutralizados ou eliminados através da adoção de medidas que conservem o ambiente de labor, dentro dos limites de tolerância estabelecidos na Norma Regulamentadora supracitada ou ainda; com a utilização de equipamentos de proteção individual que eliminem a agressividade física, a ponto de torná-la, também, dentro da tolerância (Súmula 80 do TST). O mero fornecimento do equipamento de proteção não tem o condão de eliminar a insalubridade, sendo, efetivamente necessária a diminuição ou a eliminação da nocividade (conforme a Súmula 289 do TST). O trabalho exercido em condições insalubres, em caráter intermitente, não afasta, por si só, o direito à percepção do adicional correspondente 138. O exercício do trabalho em condições perigosas é o que implica em contato permanente do obreiro com inflamáveis ou explosivos 139 , em condições de acentuado risco. O adicional respectivo corresponde a um aumento de 30% (trinta por cento) sobre o salário, sendo-lhe ressalvado o direito de opção por adicional de insalubridade eventualmente devido. Ou seja, quando a atividade expõe o trabalhador a uma atividade de duplo risco (insalubre e periculoso), esse poderá optar pelo recebimento de apenas um dos dois, não havendo a possibilidade de cumulação. Essa regra encontra-se no parágrafo 2º do artigo 193 da CLT. Conforme a norma celetista, o adicional de periculosidade não gera reflexos sobre as gratificações, prêmios ou participação nos lucros ou resultados da empresa. A vedação da acumulação de adicionais não possui argumento jurídico plausível que o justifique. No caso de atividade que componha um duplo risco (insalubre e perigoso), os 137 Somente as atividades relacionadas pelo Ministério do Trabalho são consideradas insalubres. A exemplificar esse entendimento tem-se a OJ 04 da SDI-1 (BRASIL, 2005). 138 Esse é o entendimento pacificado na Súmula 47 do TST (BRASIL, 2003). 139 Como exemplo de atividades perigosas, tem-se a exposição do empregado a radiação ionizante ou radioativa. Nesse sentido, consusbstanciou-se o seguinte entendimento na OJ 345 da SDI-1 (BRASIL, 2005). 118 agentes são diversos, as hipóteses de incidência, a gerar o direito ao adicional são diferentes, não havendo, portanto, o que se falar em bis in idem. As atividades periculosas, bem como as recomendações, prevencionistas correspondentes, classificadas pelo Ministério do Trabalho estão elencadas na Norma Regulamentadora de número 16 (dezesseis). É competente o médico ou o engenheiro do trabalho (registrados no Ministério do Trabalho) para realizar perícia técnica à classificar e caracterizar a atividade perigosa ou insalubre. O pedido de perícia pode ser feito pelas empresas interessadas, junto ao Ministério do Trabalho. Quando do requerimento, via judicial, do adicional consentâneo à atividade perigosa ou insalubre, aplica-se o princípio da fungibilidade. Caso o reclamante faça o pedido, na exordial, de insalubridade, e, sendo verificada a periculosidade, o adicional por essa atividade poderá ser decretado pelo magistrado. A verificação, mediante perícia, da existência de serviços em condições nocivas, estimando a ocorrência de agente insalubre, diverso do apontado na inicial, não prejudica o pedido de adicional de insalubridade (Súmula 293, do TST). Na folha de pagamento do empregado, deverá constar o valor correspondente ao adicional de periculosidade ou insalubridade (OJ 172 da SDI-1). Sendo arguida, em ação, qualquer das atividades, presentemente comentadas, o juiz é obrigado a requisitar perícia oficial. A perícia, para detectar agentes insalubres ou atividade perigosa, também pode ser determinada ex officio pelo Ministério do Trabalho. Para a terceira atividade correlacionada no comando constitucional: a penosidade, não há regulamentação infraconstitucional que lhe arbitre adicional. Não existe nem mesmo legislação que defina o que seria penosidade no ambiente laboral. No entanto, diante da expressa previsão de proteção contra os riscos inerentes ao trabalho, objeto do subitem anterior, contida no art. 7º, da Constituição da República, bem como a garantia à saúde e à vida como direitos fundamentais, não há impedimento à responsabilização civil do empregador, civilmente, por eventuais danos decorrentes do trabalho penoso. Atualmente, o que se verifica na prática, é a edição de normas e “entendimentos” (Súmulas e Orientações Jurisprudenciais) que acabam por estimular o fenômeno da monetarização da saúde, já que incita o empregador a não tomar medidas para eliminar os riscos no ambiente de trabalho, em muitos casos. Exemplo dessa assertiva é o item 3 (três) da NR-15 - Portaria 3.214/78. Nesse caso, quem emprega apenas desembolsará a quantia relativa a um único adicional, ainda que existam vários agentes insalubres cumulados. A norma veda 119 da cumulação de adicionais de insalubridade, quando o empregado for exposto a mais de um agente insalutífero. 2.2.24 Aposentadoria Na Constituição da República brasileira, no inciso XXIV, do artigo 7º, estabeleceuse, de forma objetiva e suscita, como direito social do trabalhador urbano e rural a aposentadoria 140. Esse benefício securitário é o supedâneo remuneratório, sem a prestação de serviço, custeado basicamente pela Previdência Social, quando do preenchimento de requisitos especificados em lei. Segundo a normatividade previdenciária, existem os seguintes tipos de aposentadoria: por idade, por invalidez, por tempo de contribuição e, a especial. O custeio da Previdência Social dos trabalhadores do setor privado é tripartite. O trabalhador contribui, proporcionalmente, ao salário; o empregador recolhe segundo a folha de pagamento e; cabe ao governo federal o dever de cobrir eventuais casos de insuficiência financeira no sistema (é o que se infere do artigo 195, da Constituição da República). Na Lei nº 8.213/91, existe a normatividade pertinente aos tipos de aposentadoria. A aposentadoria por idade é concedida aos trabalhadores urbanos do sexo masculino aos sessenta e cinco anos e do sexo feminino, aos sessenta anos de idade. Os trabalhadores rurais podem pedir aposentadoria por idade, com diminuição etária, precisamente, cinco anos a menor: aos sessenta anos, homens, e aos cinquenta e cinco anos, no caso das mulheres. Concernente à Instrução Normativa, do INSS, DC nº 96 de 23/10/2003, o trabalhador rural (empregado, contribuinte individual ou segurado especial), enquadrado como segurado obrigatório do RGPS, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário-mínimo, até 25 de julho de 2006, desde que comprove o efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses igual à carência exigida. A aposentadoria por invalidez é um benefício concedido aos trabalhadores que, por doença ou acidente, forem considerados pela perícia médica da Previdência Social, incapazes e insusceptíveis de reabilitação, para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nessa condição. Ressalte-se que a percepção, pelo 140 Presentemente, nesse respectivo tópico será considerada apenas a aposentadoria estatal, dos trabalhadores celetistas, laboristas da iniciativa privada e não servidores públicos. Ressalta-se, apenas, que existe a possibilidade de aposentadoria sob o regime privado. Funcionam no Brasil dois sistemas de previdência, o estatal e o privado. É obrigatória, para todos os trabalhadores, a previdência estatal. Nesse caso, existem dois regimes: o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), operacionalizado pelo INSS, para os trabalhadores da iniciativa privada e os funcionários públicos não concursados, e; os regimes especiais, para os servidores públicos concursados, militares e membros dos poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, dentre outros. 120 trabalhador, de proventos de aposentadoria por invalidez gera a suspensão do contrato de trabalho (artigo 475, da CLT). Frente a não extinção do contrato de trabalho, não há de se falar em fluência da contagem da prescrição bienal. Essa é a inteligência da Orientação Jurisprudencial do Regional mineiro 141. A doutrina e a jurisprudência não são pacíficas acerca da fruição do prazo prescricional quinquenal. A jurisprudência vem entendendo que esse prazo corre normalmente, quando o empregado estiver aposentado por invalidez, perdendo, portanto, seus direitos. Para quem defende essa corrente, a aposentadoria por invalidez alude suspensão contratual e não suspensão ou interrupção do prazo prescricional. Lembrando apenas, que contra o incapaz não corre prescrição (artigo 198, do Código Civil pátrio), se a aposentadoria por invalidez, concernir à incapacidade mental 142 , não correrá prescrição alguma contra o obreiro. Retornando a contagem do prazo prescricional apenas quando da cessação da incapacidade. A aposentadoria por tempo de contribuição (antiga: “por tempo de serviço”) é concedida ao trabalhador conforme o período em que se contribuiu para a previdência. Essa aposentadoria pode ser deferida de forma integral ou proporcional. Para que o trabalhador faça jus ao direito à aposentadoria integral, o homem deve comprovar pelo menos trinta e cinco anos de contribuição e a trabalhadora mulher, trinta anos. Por outro lado, para que o trabalhador possa requerer a aposentadoria proporcional, o obreiro terá que combinar dois requisitos: tempo de contribuição e a idade mínima. Os homens trabalhadores podem requerer aposentadoria proporcional com a idade de cinquenta e três anos, somando-se trinta anos de contribuição. As mulheres têm direito à proporcional aos quarenta e oito anos de idade e vinte e cinco de contribuição. No pertinente ao benefício de aposentadoria especial, será deferido ao segurado que tenha laborado em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física. Para tanto, o trabalhador deverá provar: o tempo de trabalho e a efetiva exposição aos agentes físicos, biológicos ou cumulação de agentes maléficos, nos períodos exigidos para a concessão do benefício: quinze, vinte ou vinte e cinco anos. 141 142 Está preconizado que: "APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO BIENAL E QUINQUENAL. A aposentadoria por invalidez, causa de suspensão do contrato de trabalho, impede a aplicação da prescrição bienal, não obstando, entretanto, o curso da prescrição quinquenal." (DIVULGAÇÃO: DEJT/TRT3 07/10/2009, 08/10/2009 e 09/10/2009). Conforme o artigo 3º do CC são absolutamente incapazes: “II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.” (BRASIL, 2002). 121 2.2.25 Assistência Gratuita aos Filhos e Dependentes Desde o Nascimento até 5 (cinco) Anos de Idade em Creches e Pré-escolas O constituinte originário estabeleceu no incido XXV o direito social, aos trabalhadores urbanos e rurais, a assistência gratuita, desde o nascimento até seis anos de idade, a seus filhos em creches e pré-escola. Com a emenda constitucional de número 53, de 2006, reduziu-se a faixa etária para cinco anos. Essa emenda não se limitou a modificar apenas o artigo sétimo. Consentâneo, especificamente, à presente matéria, houve, ainda, alteração do artigo 208, inciso IV, da Lei Maior, sendo feita a mesma redução. Na condição de cláusula pétrea, é princípio constitucional que normas, desse porte, não sejam alteradas, pelo poder constituinte derivado. À primeira vista, a redução aparenta ser insignificante, no entanto, é de extrema magnitude. A mãe trabalhadora que contava antes com assistência integral e gratuita à criança, até o menor completar seis anos de idade, passou a ter que matriculá-lo em escola, normalmente, de meio período. O texto constitucional é ambíguo! Não houve definição acerca da própria dinâmica operacional do direito, exemplificadamente. Quem responde pelo custeio, se é do empregador esse ônus. Mas, a jurisprudência, ao longo dos últimos anos, vem dando os contornos pertinentes à matéria. Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei (Lei nº 574/07 – cuja origem é a PLS 298/2003) que regulamentaria a matéria. Atualmente, aguarda parecer na Comissão de Finanças e Tributação (CFT). Diante da obrigatoriedade estabelecida pelo inciso em comento, o empregador poderá: destinar uma creche própria, no local de trabalho, onde seja permitido às empregadas guardar, sob vigilância e assistência, seus filhos durante o período da amamentação (conforme os artigos 389, § 1º e 400 da CLT); a empresa poderá realizar convênio com creches distritais, manutenidas por prefeituras, estado, SESI, SESC ou LBA ou de entidades sindicais (artigo 397 da CLT) ou: pagar o “reembolso-creche”. A Portaria 3.296 de 03 de setembro de 1986, do Ministério do Trabalho, permite substitutivo pecuniário, ou seja, da concessão de creches pelo pagamento em dinheiro, sob a forma do chamado "reembolso-creche". O valor do reembolso será aquele gasto pela mãe, com a creche de escolha. 122 2.2.26 Reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é o mais relevante marco normativo de mudança no modelo sindical advindo de 1930 a 1945. Como inovação, a nova constituição fixou reconhecimentos e incentivos jurídicos ao processo de negociação coletiva. Exemplo dessa assertiva é o inciso XXVI do artigo 7º. Esse aspecto foi de extrema relevância para afirmar o poder dos sindicatos em buscar, cada vez mais, melhores condições de labor para os trabalhadores. A Negociação Coletiva é um instrumento de autocomposição (em que as próprias partes, sem a intervenção de terceiros, no processo de pacificação da controvérsia) consentânea à resolução de conflitos de natureza coletiva, prevista no ordenamento jurídico pátrio. Essa autocomposição tem um caráter peculiar: o de ser, eminentemente, democrática na gerência de interesses profissionais e econômicos, possuindo alta relevância social, não havendo, portanto, as figuras da submissão e da renúncia, mas sim apenas a da transação, que será coletiva e negociada. Doutrinariamente, argumenta-se que o caráter democrático da negociação coletiva vem perdendo espaço para o capitalismo contemporâneo, mais especificamente dentro das políticas neoliberais, como pondera José Carlos Arouca (2007, p. 654): “O Direito Sindical aponta para a atuação limitada dos sindicatos, imposta pelo agravamento do capitalismo selvagem, apoiado pelo Estado”. A negociação possui dois meios tipificados, no direito laboral constitucional: o acordo coletivo de trabalho e a convenção coletiva de trabalho. O sindicato, atualmente, tem como prerrogativa fundamental a defesa dos interesses e direitos, individuais e coletivos do grupo considerado como um todo, independentemente de filiação, a teor do que dispõe o inciso III do artigo 8º da Constituição da República. Pondera José Carlos Arouca (2007, p. 658): “A defesa de interesses coletivos supõe necessariamente a livre negociação, como regra obstaculada pelo dissídio coletivo, especialmente quando aparelhada pela greve”. A Negociação Coletiva Trabalhista fundamenta-se na autonomia coletiva privada, que explicita uma correspondência dos contratantes coletivos, ou seja, os entes coletivos (sindicatos patronais e sindicatos dos empregados). Os mesmos têm competência para criar normas que revelam o poder de auto-regulamentação, além de gerar regras que alcançarão suas bases. 123 Por meio de acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, os entes coletivos podem estabelecer normas que esgotem condições benévolas de trabalho, alterando o contrato de trabalho. Ao sindicato, independente e livre, reivindicador e defensor dos interesses da categoria, é assegurada a legitimidade para negociar e firmar regras que alcancem todos os seus representados. A negociação coletiva é, eminentemente, um instrumento de solução de conflito que reúne funções de: poder - a função normativa, de criar normas; compositiva - de solucionar conflitos e política - de procedimento dialético. Mas, acima de tudo é um instrumento de paz social. 143 Ressalta-se que a OIT (Organização Internacional do Trabalho) incentiva as negociações coletivas do trabalho, como forma de autocomposição dos conflitos coletivos. As Convenções 98 e 154 têm por finalidade fomentar a utilização desses instrumentos. Os diplomas negociais coletivos, os acordos coletivos e as convenções coletivas de trabalho, são institutos ímpares no Direito do Trabalho, especificamente no Direito Coletivo (denominação de caráter objetivista, que explicita relações sócio-jurídicas coletivas). Maurício Godinho Delgado excele que: Os diplomas negociais coletivos qualificam-se como alguns dos mais específicos e notáveis destaques próprios do Direito do Trabalho, no universo jurídico dos dois últimos séculos. Na verdade, firmam o marco que esse ramo jurídico especializado estabeleceu com relação a conceitos e sistemáticas clássicas do Direito Comum: é que eles privilegiam e somente se compreendem em função da noção de ser coletivo (vejam-se, além desses institutos da negociação coletiva, também as figuras do sindicato e da greve, por exemplo). Com isso, fazem contraposição à hegemonia incontestável do ser individual no estatutário civilista preponderante no universo jurídico (DELGADO, p. 1.377, 2007). A Convenção Coletiva de Trabalho está definida na CLT, especificamente no artigo 611, caput: Convenções coletivas de trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais do trabalho (BRASIL, 2011). As convenções coletivas são negociações realizadas entre entidades sindicais, ou acordos de vontade entre sujeitos coletivos, quer a dos empregados, quer a dos empregadores, circunscrevendo-se no âmbito da categoria, possuindo caráter coletivo genérico. As 143 - Nesse sentido expôs Christianne Gurgel, no texto “A Negociação Coletiva e os Conflitos de Trabalho”. (GURGEL, 2011). 124 convenções criam normas jurídicas, autônomas (lei em sentido material), mesmo que em seu conteúdo tenham cláusulas contratuais. Poder-se-ia definir acordo coletivo como pacto de caráter normativo, em que um sindicato representativo de determinada categoria profissional negocia com uma ou mais empresas, em grupo, da respectiva categoria econômica, explicitando cláusulas de condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das empresas acordantes, às relações individuais de trabalho. Atualmente, o entendimento acerca do artigo 8º, inciso VI, da CRFB/88 está pacificado no sentido de se considerar obrigatória a participação dos sindicatos na negociação coletiva de trabalho. O legislador constituinte não referiu, nesse artigo, à sindicatos de empregadores, mas sim, apenas a entidade sindical obreira. Godinho explicita: que o empregador já é um ser coletivo por natureza, já os trabalhadores necessitam de uma atuação coletiva para assim serem considerados. Argumenta-se, erroneamente, que o acordo coletivo seria inábil a gerar normas jurídicas, dando origem à simples dispositivos contratuais, os preceitos negociados entrariam no contrato como se fossem cláusulas desse, aderindo a esse de forma permanente. Essa tese está, segundo a doutrina majoritária, equivocada, pois do ponto de vista objetivo, os preceitos do acordo coletivo têm estatuto óbvio de regras jurídicas (natureza geral, impessoal e abstrata). É oportuno fazer uma distinção abrangencial dos diplomas negociais aqui aludidos: a convenção coletiva incide em um universo mais amplo, caracterizado pela base profissional e econômica representada pelos respectivos sindicatos. Assim, respeitadas as fronteiras máximas da base territorial dessas representações, as convenções abrangem todas as empresas e respectivos empregados englobados nas respectivas categorias econômicas e profissionais e; os acordos coletivos têm uma abrangência muito mais restrita, pois atingem os empregados vinculados à empresa ou conjunto de empresas que tenham subscrito os referidos diplomas, ou seja, não obrigam empresas não negociantes, e não atingem os empregados dessas, mesmo que sejam da mesma categoria profissional e econômica. A pergunta que se faz é: existe hierarquia entre os diplomas negociais, aqui estudados? Na ordem justrabalhista, está explicitado que: as condições estabelecidas em Convenção, quando mais favoráveis, prevalecerão sobre as estipuladas em Acordo (artigo 620, in verbis). Dessa forma, cumpre-se o princípio da norma mais favorável. Podendo o contrário sobrelevar, ou seja, o ACT, se mais favorável prevalecer sobre a CCT, caso em que esse autorize a celebração em separado de acordo coletivo. 125 Relevante questão que aqui deve ser suscitada é consentânea à aderência das convenções ou dos acordos no contrato de trabalho. Correntes explicitam posições antagônicas: aderência irrestrita: sustenta que os dispositivos de tais diplomas ingressem para sempre no contrato de trabalho; aderência limitada pelo prazo: posição interpretativa que considera que os dispositivos dos diplomas negociados vigoram no prazo assinado a tais diplomas, não aderindo irrestritamente a eles. Essa corrente privilegia o caráter de norma jurídica atualmente inerente aos dispositivos convencionais e; aderência limitada por revogação (tácita ou expressa): os dispositivos dos diplomas negociados vigoram até que novo diploma negocial os revogue. Essa corrente foi adotada pelo legislador infraconstitucional na Lei nº 8.542/92, especificamente, no artigo 1º, parágrafo 1º (em que estava a norma: as disposições dos instrumentos negociais coletivos só poderiam ser reduzidos ou revogados dos contratos de trabalho, por posterior instrumento de igual forma), mas, posteriormente, revogado pela Lei de nº 10.192/2001, permanecendo em vigor apenas o caput deste artigo 144. Os Acordos Coletivos e as Convenções Coletivas são instrumentos formais, solenes, lançados por escrito, submetidos à divulgação pública razoável, têm os próprios procedimentos para a sua concepção, subordinados a ritos de extrema complexidade. Dessa forma, não se pode considerar válida negociação coletiva que não cumpra requisitos e formalidades consistentes fixadas no estatuto sindical (convocação ampla, pauta publicada, quorum razoável para instalação e deliberação assemblear, lançamento a termo escrito das regras e cláusulas estipuladas). Conforme a redação do artigo 614, parágrafo 1º da CLT: as convenções e os acordos entrarão em vigor três dias após a data da entrega dos mesmos no órgão referido nesse artigo. É ilegal a possibilidade da indeterminação do tempo de vigência do instrumento coletivo. Parte da doutrina entende que esse prazo não foi recepcionado pela Constituição. Porém, a jurisprudência caminhou para lado oposto, por exemplo, com a Súmula 34 do TST, SDC. Mister ressaltar que mesmo que seja considerado obrigatório o depósito administrativo do diploma autônomo, preserva o caráter de documento inter partes, e sua prova pode ser feita até com fotocópia simples. Nesse sentido, a OJ 36, SDI-1 do TST: “O 144 A respeito desse questionamento, Maurício Godinho Delgado (2007, p, 1.400) explicita que “[...] independentemente do debate acima, a jurisprudência tem considerado - com razão – que o patamar salarial resultante de instrumentos coletivos fixadores de reajustes salariais adere, sim, permanentemente, aos contratos de salário em vigor no período de vigência do respectivo diploma, mesmo após cessada tal vigência Isso ocorre por força do princípio especial da intangibilidade dos salários (ou sua irredutibilidade)”. 126 instrumento normativo em cópia não autenticada possui valor probante, desde que não haja impugnação ao seu conteúdo, eis que se trata de documento comum às partes”. O requisito primordial dos instrumentos normativos é de que sejam subscritos por entidades sindicais, com a devida existência legal, isto é, conforme a Portaria 186, do Ministério do Trabalho e Emprego, de 10 de abril de 2008. A negociação coletiva é monopólio sindical (artigo 8º, VI da CR/88). Para apor chancela no instrumento normativo, o sindicato tem de receber autorização da categoria, colhida pelo fórum de deliberação máxima da entidade, em assembleia, convocada para esse fim (artigo 612 da CLT). Segundo o artigo 617 § 2º, para o fim de deliberar sobre o acordo coletivo, a entidade sindical convocará Assembleia, dos diretamente interessados, sindicalizados ou não, nos termos do artigo 612 daquele mesmo diploma legal. Dessa forma, a interferência de estranhos no âmbito de eficácia da norma autônoma compromete sua validade. Concernente à convenção coletiva, todos os que integram têm direito de voto, não sendo restrita aos associados. Conforme o artigo 623, da norma celetista: será nula de pleno direito, disposição de Convenção ou Acordo que direta ou indiretamente, contrarie proibição ou norma disciplinadora da política econômico-financeira do Governo ou concernentes à política salarial vigente, não produzido quaisquer efeitos perante autoridades e repartições públicas, inclusive para fins de revisão de preços e tarifas de mercadorias e serviços. Esse artigo não foi recepcionado pela CR/88 (já que esse diploma normativo consagrou o princípio da valorização da negociação coletiva e proibiu a intervenção e a interferência do Poder Público no sindicato), e além do mais, perdeu sua finalidade, uma vez que seus objetivos estavam atinentes à época em que foi criado. O princípio da adequação setorial negociada (princípio do Direito Coletivo que mais influencia na dinâmica do Direito Individual), em suma, corresponde à harmonização entre as regras juslaborais heterônomas e as normas jurídicas oriundas da negociação coletiva (através da consumação do princípio da criatividade jurídica). Um dos pontos centrais da inter-relação entre o Direito Coletivo e o Direito Individual do Trabalho reside, exatamente, em encontrar essa harmonização, ou seja, em buscar e auferir critérios de validade jurídica e extensão da eficácia das normas, oriunda dos instrumentos normativos negociados, e a legislação estatal justrabalhista individual. Até que ponto as normas coletivas podem se opor às normas do Direito Individual? Primeiramente, as normas coletivas podem estar contrárias à legislação heterônoma estatal, do 127 Direito Individual, quando implementam um padrão de direitos superiores aos já previstos; e em segundo, quando as normas coletivas transacionam questões que fazem parte das normas justrabalhistas de indisponibilidade relativa. Nesse último caso, o princípio da indisponibilidade de direitos é afetado, mas só atinge parcelas justrabalhistas de caráter relativo. Há limites objetivos à aplicação do princípio da adequação setorial negociada, ou seja, limites jurídicos à criatividade na negociação coletiva trabalhista, tais como: a negociação não será válida, caso venha a ser concretizada mediante ato de renúncia e não de transação. Por óbvio, não prevalece a adequação setorial negociada, caso se esteja diante de direitos de indisponibilidade absoluta, que não podem ser objeto nem mesmo de negociação sindical coletiva. Essas parcelas constituem o que o ilustre professor Godinho denomina de patamar civilizatório mínimo, imantadas de caráter público, que não podem ser reduzidas, sob pena de afrontar o princípio da dignidade da pessoa humana, tais como o pagamento do salário mínimo e as regras de medicina e segurança no trabalho 145. 2.2.27 Proteção em face da automação, na forma da Lei A proteção em fase da automação é inovação importante no ordenamento constitucional social. A necessidade dessa tutela adveio da natural preocupação do ser humano com a subsunção da máquina pelo trabalho humano. Novas ciências vêm se desenvolvendo na sociedade moderna, a eletrônica, a microeletrônica, a cibernética, a robótica e a informática, são os grandes exemplos dessa evolução. Com as inovações tecnológicas sobreveio a automação que nada mais é do que: sistema quase independente, controlado por mecanismos autofuncionantes, necessitando de mínima interferência humana. No ambiente de labor, métodos passaram a ser utilizados para automatizar os processos comerciais e industriais. Nesses segmentos, o trabalho manual passou a ser mecânico e mais rápido. Diminuiu-se o tempo das tarefas, otimizaram-se as produções, aumentou-se a qualidade e os erros passaram a ser menos comuns. A indústria automobilística foi uma das primeiras, no Brasil, a utilizar a automação industrial. A automação comercial conta com meios, tais como a informática e a inteligência artificial, que possibilitaram a existência de redes de lojas, de proporções globais, tais como as de fast food e supermercados. 145 Nesse sentido, o seguinte julgado do Regional mineiro: RO 01504-2007-056-03-00-0 RO, Luiz Otávio Linhares Renault, 27/05/2008 (MINAS GERAIS, 2008). 128 A precupação quanto a essa temática reside no fato de, ainda, não existir uma norma específica a obedecer ao comando constitucional. Existem normas isoladas e outras tantas que podem ser aplicadas, no caso concreto, de forma analógica 146 . Nota-se que o ordenamento jurídico não consegue enfrentar os avanços tecnológicos. Um exemplo de lei que protege o trabalhador da automação, no caso dos frentistas, é a de número 9.956/2000, cujo artigo 1º prediz: “fica proibido o funcionamento de bombas de auto-serviço operadas pelo próprio consumidor nos postos de abastecimento de combustíveis, em todo o território nacional” (BRASIL, 2011). Na mesma lei, está previsto, ainda, multa, de alto valor, em caso de descumprimento e, havendo reincidência, até mesmo o fechamento do posto. Provavelmente, caso não existisse essa norma, os postos de gasolina, de todo o país, já teriam, nesses últimos onze anos, investido nesse setor, e, praticamente, ter-se-ia fulminada essa profissão, no Brasil. Ademais, a doutrina vem se questionando: estar-se-ia diante do início do fim do trabalho? Responde-se: em verdade, nunca se trabalhou tanto quanto na sociedade moderna! Postos de trabalho foram extintos, em virtude da automação, com efeito, diversos outros foram criados. Novas formas de organização de trabalho surgiram no presente século. No entanto, verdadeiros vácuos foram se formando no ordenamento jurídico. Criou-se o teletrabalho (os call centeres), o teletrabalho nômade 147, as novas formas de subordinação 148 (estrutural, conjuntural), o trabalho em domicílio, dentre outras figuras, ainda, pouco estudadas na atualidade. Notadamente, a tecnologia sofisticada foi, e continua sendo, incapaz de alijar o homem do mercado laboral. O capitalismo necessita do homem, para manter-se vivo. Precisa de trabalhadores para produzir e consumidores aptos a consumir. Novas regras de conduta vão sendo criadas na relação Capital-Trabalho, mas um não sobrevive sem o outro. 2.2.28 Seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa A norma constitucional do artigo 7º inciso XXIII consubstancia direito social de seguro contra acidente do trabalho (SAT), pago exclusivamente pelo empregador, sem prejuízo da responsabilidade cível, quando do cometimento de ato ilícito. Esse seguro tem 146 Nesse sentido, a aplicação do artigo 6º, da CLT, para os casos de trabalho em domicílio. Ocorre quando o trabalhador labora sem lugar determinado, muitas vezes, dentro de outras empresas. 148 Elemento fático-jurídico da estruturação da relação empregatícia. 147 129 natureza jurídica de "obrigação tributária", com vinculação específica, e exigível por um dos órgãos da Administração Pública direta, in casu, o Instituto Nacional do Seguro Social. Esse seguro é novamente reportado no artigo 201 da Constituição da República, em que o Estado avoca o "dever social" de atender e cobrir os acidentes de trabalho. A cobertura do acidente é atribuída à Previdência Social. O empregado tem, portanto, o direito social a um seguro, a cobrir os riscos acidentários de labor, que é pago pelo empregador (contribuição previdenciária parafiscal). Esse tributo é vinculado à atuação específica do Estado, relativamente à pessoa do contribuinte e, “para obter tal prestação do Estado, específicas e pessoais, os segurados obrigatórios pagam contribuição compulsória ao mesmo”, conforme os ensinamentos de Sacha Calmon Navarro Coêlho (2007, p. 450). A Lei n° 8.212/91 cuidou da base de cálculo da contribuição social do SAT. Mesmo diante da normatividade, afirmam os tributaristas, que essa contribuição não pode ser cobrada, pois carece de lei específica (e em sentido estrito) que a defina, limitando os contornos específicos da contribuição, não bastando o artigo 22 da norma previdenciária (Lei nº 8.212/91). A responsabilidade civil é um dos institutos mais comentados e debatidos na realidade jurídica atual. Maria Helena Diniz pondera que: a responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal (DINIZ, p. 35, 2007). Sebastião Geraldo de Oliveira, sabiamente, afirma: Onde houver dano ou prejuízo, a responsabilidade civil é invocada para fundamentar a pretensão de ressarcimento por parte daquele que sofreu as consequências do infortúnio. É, por isso, instrumento de manutenção de harmonia social, na medida em que socorre o que foi lesado, utilizando-se do patrimônio do causador do dano para restauração do equilíbrio rompido. Com isso, além de punir o desvio de conduta e amparar a vítima, serve para desestimular o violador potencial, o qual pode antever e até mensurar o peso da reposição que seu ato ou omissão poderá acarretar. (Grifou-se). (OLIVEIRA, p. 73, 2009). O direito à reparação nasce a partir do momento em que uma lesão foi causada a uma pessoa por alguém. Pondera, sabiamente, Pontes de Miranda: 130 [...] na linguagem do direito brasileiro, reparar e restituir compreende a recomposição natural e a recomposição pelo equivalente. [...] Sempre que há dano, isto é, desvantagem no corpo, na psique, na vida, na saúde, na honra, ao normal, no crédito, no bem estar, ou no patrimônio, nasce o direito à indenização (MIRANDA, 2002, p.77). Quando o fato gerador da reparação estiver calcado em uma obrigação contratual, a responsabilidade é contratual, porém, se o dever de indenizar advir de violação de qualquer dispositivo do ordenamento jurídico (ou do dever geral de cautela), a responsabilidade é extracontratual, também denominada de aquiliana. A indenização por acidente do trabalho ou por doença ocupacional insere-se na segunda hipótese, conforme a melhor doutrina. A responsabilidade civil tem por base normativa os artigos 186, 187 e 927, do CC/02, além dos comandos constitucionais. O Código Civil de 2003 tipificou a responsabilidade subjetiva, cuja base encontra-se no artigo 186 do CC/02 que deixa essa questão bem clara: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Nessa modalidade de responsabilidade, só será cabível a indenização se estiverem presentes o dano, o nexo de causalidade (entre o evento danoso e o trabalho) e a culpa do empregador. O dano, como pressuposto de indenização, ocorre quando há lesão a qualquer bem tutelado pelo Direito podendo ser moral, estético ou de ordem patrimonial (ou material). O dano material consiste na deterioração ou perda, total ou parcial, de bens materiais da vítima, que causa diminuição do patrimônio de forma imediata (dano emergente) ou, quando a pessoa é privada de seus ganhos futuros (lucros cessantes). O nexo causal indica quem foi o causador do dano, seria uma relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. O dano moral é o abalo moral, angústia ou sofrimento, causado pelo ato do empregador. Explicita, sabiamente, Sebastião Geraldo: O dano moral é muito acentuado quando decorre do infortúnio laboral, porquanto o trabalhador é atingido na sua integridade psicobiofísica, o que muitas vezes significa o desmonte traumático de um projeto de vida, o encarceramento compulsório numa cadeira de rodas e o sepultamento precoce dos sonhos acalentados quanto à possibilidade de um futuro melhor. (OLIVEIRA, 2009, p. 220). O grande problema na atualidade, que leva ao cerceamento de uma reparação, em virtude de um dano causado, além das decisões eminentemente políticas, é a restrição nas sentenças, frente à falta de prova do dano moral. Notadamente, diversas decisões judiciais acabam por optar pela não reparação, sem se preocupar com aquele ser humano que está nitidamente abatido, cansado, magoado, humilhado e angustiado, por não se ver mais diante 131 da possibilidade de um trabalho, em virtude da falta de instrumentalidade adequada a lhe garantir segurança de uma vida digna. O que se tem que entender é que o dano moral é ínsito à prova ofensa, decorrente da gravidade da lesão. Ou seja, o dano moral existe in re ipsa, derivando, de forma inexorável, do fato lesivo. A prova do dano moral deve ser parâmetro apenas frente à valoração, ou melhor, à extensão da lesão, para o arbitramento da indenização, mas nunca como pressuposto dessa reparação. O artigo 927 do Código Civil de 2002 prevê que “aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Os elementos indispensáveis à caracterização da responsabilidade, concernentes à teoria objetiva, são: 1) a existência de um dano efetivo e; 2) o nexo causal entre esse dano e a ação praticada pelo agente. Sendo assim, prescinde da comprovação da culpa do empregador. No parágrafo único do artigo 927, tem-se a previsão da responsabilidade objetiva, calcada na Teoria do Risco 149 , que prescinde do elemento culpa para sua caracterização. Por esse dispositivo, a responsabilidade objetiva aplica-se, além dos casos descritos em lei, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor implicar, pela sua natureza, risco para os direitos de outrem. Para a abrangência da responsabilidade objetiva, existem correntes que tentam delimitá-la: a) Teoria do Risco Proveito: baseada na noção de que aquele que se beneficia da atividade responde pelos danos causados. “Quem se aproveita do bônus, deve suportar todos os ônus”. Restringe-se a reparação apenas quando há proveito econômico. Essa teoria possui desconexões teóricas, que são altamente criticadas. b) Teoria do Risco Criado: a reparação do dano advém do simples fato de o empregador criar o risco. Essa teoria é considerada de maior amplitude do que o risco proveito, por decorrer da mera atividade que cria riscos. c) Teoria do Risco Profissional: voltada para atividade profissional da vítima. Caso o desenvolvimento dessa atividade cause danos ao trabalhador, deve o empregador arcar com a reparação desses. 149 A Teoria do Risco é constantemente objeto de análise na jurisprudência, o STJ já decidiu da seguinte forma: “Responsabilidade Civil. Teoria do Risco (presunção de culpa). Atividade perigosa (transporte de valores). 1. É responsável aquele que causar danos a terceiro no exercício da atividade perigosa, sem culpa da vítima. 2. Ultimamente vem conquistado espaço o princípio que se assenta na teoria do risco, ou do, exercício da atividade perigosa, daí há de entender que aquele que desenvolve tal atividade responderá pelo dano causado.” (BRASIL, 2000). (Grifou-se). 132 d) Teoria do Risco Excepcional: relacionado ao risco acentuado ou excepcional da atividade, ou seja, se a atividade possuir uma natureza perigosa, o empregador arcará com os danos, sem se indagar de sua culpa. A teoria do risco excepcional vem sendo adotada por muitos doutrinadores de renome, incluindo José Afonso Dallegrave Neto (2007, p. 94). e) Teoria do Risco Integral: nessa, só se exige o dano para que haja a reparação. Ignoram-se as excludentes da culpa (culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior). Essa é considerada a modalidade mais radical da responsabilidade, ora em epígrafe, é acolhida pelo ordenamento jurídico pátrio, em casos excepcionais, elencados em lei, por exemplo, frente às indenizações devidas pelo seguro obrigatório (o chamado Dpvat). 2.2.29 Ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho O instituto da prescrição é edificado, precisamente, na ideia de que o decurso do tempo exerce influência sobre os direitos. O tempo, juridicamente analisado, influencia diretamente nas relações, condicionando a validade do próprio direito, ao seu exercício, dentro de um determinado lapso temporal. Por isso que a prescrição é analisada sobre o enfoque do direito material (de ordem pública), pois o tempo inviabiliza a discussão desses direitos, materialmente assegurados. No Código Civil de 2002, existe a conceituação do que seria a prescrição: perda da pretensão, que é o poder de exigir, recorrendo ao judiciário, a prestação, obrigação, de um modo geral, descumprida pelo devedor. Essa nova redação evitou certos conflitos conceituais com o Direito Processual, pois, o texto antigo previa que a prescrição era a perda do direito de ação. A prescrição extintiva agride direitos assegurados pela ordem jurídica, pois é instituto que, em nome da segurança das relações sociais, tornam-se inexigíveis parcelas (salariais ou não-salariais) não reivindicadas ao longo do prazo estabelecido em lei. Não raro, a segurança se sobrepõe à justiça, e, é por esse resultado que o próprio ordenamento jurídico limita o instituto, ora em estudo (causas suspensivas / impeditivas e interruptivas da 133 prescrição 150 ). Lembrando apenas que a arguição de prescrição, para que tenha legitimidade, necessita de pronunciamento judicial. Mister ressaltar que dois elementos estão sempre presentes na análise do instituto da prescrição: o tempo e a inércia. Diversos são os fundamentos que explicam a existência do instituto da prescrição, o mais comumente utilizado é o do princípio do interesse social, pela estabilidade (no sentido de segurança) das relações jurídicas. As regras gerais civilistas, consentâneas ao instituto da prescrição, aplicam-se ao Direito do Trabalho, com as devidas adaptações. No Direito do Trabalho, o prazo básico está inserido sob o comando constitucional, no artigo 7º, inciso XXIX, da CR/887, sendo aplicável a todos os trabalhadores, rurais e urbanos, incluindo os domésticos. A prescrição é quinquenal, contado da data do protocolo da ação trabalhista (via judiciário), independente de extinção ou não do contrato laboral, no entanto, o prazo bienal depende desse fator, pois passa a correr exatamente quando o contrato de trabalho for extinto 151, fluindo concomitantemente com o prazo de cinco anos 152 . Ressalta-se que a prescrição quinquenal atinge os cinco anos anteriores ao ajuizamento da reclamação trabalhista e não da data da extinção contratual. Assim, por exemplo, caso o trabalhador espere um ano para ajuizar a ação, perderá um ano de direitos (objeto do litígio). A prescrição bienal só começa a fluir a partir do término do aviso prévio, mesmo que seja indenizado (sentido explicitado na OJ número 83, da SDI-1, do TST). O prazo prescricional para reivindicar diferenças de salário flui, a partir de cada quitação, da data em que deveria ter sido efetuada (artigo 119, da CLT), ou quando deveria ter sido efetuada (459, da CLT). Mister ressaltar que a prescrição não corre contra o incapaz 153. 150 Nesse sentido, tem-se a Súmula 268 do TST: “PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO. AÇÃO TRABALHISTA ARQUIVADA (nova redação) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 A ação trabalhista, ainda que arquivada, interrompe a prescrição somente em relação aos pedidos idênticos”. (BRASIL, 2003) 151 O prazo de dois anos para o empregado ajuizar ação trabalhista calcado no artigo 7º, inciso XXIX da CF/88, constitui regra geral sobre prescrição, aplicando-se a todo e qualquer trabalhador, seja urbano ou rural, inclusive para pLeitear o FGTS não depositado em sua conta vinculada. Essa matéria não está pacificada na doutrina e na jurisprudência. Inteligente foi o relato da desembargadora Maria Francisca dos Santos Lacerda, do Regional do Espírito Santo: “FGTS – PRESCRIÇÃO – O FGTS não está sujeito à regra para cômputo do prazo prescricional de que trata o artigo 7º, XXIX, da CLT, pois não tem o caráter de verba trabalhista, mas sim de contribuição estritamente social. A prescrição a ser observada, pois, é a trintenária, nos termos do disposto no artigo 23, § 5º, da Lei nº 8.036/90”. (ESPÍRITO SANTO, 2002). 152 Inteligência da Súmula 308 do TST (BRASIL, 2005). 153 Nesse sentido, o seguinte julgado: INCAPACIDADE ABSOLUTA DO EMPREGADO SUPERVENIENTE À EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO – EFEITOS EX TUNC DA SENTENÇA DE INTERDIÇÃO – PRESCRIÇÃO BIENAL – INOCORRÊNCIA – Sofrendo, o trabalhador, dentro de dois anos da extinção do contrato, agressão física que resulte na sua incapacidade absoluta para os atos da vida civil, circunstância reconhecida na sentença de interdição ulterior, perante o Juízo competente, ainda que a ação trabalhista seja ajuizada depois de dois anos de extinto o contrato, porém, antes de decorrido o biênio contado do ato interdicional, não se consumou a prescrição (Artigo 169, I CCB). Os efeitos da sentença declaratória da interdição podem retroagir, abrangendo os atos anteriores e praticados quando já existente a 134 No pertinente à contagem e consequência da prescrição, existe uma importante diferenciação: a prescrição total e a prescrição parcial. Essa ocorre, quando a lesão ao direito, atingir prestações de natureza sucessivas, calcadas em lei, que já se venceram, ou seja, a infração não compromete o direito em si e nem sua causa jurídica. Assim, em se tratando de prestação contínua, calcada em lei e não em ato negocial (de livre contratação entre as partes) a prescrição será parcial. A prescrição total, que é nitidamente mais desfavorável ao trabalhador, incide apenas naquelas obrigações, que correspondem a um ato, que não se desdobram no tempo (ex. o dano moral frente a um ato específico, diferentemente do assédio moral, que se constitui através de diversos atos, ao longo de certo lapso temporal). A lesão, nesse caso, compromete a causa ensejadora do direito, sobre o qual se originou a prestação. São exemplos de parcelas que estão sujeitas a prescrição total: as gratificações que são ajustadas e o salário-prêmio (são criadas por dispositivos regulamentares ou através de contrato, e não estão estabelecidas em lei). Entende, a melhor doutrina, que a sinonímia “preceito de lei”, da Súmula 294, do TST, deve ser entendida de forma ampla, assim sendo, só haverá prescrição total frente a parcelas do contrato ou de ato unilateral do empregador, em que os dispositivos têm natureza de cláusula e não de norma – lembrando que o ACT e a CCT são normas. A prescrição parcial pode ocorrer em: diferenças por equiparação salarial (Súmula 6, IX do TST), diferenças frente ao desvio funcional (Súmula 275, I do TST). 154 O questionamento que se faz acerca do polêmico tema “prescrição” paira em critérios de justiça: é justo que o empregado que trabalhou em uma empresa por dez anos, quando da cessação da relação laboral, tenha dois anos para pleitear os últimos cinco de direitos consentâneos àquela relação? Fatidicamente, se o empregado depara-se com burlas contratuais, durante o pacto de trabalho, e entrar com uma reclamatória trabalhista, para reivindicar, perante a justiça, provavelmente, será dispensado pelo empregador, uma vez que, atualmente o empregado quase não possui segurança nessa relação (em virtude da rotatividade no mercado). O trabalhador, atualmente, tem que se conformar com o fato de o empregador deixar de pagar verbas (adicionais, exemplificadamente), e caso queira exigi-las, irá perder seu meio de subsistência. incapacidade civil. (Doutrina: Von Thur, Aubry e Rau, Josserand, Colin e Capitant e Pontes de Miranda; jurisprudência: in Rev. dos Tribs., 149/802, 153/560 e 193/799, Arq. Jud., 89/226) Recurso ordinário a que se dá provimento, para afastar a prescrição. (CAMPINAS/SP, 2002). 154 Sobre a matéria tem-se: Súmulas 274 (BRASIL, 2005), 275 (BRASIL, 2005) (reenquadramento em planos de cargos e desvio de função) 291 (BRASIL, 2011), 294 (BRASIL, 2003) e 372 (BRASIL, 2005) do TST, bem como a OJ da SDI-1 do TST de número 243 (BRASIL, 2003). 135 2.2.30 Proibição de diferenças de salário, de exercícios de função e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos e; igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso Consagra a Constituição da República do Brasil 1988 um rol de normas antidiscriminatórias, diretamente relacionadas, concernentes aos incisos XXX, XXXI, XXXII e XXXIV, do artigo 7º. A norma, enquanto reguladora da conduta humana, pode ser discriminatória, privilegiando um, em detrimento do outro, de forma justificada, a igualar os desiguais (é a chamada discriminação positiva 155 ). É a pura aplicação do princípio da igualdade: tratar igualmente os iguais, e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades. Segundo Márcio Túlio Viana (2000) existem pelo menos dois modos de discriminar: a forma que vai contra a normatividade vigente (“ferindo as regras”156) e a forma que, fazendo valer das próprias regras, discrimina-se (“com a próprias regras”157). Nesse último caso, a norma é desigualitária, propositalmente. A discriminação, que vai contra a regra, por exemplo, pagar salários diferentes a dois empregados, um homem e uma mulher, que exercem funções iguais, com a mesma qualidade técnica é a chamada visível (direta), reprimida pela sociedade (ou pelo menos deveria ser reprimida). Ou ainda, quando uma empresa não contrata um empregado, em função da sua etnia (por ser negro, exemplificadamente). Portanto, a forma direta de discriminação está calcada em critérios proibidos pelo ordenamento jurídico. Ao lado dessa forma discriminatória, existe aquela em que se utiliza a própria regra, não sendo circunstancial, mas sim estrutural, faz parte de todo o sistema, muitas vezes é 155 A discriminação positiva consiste em um modo de compensar as diferenças, assegurando a igualdade de oportunidades, com políticas de proteção, a corrigir os desníveis sociais. Essa forma discriminatória também é denominada de ação afirmativa, a proporcionar um tratamento preferencial às minorias, que possuem desvantagens histórico-sociais, como critério de justiça social. A exemplificar a forma discriminatória positiva tem-se a reserva legal de empregos destinada aos portadores de necessidades especiais, no setor público: artigo 37, VIII da CR/88 e, no setor privado, o artigo 93 da Lei 8.213/91. Ou ainda, a reserva de vagas para o menor aprendiz, estabelecida no artigo 429 da CLT. As discriminações positivas, na terminologia do direito europeu, ou ações afirmativas, conforme o direito americano, consistem na implementação de política pública ou privada, de caráter temporário e especial, distributiva, cuja finalidade é promover a igualdade material de grupos historicamente discriminados, ou seja, a inclusão social. 156 VIANA, 2000.p. 321. 157 VIANA, 2000.p. 321. 136 velada (forma indireta de discriminação). A forma indireta de discriminação pauta-se na impressão de um tratamento formalmente igual, mas que produz um resultado diverso para certo indivíduo ou grupo. Nas palavras do ilustre professor Márcio Túlio Viana: A discriminação está presente na escola, no fórum, no cinema, no clube, nas ruas, no restaurante. Ela está em nosso lar, onde somos servidos à mesa por uma empregada doméstica. Está em nossos sonhos, quando imaginamos uma casa com jardins. Às vezes, ela está no coração dos próprios discriminados. (VIANA e RENAULT, 2000, p. 322). Tudo isso dito, para demonstrar que existe discriminação positiva na norma constitucional e infraconstitucional (em obediência ao comando da Lei Maior), todavia, muitas vezes, ineficaz, pois existem verdadeiros rombos discriminatórios no círculo do mercado laboral: frente à mulher, o negro, o deficiente físico e dentre outros. De qualquer forma, o constituinte originário, na estrutura empresarial, proibiu discriminações, de forma ampla, desde o processo de admissão, perpassando pelas formas remuneratórias até a divisão de funções, no ambiente laboral. Na ordem internacional, a Convenção nº 159/83, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), foi ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo nº 51, de 28 de agosto de 1989, o que lhe outorgou força de lei. Assumiu, por isso, importância primordial. Representa a posição mais atual da OIT. Seu princípio basilar esteia-se na garantia de um emprego adequado e na possibilidade de integração ou reintegração das pessoas com deficiência na sociedade. Esse é o primado de um estado democrático, voltado para o estado de bem estar social: dar igualdade de oportunidades a seus membros. A norma constitucional, ora em enfoque, proibiu qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência. Em 13 de dezembro de 2006, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com Deficiência, primeiro documento de direitos humanos do Século XXI e o oitavo da ONU. Trata-se de importantíssimo instrumento de aprimoramento dos direitos humanos, não apenas porque atende às necessidades específicas desse grupo, que conta com cerca de 650 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), mas, acima de tudo, porque revigora os direitos humanos, hoje ameaçados por guerras consideradas ilegais pela ONU e pelo avanço do mercado global, em detrimento de direitos sociais antes consolidados. 137 A questão da proteção das pessoas portadoras de deficiência físico-mental enfatizouse após o término das duas Grandes Guerras, em função da imensidão de pessoas que passaram a ter distúrbios pós-guerra. Em seara infraconstitucional 158 , no Decreto nº 3.298/99 159 , norma vigente, a deficiência conforme a dicção do artigo 3º, inciso I, seria “toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal, para o ser humano”. No artigo 3º, inciso II, dessa mesma norma, considerou-se deficiência permanente aquela que ocorreu ou se estabilizou, durante um período de tempo, suficiente para não permitir recuperação ou ter possibilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos. Já a incapacidade, seria a redução efetiva e acentuada da aptidão de integração social, havendo, a necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ou praticar certas atividades. A política de emprego no Brasil possui, como finalidade primordial, a inserção da pessoa portadora de deficiência, no mercado laboral. Na norma supracitada, foi edificado um regime especial de trabalho protegido, consoante a dicção do artigo 34, cuja seção IV é titulada: “Do Acesso ao Trabalho”. Para tanto, a empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois) a 5% (cinco por cento), de seu quadro de empregados, com beneficiários da Previdência Social reabilitados ou com pessoa portadora de deficiência habilitada. Até 200 (duzentos) empregados, o empregador terá que contratar 2% (dois por cento); de 200 (duzentos) a 500 (quinhentos) empregados, a obrigatoriedade é de 3% (três por cento); de 500 (quinhentos) e 1.000 (um mil) empregados, 4% (quatro por cento) e; ou sendo ultrapassados mil empregados, 5% (cinco por cento). Na hipótese de o empregado ser dispensado, o empregador terá que contratar outra pessoa nas mesmas condições, ou seja, um portador de necessidades especiais. A questão que não se justifica, em termos discriminatórios positivos, é a dicção do § 6º (artigo 35 do Decreto nº 3.298/99), em que está explicitado que o período de adaptação e qualificação para o trabalho de adolescente ou adulto portador de deficiência em oficina não caracteriza vínculo empregatício. Essa negação de direitos não se justifica, “pois inserir no mercado de trabalho é fazer incidir toda a gama de responsabilidades, obrigações e direitos que lhe integram” (MAIOR, 2008, p. 376). Nota-se que existe um paradoxo abismal entre o 158 159 Essa é uma discriminação positiva legal. Normatividade que regulamentou a Lei de número 7.853/89. 138 caput do artigo 34, do dito Decreto, e o parágrafo sexto do artigo subsequente: a criação de um regime especial, com a retirada da vinculação empregatícia do trabalhador portador de deficiência, naquele caso. No artigo 93, parágrafo 1º, da referida norma, existe a previsão de uma estabilidade no emprego. Na Lei nº 8.212/89, impõe que a União deve reservar, em seus concursos até 20% de vagas aos portadores de deficiência 160. Para concluir, acerca da discriminação positiva em fase dos portadores de deficiência, melhor ensinamento não subsiste: A maior deficiência que pode atingir as pessoas é a incompreensão do real sentido da dignidade, com a concreta eliminação dos preconceitos. Claro, muitas vezes há a completa compreensão da situação, mas esta sucumbe a razões de uma visão distorcida do sentido de produtividade. (MAIOR, 2008. P. 376). (Grifou-se). No pertinente à discriminação salarial no inciso XXX, está consagrada a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil. Como bem excele Chiarelli: O salário deve corresponder a uma determinada qualidade e quantidade de trabalho, sem que seja admissível, segundo a lei, paternalisticamente, o empregador dar diferenças remuneratórias que não estejam vinculadas ao serviço prestado pelo empregado. (CHIARELLI, 1989, p. 241). Na Constituição da República pátria, adotou-se a máxima firmada no Tratado Versalhes, em 1919, consagrada no artigo 427: “Igual salário para igual trabalho”. Essa mesma regra está insculpida em norma celetista, artigo 461 “sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade e cor” (BRASIL, 1943). O trabalho caracterizado como sendo de igual valor é aquele que possui igual produtividade e mesma perfeição técnica. Hodiernamente, a prática discriminatória por gênero volta-se, em sua maioria, contra a mulher, no entanto, não raro, homens também podem sofrer danos em função de certos atos desigualitários. Por exemplo, em anúncios de jornais em que é explícita a preferência por mulheres em cargos como: educação, enfermagem, secretariado dentre outros. 160 Esses são outros exemplos de discriminação positiva. 139 A discriminação em relação à idade circunscreve-se à contratação, basicamente, de crianças e adolescentes (objeto do tópico subsequente), com o intuito de se “economizar” com a mão-de-obra. A outra face da discriminação, a negativa, apresenta-se em práticas ocorridas no início, execução e na extinção do contrato de trabalho. Por exemplo, cita-se a não contratação ou a demissão de trabalhadores que alcançaram determinada idade, são os chamados “envelhecentes”. Muitos empregadores acreditam que trabalhadores com mais idade serão prejudicais ao seu negócio, sendo necessário, para tanto, a substituição desses por trabalhadores mais jovens, supostamente dotados de maior aptidão para o cumprimento das funções que lhes são atribuídas. O que os empregadores esquecem é que a experiência de um trabalhador com mais idade é insubstituível. Essa discriminação é, por óbvio, injustificada quando desprovida de critério ou fundamento razoável. Logo, em determinadas atividades, o critério de idade deve ser levado em conta na contratação do trabalhador. Cita-se, por exemplo, a contratação de policiais militares e civis, caso em que a natureza da função apresenta motivação, razoavelmente aceitável, para o estabelecimento de idade máxima para as contratações. A discriminação por cor paira em um grave problema até hoje vivenciado: o racismo. As razões da discriminação nem sempre são notoriamente perceptíveis, pois trazem consigo elementos culturais, enraizados na sociedade. No mercado de trabalho, atualmente, eleva-se, e muito, a questão do estereótipo: de quem é bonito, com boa feição, etc. O ato racismo constitui um conjunto de teorias e crenças, baseado na diversidade de raças ou grupos étnicos humanos, em que se estabeleceu, ao longo da história da humanidade, uma hierarquia entre esses, justificando comportamentos de intolerância e discriminação. Não raro, a discriminação é, até mesmo, despretensiosa, no entanto, com consequências, inimagináveis, quando se diz, por exemplo: “o negro só sabe jogar bola e sambar”! A República Federativa do Brasil é regida, nas suas relações internacionais, dentre outros, pelo princípio do repúdio ao racismo e, tem como um dos objetivos fundamentais promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (artigos 4º, inciso VIII e 3º, inciso IV, respectivamente). Na ordem constitucional, ao crime de racismo é conferida a qualidade de inafiançável e imprescritível, cuja pena é a de reclusão (artigo 5º, inciso XLII, da CR/88 e a Lei nº 7.716/89). 140 Define os Crimes Resultantes de Preconceitos de Raça ou de Cor. ARTIGO 20 Praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação social ou por publicação de qualquer natureza, a discriminação ou preconceito de raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional. Pena: reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. (BRASIL, 2011). No que concerne à proibição de discriminação entre o trabalho manual, técnico e intelectual veda-se a hierarquia indevida frente à natureza do trabalho. O que não significa a não apreciação da forma de prestação de serviços, bem como seu tipo, sem levar em conta a característica do processo produtivo, sua rentabilidade, qualificação do empregado e dentre outros fatores diferenciadores. Essas questões podem ser elevadas no contexto da dinâmica empresarial, sem que em razão da diferenciação lícita, ocorra discriminação negativa. Pertinente à proibição de diferença entre o empregado, possuidor do vínculo empregatício e o trabalhador avulso, reflete uma discriminação nada velada. Essa diferenciação ocorre, em sua maioria, dentre os próprios trabalhadores, causando uma pulverização da solidariedade entre os mesmos. O trabalhador que tem o vínculo empregatício reconhecido, pela ordem jurídico-laboral, é aquele que possui, na realização de seu labor, a conjugação de fatores, denominados elementos fático-jurídicos (expressão de Maurício Godinho Delgado), são esses: a) o trabalho realizado por pessoa física (pessoa jurídica não pode ser empregado); b) com pessoalidade (o trabalho é intransferível, possui caráter intuito personae); c) labor realizado de forma não-eventual (é ideia de permanência); d) onerosidade (princípio determinante da não existência de empregado que labore de forma gratuita) e; e) realizado por subordinação (que traduz-se no comprometimento do empregado em obedecer aos lícitos comandos da direção empresarial). O Trabalhador avulso é um trabalhador eventual, que labora para diversos tomadores (empreendimentos no mercado específico do setor portuário, através de entidade intermediária 161 ), sem se fixar a nenhum deles. O trabalhador eventual possui a mesma característica, no entanto, oferta seus serviços em diversos setores e não apenas no portuário. Essa categoria aparta-se da existência do elemento fático-jurídico subordinação. A interpretação dessa norma deve ser ampliativa, pois a não discriminação deve englobar, ainda, o trabalhador eventual, o terceirizado e, até mesmo, o trabalhador voluntário. Todas essas pessoas gastam seus tempos no dispêndio de energia (lato sensu) em prol da sociedade. É esse elemento que deve ser sempre valorizado! A Lei Maior evidencia, ainda, que solteiros, casados, divorciados ou separados estarão em pé-de-igualdade na disputa por uma colocação no mercado laboral. Não raro, 161 Matéria regida pela Lei do Trabalho Portuário de número 8.630/93, cuja interposição, dessa forma de labor, é feita por meio de órgão de gestão de mão-de-obra. 141 homens solteiros são mais valorizados no mercado de trabalho. Mulheres casadas, quando de suas admissões, costumam ser questionadas, se pretendem ter filhos, exemplificadamente. Essa prática comum constitui ato ilícito e inconstitucional, devendo o atuante ser punido, no mínimo, através da reparação pecuniária, via responsabilidade civil. O problema, quando da busca por responsabilização, junto ao Poder Judiciário, dos causadores de danos, em função da discriminação, é a prova. A imputação de responsabilidade e, consequente reparação pecuniária, possui efeito profilático, e a dificuldade de provar deve ser elevada pelo magistrado, no caso concreto, aplicando os meios processuais cabíveis, tal como, a técnica da inversão do ônus probatório. Os meios de combate à discriminação, via judicial, é o pedido de equiparação salarial (estando presentes os requisitos do artigo 461, da CLT e Súmula 6, do TST) e o salário equitativo. O princípio da isonomia salarial é amplo e não se restringe, exclusivamente, ao preceito do artigo 461 da CLT. A via equiparatória não deve ser vista como o único meio de se obter um salário equânime na relação laboral. Calcado no artigo 460 da norma celetista, o salário equitativo, como bem já decidiu Luiz Otávio Linhares Renault, “é o salário equânime e justo; o salário na sua verdadeira dimensão social e que deve ir ao encontro da valorização do trabalho humano, importante valor para a incorporação do empregado no estado democrático de direito.” (MINAS GERAIS, TRT 3ª R.00993-2006-004-03-00-2 RO, 2007). 2.2.31 Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos A Constituição da República pátria proíbe o trabalho do menor de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, aos maiores de quatorze anos, além da vedação do trabalho noturno, insalubre e perigoso aos menores de 18 dezoito anos. Existe, na norma constitucional, a consagração de uma tutela específica ao menor de idade, a laborar em local e ambiente de trabalho livre de fatores prejudiciais à saúde e à formação psicofísica do trabalhador menor. Na aprendizagem empresarial, o aspecto pedagógico deve ser preponderante na execução do trabalho. O direito a profissionalização (prerrogativa de cidadania) não pode ser confundido com mero trabalho produtivo. A sinonímia “menor” não expressa a concepção mais correta, que foi corrigida pela dicção utilizada pelo artigo 227 da Constituição, que se refere à criança e adolescente. Pelo 142 Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n º 8.690/90), “criança” seria o menor de 12 anos e adolescente seria o maior de doze anos e menor de dezoito anos. Dessa forma, em hipótese nenhuma é possível o trabalho da criança. Na normatividade celetista, existem disposições sobre a proteção do trabalho do adolescente: do artigo 402 ao 441. Os contornos normativos constitucionais atuais, frente ao trabalho do adolescente e da criança, inibiram, mas não alijaram do mercado, uma praxe muito comum de “contratação” dessas pessoas, que significava uma parcela considerável da mão-de-obra explorada, na formação do sistema de produção capitalista, para a diminuição dos custos empresarias. Na França, em 1841, editou-se uma Lei de proteção ao trabalho, proibindo o labor em usinas e manufaturas, de crianças com menos de 8 anos, além, de limitar o trabalho dessas há no máximo 8 horas diárias, dos 12 aos 8 anos, e, de 12 horas aos adolescentes de 12 a 16 anos. Porém, essa lei não possuía eficácia, uma vez que o Estado não fazia um controle efetivo organizado. Por incrível que pareça, essa lei foi um marco cronológico e histórico, pois até então, não havia norma consentânea ao trabalho infantil. Caso seja feita uma analogia com o direito à propriedade, existe proteção desde os primórdios civilizatórios, ver-se-á a morosidade da lei em proteger o menor. O quadro de exploração infantil só veio a melhorar com a criação da OIT em 1919, pois as Leis, até então, apenas eram positivadas para que os países, que as editassem, não ficassem com uma imagem deflagrada, no âmbito internacional. O trabalho infantil favorece apenas uma camada muito espessa da sociedade, porém, na realidade acaba por desestabilizar: [...] o processo produtivo internacional e conduz à marginalidade de pessoas e economias. Alimenta um espiral descendente de consumo e de empregabilidade, fenômenos muito comuns em países de terceiro mundo, cuja única oportunidade de curar tais mazelas reside na educação profissionalizante” (MAIOR, 2008, P. 371). Em leitura conjunta ao inciso XXXIII, tem-se o artigo 227, da Lei Maior, em que está estabelecido que é dever da família, da sociedade e do próprio Estado resguardar a criança e o adolescente, com absoluto prediletismo, seus direitos: à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Nesse artigo, o constituinte ressalvou a necessidade 143 preeminente de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. As normas da CLT devem ser lidas conforme a CR/88, bem como as regras previstas no ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente, privilegiando a norma mais favorável ao trabalhador. O acesso à escola e a atividade laboral, compatível com o desenvolvimento do adolescente, e não a realização de trabalho em locais prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, ou em horários e locais que não permitam a frequência à escola, são exemplos de proibições basilares no labor do menor. O Trabalho noturno, tanto no meio rural quanto no urbano, é expressamente proibido para o menor. Assim como o trabalho insalubre e periculoso (artigo 405 da CLT). O parágrafo 1º desse artigo celetista demonstra que essa questão, do trabalho do adolescente, ainda, não está bem resolvida na legislação pátria, que só foi revogado pela Lei nº 10.067/00. É de inteira responsabilidade do empregador o tipo de atividade exercida pelo adolescente, além de ter que observar as limitações impostas pelo ordenamento jurídico. No entanto, o que se nota, não raro, é uma distorção da normatividade protetiva. Um exemplo dessa assertiva é o fato de que diversos municípios brasileiros, através de “programas sociais”, instituíram os “guardas mirins” (de carros nas ruas), sem o menor comprometimento com a profissionalização, apenas ratificando a pauperização, o intuito relaciona-se à mera geração de renda. O que fere inteiramente o princípio da proteção integral à criança, essas crianças ficam expostas a todos os tipos de condutas antissociais, primordialmente violência (envolvimento com o narcotráfico), e exploração sexual. Lembrando-se que no artigo 149 do Código Penal pátrio, está previsto o crime de “redução à condição análoga a escravo”, com um caso de aumento de pena, no § 2º inciso I, quando o crime for cometido contra criança ou adolescente (redação de 2003). O exercício do trabalho subordinado não pode interferir, negativamente, na formação física, moral e psíquica do adolescente. Afinal, as crianças e os adolescentes de hoje serão o futuro próximo. Que tipo de pessoas irá se formar, trabalhado de forma periculosa, insalubre, no labor noturno e, etc.? Cuidando dessas pessoas hoje, estar-se-á cuidando do futuro da sociedade em que se vive. A rotatividade do trabalho, no Brasil, sempre vem fundamentada, pelo mercado empregatício, que não existe trabalho para todos, mas, se falta emprego para tantos pais de família, por que atrair, para o mercado, adolescentes e crianças? Por óbvio, sob aquela mesma mentalidade, da dinâmica empresarial, de redução dos custos. 144 O problema é que a realidade social não é tão generosa com as crianças e adolescentes, quanto à legislação, que é considerada avançada, e serve como modelo para o direito comparado. Mas, no campo da eficácia, constitui uma das legislações menos observadas, sendo, não raro, cotidianamente vista a exploração do trabalho infanto-juvenil, resquício evidente de três séculos e meio de escravidão no Brasil. Desabafa Jorge Luiz Souto Maior: Sendo assim, é imprescindível, um esforço de conscientização em toda a sociedade, mostrando que o trabalho do menor, na forma em que hoje se realiza, pode comprometer o seu futuro profissional, emocional e a sua saúde, pois ele será submetido a uma eterna servidão devido às suas limitações futuras. Tal questão indica que nenhum programa de prevenção ao trabalho precoce será eficaz se não dispuser de recursos capazes de compensar a falta dos rendimentos dos menores em sua família. (MAIOR, 2008, p. 352). Ensinam Roberto Basilone Leite e Viviane Colluci: A grave conjuntura econômica que assola famílias desamparadas não pode justificar o apartheid social que condena o filho dos menos favorecidos a uma situação de permanente exclusão. O trabalho, antes da idade mínima legal, constitui fator de agravamento da pobreza e inviabiliza a adequada inserção social do cidadão portador de aptidões próprias, adiando a implantação do projeto de uma sociedade livre, justa e solidária (LEITE; COLLUCI, 2007, p. 272). Mister ressaltar que no artigo 67, especificamente no inciso III, do Estatuto da Criança e do Adolescente, está a previsão de vedação expressa ao trabalho de aprendiz, em regime familiar. Na conjuntura atual, é muito comum que pessoas “contratem”, crianças e adolescentes, para trabalhar no âmbito familiar, cuja contraprestação é alimentação e moradia (muito comum é a figura da “doméstica”, meninas, crianças). Raros são os casos em que esses menores possam estudar. É normal que famílias procurem crianças dos interiores do Brasil, para essa finalidade, a executar, geralmente, serviços domésticos. Essas circunstâncias constituem praticamente um trabalho escravo, condutas que apenas ratificam que a cultura colonialista não foi inteiramente superada. 145 2.2.32 Trabalhadores Domésticos. O constituinte brasileiro de 1988, no discriminante parágrafo único, do artigo 7º, excluiu, de forma expressa, os trabalhadores domésticos do convívio com as normas tutelares da relação laboral. Rechaçou-se a mentalidade cultural escravocrata, a confirmar a categoria dos trabalhadores domésticos como sendo de subordinação ilimitada, delimitando, de forma específica, os direitos sociais pertinentes aos mesmos. A história de “Casa Grande e Senzala”, apesar de na Lei Áurea de 13 de maio de 1888, ter-se abolido a escravidão, passados tantos anos, não há negociação na relação do trabalhador doméstico e patrão. Sem haver negociação categorial, o doméstico não pode contestar, aderindo a um pacto de labor, sob total subserviência, realiza seus serviços sobre o arbítrio do empregador. O motorista particular, o jardineiro das mansões, o caseiro, a serviçal de residência (doméstica), a cozinheira, enfim, a categoria, não acompanhou a evolução particularmente no Brasil, das regras disciplinadoras da relação de trabalho e, mais, as normas protetivas do vínculo empregatício. Acrescenta-se ainda, que nem mesmo o direito social à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. No dito parágrafo único, estabeleceu-se que são assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, do artigo 7º, bem como a sua integração à previdência social. Quais sejam: salário mínimo, irredutibilidade salarial, décimo terceiro salário, repouso semanal remunerado, gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal, licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias, licença-paternidade, nos termos fixados em lei, aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei e aposentadoria. Conforme a normatividade celetista vigente, o trabalhador doméstico seria uma espécie diferenciada da figura de empregado. Sua tipificação legal compõe-se dos mesmos cinco elementos fáticos e jurídicos característicos da relação empregatícia,quais sejam: pessoa física que presta serviço subordinadamente, com onerosidade, de forma contínua, sem finalidade lucrativa à pessoa ou família, em função do âmbito residencial desse (CLT mais a lei regente dos domésticos: de número 5859/72). Assim, o traço diferenciador do emprego doméstico é o caráter não-econômico da atividade exercida no âmbito residencial do empregador. Dessa forma, o vínculo empregatício doméstico se configura a partir de oito elementos fático-jurídicos: Os cincos genéricos, concernentes à relação de emprego, e três particulares: 146 1) finalidade não-lucrativa dos serviços; 2) Prestação laboral à pessoa familiar e; 3) Âmbito residencial. A Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, regulamentada pelo Decreto nº 71.885, de 9 de março de 1973, dispõe sobre a profissão do (a) empregado(a) doméstico(a), conceituando e atribuindo-lhes seus direitos. No mundo, atualmente, estima-se existir cerca de 52 milhões de trabalhadores domésticos, sendo que 15 % concentram-se no Brasil. Após 50 anos, de pedido feito frente à OIT, para a igualação entre os trabalhadores, incluindo os domésticos, esse organismo internacional, atualmente, está tendente a editar uma nova convenção. Essa possível mudança da praxe mundial levará o legislador constitucional a reformular o, ora estudado, parágrafo único, que, certamente, não deveria nem ter sido inserido na Constituição cidadã. 147 3 AS TUTELAS DE URGÊNCIA E EVIDÊNCIA NO PROCESSO DO TRABALHO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 3.1 Tutela de Evidência (Noções de Direito Evidente) Tutela concerne ao amparo estatal dado ao cidadão diante da interferência, ou da sua iminência, a seus direitos, concedida através de ação judicial correspondente aos fatos in concreto. É através da jurisdição, que é provocada pela parte interessada. O Estado institui o método de composição do litígio. A tutela seria a proteção que a pessoa tem frente aos direitos assegurados na ordem jurídica. Preleciona Luiz Fux (1996, p.3) que o Estado é o garantidor da paz social: “impõe-se a solução monopolizada dos conflitos intersubjetivos pela transgressão à ordem, limitando o âmbito da autotutela”. O indivíduo não está autorizado pelo Estado Democrático à autotutela, em outras palavras, não tem o poder de “fazer justiça com as próprias mãos”. A função jurisdicional do Estado não se confunde com a tutela dos interesses dos cidadãos. A jurisdição é a atividade em que o Estado soluciona a lide declarando ou realizando o direito in concreto. Ensina Giuseppe Chiovenda, que a jurisdição seria a função do Estado que objetiva a atuação da vontade concreta da lei, por meio de substituição (da atuação de um terceiro imparcial), pela atividade dos órgãos públicos, da atividade dos particulares ou de outros órgãos públicos. Essa “vontade” concreta de realização do direito é feita através do processo. O Estado utiliza-se do processo para alcançar os escopos da jurisdição. Conforme a doutrina moderna, essa visão denomina-se: instrumentalidade positiva do processo. O processo, sob a ótica moderna, precisa garantir a tutela adequada, célere e efetiva. Das pretensões deduzidas em juízo em que o direito da parte, diante dos lastros probatórios, levados ao magistrado, revela-se evidente estar-se-á diante do, modernamente, denominado: direito evidente. Argumenta Luiz Fux (1996, p.311) que “o direito evidente é aquele que se projeta no âmbito do sujeito que postula”. Notadamente, o mesmo estudioso fundamenta que: “sob o prisma processual, é evidente o direito cuja prova dos fatos sobre os quais incide revela-os incontestáveis ou ao menos impassíveis de contestação séria” (FUX, 1996, p.311). Frente às novas necessidades processuais, o legislador e, primordialmente, o aplicador do direito precisam de instrumentos para se desviar da demora processual e proteger ou satisfazer o direito evidente. 148 Segundo os ensinamentos de Eduardo de Avelar Lamy, não existe: [...] uma espécie de tutela jurisdicional de natureza antecipatória [...] as chamadas ‘tutelas de urgência’ correspondem a uma única tutela de urgência; uma tutela não definitiva, que possui o caráter de executividade e da cognição sumária. (LAMY, 2004, p. 290-291). Conforme os ensinamentos desse mesmo autor, a classificação mais adequada das tutelas jurisdicionais, após a volta do movimento de sincretismo processual, que agrupa cognição e execução, de forma concomitante, nos procedimentos – o que não enfraquece a autonomia científica do direito processual civil – seria aquela que se subdivide em: tutela definitiva e tutela de urgência, ou seja, tutela definitiva e tutela provisória (podendo essa última ser prestada mediante meio/medida de caráter acautelatório ou satisfativo). (LAMY, 2004, p. 290-291). Existe uma importante diferenciação entre técnica processual, de medida processual e tutela de urgência. A técnica é a maneira processual, prevista na lei, por meio do qual a tutela é prestada. A tutela jurisdicional é concedida através da atuação do Poder Judiciário, fornecendo um resultado acerca dos fatos apresentados, em juízo, pelas partes. Essa tutela é o escopo da jurisdição. A medida seria o procedimento judicial aplicável ao caso, posto em litígio, por exemplo, a medida cautelar. O paradigma processual idealizado pelo Iluminismo e concretizado pelo Positivismo, notadamente, vem sendo subjugado por sistemas organizacionais jurídicos do mundo todo, frente às mudanças na sociedade contemporânea. José Roberto dos Santos Bedaque expoe que: “Inúmeras são as dificuldades enfrentadas por quem se dispõe a pleitear a tutela jurisdicional do Estado, na tentativa de obter proteção a um direito lesado ou ameaçado.” (BEDAQUE, 2009, p. 3). Preleciona Bedaque (2009) que a crise do Judiciário não assola apenas o Brasil, é sim uma dificuldade vivenciada até mesmo por países desenvolvidos (como será exemplificado no Capítulo III, do presente estudo dissertatório). “E crise na Justiça implica, necessariamente, crise de justiça” (BEDAQUE, 2009, p.3). Acontece que, a carência de aparelho estatal, apto a resolucionar os conflitos sociais, favorece o aparecimento de instrumentos extrajudiciais de solução de controvérsias, que, não raro, são inadequadas à proteção concreta dos sujeitos envolvidos. Como é o caso das Comissões de Conciliações Prévias, no Brasil, instituto que não “colou”. Na falta de garantias processuais necessárias à proteção e efetivação do princípio 149 da igualdade, o “lado” mais forte (que nem sempre o detentor real dos direitos judicialmente protegidos) acaba por se beneficiar do mais fraco. O formalismo dos institutos do sistema germânico tornava o processo longo e complexo. As partes depositavam em juízo, dentro dos prazos estabelecidos, atos escritos. Essas não podiam assistir à inquirição das testemunhas, mas eram também ouvidas e tudo era transcrito em uma ata, que serviria como base para o julgamento. Esse processo era denominado Solemmis ordo iudiciarius. Em 1.306, Clemente V, na constituição Clementina scepe, instituiu a simplificação dos procedimentos (concentração dos atos em uma audiência única, dispensando a rigorosa sucessão de prazos, reforçando os poderes do juiz e dentre outras medidas), nos moldes do que hoje vemos no Rito Sumário no Processo Civil, nos Ritos dos procedimentos dos juizados especiais e, até mesmo, no Processo trabalhista. Séculos depois, diversas soluções estão sendo intentadas mundialmente, sob a pecha de preconceitos, pois as sociedades, de um modo geral, possuem uma espécie de cultura jurídica enraizada e positivada em ordenamentos. Importante resposta que, atualmente, vem sendo matéria de enfoque é o movimento Pós-positivista. Fala-se, ainda, em instrumentalidade e busca pelo sincretismo processual. As Tutelas de Urgência vêm sendo utilizadas exatamente para suprir a falta de efetividade e a lentidão das modificações pertinentes a cada ordenamento jurídico. A análise comparatística (Direito Comparado) dos sistemas é imprescindível para que se possa ter uma noção generalizada do tema em estudo. A mera comparação das normas legais (exegese) não é o suficiente para revelar as práticas jurídicas dos sistemas, para que se possa visualizar o grau de efetividade dos mesmos. Pondera Humberto Theodoro Junior (2003), concernente ao processo brasileiro, cabível também a diversos sistemas processuais no mundo inteiro: Desde que os olhos da ciência do direito se voltaram para a noção do devido processo legal, um ponto se tornou consenso: não se pode reconhecer como processo devido aquele excessivamente demorado, ou seja, aquele que entre a invocação da tutela jurisdicional e efetiva prestação demanda um tempo muito longo, afrontando o que seria duração razoável do processo. [...] Daí a inserção entre as garantias fundamentais a que assegura a duração razoável do processo e o procedimento organizado segundo regras de celeridade processual (CF/88 artigo 5º, LXXVIII) (THEODORO JUNIOR, 2003, p.250). (Grifou-se). Especialmente no Direito do Trabalho, essa morosidade, atinge direito de caráter alimentar, essencialíssimos à própria sobrevivência do trabalhador, hoje pós-moderno e 150 polivalente. A classe-que-vive-do-trabalho vende a sua força de trabalho, e, com seu salário, sustenta, em tese, a si própria e, em quase a totalidade dos casos, à sua família. O Direito Brasileiro é de filiação romano-germânica (oriundo da adoção do Direito Romano pelos povos germânicos), ou de Civil Law, que se contrapõe em termos ideológicos, sistemáticos e organizacionais ao Common Law. Mister, portanto, fazer uma análise comparativa (das medidas de urgência) dos demais sistemas que estão sobre a égide dos reflexos da família romano-germânico na Europa, inspirando-se em contornos como a do Contempt of Court, em que, em nome da obediência às determinações da Corte, pune fortemente àqueles que se opuserem, de forma injusta, ao poder de imperium. A morosidade dos processos, em todas as searas jurídicas, que acaba por levar à inefetividade da Justiça, conduz a uma clara e evidente necessidade de mudança legislativa, a uma mudança comportamental dos operadores do direito e, primordialmente, da jurisprudência, na modificação do paradigma formalista do processo atual. 3.2 Tutelas de Urgência no Ordenamento Jurídico Brasileiro 3.2.1 Considerações Iniciais No ordenamento jurídico brasileiro, existem instrumentos processuais destinados a proteger pretensões que não podem esperar a tramitação habitual de um processo, e muitas vezes, nem mesmo se pode aguardar a citação do réu. Esses instrumentos processuais são chamados, pela doutrina, de tutelas de urgência, quais sejam, especificamente: a tutela cautelar (objetivando resguardar o direito), a tutela antecipatória (antecipação dos efeitos de mérito) e a tutela inibitória (prevenir que um dano iminente sobrevenha). José Roberto dos Santos Bedaque explicita que: Os provimentos antecipatórios urgentes são cabíveis em qualquer forma de tutela e podem antecipar totalmente os efeitos da tutela final. Essa circunstância confere à instrumentalidade, característica fundamental das cautelares, conotação pouco diversa daquela atribuída tradicionalmente a essa modalidade de tutela, se analisadas as medidas meramente conservativas (BEDAQUE, 2003, p.158). Conforme os ensinamentos desse estudioso, é em razão desse fator, apresentado na citação, que a doutrina pátria passou a teorizar outra categoria de proteção judicial: a chamada tutela de urgência, cabível frente às medidas necessárias a evitar o risco de ocorrência de dano ao direito. Caracterizam-se não apenas pela sumariedade do procedimento (viés encontrado 151 também em outras medidas que não se enquadram na categoria de tutela de urgência, propriamente dita), mas, sobretudo, pelo periculum in mora. A situação substancial é analisada e é averiguada a necessidade dessa especial proteção, de caráter imediato, ante a impossibilidade de se aguardar o tempo necessário para a entrega da tutela final. Ressalta-se que, na CLT, artigo 659, incisos IX e X, existe disciplina relativa à tutela de urgência. Conforme a doutrina dominante, essa disposição não se trata de instrumento cautelar, pois não é medida que visa assegurar a efetividade da tutela jurisdicional, tão pouco da antecipada. Trata-se de concessão da própria tutela de mérito, antes da sentença; dessa forma, tem caráter antecipatório 162 . Na redação do referido diploma legal, o magistrado do Trabalho poderá conceder liminares, antes da decisão final, com o intuito de se evitar a transferência abusiva do empregado, ou para reintegrar dirigente sindical. 3.2.2 O Princípio da Fungibilidade frente às Tutelas de Urgência A moderna doutrina, enfocado o caráter de urgência das tutelas antecipadas, na busca pela efetividade do processo, consagra a aplicação do Princípio da Fungibilidade, em que o juiz pode conceder uma medida de urgência no lugar de outra demandada, caso os demais requisitos, para essa concessão, estejam presentes. A possibilidade, acima aduzida, advém exatamente das mudanças ocorridas no CPC (os artigo 273, parágrafo 7º e 489), assegurando a efetividade e instrumentalidade do processo. Esse último artigo ratifica a possibilidade da aplicação do princípio em análise. Eduardo Talamini, Luiz Rodriguez Wambier e Flávio Renato Correia (2005, p. 40) afirmam que “muitas medidas encontram-se em uma zona cinzenta entre o terreno equivocadamente destinado à tutela conservativa e aquele outro atribuído à antecipação”. O juiz, nos casos urgentes, não pode furtar-se de conceder uma medida de urgência, simplesmente, pelo fato de não ter sido requerida pela via cabível. É um dever do magistrado conceder a tutela de urgência, e, caso seja necessário, ordenar que parte faça as adaptações necessárias a corrigir a medida. Nessa linha, o colendo TST entende que o pedido de antecipação de tutela, formulado nas mesmas condições, será recebido como medida acautelatória em ação rescisória, por não se admitir tutela antecipada em sede dessa modalidade de ação (ex-OJs nºs 1 e 3 da SBDI-2 - 162 Nesse sentido tem-se o seguinte julgado: TST, RO-MS 417.142/98.7, Milton de Moura França, Ac. SBDI-2. 152 inseridas em 20.09.2000 - e 121 da SBDI-2 - DJ 11.08.2003 – Súmula 405). Esse entendimento consubstancia a possibilidade de aplicação da técnica da fungibilidade. Cândido Rangel Dinamarco (2009) pondera, a respeito do artigo 279, parágrafo 7º, que o texto normativo não deve ser lido somente como definidor da autorização de concessão de uma medida cautelar, quando requerida a antecipação de tutela, mas também, quando realizado um pedido acautelatório. Nesse caso, o juiz está autorizado a conceder uma medida por outra, estando assim convencido e diante da existência dos pressupostos. Como bem assevera esse ilustre autor: “não há fungibilidade em uma só mão de direção. E, direito, se os bens são fungíveis isso significa que tanto se pode substituir um por outro, como outro por um”. (DINAMARCO, 2009, p. 285). Esse sentido está rechaçado no artigo 489 do CPC. Nessa norma, com o intuito de suspender o cumprimento da sentença, em sede de ação rescisória, é cabível a medida antecipada ao invés da cautelar, estando presentes os requisitos legais. O ajuizamento da ação rescisória não impede o cumprimento da sentença ou acórdão rescindendo, ressalvada a concessão, caso imprescindíveis e sob os pressupostos previstos em lei, de medidas de natureza cautelar ou antecipatória de tutela. (BRASIL, 2006). Concernente ao entendimento de Mauro Schiavi (2008), analisando a redação do artigo 489, o inciso II da Súmula 405, acima comentada, foi tacitamente revogado por essa norma processual civilista, já que na lei está disposta a possibilidade de concessão de meio antecipatório na ação rescisória, para fim de suspender a execução da sentença. Não obstante, a fungibilidade ser um meio processual de efetivação do direito objeto de uma lide, em verdade, seu teor vai além da técnica processual, rumo “à unificação da teoria das medidas urgentes” (DINAMARCO, 2001, p. 91). Nesse diapasão, entende-se que é possível a concepção da tutela inibitória, quando o autor, equivocadamente, pedir tutela cautelar ou antecipatória. 3.3 Bases fundamentais da Tutela Antecipatória e o Processo do Trabalho A tutela antecipada é medida satisfativa, sendo entregue ao autor, quando deferido seu pedido, o bem da vida pretendido, antes da prolação da decisão judicial (antecipa os efeitos do provimento final e não a pretensão em si). O objeto da referida tutela nem sempre coincide, de forma exata, à sentença. Essa medida, prevista no CPC, é compatível com o Processo do Trabalho, por força da aplicação do artigo 769, do diploma celetista. A reforçar 153 essa possibilidade e necessidade de aplicação desse instrumento antecipatório, no Processo do Trabalho, tem-se o artigo 765 da norma celetista, cuja redação prevê que os magistrados trabalhistas valer-se-ão pelo andamento rápido da causa, “podendo determinar qualquer diligência necessária ao esclarecimento delas” (BRASIL, 2011). A técnica antecipatória, consentâneo aos ensinamentos de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2008), é arma contra os males do processo moroso, inefetivo, a evitar um dano irreparável ou de difícil reparação (inteligência do artigo 273, I, do CPC). Propicia, ainda, melhor distribuição do tempo processual, entre as partes litigantes, na medida em que evidencia direito da parte autora, bem como, frente à fragilidade da defesa do réu (artigo 273, II e parágrafo 6º do código processual civilista). Assim, a antecipação dos efeitos meritórios consiste, em suma, na distribuição do tempo do processo. A técnica, ora estudada, possibilita a visualização de que não apenas a morosidade é causadora de prejuízos, em sede processual, mas, sobretudo, a omissão do magistrado em temer a concessão da antecipatória. É necessário sim que, frente a tal pedido, o juiz digne a ser prudente e cauteloso (nunca deixando de lado a responsabilidade social), o que se distancia, e muito, do comodismo frente às fases do rito processual. Esse aspecto eleva-se, sobremaneira, em se tratando de direito de caráter alimentar, na justiça do trabalho. “O juiz que se omite é tão nocivo quanto o juiz que julga mal” (MARINONI; ARENHART, 2008, p. 200) No entanto, não é apenas o magistrado que teme, mas também o advogado que não pede a aplicação da ditada medida, muitas vezes até mesmo pelo fato de desconhecer a fundo o instituto. Como bem prelecionava Carnelutti, “o tempo é um inimigo do Direito sobre o qual o juiz deve travar uma guerra sem tréguas” (SCHIAVI, 2008, p. 866). Com a antecipação da tutela, permitem-se que sejam realizadas, de forma célere, as consequências concretas, enquanto efeitos externos da sentença meritória. Os efeitos antecipados, em juízo, seriam aqueles que se operam fora do processo, no entanto, no âmago das relações de direito. A diferenciação entre tutela antecipada e tutela cautelar reside, notoriamente, no fato de que, com a antecipação dos efeitos meritórios, é possível obter a satisfação do direito, enquanto que, com a cautelar, conforme os ensinamentos de Libman (1984, p. 216) objetivase assegurar, garantir o “curso eficaz e o resultado útil” do processo cognitivo ou executório, “concorrendo, assim, indiretamente, para a consecução dos objetivos gerais da jurisdição”. 154 3.3.1 Pressupostos da Tutela Antecipatória Ao conceder o pleito antecipatório, o magistrado deve ater-se a certos elementos legais, previstos no artigo 273 do CPC. O legislador optou pela necessidade de flexibilidade interpretativa do instituto, por inserir terminologias e expressões jurídicas indeterminadas, não indicando conceitos e limites à “prova inequívoca”, “verossimilhanças das alegações”, o “manifesto propósito protelatório”, “fundado receio, dano de difícil reparação” e ao “abuso de direito”. A “imprecisão” do legislador possibilitou, ao julgador, maior margem interpretativa, devendo o magistrado, obedecendo ao comando constitucional, acerca da necessidade de fundamentação das decisões judiciais (artigo 93, IX da Lei Maior), na decisão que denega ou acolhe a antecipação, devem ser apontados quais requisitos são inexistentes ou não, no caso concreto. A doutrina subdivide, didaticamente, os pressupostos em genéricos ou específicos (da espécie positiva), e o pressuposto negativo. Os genéricos são, de acordo com o caput, do artigo 273 da Lei Processual Civilista: a) requerimento da parte; b) identificação dos efeitos a serem antecipados com provimento final; c) prova inequívoca; d) verossimilhança da alegação. Além desses requisitos (cumulativos), tem-se a necessidade de existência de pelo menos um desses dois: a) fundando receio de dano ou de difícil reparação e; b) abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório. O requisito negativo seria: a irreversibilidade dos efeitos da antecipação de tutela (previsto no parágrafo 2º do artigo, ora em voga). 3.3.2 Requerimento da Parte Consoante ao exposto no artigo 273, “O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial [...]” (BRASIL, 1994). Da Leitura da primeira parte, dessa norma, nota-se que o requisito ali fundado reside no requerimento da parte. O deferimento da antecipação da tutela, em regra, carece de pedido expresso do autor, não estando o magistrado autorizado, por esse preceito, a concedê-la ex officio. O mesmo se aplica ao Processo Laboral. Nesse diapasão, Luiz Fux (1996) preleciona que o legislador brasileiro desprezou oportunidade única de enfrentar “com coragem e ousadia a questão da inércia jurisdicional”. Acrescenta-se, ainda, que o legislador desperdiçou a oportunidade de lançar mais armas ao 155 ativismo judicial responsável e consciente. A atuação de ofício do magistrado é “consectário do dever geral de segurança que se ancora nos poderes instrumentais do juiz para prestar a atividade substitutiva” (FUX, 1996, p. 338). Certos casos, envolventes do interesse público, necessitam da atuação incontinenti do Poder Judiciário. Não obstante, à existência daquela regra, no Processo do Trabalho, quando o autor estiver desacompanhado de advogado, o juiz poderá conceder a medida de ofício, fundamentando-se nos artigos 765 e 791 da CLT, levando em consideração a função social desse processo e a hipossuficiência do trabalhador, conforme os ensinamentos da melhor doutrina trabalhista. E, em caso de reconvenção ou nas ações de natureza dúplice, o réu também poderá formular o requerimento. 3.3.3 Prova Inequívoca Capaz de Fazer Surgir a Verossimilhança A denominada “prova inequívoca” é aquela capaz de convencer o juiz da verossimilhança das alegações, por ser idônea e clara. A parte interessada pode se valer de todas as provas admitidas em direito: a prova documental, testemunhal, pericial (essas realizadas antecipadamente, em outro processo, exemplificadamente) laudos, pareceres e dentre outros instrumentos probatórios. Equivocam-se os que afirmam que apenas a prova documental permite a concessão da antecipação de tutela. Como bem expôs o juiz Jesse Claudio Franco de Alencar, convocado pelo Tribunal Regional de Minas Gerais, “a prova inequívoca é aquela cujo grau de convencimento não comporta nenhuma dúvida razoável” (MINAS GERAIS, 2009), ou seja, a prova não necessita ser robusta, mas sim, que não comporte dúvidas razoáveis. 163 3.3.4 Verossimilhança das Alegações A verossimilhança das alegações é o juízo provisório feito pelo magistrado acerca do fato (narrado na peça processual), que deve ser plausível ou concreto. Caso o juiz esteja em dúvida quanto à probabilidade da existência do direito do autor, deverá dilatar o curso probatório antes de conceder a antecipação da tutela. Os motivos apresentados devem suplantar os argumentos em contrário. Consoante ao entendimento esboçado por Luiz 163 Diversamente do que foi decidido em primeira instância e reformado no Regional da Bahia. Nessa ação, o magistrado de primeiro grau não concedeu a antecipação de tutela em virtude da falta de prova pericial. Se assim fosse entendido, de forma majoritária, o instituto perderia sua razão de ser. (BAHIA, 2010). 156 Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2009, p. 212), deve-se considerar, para tanto: “(a) o valor do bem jurídico ameaçado, (b) a dificuldade de o autor provar sua alegação, (c) a credibilidade da alegação e, (d) a própria urgência descrita”. A verossimilhança é uma questão de fato, devendo o juiz analisar as circunstâncias e as peculiaridades de cada caso, através das provas levadas aos autos, formando um juízo seguro de probabilidade à aceitação da proposição aviada. Na avaliação da verossimilhança, o juiz deve analisar se há mais motivos para conceder do que para não conceder a tutela de urgência. Os argumentos para a concessão devem suplantar os fundamentos contrários, não podendo haver equivalência entre a pretensão e a resistência. Consoante à redação dos incisos I e II do artigo 273 do CPC existe, ainda, dois requisitos alternativos, que se seguem abaixo relacionados. Em outras palavras: para o deferimento da antecipação de tutela, além dos pressupostos específicos acima relacionados, é, ainda, necessária a presença de pelo menos um dos pressupostos explicitados nos subitens seguintes. 3.3.5 Identificação dos efeitos a serem antecipados com o provimento final O ato decisório de antecipação da tutela deve estar adstrito, total ou parcialmente, ao que está sendo pedido, como provimento final, ou seja, a abrangência da antecipação deve ser delimitada pelo juiz, quando da concessão. Lembrando que ao magistrado são proibidos, veementemente, pelo ordenamento jurídico brasileiro, os pedidos: ultra, extra e infra petita. A tutela antecipatória pode ser total ou parcial, mas sempre limitada ao pedido formulado pela parte demandante. Na Justiça Laboral, com a aplicação do princípio da oralidade, é possível a alteração de pedidos em audiência, desde que não haja prejuízo para a defesa e para a administração da justiça. Souto Maior (2009) sustenta, contrariando a doutrina dominante, que é permitido ao magistrado a prolação de julgamento extra petita, tendo em vista o cumprimento de regras de caráter público, o que deveria ser aplicado no âmbito da antecipação de tutela. 3.3.6 Fundado Receio de Dano Irreparável ou de Difícil Reparação No atinente à tutela antecipatória, concedida à base de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, protege-se, a parte litigante, dos perigos da mora processual (periculum in mora). A técnica, nesse contexto, é a “antecipação assecuratória” 157 (ZAVASCKI, p. 58, 1996). Em outras palavras: o instrumento antecipatório é concedido face ao grande risco de perecimento do direito, posto à tutela jurisdicional. A sinonímia “ou de difícil reparação”, tecendo elogios ao legislador, abarca uma gama de ilícitos praticados, que podem ainda não ter gerado dano, mas que se ocorrente, será dificilmente reparado. No Tribunal Regional de Santa Catarina, já se decidiu, em favor da antecipação de tutela, baseando-se no fundado receio de dano à sustentabilidade da autora (ex empregada), quando da ocorrência de acidente do trabalho. Nesse caso, ponderou a desembargadora que a requerente não poderia esperar a realização do direito de crédito, na medida em que a mesma estava doente e não percebia benefício previdenciário, já que a empresa não emitiu a CAT (a requerente não contava, à época, com o período de carência necessário para o gozo de auxíliodoença comum) (Desembargadora Águeda Maria L. Pereira, Processo: 000219422.2010.5.12.0047, 2011). Essa decisão denota um exemplo de concessão do pleito antecipatório enfocando a efetividade do direito material, na medida em que o contrato de trabalho é instrumento de convívio social. O pacto laboral tem que ser útil e justo. Cessar o contrato laboral, por justa causa, estando a empregada doente, fere os princípios constitucionais protetivos e valorativos do trabalho digno. O fundado receio não concerne às questões de ordem subjetiva da parte, mas sim aos fundamentos objetivos da existência da probabilidade de ocorrência de graves prejuízos. O risco de dano irreparável ou de difícil reparação não pode ser hipotético, devendo ser atual (o que se apresenta urgente no curso do processo), e não naturais inconvenientes da demora processual. 3.3.7 Caracterização do Abuso de Direito de Defesa ou o Manifesto Propósito Protelatório do réu A caracterização do abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu autoriza o juiz a conceder a tutela antecipada, diante de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos alegados, de forma infundada, pelo réu. Essa hipótese denota a possibilidade de antecipação em caráter punitivo, por sancionar o réu ao abusar do direito de defesa ou agir de forma a protelar os interesses aduzidos pela parte autora, afetando a celeridade processual e o restabelecimento da paz social, com a não resolução, rápida e eficaz do conflito. 158 A ilegalidade ou abusividade do ato objurgado pode residir em atitudes extraprocessuais ou endoprocessuais. Nas hipóteses em que, exemplificadamente, a parte (e seu procurador), com ou sem má-fé, após o ato citatório, apresenta contestação inconsistente, recursos protelatórios ou retém os autos por tempo prolongado, ou seja, a parte procrastina ou evita os efeitos do trânsito em julgado da sentença, possivelmente, de cunho condenatório (condutas endoprocessuais). Condutas extraprocessuais seriam atos praticados fora do âmbito processual, com potencial de interferir, de forma direta, no processo posto à resolução jurisdicional. A interpretação, presentemente proposta, é ampliativa, uma vez que, no dito parágrafo, afirmou-se a possibilidade de atitudes abusivas ou protelatórias do “réu”. O pedido de antecipatória, calcado em conduta abusiva ou protelatória extraprocessual, não teria o propósito de resguardar o processo; nesse sentido, não seria antecipação, mas sim cautelar. Poderia ser o caso de fraude em sede de CCP (Comissão de Conciliação Prévia), atrapalhando o regular andamento do futuro processo. Jorge Luiz Souto Maior excele acerca da necessidade de se coibir, de forma: [...] eficiente, as defesas protelatórias, no âmbito laboral, afirmando que: obedecendo-se ao princípio da oralidade, os feitos trabalhistas se desenvolvem de forma atrelada e, por isso, a adoção generalizada de táticas protelatórias causa prejuízos não só aos autores das reclamações trabalhistas (normalmente, os empregados, ou melhor, os ex-empregados) como também a eficácia da ordem constitucional, que assegurou os direitos sociais, e à própria administração da Justiça que, querendo distribuir justiça, vê-se impedida de fazê-lo em razão do emaranhado de filigranas processuais que se instauram na sacralização do direito de litigar. (MAIOR, 2009). Pelas razões acima apresentadas, pelo ilustre autor, na praxe laboral, no combate às defesas protelatórias, o critério argumentativo mais comum é o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. As demais hipóteses são pouco pedidas, e, em consequência, pouco deferidas. Almeida (2006, p. 1.052) expõe que “protelar o andamento da causa é adotar postura que dificulte ou prejudique o normal desenvolvimento do processo e, com isso, a solução definitiva do litígio”. Esse autor não distingue os dois institutos, afirmando que: “protelar a solução definitiva da causa é também abusar do direito de defesa” (ALMEIDA, p. 1.053). No entanto, o legislador optou por fazer a distinção entre os mesmos. Notoriamente, essa afirmativa é confirmada pela própria lógica gramatical ao inserir “ou”, partícula que denota alternância, entre as condutas explicitadas na normatividade. A falta de seriedade da defesa não pode gerar ao autor que tem razão riscos à efetivação do direito pleiteado. Dessa forma, é possível afirmar que há de se atribuir “maior 159 efetividade à antecipação de tutela, especialmente no Processo do Trabalho que, não raro, lida com litígios que envolvem prestações pecuniárias que se destinam à sobrevivência – ou pelo menos de um viver menos indigno – de pessoas.” (MAIOR, 2009, p. 95). 3.3.8 Irreversibilidade dos efeitos da Antecipação de Tutela O perigo de irreversibilidade do provimento antecipado é causa obstativa da concessão da antecipação da tutela (artigo 273, parágrafo 2º, para parte da doutrina, requisito negativo da antecipação de tutela), devendo o juiz, discricionariamente, analisar o caso, levando em consideração os princípios da razoabilidade e efetividade processual. A irreversibilidade não trata, especificamente, da tutela, mas sim dos efeitos que a concessão pode trazer à parte ex adversa. A desautorização circunscreve-se às consequências claramente irreversíveis. A irreversibilidade não é óbice intransponível, até mesmo pela previsão do artigo 811 do CPC, em que o requerente da medida responde pelos prejuízos causados à parte demandada. Ressalta-se que essa responsabilidade é independente da prova de culpa. Acredita-se que somente as hipóteses dos incisos I e IV, desse artigo, são aplicáveis ao Processo do Trabalho, respectivamente, nos casos de sentença desfavorável, ao final e; nas hipóteses de acolhimento, pelo juiz, frente à defesa, de prescrição ou decadência do direito do réu. O perigo de irreversibilidade do provimento antecipatório deve ser visto com cuidado. Esse requisito, quando do deferimento de uma antecipação de tutela, que autorize a imediata reintegração do dirigente sindical, que foi dispensado sem justa causa, conforme o artigo 659, X, da CLT, é de difícil comprovação. Como bem decidiu Alice Monteiro de Barros, citando Estevão Mallet: Logo, se é bastante provável que exista o direito alegado pelo demandante - pois do contrário o pedido de antecipação não teria cabimento - não se compreende como deva sacrificá-lo para preservar um direito sobre cuja existência não há o mesmo juízo de probabilidade. É intuitivo que o provável prefere ao improvável" (Estevão Mallet. Antecipação da Tutela no Processo do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1999, p. 107). Logo, o simples ajuizamento de ação rescisória buscando a desconstituição da decisão, que reconheceu a garantia de emprego do trabalhador, em ação de consignação de pagamento ajuizada pela demandada, não configura o perigo de irreversibilidade do provimento antecipado, previsto no parágrafo 2º do art. 273 do CPC. (MINAS GERAIS, 2009). (Grifou-se). 160 Jorge Luiz Souto Maior (2009) assevera que o perigo da irreversibilidade não pode ser visto sob o prisma puramente econômico, afirmando que, a materialização desse requisito “sem a devida aplicação racional, poderia significar, concretamente, que somente os ricos teriam direito ao instituto da antecipação de tutela, o que se apresenta, amplamente inconstitucional, já que fere o princípio da isonomia” (MAIOR, 2009, p. 97). Em uma primeira leitura, acerca do dito parágrafo, poder-se-ia entender que o juiz estaria proibido de conceder a tutela antecipada quando puder causar prejuízo irreversível ao réu. No entanto, o direito que o autor tem que provar é de ordem razoável (direito provável). “Não há como não admitir a concessão dessa tutela sob o simples argumento de que ela pode trazer um prejuízo irreparável ao réu.” (MARINONI e ARENHARTE, 2008, p. 229). Como apontado no exemplo acima, não se pode sacrificar o direito provável diante do argumento de probabilidade de prejuízo irreparável ao “direito improvável” do demandado, como excele Marinoni e Arenharte (2008). Em favor dessa assertiva, fundamenta José Roberto Bedaque (1998) que o direito constitucional à adequada tutela jurisdicional estaria sendo negado frente a não concessão, pelo magistrado, apenas pelo argumento de risco de prejuízo irreparável, primordialmente, em se tratando de Direito do Trabalho. É necessário sopesar, como ensina Souto Maior (2009) o dano da não concessão da tutela ou o dano de não se poder reverter os efeitos da tutela antecipatória concedida. 3.4 A efetividade da Tutela Antecipada – Técnicas legais que permitem a eficácia desse instrumento Na busca pela efetividade desse instrumento, ora em apreço, a jurisprudência e a doutrina admitem a concessão dessa proteção antes da ouvidoria do réu (inaudita altera pars), quando esse ato puder comprometer a efetividade do direito, postergando o contraditório, como antes afirmado. No parágrafo 3º, do artigo 273, da norma processual civil, o legislador apontou certas peculiaridades para a efetivação do provimento antecipado, sendo observadas as normas, no que couber, conforme a sua natureza dos artigos 588, 461, parágrafos 4º e 5º, e 461-A. O artigo 588 do mesmo diploma foi revogado pela Lei nº 11.232/2005 (normas que expunham acerca da execução provisória realizada aos moldes da definitiva). Essas normas são plenamente aplicáveis à tutela antecipada. O artigo 461 desse codex teve sua redação alterada em 1994, pela Lei nº 8.952. Essa nova redação foi um marco no Direito Processual Brasileiro. Nos provimentos que tenham 161 por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o magistrado deferirá a tutela específica da obrigação ou, em caso de procedência do pedido, definirá providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. Consoante ao exposto no parágrafo 4º, da Lei Processual Civil, é facultado ao juiz, de ofício, impor multa diária, ao réu, antes ou após a prolação da sentença, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito. Na hipótese de o demandante judicial pleitear, em sede de tutela antecipada, a entrega de coisa, é cabível, ao juiz, conceder tutela específica, fixando prazo suficiente para a execução da obrigação (disposição do artigo 461-A, caput). A tutela pode ser concedida na própria sentença, ou após a mesma. No caso do artigo 273, II, do CPC, a medida pode ser concedida posteriormente à apresentação da defesa (OJ 68 da SDI-II, TST). A antecipação pode ser concedida na sentença, por força do artigo 520, inciso VII, do CPC. No Processo do Trabalho, essa última assertiva não gera dúvidas, pois o Recurso Ordinário não tem efeito suspensivo (Súmula 414 do TST). Ressalta-se que não existe momento preclusivo para a concessão da medida antecipatória, podendo ser outorgada em grau de recurso, frente ao abuso do direito de recorrer. A decisão que aprecia o pleito tutelar tem natureza interlocutória, segundo a doutrina laboral. Para o requerimento da tutela antecipada não existem formalidades especificadas em norma, podendo ser, até mesmo, requerida oralmente em audiência. Quando o pedido for incontroverso (admitido ou não contestado pelo réu – hipótese do artigo 273, parágrafo 6º do CPC), a tutela antecipada poderá ser concedida e terá caráter definitivo. As técnicas para a efetivação da tutela antecipada, extraídas do dito artigo são: a) do reconhecimento parcial ou da não contestação; b) o julgamento antecipado de um ou mais pedidos cumulados, ou de parcela deles, realizados pelo demandante. No primeiro caso, supondo que o pedido abarque um valor pecuniário mais juros, e que a parte conteste apenas os juros, existirá o reconhecimento parcial da dívida. Na segunda hipótese (do item “a”), o réu não contesta, ou o faz de forma imprecisa, os fatos alegados pelo autor (conforme a regra do artigo 302 do CPC). No caso de imprecisão da defesa, não é possível a averiguação real da vontade impugnatória dos pedidos. O direito posto em juízo, diante de pedidos considerados como incontroversos, não pode ser procrastinado, admitindo-se a antecipação de tutela da parte incontroversa. Ressalta-se que na CLT, acerca da parte incontroversa das verbas trabalhistas (objeto de pedido inicial), está exposto que o empregador tem que efetuar o pagamento das mesmas, de pronto, à data do primeiro comparecimento à Justiça do Trabalho, sob pena de o 162 pagamento ser acrescido de multa de cinquenta por cento (artigo 467 da CLT). Sobre essas verbas, o pedido de antecipação não necessita de ser realizado, pois essa medida, também de caráter satisfativo e antecipatório é exclusiva do Processo Laboral. No entanto, não pode ser confundida com a técnica da tutela antecipada prevista no artigo 273 do CPC, e aplicável ao Processo do Trabalho, em outros casos. No que é pertinente, às verbas rescisórias, objeto de controvérsia, nada impede que o empregado peça a tutela antecipada acerca desses valores, quando as mesmas forem evidentes. Nesse caso, o juiz está munido de instrumentos processuais podendo impor pena pecuniária diária pelo inadimplemento. Frente aos provimentos de natureza mandamental, obrigações de fazer e não fazer, além do pagamento da dita multa, poderá, o empregador, incorrer no crime de desobediência. Na hipótese de acidente do trabalho, caso os requisitos da responsabilização civil tenham sido cumpridos (através da prova documental) e havendo contestação, porém infundada, não há razão, constitucionalmente assegurada, para não se deferir, pelo menos, a antecipação acerca dos danos de ordem emergente. Não raro, para se aferirem os lucros cessantes é necessária perícia, não cabendo, então, via de regra, o adiantamento da tutela. A tutela acerca dos pedidos incontroversos é exauriente, não podendo ser concedida, caso haja necessidade de dilação probatória. Essa tutela adquire estabilidade, sendo incabível a sua modificação ou revogação ao final do processo. Em sede do Tribunal Regional, o magistrado pode conceder tutela antecipada, quando o Recurso Ordinário tiver intenção meramente protelatória, liberando o valor do crédito do reclamante, pelo menos, quando for o caso, no montante do depósito recursal. 164 Ressalta-se ainda que, se em nome da economia processual, a lei permite a cumulação de pedidos. Seria irrazoável exigir que a parte demandante tivesse que esperar o processo de conhecimento de todos os pedidos, para se ver satisfeita frente aos incontroversos ou um direito que já se encontra pronto para julgamento. Diante de uma situação de urgência, não deve, o magistrado, ater-se a discussões doutrinárias vazias. Como excele José Roberto dos Santos Bedaque (2003, p. 290) “Questões meramente formais não podem obstar a realização de valores constitucionalmente garantidos”. Notadamente, a tutela antecipatória tornou-se remédio contra a ineficácia do sistema, bem como dos danos causados pela morosidade das decisões judiciais, primordialmente, após a Emenda Constitucional 45/2002. Nessa emenda, o direito fundamental à duração razoável 164 Sobre a possibilidade de requerimento de tutela antecipada em tribunais, tem-se a posição de Marinoni em: “Antecipação de Tutela”. (MARINONI, 2008). 163 do processo foi constitucionalizado, no ordenamento pátrio, e deve estar à base das motivações de concessão da tutela antecipatória, assim como dos demais meios urgentes de efetivação dos direitos. É notório que não pode haver efetividade sem riscos, mas a omissão é muito mais prejudicial do que o agir, em diversos casos. Não existe razão para cautela no uso do meio antecipatório. O Poder Judiciário necessita de ser progressista para não falhar no sentido de privilegiar o lado não hipossuficiente da relação laboral. 3.5 A Impugnação da Medida que aprecia a Tutela Antecipada no Processo do Trabalho No Processo do Trabalho, sabe-se que, via de regra, as decisões interlocutórias não são passíveis de recurso, de imediato (893 da CLT). A concessão de tutela antecipada não constitui decisão definitiva, não cabendo, dessa feita, a interposição de Recurso Ordinário. Admite-se a interposição de mandado de segurança, caso estejam presentes os requisitos desse remédio constitucional, e, caso a concessão da tutela cause dano irreparável à parte, ou seja, concedida ou negada de forma abusiva. A possibilidade de interposição do mandado de segurança deve ser analisada com cautela. No TST, já se decidiu que direito líquido e certo não é ferido quando da concessão de tutela antecipada para reintegração de empregado, resguardado por estabilidade provisória, decorrente de lei ou diploma coletiva (OJ 64 da SDI-II). Nesse sentido o seguinte julgado: (BRASIL, 2011). A possibilidade de impetração de mandado de segurança para a concessão ou não está assente na doutrina. Souto Maior (2009) pondera que, quando se antecipa ou não uma tutela, não se está agindo com abuso de autoridade ou desvio de poder. A utilização do mandado de segurança, com essa finalidade, agride o parágrafo 1º do artigo 893 da CLT. Além disso, esse mesmo autor aponta que a decisão que concede ou denega a antecipatória não pode ser enquadrada como mera decisão interlocutória, e que o ideal seria que tais decisões fossem, de forma imediata, revisadas. 165 Conforme entendimento sumulado pela Suprema Corte Trabalhista, a antecipação da tutela, concedida na sentença, pode ser impugnada mediante recurso ordinário, não 165 Ressalta-se que a posição apresentada pelo ilustre autor é extremamente interessante, no entanto, minoritária, pois a grande maioria da doutrina laboral informa que a tutela antecipada é decisão interlocutória e, de imediato, não pode ser objeto de recurso. 164 comportando mandado de segurança. 166 Sobrevindo sentença, nos autos originários, o mandado de segurança (utilizado como meio para impugnar a antecipação de tutela) perde seu objeto. 3.6 Execução da Tutela Antecipada no Processo do Trabalho O provimento antecipado, quando devidamente concedido pelo judiciário, de nada adiantaria se não pudesse, de pronto, ser executado. Lembrando-se de que a tutela tem caráter satisfativo, o demandante não pode esperar, sem grave dano, a efetivação do direito de crédito. A utilização da fase executória, em face da concessão da antecipação da tutela, farse-á necessária, no caso da obrigação de pagar, já que não se pode apenar o empregador com prisão. A execução é realizada nos autos da própria ação de conhecimento. As regras que regem a execução da medida antecipatória concernem às mesmas apresentadas no artigo 475-O, do CPC (execução provisória). Esse entendimento não é assente na doutrina, inclusive, certos estudiosos acreditam na possibilidade de execução definitiva 167. No que se refere ao Processo do Trabalho, na execução provisória, não há necessidade de caução, frente ao levantamento de depósito em dinheiro, e à prática de atos que impliquem na alienação de propriedade. A exigência peremptória da caução pode inviabilizar, por completo, em muitos casos, a efetividade da tutela antecipada. “O processo não pode ser visto como instrumento de obstrução da realização de justiça” (MAIOR, 2009, p. 90) Na seara comum, essa caução é arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos. Acredita-se que a execução da tutela antecipada não pode parar na penhora, nesse mesmo sentido excele Mauro Schivi (2008). 3.7 Tutela Antecipada das Obrigações de Fazer, Não Fazer e Dar no Processo do Trabalho No artigo 461 do CPC, está prevista a concessão, pelo juiz, da tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer. Sob a égide desse comando legal, o magistrado pode ordenar à parte a prática ou abstenção de um ato. Lembrando que descumprir determinação judicial 166 167 Inteligência da Súmula 414 do TST (BRASIL, 2005). Nesse sentido Jorge Luiz Souto Maior (2009). 165 configura crime de desobediência, tipificado no artigo 340 do Código Penal Pátrio. A concessão da tutela é realizada através de liminar (artigo 461 parágrafo 3º), que indica o momento em que a decisão é proferida. No Processo do Trabalho, existem hipóteses legais de concessão de liminar, impondo obrigação de fazer: artigo 659, incisos IX e X da CLT. No primeiro caso, a liminar visa impedir a transferência abusiva do empregado, de seu local de labor. A transferência será assim considerada quando: não houver a anuência do empregado ou estiver sendo realizada para local diverso do estabelecido no contrato. É incabível se falar em dano irreparável ao empregador, quando da determinação de reintegração do empregado, uma vez que esse trabalhará (haverá dispêndio de energia/tempo em prol daquele). Em outras palavras, quem emprega usufruirá a prestação de serviços, mesmo que tenha que lhe pagar salários. 168 Consentâneo à tutela antecipada, frente às obrigações de entrega de coisas, o artigo 461 do CPC deve ser analisado, conjuntamente ao artigo 769 da CLT, para a sua aplicabilidade no Processo do Trabalho. Como exemplos, dessa disposição, têm-se as tutelas concedidas para a entrega de CTPS, que está em posse do empregador ou, até mesmo, os pertences do empregado. 3.8 Medidas Antecipatórias de Caráter Satisfativo Com a nova redação, conferida aos artigos 273 e 461 do Código de Processo Civil, através da Lei nº 10.444 de 2002, o legislador inseriu, na seara processualística do ordenamento brasileiro, a tutela antecipatória de caráter satisfativo (tutela satisfativa). Satisfatividade não se confunde com definitividade, na medida em que: para a definição de um processo, é necessária a existência de fase cognitiva exauriente, dispensandose a ação principal (MARINONI, 2008). Exemplificadamente, no âmbito do direito do trabalho, tem-se a reintegração do empregado, ao emprego, quando dispensado sem justa causa (hipótese prevista no artigo 659 da CLT). Nesse caso, se restabelece a cláusula contratual, suspendendo a transferência. Outros exemplos de tutela antecipada no Direito Processual do Trabalho concernem às estabilidades provisórias, tais como: a reintegração da gestante (ADCT, artigo 10, II, b); do 168 Este entendimento encontra-se uniformizado pelo TST: OJs 64 (BRASIL, 2005) e 114 da SDI-II (BRASIL, 2005). 166 cipeiro (ADCT, artigo 10, II, a) e o representante dos trabalhadores no Conselho Curador do FGTS (Lei nº 8.036/91). O encargo frente à concessão de uma tutela de caráter satisfativo, a antecipar os efeitos meritórios (antes de amplo debate e instrução do feito), é denso. Esse motivo revela a importância da existência e rigidez, na prática, dos requisitos legalmente positivados. A tutela antecipatória elimina de per si o ilícito e em outras palavras, a medida de urgência pode ter caráter satisfativo, exatamente, porque extingue, de pronto, a ilicitude cometida. A ação que responde à parte, antecipando-lhe o provimento final, é bastante em si, é autônoma, ou seja, é satisfativa, dispensando uma ação futura chamada de “principal”. 3.9 Tutela Inibitória e sua aplicação no Processo do Trabalho Brasileiro A tutela inibitória é instrumento de proteção atípico contra um ilícito, enquanto ato contrário ao direito. A ameaça da prática de um ilícito é o pressuposto único dessa tutela. Seguindo a linha de raciocínio de Sergio Cruz Arenhart (2003, p. 292.), a “tutela inibitória é tutela satisfativa e definitiva, no sentido de ser capaz, por si só, de atender às necessidades das partes (e do próprio Estado) em lidar com o conflito de interesses e corresponder aos escopos da jurisdição”. Esse mesmo autor completa que a tutela em comento é “forma de tutela de urgência para lidar com o ilícito premente, é a antecipação dos efeitos do provimento final” (ARENHART, p. 295, 2003), sendo somente “por meio da antecipação da tutela que se pode obter o ideal enfrentamento da tutela urgente em ação inibitória” (ARENHART, p. 296, 2003). A tutela, em estudo, tem suporte jurídico na Lei Maior, especificamente, no artigo 5º inciso XXXV, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 2011), além do argumento da necessidade de efetividade da tutela jurisdicional. No Direito do Trabalho, a proteção dos direitos individuais necessita, sobremaneira, do mecanismo inibitório (que evite a agressão ao direito do mais fraco, na relação laboral), sendo ineficiente, em um Estado Democrático, a existência apenas do meio reparatório. Ademais, com a ação inibitória, o que se “vislumbra é a probabilidade de que o ilícito não venha a ocorrer” (MAIOR, 2009, p. 109), diferentemente da responsabilização civilista, calcada no artigo 927, e que, quem cometer o ato ilícito fica obrigado a reparar o dano causado. 167 Não admitir a necessidade de existência da tutela inibitória seria o mesmo que dizer que as normas, por si só, são cumpridas de forma espontânea. É o que se infere da decisão da desembargadora Dalila Andrade, do Tribunal Regional da Bahia 169 , quando afirmou que a tutela inibitória não pressupõe o dano ou a culpa, limita-se a apenas à prova da probabilidade da prática de um ilícito, sua repetição ou continuação. O direito à proteção inibitória surge quando da ameaça de violação de um direito. O autor não necessita provar, nessa ação, a probabilidade de dano, muito menos culpa ou dolo do réu. “A tutela inibitória deriva do direito material, enquanto a ação inibitória está ancorada no direito fundamental de ação” (MARINONI; ARENHART, p. 75, 2008). A tutela, ora em comento, é específica, dentre as mais importantes, para não falar a mais respeitável e progressista, pois está voltada para impedir a violação de um direito, de forma antecipada. Difere-se daquela de remoção do ilícito, pois, essa objetiva eliminar os efeitos ocorridos, após a efetiva prática de um ato contrário ao direito. A tutela inibitória tem o caráter preventivo, pois pode impedir a prática, repetição ou continuação de um ilícito, bastando, para tanto, a probabilidade de ocorrência do mesmo. Dessa feita, não é necessário que haja um dano, esse requisito é prescindível. A tutela inibitória é genuinamente preventiva e de caráter satisfativo, mas não se confunde com a possibilidade da condenação para o futuro (essa não é tutela inibitória, esses dois institutos possuem funções distintas). Segundo os moldes conceituais traçados por Proto Pisani e Chiovenda, a condenação para o futuro consiste em uma condenação anterior à lesão ao direito. Essa condenação baseia-se na suposição legítima da probabilidade de violação futura do direito, havendo a criação de um título executivo, em que, a execução só seria intentada se houvesse o inadimplemento da obrigação ou a violação do direito. A exemplo dessa possibilidade no ordenamento brasileiro, tem-se o artigo 290 do CPC, cuja redação dispõe: [...] quando a obrigação consistir em prestações periódicas, considerar-se-ão elas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor; se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las, a sentença as incluirá na condenação, enquanto durar a obrigação (BRASIL, 1973). Chiovenda demonstrou que as principais vantagens da condenação para o futuro residiriam: 169 TRT 5ª R., Dalila Andrade, Processo 0102100-71.2008.5.05.0492 RO, 05/05/2009 (NAHIA, 2009). 168 i) na necessidade de prevenir o dano que decorreria da falta de um título executório no momento em que a prestação será devida; ii) na conveniência de evitar processos reiterados para conseguir o que é devido periodicamente (cota de aluguel, de alimentos, de juros, de rendas), uma vez que haja razão para supor que esses processos se tornariam, de qualquer forma, necessários: como quando o devedor se mostra moroso no pagamento de algumas cotas. (MARINONI; ARENHAR, p.40, 2008) Alguns exemplos de aplicabilidade no Direito do Trabalho da tutela inibitória são demonstrados por Schiavi (2008): frente práticas às anti-sindicais, que atentam contra a liberdade sindical; atos discriminatórios na relação de emprego; as cláusulas contratuais abusivas e; no interdito proibitório em caso de greve (932 do CPC). A tutela de inibição encontra suporte no artigo 461 do CPC, e se efetiva através da ação inibitória (ação de conhecimento de cunho condenatório). A natureza desse procedimento é mandamental e independente de ação de execução, para a sua efetivação. Para que o demandado tenha, provisoriamente, e de forma reversível, seu direito garantido, o juiz concede uma liminar, que significa uma manifestação do magistrado a ordenar o demandado a fazer ou deixar de fazer algo, antes da citação do réu ou após a justificação, em que o réu já foi citado, mas o contraditório, ainda, não está instaurado no processo. Notadamente, ao se realizar uma pesquisa jurisprudencial, com relação à tutela inibitória, no Processo do Trabalho, notou-se que as áreas com um maior número de demandas, concernentes a evitar a ocorrência de um ilícito ou a repetição desse, são as de: medicina, saúde, higiene e segurança no ambiente laboral. Adamovich explicita o porquê dessa questão: [...] as obrigações de prestar fato ou abster-se dele em Direito do Trabalho, em boa medida, dizem respeito às matérias de Medicina e Segurança do Trabalho, que envolvem especiais cuidados com a pessoa do empregado, assumindo a sua sistemática violação pelo empregador gravidade que deve merecer atenção imediata e redobrada das autoridades, encarregadas de conhecer daquelas matérias. (ADAMOVICH, 2000, p. 226). Essa constatação prova que são necessárias mudanças na efetividade desse poderoso instrumento processual de efetivação dos direitos sociais. Inexiste impedimento legal, acerca da aplicação desse instrumental em diversas outras hipóteses. Na defesa dos direitos sociais dos portadores de necessidades especiais, é cabível que o trabalhador, o sindicato ou ministério público, ajuíze uma ação apontando que não houve, em determinada empresa, o devido cumprimento das cotas. Inicialmente, não há prejuízos para as partes, no entanto, a 169 condenação para o futuro evitará que danos ocorram com a imposição, para a empresa, em contratar pessoas portadoras de deficiência, nos termos legais 170. É oportuna ação inibitória, quando da inobservância de uma empresa, do número de aprendizes a serem contratados, caso esse, averiguado e julgado no regional do Paraná (TRTPR, Edmilson Antônio de Lima, 05871-2009-660-09-00-0-ACO-02282-2011, 25-01-2011). Trata-se da imposição judicial à empresa de obrigação de fazer, qual seja: a observância ininterrupta das normas trabalhistas, in casu, do artigo 429 do diploma celetista. A tutela inibitória é meio eficaz para proteger a pretensão dos obreiros, que objetivem o impedimento do uso do instituto da terceirização da mão de obra, de forma abusiva e lesiva aos trabalhadores. Nesse caso, o autor terá que fazer prova para demonstrar ao juiz os elementos suficientes que evidenciam a probabilidade de que a empresa venha a continuar a prática abusiva (Sergio Murilo Rodriguez Lemos, TRT-PR-00800-2009-662-0900-3-ACO-18710-2010, 18-06-2010). Lembrando apenas que, a terceirização é uma das formas flexibilizatórias da normatividade constitucional trabalhista mais comum, nos tempos modernos. A terceirização consiste em uma relação triangular entre trabalhador, empresa prestadora de serviços terceirizados e a empresa cliente (tomadora dos serviços). Com essa prática, “fundamentada” na Súmula 331 do TST (cujo título dispõe: “Contratação de Prestação de Serviços. Legalidade”), é cabível, segundo a Suprema Corte Laboral, a não formação de vínculo empregatício, com a empresa tomadora de serviços terceirizados, contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados, ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta (item I) – elementos fáticos jurídicos da relação de emprego. A grande controvérsia circunscreve-se ao conceito e diferenciação de atividade-meio e atividade-fim. Diz-se que a atividade-meio consiste em sendo atividades periféricas à essência da dinâmica empresarial da empresa cliente. A atividade-fim seria aquela relacionada estritamente com a atividade essencial da empresa. Frente a essa lacuna jurídico-doutrinal, as práticas terceirizantes tomaram conta do mercado laboral, e, precarizaram, sobremaneira, os direitos sociais individuais, constitucionalizados. 170 Caso verídico julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina: Processo: Nº 02707-2006-00712-00-3, Juíza Mirna Uliano Bertoldi, 09-07-2009 (SANTA CATINA, 2009). 170 3.9.1 Âmbito de Atuação O âmbito de atuação da tutela inibitória recai sobre os direitos patrimoniais absolutos, relativos e direitos não-disponíveis. Os direitos patrimoniais absolutos tiveram origem na proteção imobiliária, tanto no direito romano, quanto no brasileiro, sendo exemplos, de meios protetivos: a nunciação de obra nova e do interdito proibitório. Notadamente, hoje, são também direitos absolutos os direitos personalíssimos, os direitos individuais fundamentais do homem (incluindo os individuais laborais, objeto de explanação no primeiro capítulo, do presente estudo), os direitos reais e os da família. Pondera Pozzolo: Não obstante à natureza obrigacional do contrato de trabalho (logo não-real), os direitos trabalhistas, a nosso ver, devem ser classificados como absolutos ou receber proteção equivalente aos direitos absolutos, pois são inseridos em nossa Constituição Federal no Capitulo II (dos direitos sociais), do Título II (dos direitos e garantias fundamentais). Destarte, os direitos trabalhistas pertencem aos direitos e garantias fundamentais do homem, como têm natureza alimentar, devem ter proteção até mais elevada que a propriedade imobiliária. (POZZOLO, 2001, p. 83). As normas laborais são de ordem pública e irrenunciáveis, assim foram consideradas pelo legislador brasileiro. A tutela inibitória tende, exatamente, a privilegiar o alargamento do âmbito de aplicação, abrangendo situações outras de direito material. Os direitos patrimoniais relativos pressupõem uma vinculação às pessoas determinadas, que estão conectadas a uma relação obrigacional de ordem jurídica, por exemplo, o direito de crédito. O comportamento dos sujeitos do direito é essencial para a ocorrência dos direitos patrimoniais relativos. Os direitos não patrimoniais não são suscetíveis de estimativa pecuniária, quais sejam: os direitos de família e os direitos da personalidade. Na esfera trabalhista, existem diversos direitos de natureza não-patrimoniais a serem protegidos. O direito à intimidade é um exemplo, inclusive para coibir a vigilância ostensiva e dispensável por meio de câmeras de vigilância; o assedio sexual, o preconceito contra aidéticos, a circulação de “listas negras” de empregados, que pleiteiam seus direitos na Justiça do Trabalho ou que tenham postura sindical ativa e assim por diante. Nesses casos, diante do risco de dano, o empregado deve ajuizar uma ação pleiteando uma obrigação de fazer ou de não fazer, do empregador. Não raro, empresas criam as chamadas “listas negras” de ex-empregados que ingressaram contra a instituição, na Justiça Laboral, visando a retomada dos mesmos no mercado empregatício. Essa é uma prática discriminatória que, pode ensejar tanto a possibilidade de ação inibitória, quanto à de cunho ressarcitório (dano moral coletivo ou 171 individual). Acredita-se que, caso a lista venha a se tornar pública, de per si, geraria danos aos apontados (é o que ocorre frente às anotações desabonadoras na CTPS, quando de sua baixa), não mais ensejando a possibilidade de ação inibitória e sim reparatória, pela prática de ato ilícito discriminatório. No caso da lista não ser divulgada, é cabível a tutela preventiva, a fim de evitar danos futuros e de difícil reparação. 3.9.2 A Importância da Tutela Inibitória para a Efetividade da Tutela dos Direitos A tutela inibitória é de extrema importância para a efetividade da tutela dos direitos não patrimoniais, incluindo, nesse contexto, por exemplo, o direito ao meio ambiente saudável de trabalho e, ainda, os direitos da personalidade e intimidade do trabalhador. É inadmissível que tais direitos sejam tutelados apenas pela técnica ressarcitória, ou seja, após a lesão ao direito. A lesão aos direitos sociais, geralmente, constitui-se frente a uma atividade de natureza continuada ou com a pluralidade de atos, por exemplo, a difusão de notícias que lesam a personalidade. É nítida a importância dessa tutela frente a casos de direito ao invento e à marca. Para a efetividade da tutela jurisdicional, mister a existência de um aparato procedimental específico, fundamentado nos dispositivos no Código de Defesa do Consumidor, artigos 83 e 84. Consoante ao artigo 83, aplicável ao Processo Laboral (em obediência ao comando estabelecido no artigo 769 da CLT), para a defesa dos direitos e interesses, protegidos pelo Código de Defesa do Consumidor (cuja base é similar às normas protetivas laborais: a tutela do hipossuficiente) “são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela” (BRASIL, 1990). A adequada e efetiva tutela somente são concretizadas, via judicial, através do meio processual cabível e apropriado ao caso concreto. Com o perigo da demora da resposta judicial, criaram-se exatamente os meios emergenciais para a obtenção (satisfativa ou não) ou o resguardo de direitos. Para tanto, é necessária a atuação progressista e ativista do magistrado, por exemplo, fixando astreintes, para que o demandado judicialmente cumpra, de pronto, a obrigação que lhe for imposta. É exatamente nesse sentido que a normatividade do consumidor impõe: “Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o Juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.” (BRASIL, 1990). 172 É possível perceber essa mesma linha de conduta em diversas decisões dos Tribunais Regionais brasileiros. Abaixo relacionado, acerca do tema, texto do acórdão de relatoria da desembargadora Flávia Simões Falcão, do Tribunal Regional do Distrito Federal e Tocantins: Ementa: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IRREGULARIDADES CONSTATADAS EM MARMORARIA. DESCUMPRIMENTO DE NORMAS RELATIVAS A SAÚDE E SEGURANÇA DO TRABALHADOR. O art. 7º, XXII, da Constituição Federal preceitua que é direito do trabalhador a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Cabe à empresa, a teor do art. 157 da CLT, fazer cumprir tais normas. Uma vez comprovadas várias irregularidades cometidas pela empresa, mesmo após ter sido notificada para corrigi-las, procede a pretensão constante na ação civil pública, inclusive com aplicação de tutela inibitória. (...) Depreende-se da inicial que o Autor elencou uma série de obrigações de fazer e não fazer que a Ré deveria cumprir, sob pena de multa; esta, inclusive, tem lastro nas disposições do art. 461, § 4º, do CPC. É por meio da tutela inibitória que é possível evitar as irregularidades encontradas. Não postulou o Autor, portanto, apenas aplicação de multa como entendeu o Juízo vestibular, data venia. O pedido na ação civil pública, por força do art. 83 do CDC, aplicado de forma integrada (LACP, art. 21), deve assegurar a adequada e efetiva tutela dos interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Por essa razão, sobretudo para não frustrar a mens legis, o pedido na referida ação poderá ter conteúdo condenatório, constitutivo e/ou declaratório (SÃO PAULO, 2011). Descumprir direitos do trabalho é lesionar direitos humanos. A tutela inibitória, por ser preventiva, é ainda mais eficaz à proteção dos direitos sociais, na medida em que evita (ou pode evitar) danos futuros. O desrespeito aos direitos fundamentais laborais “não pode ser visto como mero inadimplemento contratual” (MAIOR, 2009, p. 108). Esse mesmo estudioso preleciona que o descumprimento de normas laborais é uma ofensa à humanidade e não apenas ao trabalhador individualmente considerado. O ajuizamento de uma ação inibitória requer algumas considerações acerca das condições da ação, para que seja efetivada na prática. O interesse processual da parte reside no justo receio de que um dano possa ocorrer, mesmo que seja de cunho moral (essa é a prova que tem que ser realizada em juízo). A possibilidade jurídica do pedido difere-se do conceito tradicional, já que o pedido e o provimento não estão positivados em uma norma. Nesse sentido Jorge Luiz Souto Maior (2009, p. 110) expõe que “há na ação inibitória uma típica tutela de natureza normativa, ou seja, cria-se a norma de conduta de natureza específica, para que se evite o dano em concreto”. Essa assertiva encontra-se calcada na ação do magistrado em conceder tutela específica de uma obrigação de fazer ou não fazer. Na causa de pedir, é de suma importância a especificação dos fatos, sobre o qual se recai o risco de ocorrência de uma futura lesão, e estabelecer a pretensão específica, considerada para o caso, como eficaz para se evitar o dano. O magistrado, no entanto, não está restrito ao pedido formulado, “podendo julgar de forma extra petita se o autor formular 173 pretensão apenas de natureza ressarcitória e houver maneira eficaz de inibir o dano” (MAIOR, 2009, p. 110). Em verdade, o julgamento não é extra petita, mas sim, a aplicação do princípio da fungibilidade. Acerca da legitimidade da ação que evita a concretização do dano, qualquer cidadão, individualmente, pode defender em juízo o direito de não ser lesionado em seu patrimônio ou moralmente. É mais comum que os entes coletivos proponham a tutela inibitória em ações coletivas (questão essa que será abaixo explicitada). 3.9.3 Fundamento da Tutela Inibitória A exercer a função geral de tutela prevista pela norma constitucional, a Ação Inibitória deve ser atípica. No artigo 5º inciso XXXV, está demonstrado que a “lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1983), essa sinonímia “ameaça a direito” deixa clara a intenção do legislador constituinte de possibilitar a proteção inibitória. Dessa forma, negar essa medida processual frente as ameaças ao direito, que não podem ser tuteladas pela via ressarcitória, é denegar ação concreta à norma constitucional. Não proteger o ilícito, sem o dano, é o mesmo que admitir que as pessoas devam suportar o ilícito, tendo direito, eventualmente, a um ressarcimento pelo futuro dano (MARINONI, 2008). O direito prolatado na Lei Maior, inciso XXXV, do artigo 5º, à adequada tutela jurisdicional é direito que deve ser sempre, obrigatoriamente, previsto em Constituição de um Estado democrático. No Brasil, essa previsão atende ao princípio fundante desse Estado, que é o da Dignidade da Pessoa Humana. Uma pessoa que não tem seu direito previamente tutelado, frente à prática de um ato ilícito, que possivelmente criará um dano, lanceia sua dignidade. Marinoni (2004) expõe que o fundamento da ação inibitória é o próprio direito material. O Estado Democrático exige a necessidade de se admitir uma ação de conhecimento preventiva, frente às várias situações de inviolabilidade de direitos substanciais. Contrariamente a esse entendimento, poder-se-ia afirmar que as normas que proclamam direitos, ou que tutelam bens fundamentais (incluindo os direitos individuais constitucionais trabalhistas), não teriam qualquer significação prática, uma vez que poderiam ser violadas a qualquer momento, restando somente o ressarcimento do dano para o lesionado. 174 3.9.4 Acesso à Justiça (como fundamento da Tutela Inibitória) e Instrumentalidade do Processo A demora no process é um fator intrínseco à realidade jurídica nacional, mas não pode gerar prejuízos às partes com o perecimento do direito. As palavras de Dinamarco (2008) mostram que as decisões devem dar a quem tem o direito, tudo aquilo de direito. Em uma Ação Inibitória, por exemplo, caso o objetivo seja evitar um ato contrário ao ordenamento jurídico, que assim seja proferido, ou seja, não é a busca de uma futura reparação, de imediato. Ensina Cândido Rangel Dinamarco: [...] é indispensável que o sistema esteja preparado para produzir decisões capazes de propiciar a tutela mais ampla possível aos titulares de direitos reconhecidos pelo juiz (e, aqui, é inevitável a superposição do discurso acerca da utilidade e efetividade das decisões, ao da abertura da via de acesso). (DINAMARCO, 2008, p. 352-353). O ideal seria a reprodução precisa, através da decisão judicial, da mesma situação que existiria se a lei não fosse descumprida, ou pelo menos, próximo disso, pois, em outro sentido, a resolução seria meramente paliativa. Nesse sentido, afirma Dinamarco: [...] onde houver uma insatisfação lamentada, uma alegação de direito inobservado, ali terá lugar a atividade jurisdicional e ela há de endereçar-se, sempre que possível, ao mesmíssimo resultado jurídico-material específico pelo qual o direito objetivo material haja manifestado sua preferência. (DINAMARCO, 2008, p. 352-353). A Ação Inibitória, sob a ótica da efetividade do processo, tanto aclamado por Dinamarco (2008), e pela sociedade moderna, constitui uma evolução jurídica no Processo Civil, e, consequentemente, no Processo do Trabalho. A instrumentalidade do processo significa que esse deve estar à disposição da sociedade, para a justa resolução, em tempo razoável, de um litígio, honrando o princípio constitucional processual de maior envergadura: o devido processo legal (que engloba todos os valores constitucionais, voltados para o processo, tais como, o contraditório e ampla defesa). Para tanto, deve haver limitações aos poderes do juiz (na consideração de Dinamarco (2008), dos auxiliares da justiça e até mesmo das partes, devendo o magistrado, quando possível, aplicar penalidades legais para não deixar que o processo torne-se um instrumento de abuso do poder, por exemplo, utilizando-se da condenação à litigância de má-fé. 175 O primeiro passo para o acesso à justiça reside no fato de se eliminar, na prática forense, preconceitos quanto aos chamados “interesses legítimos” e conflitos de pequena monta, ou pequeno valor. Ensina aquele ilustre autor a respeito do acesso à justiça: A garantia do ingresso em juízo (ou o chamado “direito de demandar”) consiste em assegurar às pessoas o acesso ao Poder Judiciário, com suas pretensões e defesas a serem apreciadas, só lhes podendo ser negado a exame em casos perfeitamente definidos em lei (universalização do processo e da jurisdição). [...] O Poder Judiciário, pouco a pouco, vai chegando mais perto do exame do mérito dos atos administrativos, superando a ideia fascista da discricionariedade e a sutil distinção entre direitos subjetivos e interesses legítimos, usadas como escudo para assegurar a imunidade deles à censura jurisdicional. Nessa e em outras medidas, voltadas à universalidade do processo e da jurisdição, reside o primeiro significado da garantia constitucional do controle judiciário e o primeiro passo para o acesso à justiça. (DINAMARCO, 2008, p. 359-360). O acesso à justiça é o escopo de todas as normas infra e constitucionais processuais, de um Estado Democrático de Direito, na busca pela pacificação social. É exatamente por essa razão, que a Ação Inibitória fundamenta-se no artigo 5º, inciso XXXV da Constituição da República, pois o Poder Judiciário, não poderia negar ao demandado uma resposta, frente à possibilidade de ocorrência de um ilícito e, consequente lesão ao direito, ou ainda, a ameaça de repetição desse ilícito. Estaria, assim, esse Poder, contrariando as bases constitucionais que fundamentam o próprio Estado brasileiro. É interessante ressaltar que as tutelas de emergência em geral, nas palavras de Humberto Theodoro Junior, motivam-se em: [...] assegurar a efetividade do provimento definitivo, sem que isso anule o contraditório e ampla defesa. O que se faz é apenas uma protelação do momento do contraditório. As medidas de urgência, para conjurar a situação de perigo, são sempre provisórias e reversíveis e devem durar apenas até o provimento final de mérito. Logo após a medida de urgência, o contraditório estabelece-se e pode, afinal, redundar em manutenção, reforma ou cassação daquilo que emergencialmente se estabeleceu (THEODORO, 2003, p. 254). É importante enfatizar, ainda, que o contraditório não é totalmente protelado, o magistrado deve citar o réu para que se pronuncie a respeito, sempre que possível, antes de decidir acerca da medida de urgência. Essa hipótese é ressalvada no caso expresso do artigo 804 171 do CPC, em que a medida de urgência poderia se tornar ineficaz com a citação do réu. 171 Na redação, está disposto que: “é lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz; caso em que poderá determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória de ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer.” (BRASIL, 1973). 176 3.9.5 O artigo 461 do CPC e 84 do CDC como fonte da Ação Inibitória Consoante ao ordenamento processual civilista, na ação que tenha por objeto o cumprimento de uma obrigação específica (de fazer ou não fazer) o juiz concederá essa tutela ou, se procedente o pedido, decidirá acerca das providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento (artigo 461, do CPC). No parágrafo 3º, desse mesmo diploma normativo, está exposto que, sendo relevante a motivação da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao magistrado, conferir a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. Essa medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, mediante decisão fundamentada. Subsequentemente, no parágrafo quarto, daquele mesmo artigo, está previsto que o juiz poderá, na hipótese do parágrafo terceiro, ou na sentença, impor multa diária (astreintes) ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito. No parágrafo quinto, do artigo 461, daquele diploma processual, está a permissão ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar medida executiva adequada para a proteção do direito alegado pelo demandante, ao final ou antecipadamente. Para a efetividade da tutela inibitória, é cabível a utilização da tutela antecipatória. Ademais, o amplo poder concedido ao juiz, na efetivação da tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, descrito no artigo 461, também é fundamental a concretização dessa tutela. Em casos excepcionais, quando se tem a repetição do ilícito, é possível evitá-la, através de uma medida executiva, ou seja, que independa da vontade do demandado. 3.9.6 O uso distorcido da Ação Cautelar e a Ação Inibitória a partir dos artigos 461 do CPC e 84 do CDC Existem direitos de conteúdos não patrimoniais, que não são, em princípio, passíveis de ressarcimento pecuniário, no caso de violação. Mas, por óbvio, existe a possibilidade de que sejam ameaçados por terceiros. Nesse caso, não resta alternativa, senão procurar o Poder Judiciário, com o fito de se resguardar através de uma tutela preventiva. Diante dessas circunstâncias, não basta invocar o princípio constitucional de acesso à justiça, deve o 177 legislador colocar à disposição da parte, um aparato normativo processual, exatamente para proteger esse mecanismo de prevenção, por exemplo, com meios de execução que possam permitir a obtenção concreta dessa medida, além de um tipo específico de sentença. Por essas razões a proteção preventiva difere-se, em sua essência, da tutela antecipada e da cautelar. Fazendo um comparativo histórico Luiz Guilherme Marinoni pondera: [...] antigamente era utilizada a técnica do procedimento cautelar para a obtenção da tutela preventiva. Hoje, em razão dos instrumentos processuais implantados pelos artigos 84 do Código de Defesa do Consumidor e 461 do Código de Processo Civil, é possível pensar em uma ação de conhecimento com tutela antecipatória e sentença capaz de permitir a tutela preventiva, vale dizer, em uma espécie de ação de conhecimento capaz de conferir a tutela preventiva, não sendo mais necessário o uso distorcido da ação cautelar inominada. (MARINONI, 2008. p. 69). (Grifou-se). A ação de conhecimento, sobre a qual se refere o ilustre doutrinador, é exatamente a Inibitória, que possui essa designação em virtude do seu teor eminentemente preventivo. Está extremamente ligada à ação cautelar (que permite a tutela contra situação de perigo) e a antecipatória, mesmo porque são medidas emergenciais diferenciadas, que não podem ser confundidas. No capítulo três, serão expostos os resultados negativos para a efetividade da tutela de urgência na Itália, frente a essa “confusão” doutrinária e jurisprudencial do tema. Luiz Guilherme Marinoni (2008) assevera que a ação inibitória é autônoma e de cognição exauriente (contrariamente à cautelar, marcada pela instrumentalidade e fundada em uma cognição sumária), não objetivando assegurar um direito controvertido e nem o resultado útil de um processo. Outrora, para proporcionar ao demandante a proteção contra um ilícito, com a tutela inibitória, utilizava-se a “ação cautelar inominada” (ou ação cautelar satisfativa ou autônoma), de forma desvirtuada, pois se dispensava a ação principal. Mas, hoje, o lastro jurídico é o artigo 461, do CPC, ou o 84 do CDC, conforme o caso, e o fundamento, como já dito, é constitucional. Esse tipo de tutela sempre está vinculado ao cumprimento de um não fazer ou de um fazer (o artigo 461, parágrafo 3º, estabelece a antecipação de tutela inibitória). 3.9.7 A Tutela Inibitória e a Questão do Ilícito A principiologia da proteção inibitória é a coibição da prática de um ilícito, sendo de suma importância a completa compreensão desse ato ilícito. A tutela preventiva não é um procedimento simplesmente garantidor de uma obrigação de fazer ou um não-fazer, vai muito além. 178 A doutrina majoritária italiana, especificamente Cristina Rapisarda, explicita que “[...] tutela inibitória prescinde, por sua própria natureza, dos efeitos do ato ou da atividade ilícita, sejam esses danosos ou não”, acrescentando que: “[...] a tutela inibitória nada tem a ver com o dano, mas apenas com o ato contrário ao direito.” (MARINONI, 2008, p. 71). Essa mesma doutrina propõe um conceito de ilícito que seja, eminentemente, independente do fato danoso, porquanto, há ilícito quando há um fato que esteja em contradição com o direito. Nas palavras de Marinoni (2008, p. 72): “O perigo liga-se ao ato contra ius e não ao dano. A tutela inibitória pressupõe a probabilidade de que o ilícito (o ato contrário ao direito) prossiga ou se repita, ou mesmo que venha a ser praticado, se ainda se verificou.” (Grifou-se). Nesse sentido, interpreta-se a inibitória como uma tutela de prevenção, concluindo, assim, que a pessoa que tenha praticado um ato, que seja contrário ao direito, mesmo que não tenha produzido um dano, não pode escusar-se da seara de aplicação do Processo Civil ou do Processo Trabalhista. 3.9.8 Finalidade e Classificação (Espécies) da Ação Inibitória A finalidade da ação inibitória, em regra, é evitar a prática de um ato contrário ao direito (um ato ilícito), a repetição ou continuação do mesmo. Existem autores que admitem o cabimento dessa ação para prevenir tout court o ilícito, ou seja, requerer a tutela para prevenir a violação ao direito, mesmo que nenhuma violação da mesma natureza tenha sido praticada anteriormente. No ordenamento jurídico pátrio, essa última possibilidade encontra fundamentação legal no artigo 12 do Código Civil, em que, concernentes aos Direitos da Personalidade, é cabível, a exigência de cessação da ameaça, ou da lesão, a tais direitos, e a reclamação em perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em Lei. A tutela inibitória pode ser classificada como: a) específica: visa garantir o exercício integral do direito e; b) preventiva (tutela inibitória de fato): estritamente voltada para o futuro, buscando evitar a ocorrência do ilícito e suas eventuais consequências. Notar-se-á o nítido intuito preventivo, e não reparatório (reparação de um dano), da tutela em comento. Eduardo Talamini (2000) explicita esta classificação de forma diferenciada, considerando as tutelas provenientes do artigo 461 do CPC de tutela/poder geral, em contraposição ao que ele denomina de tutela específica, como aquelas previstas no artigo 461, no Livro IV, do mesmo diploma. Interessante jurisprudência do TRT de Minas Gerais resume os preceitos de Marinoni, no que concerne à finalidade da ação inibitória: 179 EMENTA: TUTELA INIBITÓRIA. PREVISÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. DESNECESSIDADE DO DANO. Segundo ensina Luiz Guilherme Marinoni, um dos grandes obstáculos para tutela preventiva encontra-se na própria classificação trinária das sentenças, eis que nenhuma das espécies nominadas (meramente declaratórias, constitutivas e condenatórias) tem a virtude de propiciála. Com efeito, através do conceito de condenação (execução por sub-rogação), esconde-se uma opção pela incoercibilidade do facere, fruto da doutrina desenvolvida com base no Código Napoleônico no sentido de que toda obrigação de fazer ou não fazer resolve-se em perdas e danos. Acrescenta que esses valores liberais impregnaram o sistema clássico de tutela dos direitos, relegando a segundo plano a tutela preventiva, pois a ideia reinante era de que a única tutela contra o ilícito constituía-se na reparação do dano. Atualmente a processualística moderna invoca o direito inconstitucional de acesso à justiça como fundamento jurídico para concessão da tutela inibitória, positivado no artigo 5, XXXV da Constituição Federal. Não obstante, ainda devem ser mencionados os artigos 11 da Lei da Ação Civil Pública e 461 do CPC como dispositivos legais que amparam o pedido de tutela inibitória, restando demonstrado que, além de não existir norma legal que vede a pretensão do autor, há toda uma estrutura normativa que ampara o seu pedido. Assim, não subsistem os argumentos quanto à inexistência de dano para impedir a tutela jurisdicional, pois o que se pretende é exatamente a prevenção do ilícito, potencial e iminente. (MINAS GERAIS, 2003). A tutela inibitória pode, ainda, ser classificada como: positiva, quando o magistrado ordena o demandado a fazer algo (atividade concreta) e; tutela inibitória negativa concernente à abstenção, deixar de fazer algo, ou ainda, à tolerância, deixando que alguém faça algo. Esse “deixar de fazer” (enquanto atuação negativa) não engloba o desfazer algo (previsto nos artigos 642 e 643 do CPC, sob o título: “Da obrigação de Não Fazer”), que não será aqui tratada, pois não pode ser objeto de tutela inibitória. O ordenamento jurídico pátrio autoriza o juiz a impor um “fazer” ou um “não fazer”, desde que, seja adequado à solução do litígio. O magistrado pode conceder um “fazer”, quando o pedido concernir em um “não fazer”, essa técnica contribui para a efetividade processual. Assim, se a empresa não é obrigada a fornecer certos equipamentos de proteção individual, nada impede que o juiz ordene a instalação de determinado equipamento, que contribuirá para a proteção da saúde do trabalhador. Supondo que, nessa hipótese, não exista regra que obrigue a empresa à instalação de certos equipamentos, a imposição do “fazer”, conferido pelo magistrado, nesse ato, pela legislação processual estará calcada nos artigos 84, do CDC, e 461, do CPC. O juiz, para tanto, se valerá da medida mais adequada aplicável ao caso concreto. A tutela inibitória seria, então, negativa, pois não existe uma norma que obrigue um facere. A inibitória positiva calca-se na existência de uma norma de direito substancial. Marinoni adverte que a análise dessa classificação deve ser feita de forma cautelosa, pois: 180 Supor que a ordem para o cumprimento de dever de fazer não constitui tutela inibitória, seria o mesmo que aceitar que a inibitória positiva somente existe quando o direito material não prevê dever positivo, mas apenas dever negativo. É esquecer que o próprio direito material, em alguns casos, possui função preventiva, e que a tutela jurisdicional, destinada à atuação desse direito, não tem como perder o caráter inibitório da norma não observada. (MARINONI, 2004, p. 7). Ter-se-á inibitória positiva, por exemplo, quando se tem o comando para que uma empresa adote medidas preventivas para a melhoria da segurança do trabalho, de forma a impedir a ocorrência de um ato ilícito e consequente lesão ao direito. Pozzolo (2001, p. 107) explicita que tutela negativa, o non facere, é adimplida “pelo devedor pela não realização daquilo que se comprometeu a não executar”, exemplificando, que o “empregado durante as férias não pode ser admitido para trabalhar para outro empregador, ou seja, deve descansar, salvo a hipótese de já possuir dois empregos (CLT, art. 138)” (POZZOLO, 2001, p. 107). Com relação ao empregador, um exemplo seria, com relação à obrigação de não fazer: a não exigência da mulher trabalhadora realizar serviços que demandem força muscular superior a 20 (vinte) quilos, para o trabalho contínuo, ou 25 (vinte e cinco) quilos, para o trabalho de natureza ocasional. Classificam-se, ainda, as tutelas inibitórias em contratuais e extracontratuais (POZZOLO, 2001). As obrigações extracontratuais não advêm de um pacto celebrado entre as partes, e sim da lei ou da ocorrência de um ato ilícito. Já as obrigações contratuais advêm de um acordo. Via de regra, as obrigações trabalhistas estão inseridas na lei, especificamente a CLT, a Constituição da República e a Lei Complementar. Para as demais fontes do Direito do Trabalho, com o contrato de trabalho, o regulamento empresarial, os acordos e convenções coletivas e entre outros, é possível que as partes, por via de Ação Inibitória, façam com que o demandando cumpra as obrigações contratuais ou extracontratuais. No direito anglo-americano, para o cumprimento de uma obrigação de origem contratual o meio utilizado é a specific performance (originada da equity). Contra o ilícito extracontratual (torts) tem-se a injunction. Idealizada pela doutrina italiana, existe a diferenciação entre tutela inibitória final, que seria a probabilidade de ocorrência de um ato ilícito, mas sem se cogitar, ainda da existência do dano, e a inibitória provisória, que necessita, para a sua demanda, da probabilidade de dano. Pozzolo (2001, p. 114) preleciona que a tutela inibitória provisória possui natureza de antecipação de tutela, de caráter satisfativo, correspondendo a “uma liminar ou provimento veiculado através de decisão interlocutória, proferida no curso de um processo, como definido 181 no § 2º do art. 162, do CPC; e a tutela inibitória final equivale a uma sentença, definida pelo § 1º do art. 162 do CPC.” Aldo Frignani citado por Pozzolo (2001, p. 117) expõe que: a inibitória final “consiste na verdade em uma sentença de mérito, que se baseia em um juízo ordinário de cognição; define, portanto, a controvérsia surgida, e é idônea a adquirir autoridade de coisa julgada sobre as respectivas razões das partes”. Já em se tratando de tutela inibitória provisória, deverá ser concedida pelo magistrado (decisão interlocutória), quando houver, no mínimo, verossimilhança da alegação e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou, ainda, abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu, aos moldes do artigo 273 do CPC. Fala-se em tutela lato sensu ou mandamental. Ação inibitória tem caráter mandamental, na medida em que o juiz expede um comando de “dar”, “fazer’ ou “não fazer”, podendo, inclusive, impor multa diária. A inibitória com caráter de executiva lato sensu é medida não atuante sobre a vontade e conduta da parte, uma vez que os atos necessários, para satisfação do credor, serão desempenhados por agentes do Poder Judiciário (oficial de justiça, com o auxílio de força policial, quando necessário) ou por terceiros, conforme a determinação do juiz. A exemplificar esse último caso, tem-se a hipótese em que o empregado retém as ferramentas de trabalho, fornecida pelo empregador, e se recusa à devolução. 3.9.9 Requisitos da Ação Inibitória Para que se possa intentar uma ação inibitória, além dos requisitos fundamentais às tutelas de urgência, quais sejam: Fumus boni iures e Periculum in mora, a doutrina, ainda, demonstra que é necessário a explicitação de um desses elementos: a) o perigo da prática de ato contrário ao direito. Para Pozzolo (2001, p. 74) seria: “perigo ou ameaça da prática do antijurídico, do ilícito ou do dano”; a sinonímia perigo significa risco, objetivamente detectado (probabilidade futura), que pode advir de um ato voluntário humano, ou até mesmo de um animal. Não é suficiente que essa probabilidade enraíze-se na mera imaginação (receio) da parte demandante, e sim em fatos concretos indicativos de um provável ato (a ocorrência de efetiva ameaça de lesão a um direito) que possa gerar um dano. b) o perigo de sua repetição ou continuação do ato antijurídico do ilícito ou do dano. Basta a prova da transgressão a um comando jurídico. A repetição e a continuação seriam dois pressupostos distintos. A continuação ocorre no prolongamento, no tempo, dos efeitos do 182 ilícito. Na seara laboral, ocorreria essa continuação, necessitando da proteção inibitória, frente ao trabalho em condições insalubres. A ação inibitória, nesses casos, faz cessar o labor, nessa condição, sendo determinado, pelo juiz, que o empregador forneça os equipamentos de proteção individual ou a adoção de medidas adequadas de ergonomia. Nesse sentido, a tutela inibitória faz cessar a continuação de uma conduta socialmente indesejada, impedindo que maiores danos ocorram, ou até mesmo, impedindo que haja o agravamento das lesões. Já a ameaça de repetição consiste na reprodução de uma conduta já praticada. Nesse caso, a prova para o demandante é de mais fácil obtenção, uma vez que a prática do ato antijurídico anterior pode demonstrar a probabilidade do posterior “não obstante devam ser demonstrados os atos preparatórios ou os motivos para se temer a nova conduta” Pozzolo (2001, p. 98). O autor deve provar o perigo da prática de determinado ato, da continuação ou da repetição do ato contrário ao direito, e que o ato será ou é ilícito. Ademais, basta uma conduta, mesmo que não seja seguida de um evento danoso, assim, o dano não é essencial para a configuração do ato ilícito. O direito (ou o ato contraposto a ele) será em si considerado, deixando de lado, contrariamente à doutrina tradicional, a responsabilização pelo dano (tutela ressarcitória). É um equívoco fazer associações, em se tratando de tutela inibitória, entre o dano e o ilícito. Basta lembrar que a finalidade da tutela inibitória é evitar a ocorrência de um dano futuro, e não repará-lo. Caso o dano já tenha ocorrido, a tutela perde a sua razão de ser e, essa conduta, contrária ao ordenamento jurídico, deverá ser compensada (reintegração patrimonial) em sede de ação ressarcitória ou até mesmo de remoção do ilícito. A culpa ou o dolo também não são elementos que afirmam a possibilidade de tutela inibitória. A questão subjetiva é apenas um critério de inculpação da sanção ressarcitória. 3.9.10 Limites da Tutela Inibitória Os limites da tutela inibitória resumem-se no binômio, principiológico, necessidade e razoabilidade. A necessidade subdivide-se em sub-princípios: o do meio mais idôneo, o princípio da menor restrição possível e o princípio da proporcionalidade. Para se estabelecer limites da proteção inibitória, mister sopesar valores constitucionalmente assegurados, pois, diante de um conflito, entre bens juridicamente tutelados, restringir-se-á a liberdade de alguém, e, por outro lado, será protegido um direito prejudicado. 183 O princípio do meio mais idôneo constitui a realização da medida mais adequada, que pode variar de acordo com o caso prático, por exemplo, frente ao patrimônio do réu, sua personalidade ou a natureza da obrigação. O princípio da menor restrição possível seria a concretização dos meios coercitivos apenas na medida do necessário, sem exageros. O agir humano e sua limitação não deve ultrapassar o necessário para a obtenção do resultado pretendido. O devedor não deve ser coagido a praticar atos que não possam ser realizados, ou que conduzam à ruína pessoal ou moral. O resultado da tutela não pode ser objeto de lesão à dignidade humana que é protegida pela Constituição Federal (art. 1º, inc. III). O princípio da proporcionalidade preleciona que as medidas utilizadas na tutela de um direito devem ser adequadas e não desproporcionais. Via de regra, para se proteger, exemplificadamente, a liberdade sindical, não se pode determinar o fechamento de uma fábrica. Essa noção não é unânime na doutrina e jurisprudência, pois em certos casos mandase “fechar a fábrica” para a proteção dos direitos laborais. O princípio da proporcionalidade relaciona-se à justa medida, ao meio-termo, à moderação nos meios de coerção. No entanto, sendo necessário o fechamento de uma empresa para o bem-estar dos trabalhadores ameaçados em sua integridade física e vida, que assim seja feito. Ao sopesar interesses, a vida sempre virá em primeiro lugar. 3.9.11 A Ação Inibitória que tem por objetivo prevenir tout court o ilícito e a Tutela Inibitória que visa a impedir a sua continuação ou repetição - A questão probatória Quando do cometimento de um antijurídico, a tutela inibitória recairá sobre o perigo da repetição ou continuação desse ato ou a ação ilícita continuada. Assim, não é importante o ilícito que já foi indevidamente praticado, mas sim a probabilidade de que o ato se repita ou continue. A prova desse perigo recai exatamente sobre essa possibilidade. Observar-se-ão exemplos na jurisprudência mineira a respeito do tema: EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA - TUTELA INIBITÓRIA POSSIBILIDADE. A forte resistência da reclamada em implementar as medidas de segurança indicadas pelo Termo de Ajuste de Conduta proposto pelo Ministério Público do Trabalho - objeto do pedido desta ação -, bem assim a caracterização de ação ilícita continuada, justificam o receio do autor de que ela continue a agir ilicitamente, repetindo as irregularidades que violam os direitos indisponíveis dos seus empregados a um ambiente de trabalho saudável e seguro. Assim, basta a probabilidade de repetição do ilícito para que ocorra, com caráter pedagógico e preventivo, a tutela jurisdicional inibitória. (MINAS GERAIS, 2008). (Grifou-se). 184 Nesse último exemplo, a tutela inibitória foi ajuizada objetivando-se evitar fraude nos contratos trabalhistas. O mesmo pode ser aferido na hipótese em que, o empregador, mesmo não dispensando nenhum de seus empregados, começa a dilapidar o patrimônio da empresa. Nesse diapasão, pode o sindicato, ou quaisquer dos empregados, demandarem em juízo a proteção inibidora da dilapidação dos bens que, no futuro, podem vir a ser objeto de execuções, quando da cessação das relações laborais daquele empreendimento. Torna-se de difícil visualização a ocorrência de uma ação inibitória a impedir a ocorrência de um ilícito, primordialmente, no que tange à prova da probabilidade de que esse será cometido. Em princípio, tal prova, na prática, parece ser impossível. Deve-se, para tanto, tentar provar um ato pretérito que aponta para a possibilidade de um fato futuro (que irá gerar um ilícito). Convencido desta verossimilhança, o magistrado irá ordenar que o réu abstenha-se de praticar um ato. Nesse sentido, já se decidiu no regional da Bahia, cuja ementa predispõe: “Tutela Inibitória. Prova. Inexistindo prova da probabilidade do ilícito, não há como vir a ser deferida a tutela inibitória pretendida.” (BAHIA, 2007). Fazendo uma pesquisa a respeito do tema em apreço, ver-se-á o seguinte exemplo, na jurisprudência, em que o ato pretérito não era ilícito, mas caso se perdurasse no tempo, existiriam plausíveis provas de que no futuro ocorreria um ato ilícito: EMENTA: RESCISÃO INDIRETA. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. PODER GERAL DE CAUTELA - Na rescisão indireta do contrato de trabalho, o vínculo empregatício desfaz-se à luz dos mesmos requisitos, tal como se a justa causa tivesse sido alegada pelo empregador, exigindo-se a produção de prova firme e convincente a respeito dos fatos ensejadores da quebra de fidúcia entre as partes. Afastando-se o empregado do serviço, os efeitos da sentença retroagem àquele momento, que, normalmente, coincide com a data do ajuizamento da ação trabalhista. Todavia, se o Autor lança mão da faculdade contida no art. 483, parágrafo 3º, da CLT, e continua prestando serviços, a data da resilição contratual será a do dia seguinte ao do trânsito em julgado da decisão. O juiz pode, em qualquer grau de jurisdição, exercer o seu poder geral de cautela e conceder tutela inibitória, visando à cessação dos atos que deram suporte à rescisão indireta do contrato de trabalho, jornada excessiva de trabalho e veículo em condições inseguras de circulação -, prevendo a incidência de multa em caso de descumprimento, até que se opere o trânsito em julgado da decisão. Com essa medida, coibe-se a prática de atos que colocam em risco a integridade física do empregado, dos passageiros e de toda a coletividade. (MINAS GERAIS, 2006) (Grifou-se). 3.9.12 Atuação do Juiz frente à Tutela Inibitória O magistrado, na concessão ou não de uma tutela inibitória, não está adstrito ao princípio do dispositivo, regente no processo ordinário. Podendo conceder uma sentença de 185 natureza diversa da referida na inicial, ou ordenar que o demandado faça algo, ou deixe de fazê-lo, fora do pedido do autor. Como exemplo dessa assertiva, tem-se o caso em que: a parte, na petição inicial, referiu-se à instalação de filtros na fábrica, mas o juiz, conforme o caso, verificando que o maquinário pode gerar danos ainda mais graves (do que os referendados na peça inaugural), ordena que o equipamento seja trocado. Assim, o magistrado tem o poder de ordenar, ex officio, medidas executivas, quando se deparar com um nítido caso de crime de desobediência (artigo 300 do CP) da parte ré. Dessa forma, a tutela inibitória seria “transformada” em tutela preventiva de natureza executiva, ou ainda, reintegratória, dependendo do caso (MARQUES e BELLINETTI, 2006, p. 75). Nas palavras de Dinamarco: A Reforma do Código de Processo Civil instituiu também um poder geral de antecipação de tutela, pela qual o juiz dispõe de poderes para antecipar no todo ou em parte os efeitos do julgamento final previsível, fundado na probabilidade de existência do direito e na urgência da situação (ou na incontrovérsia quanto a algum dos pedidos cumulados, ou ainda, à malícia do réu que se opõe ao andamento do processo – art. 273, inc. e § 6º). (DINAMARCO, 2008, p. 308). (Grifou-se). Assim, tem o juiz mais liberdade de ação exatamente para garantir o resultado prático do provimento, assegurando a instrumentalidade do processo e eficiência da atuação do judiciário. 3.9.13 A liminar A liminar é direito constitucionalmente assegurado (artigo 5º inciso XXXV), caracterizando-se como um meio de provimento inicial do magistrado. Essa medida, concedida frente às ações inibitórias, são eminentemente satisfativas, por anteciparem os efeitos do próprio mérito. Wagner Giglio explicita ser a dita medida: “provimento inicial, concedida no liminar do ingresso em juízo, e se inspira, obviamente, nos procedimentos do mandado de segurança” (GIGLIO, 1996, P. 884). O instrumento liminar seria o resultado de uma pronunciação com caráter de urgência, além de ser condição primordial para a utilidade e efetividade da sentença. A ação inibitória tem o caráter uno (diferentemente da cautelar), ou seja, é de cognição exauriente. Com relação à eficácia da liminar, essa perdura até o trânsito em julgado da sentença. Quando confirmada pelo julgamento de fundo, os seus efeitos permanecem até o efetivo cumprimento do preceito definido pelo juiz. Os pressupostos necessários para o 186 ajuizamento de uma inibitória são aqueles contidos nos artigos 273 e 461, utilizados de forma analógica. Mister ressaltar que não ocorre preclusão para o ato do juiz em, primeiramente, optar por negar o pedido liminar e, posteriormente, concedê-lo, revogá-lo ou modificá-lo, conforme as peculiaridades do caso concreto. É o que se extrai da disposição prevista nos artigos 273, parágrafo 4º e 461, parágrafo 3º do código processual pátrio. A dita modificação pode se dar até mesmo ex officio pelo juiz, sem o requerimento da parte. No Processo do Trabalho, quando a parte sentir-se lesada (e tiver direito líquido e certo) pode impetrar mandado de segurança para reaver a decisão judicial de concessão, modificação ou supressão da medida. 3.9.13 Meios de Coerção e de Efetividade da Tutela Inibitória / Multa inibitória / Meios Sub-rogatórios / Prisão A tutela inibitória necessita, para não perder a razão de ser prática, de instrumentos hábeis, de coerção do devedor ao cumprimento de sua obrigação. À proteção inibitória aplicase o princípio da primazia jurídica da tutela específica, em outras palavras, a medida preventiva não pode ser objeto de convolação em simples em perdas e danos, a transforma-se em uma tutela ressarcitória. Dessa feita, meios coercitivos devem ser utilizados, ainda em sede de inibitória, para resguardar a efetividade do provimento preventivo. A multa é um dos meios mais eficazes e utilizados para forçar o cumprimento da obrigação. Esse meio é especialmente utilizado frente às obrigações infungíveis, quando o devedor cumpre a obrigação por si mesmo, sem o intermédio de outrem. Através da sentença inibitória, o magistrado pode ordenar o cumprimento de uma obrigação sob pena de Contempt of Court, fixando as chamadas astreintes, bem como o dies a quo e dies ad quem (deve o magistrado fixar o termo inicial e final da multa), sendo que a cobrança será feita com o trânsito em julgado da sentença. Como é cediço, essa multa coercitiva não tem caráter indenizatório, mas sim a função específica de suscitar força à ordem judicial (frente à inobservância da ordem pelo sujeito passivo). Por óbvio, essa multa não busca recompor prejuízos causados, pois, como já dito, a tutela inibitória não visa à reparação de um dano e sim à prática de um ilícito. A astreinte consiste em condições pecuniárias, multa cominatória, impostas pelo magistrado, até mesmo de ofício, ao devedor, comumente diária, mesmo que ainda não exista um dano. E, como bem afirmou Marcelo Pertence, “a finalidade das astreintes é constranger o devedor a adimplir determinada obrigação, garantindo efetividade à tutela jurisdicional, 187 incidindo de forma objetiva enquanto perdurar o descumprimento” (TRT 3ª R. 00980-2005075-03-00-0 AP, 13-09-2011). Lembrando-se ainda que a legitimidade para deferir ou não a multa encontra-se na esfera jurisdicional, ou seja, não está na órbita dispositiva das partes em litígio. Ada Pellegrini Grinover expõe que a multa: “trata-se, isto sim, da chamada execução indireta, caracterizada por atos de pressão psicológica sobre o devedor, para persuadi-lo ao adimplemento da obrigação” (GRINOVER. 1996, p. 256). A aplicação de astreintes, ex officio, não excede aos contornos da lide, porquanto expressamente autorizada no § 4º do art. 461 do CPC 172 . A multa em comento pode ser fixada contra a Fazenda Pública, como vem sendo decidido pelo STJ: Processo REsp 1063902 / SC RECURSO ESPECIAL 2008/0123392-8 Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCÃO (1116) Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 19/08/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 01/09/2008 Ementa PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. MULTA. ART. 461 DO CPC. PROVEITO DA MULTA EM FAVOR DO CREDOR DA OBRIGAÇÃO DESCUMPRIDA. I - É permitido ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a fixação de multa diária cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer, in casu, fornecimento de medicamentos a portador de doença grave. II - O valor referente à multa cominatória, prevista no artigo 461, § 4º, do CPC, deve ser revertido para o credor, independentemente do recebimento de perdas e danos. Precedente: REsp 770.753/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, DJ de 15.03.2007. III - Recurso especial provido. (BRASIL, 2007). Existem critérios acerca da fixação da multa, que devem ser analisados pelo magistrado, quais sejam: a capacidade econômica do demandado (nesse caso, o valor pode ultrapassar a obrigação principal); a aptidão para sua resistência; o comportamento, levando em consideração o grau de culpabilidade; a projeção, no sentido profilático, individual e social da conduta indesejada e; dentre outros fatores peculiares ao caso. Na hipótese de inexistência da possibilidade de fixação das astreintes, a própria ação inibitória perderia a razão de ser, uma vez que o demandado arcaria com a responsabilidade apenas dos danos causados, não se importando com a probabilidade de causá-los, já que não seria penalizado nesse interregno. Pontifica Sérgio Cruz Arenhart, demonstrando a diferença da multa em análise e da indenização (na reparação do dano causado): A indenização decorre do direito material, sendo sanção prevista – pela regra material – para o descumprimento tempestivo da prestação assumida. A sanção pecuniária é sanção processual, decorrente da aplicação de regra processual e agregada à ordem contida no provimento, concebida para não incidir (ao contrário 172 Nesse sentido: TRT 3ª. R, 00956-2009-107-03-00-4 RO. Des. Rel. Jose Murilo de Morais, 08-08-2011. 188 da indenização), pois se espera que a ameaça que dela resulta encoraje o ordenado a cumprir o comando judicial. A multa coersitiva é, nesse sentido, instrumental, pois visa a dar efetividade à tutela (específica), enquanto a indenização é final, pois representa em si a resposta dada pelo Estado ao dano experimentado. Enfim, pode-se dizer que a multa se presta à consecução da tutela do interesse, enquanto a indenização é uma forma de tutela. (ARENHART, 2003, p. 354). Existe a possibilidade de fixação progressiva da multa em epígrafe, ou seja, o aumento dos valores conforme a resistência de cumprimento do demandado 173 . O juiz deve fazer uma análise valorativa do caso, por exemplo, sopesando a saúde versos o patrimônio, quanto maior for o bem tutelado pelo ordenamento jurídico, maior será a multa fixada e, consequentemente, maior a pressa no cumprimento da obrigação. O pagamento da astreinte é desvinculado da obrigação principal e do resultado do provimento final. Dessa forma, o mérito conclusivo pode ser desfavorável ao demandante, mas, mesmo assim, a multa é devida. 174 Manuel Antônio Texeira Filho (1996, p. 43) sobre a matéria expõe: “Se imaginássemos que a multa estaria ligada ao direito material, por certo ela somente poderia ser exigida se a sentença declarasse a existência desse direito [...]”, ou seja, a astreinte é desconexa à ação principal. Em regra, a multa deve ser revertida para o autor, caso venha a ser vencedor na ação. Entretanto, parte da doutrina afirma que, por não possuir caráter indenizatório, a astreinte deveria ser convertida em favor do Estado e não da parte vencedora. Em verdade, a multa tem a função psicológica e profilática (na medida em que é imposta para que um futuro dano não ocorra, por exemplo), quando o devedor souber que as astreintes podem ser revertidas para a parte autora, “seu desafeto”, irá preferir cumprir a obrigação principal, a beneficiar o autor. Ressalta-se ainda que, além desses aspectos apontados por esses estudiosos, o demandado cumprirá a sua obrigação perante o Poder Judiciário, em função da coerção que lhe foi imposta, independentemente, do destino da multa. Existem medidas que podem ser utilizadas para o cumprimento da tutela inibitória, exclusivamente voltadas para obrigações fungíveis, mas que não anulam a possibilidade das demais medidas. Essas são as chamadas medidas sub-rogatórias. Nesse caso, o juiz ordena o cumprimento da obrigação, sem a participação do demandado. 173 Acredita-se que tal medida seja possível mesmo que não esteja expressamente previsto no artigo 461 do CPC e 85 do CDC. O ordenamento constitucional respalda essa assertiva, como exemplos, frente aos comandos do artigo 5º, inciso XXXV e LXXVIII cuja redação, desse último, dispõe: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. O não cumprimento de uma obrigação pode obstar a celeridade e o regular trâmite processual. 174 Esse é o entendimento de Paulo Ricardo Pozzolo, mas existem divergências doutrinárias, por exemplo, Marinoni demonstra que esse ensinamento é ilógico, pois estaria prejudicando o demandado, inocente, apenas em face de um descumprimento judicial. 189 A adoção de medidas sub-rogatórias tem fundamento no parágrafo 5º do artigo 461, do Código de Processo Civil, além do artigo 52, inciso VI, do CDC. Exemplo típico, no Processo do Trabalho, é a anotação da CTPS, pela secretaria de Vara de Trabalho, segundo o preceito estabelecido no art. 39, parágrafo 1º. A possibilidade de prisão do demandado na ação inibitória é uma realidade, mas deve ser analisada com parcimônia. A sanção penal constitui a utima ratio recorrível quando, por várias razões, não for possível a obtenção do cumprimento da obrigação, simplesmente mediante sanções específicas de cunho pecuniário. Para tanto, o descumprimento da obrigação que enseja a prisão, tem que ser absolutamente injustificado. A ordem de cumprimento da obrigação, em sede de ação inibitória, é um mandado judicial, ou seja, é ordem legal. O seu desatendimento constitui crime de desobediência, como por exemplo, o fato de o renitente descumprir a ordem judicial que proíbe empregar menor em atividades consideradas inadequadas, ou ainda, a concessiva de segurança e medicina no trabalho. Aduzem alguns doutrinadores que como fator impeditivo à prisão, presentemente objeto de análise, é a existência do Pacto de São José da Costa Rica, além do artigo 5º inciso LXVII, da Constituição da República, que preveem a impossibilidade de prisão civil por dívida. No entanto, a hipótese aqui da prisão é pelo descumprimento da ordem judicial e não pela dívida (em sentido estrito), propriamente dita. Essa possibilidade encontra reforço no princípio dos poderes inerentes à função do Poder Judiciário (instituição), que deverá ser deferida, como antes dito, somente em casos excepcionais. A prisão em comento possui fundamento, para alguns doutrinadores, no parágrafo 5º do artigo 461, enquanto medida necessária para assegurar a efetividade do processo. Para outros estudiosos o deferimento dessa prisão é um desdobramento do princípio do devido processo legal, constitucionalmente assegurado. Pozzolo (2001) defende que deve ser aplicado, analogicamente, ao caso estudado, o artigo 733, do CPC. José Roberto Freire Pimenta (1997) expõe que o permissivo encontra-se no próprio artigo 461, do CPC, é o que se extrai do acórdão relatado pelo respeitável ministro: EMENTA: HABEAS CORPUS PREVENTIVO. TUTELA ANTECIPADA DASOBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER (ART. 461 DO CPC). COMINAÇÃO DEPRISÃO DO DESTINATÁRIO DO COMANDO SENTENCIAL, EM CASO DE SEUDESCUMPRIMENTO. O novo artigo 461 do CPC, introduzido pela Lei n.8.952/94, veio possibilitar a eficaz e pronta tutela antecipada e definitiva das obrigações de fazer e não fazer, priorizando sua execução específica. Para tanto, autorizou o Julgador a emitir provimento mandamental, podendo determinar, de ofício ou a requerimento da parte, todas as medidas 190 necessárias capazes de assegurar a tutela específica do direito do autor ou obtenção do resultado prático equivalente, inclusive cominando sanções contra a liberdade pessoal do renitente destinatário do comando sentencial. Em tais circunstâncias, a cominação de prisão em flagrante, pelo próprio Juiz que prolatou a sentença, daquele que descumprir a ordem judicial que foi regularmente proferida, de acordo com o devido processo legal, não enseja a concessão de"habeas corpus". O respeito e o acatamento às decisões judiciais é pedra angular do Estado Democrático de Direito. (MINAS GERAIS, 1997). Assevera Marinoni, brilhantemente, acerca da interpretação da norma constitucional: A interpretação, que simplesmente nega o uso da prisão como meio coercitivo, desconsidera os métodos hermenêuticos modernos, os quais são absolutamente necessários quando o que se tem a interpretar é um contexto de grande riqueza e complexidade. Com efeito, não sendo o caso de apenas considerar o texto da norma, como se ela estivesse isolada do contexto, é necessário recorrer ao método hermenêutico-concretizador. (MARINONI, 2004, p. 25 a 26). O artigo 5º, LXVII, CR/88, aponta para dois direitos de ordem fundamental: a efetividade da tutela jurisdicional e o direito de liberdade. A aplicação dessas regras deve ser harmonizada. É extremamente simplista a interpretação de que essa norma veda a prisão, quando o objeto da prestação depender da disposição patrimonial. O maior medo do ser humano é ver-se privado de sua liberdade. Ou seja, essa punição, no Brasil, é a mais grave e funcional. Sem essa possibilidade, em determinados casos, os próprios direitos ficam desprovidos de proteção. A ordem que consagra os direitos, assegurados como invioláveis, assume uma posição retórica dentro do ordenamento jurídico. A hipótese de prisão, ora em comento, revela-se necessária para o efetivo cumprimento das normas constitucionais protetivas do direito social, quando, exauridos outros instrumentos coercitivos, mesmo assim persiste o devedor ao não cumprimento. Assim é cabível extrair elementos possibilitantes da prisão pelo descumprimento de ordem judicial na seara laboral: 1) quando houver o descumprimento de um comando sentencial, injustificado; 2) frente à inadequação das multas as medidas de execução direta (caracterizase como ultima ratio); 3) quando se busca a efetividade de norma constitucional, primordialmente, de caráter alimentar e; 4) quando o devedor tiver plenas condições (inclusive financeiras) de arcar com o cumprimento, no entanto, não o faz por não ser de sua vontade. Na busca pela efetividade da medida inibitória, é cabível, ainda, a cumulação de medidas coercitivas para a obtenção da satisfação daquele que tem razão, a impedir que ocorra a prática, a continuação ou a repetição de uma conduta contrária à lei. Na verdade, 191 recomenda-se que o magistrado assim o faça para que a demanda de urgência tenha uma rápida resposta jurisdicional. 3.9.14 Provimento Executivo lato sensu e/ou mandamental / Ação Inibitória x de Remoção do Ilícito A sentença da ação inibitória tem caráter mandamental, na medida em que o juiz expede um comando de dar, fazer ou não fazer, podendo impor multa diária. Essa sentença, em concomitância, possui caráter de executiva lato sensu, sendo que, caso o demandado não cumpra o comando judicial incorrerá no crime de desobediência, podendo acarretar até mesmo, a privação de sua liberdade. Normalmente, essa ação é de caráter eminentemente mandamental e executivo lato sensu, primeiramente ante a satisfatividade do provimento, não necessitando de fase ou processo de cunho executório. Diferentemente da tutela condenatória, que necessita para a satisfação do credor, da relação processual de execução (sendo buscado no patrimônio do devedor, com a penhora de bens de propriedade do devedor). Na tutela executiva lato sensu, os atos, para a satisfação do credor, são realizados por agentes do Poder Judiciário, ou por terceiros, frente ao comando judicial. Já na tutela mandamental, o comando sentencial ordena que o devedor pratique ou se abstenha de um ato, interferindo, portanto, em sua vontade. Assim sendo, a tutela de natureza inibitória tem por escopo evitar o prosseguimento de um agir ou de uma atividade ilícita e não coibir os efeitos continuados de um ilícito, frente a uma ação já praticada. Caso o infrator já tenha cometido o ato ilícito, basta a remoção dessa situação. 3.9.15 Tutela Inibitória Antecipatória O fumus boni iures é referendado no artigo 461 da Lei Processual Civil, quando alude à relevância do fundamento da demanda. O autor da inibitória, para obter a tutela antecipatória, deverá demonstrar, ainda que sumariamente, o perigo da prática, da continuação ou repetição do ilícito (MARINONI, 2008. p. 90.). Além do mais, o demandante terá que justificar o receio de ineficácia do provimento final, ou seja, de que o ato contrário ao direito será praticado no decorrer do processo de cognição, ou antes, do trânsito em julgado. Assim, se a tutela for concedida ao final, provavelmente o ato ilícito será praticado (ou que será novamente cometido). 192 A tutela inibitória carece da tutela antecipada, para efetivar-se. A respeito dessa necessidade, Fux (1996, p. 361), afirma que: “há obrigações de fazer e de não fazer cujo descumprimento torna um eventual provimento judicial tardio e inoperante, revelando-se de extrema importância prática a tutela antecipada, também nesse campo”. Completando ainda que é exatamente por essa razão que o legislador infraconstitucional incluiu um comando específico “para essas obrigações, mediante a regra genérica do artigo 273 do Código de Processo Civil, aplicável a qualquer processo de conhecimento, independentemente da natureza da obrigação objeto do pedido.” (FUX, 1996, p. 361). Nesse mesmo sentido, tem-se a disposição do parágrafo 3º do artigo 461, do mesmo diploma. É de vital importância que a tutela inibitória possa ter seus efeitos antecipados, pois, por óbvio, a prevenção do antijurídico, do ilícito ou do dano possui caráter de urgência. Lembrando que a tutela antecipada não é uma espécie de ação, mas sim técnica processual de antecipação dos efeitos sentenciais. 3.9.16 Momento de concessão do Provimento Antecipado A urgência de se proteger o direito leva o Estado Democrático a privilegiar o acesso à justiça, em detrimento do contraditório. Ambos os princípios estão enraizados na Constituição da República, o que justifica a concessão de medida liminar antecipatória, antes mesmo da citação do réu. A antecipação de tutela pode ser concedida a qualquer momento dentro do procedimento inibitório. O deferimento da medida liminar antecipatória pode ser concedido initio litis, ou seja, antes de citado o réu (ou inaldita altera parte); mediante a ocorrência de justificação prévia, ou ainda; após a justificação prévia, em que o réu é citado para contraditar. Essa justificação, acima referida, concerne-se a uma audiência, em que o demandado toma ciência, no caso, da ação inibitória, além de poder acompanhar as provas produzidas pelo demandante. O réu não deve produzir provas nessa audiência, pois, o magistrado irá oportunizar sua defesa em momento mais adequado, conferindo, em tempo hábil, a necessária dilação probatória. Existe uma discussão doutrinária do cabimento de o magistrado conceder tutela antecipada inibitória antes da propositura da ação inibitória. Certos estudiosos explicitam que essa possibilidade não se perfaz, em função de que a “antecipação de tutela se dá com relação à tutela final que se pede na petição inicial” (ARENHART, 2003, p. 308). Todavia, é possível 193 essa tutela antecipada inibitória quando o periculum in mora é de tal monta, que nem mesmo existe tempo para a elaboração de uma petição inicial, recolher provas para se juntar nessa peça inaugural ou, ainda, para a formulação dos fatos e do direito de forma pormenorizada. Assim, o autor deve preparar uma petição sintetizada, apenas demonstrando os fatos mais importantes. Determinados autores demonstram que essa possibilidade seria razoável frente a uma cautelar preparatória, cujo processo principal seria a ação inibitória. Mas, para tanto é necessário reconhecer a fungibilidade entre a cautelar preparatória e a antecipação de tutela, fundamentando-se no artigo 273, parágrafo 6º, do CPC. Lembrando que um dos princípios que rege a possibilidade da tutela urgente inibitória é o da proporcionalidade entre os interesses submetidos ao crivo do Poder Judiciário. O juiz deve ater-se aos propósitos do demandante para não correr o risco de ratificar abusos de direito ou privilégios indevidos contra o demandado. Os valores protegidos pelo ordenamento jurídico devem ser sopesados. A tutela liminar não deve ser deferida ensejando uma desproporção entre o interesse e a medida, ou seja, se o prejuízo da parte requerida for demasiadamente maior do que o da demandante. Sérgio Cruz Aranharte propõe a seguinte medida: Isso, porque em juízo de mera plausibilidade, toma particular relevância a dimensão da lesão causada aos direitos em conflito: investigar, pois, se a importância (para o ordenamento jurídico) do interesse do autor for incomensuravelmente superior à do interesse do réu, ou se a dimensão do dano experimentado por aquele for imensamente maior do que o sofrido pelo requerido (caso não fosse concedida a medida), converte-se em perquirição fundamental para a outorga ou não da tutela de urgência. (ARENHARTE, 2003, p. 312). Mister relembrar que o perigo da irreversibilidade do provimento antecipado, previsto no artigo 273 parágrafo 2º, do CPC, é elemento que obsta a concessão de medidas de urgência antecipatórias. Esse perigo corresponde ao fato de uma decisão, antecipatória poder gerar coisa julgada, sob a égide de um procedimento dotado de provisoriedade. É sobre essa questão que recai a proibição supracitada, quando houver o perigo em comento, de natureza dúplice (- ou irreversibilidade recíproca - é possível o perigo de a irreversibilidade estar diante tanto do demandante quanto do demandado), deve o juiz proteger o direito que pareça ser mais verossímil, ou seja, o direito que seja mais provável, que a parte terá sucesso no final do processo. Marinoni (2008, p. 195) dá os seguintes exemplos sobre a possibilidade do perigo de irreversibilidade: “[...] a antecipação da constituição de uma relação de filiação ou antecipação da desconstituição de um casamento”. Os exemplos são oportunos, pois é ilógico 194 pensar que alguém pode estar provisoriamente casado ou solteiro ou ser provisoriamente filho ou não. 3.9.17 A Fungibilidade da Medida Antecipada e a Fungibilidade da Proteção Inibitória O magistrado, sob a égide do poder geral de cautela, pode conceder uma medida de urgência diferente daquela explicitada pelo demandante na inicial, ou seja, o juiz pode não se vincular, de forma taxativa, ao pedido de antecipação e conceder uma medida mais adequada diante do caso concreto, como, por exemplo, concedendo uma tutela negativa, mesmo que tenha sido requerida uma tutela positiva. Essa possibilidade reside na ideia de que a tutela antecipatória é oscilante podendo, ao longo do processo, modificar quantitativa e qualitativamente, além da possibilidade de fatos novos advirem no curso da ação inibitória. Importante mencionar os ensinamentos de Lamy a respeito da nomenclatura acerca da fungibilidade. Não se pode estudar a fungibilidade e a possível flexibilização entre “tutelas” de urgência, já que a tutela de urgência é uma só. É por isso que a fungibilidade do § 7º, do artigo 273 do CPC significa o câmbio de uma técnica pela outra e não de uma tutela por outra. [...] Se a fungibilidade entre as medidas de urgência se tratasse de uma substituição de tutelas jurisdicionais, estar-se-ia trocando um fim por outro e desrespeitando, ao final, o pedido mediato realizado pelo autor da demanda, a quem interessa pouco a forma pela qual a tutela jurisdicional requerida será atingida. (LAMY, 2004, p. 292 e 293). Consoante ao exposto pelo ilustre autor, a “flexibilização” das técnicas de urgência institui a continuação da adaptação do Código de Processo às próprias reformas nele ocorridas, em virtude do sincretismo processual, para abrandar, ou até mesmo, numa perspectiva “jusfundamental”, unir os elementos legais de concessão do instrumento emergencial. A fungibilidade das tutelas de urgência possui, por óbvio, limites. Inicialmente, deve, o magistrado, considerar o binômio razoabilidade e proporcionalidade. E em segundo lugar, o juiz deve observar a efetividade e instrumentalidade da proteção antecipatória e proceder de forma a intervir de forma menos incisiva, ou seja, existe fundada semelhança entre a tutela concedida e a requerida. Pondera Arenhart a respeito: [...] a medida liminar de cunho antecipatório inibitório possui ampla fungibilidade, de modo a permitir-lhe adaptar-se a todas as situações que possam surgir na sequência da outorga da proteção provisória. Porque constitui uma forma de proteção em que é essencial sua aderência à realidade substancial, em que é 195 fundamental interagir com a realidade concreta para que a proteção judicial possa ser a mais efetiva possível. [...] a medida a ser utilizada deve ser aquela capaz de isolar, da melhor forma possível, o efeito negativo do tempo sobre o processo [...] (ARENHART, 2003, p. 317 e 318). A fungibilidade do provimento inibitório reside no fato de o magistrado, respeitando o pedido estatuído na petição inicial, valer-se de elementos mais apropriados para atingir o fim do mecanismo antecipatório. Visando evitar o ilícito ou a reparação dos danos causados, é possível também, a fungibilidade entre a tutela inibitória, a reintegratória e a ressarcitória. Essa assertiva privilegia a instrumentalidade, que é corolário do processo no Brasil. Interessante é o caso trazido por Arenhart: [...] a própria lei determina a fungibilidade subsidiária entre a tutela inibitória e a tutela ressarcitória, autorizando o magistrado a oferecer esta no lugar daquela sempre que se mostrar, no caso concreto, impossível a tutela específica ou o resultado prático equivalente. Assim, se, requerida a tutela inibitória, não for ela concedida em tempo, ou se, mesmo concedida, o réu não se comportar como determinado pela ordem judicial, caberá ao juiz converter a prestação de abstenção (ou a conduta positiva que geraria a inibição do ilícito) em perdas e danos, prosseguindo no processo para a apuração do dever de reparar o prejuízo e do quantum dos danos indenizáveis, oferecendo tutela ressarcitória ainda que o pedido inicial fosse de conteúdo inibitório. (ARENHART, 2003, p. 340). Pozzolo (2001, 119) afirma que a possibilidade de fungibilidade da tutela inibitória reside no princípio da “adaptabilidade do procedimento às necessidades da causa” ou o “princípio da elasticidade”, referente à flexibilidade do modelo procedimental. Bedaque, citado por Pozzolo (2001, p. 119), explicita que: “Não se admite mais o procedimento único, rígido sem possibilidades de adaptação às exigências do caso concreto”. Assim, a fungibilidade permite que o juiz adéque a tutela à nova situação de fato existente. 3.9.18 As demais Tutelas que podem ser prestadas a partir dos artigos 461 do CPC e 84 do CDC A tutela reintegratória (de remoção do ilícito) atua contra um ato contrário ao direito, e prescinde de um dano decorrente de um ato ilícito (elemento subjetivo), mas quando a causa do dano for retirada do mundo jurídico, a tutela ressarcitória perde a razão de ser, por exemplo, quando se interdita um estabelecimento comercial, por ter sido construído em local proibido, salvo se tal atitude tiver dado causa a algum dano. Marinoni (2008) exemplifica explicitando que a proteção que ordena a interdição de uma fábrica, o desmoronamento de 196 uma obra ou a busca e apreensão de produtos que estão sendo comercializados em confronto com as normas específicas, “não se destina a reparar qualquer dano, mas simplesmente eliminar uma situação de ilicitude” (MARINONI, 2008, p.91). A tutela, em epígrafe, necessita de um ato contrário ao comando jurídico, mesmo sem o dano, e prescinde do elemento subjetivo. Na tutela ressarcitória, o dano é essencial, sobre o sujeito ou o seu patrimônio, podendo ser determinada, em concreto, para que se possa atribuir a responsabilidade, fundada na imputabilidade (na correlação entre um sujeito ativo – elemento subjetivo baseado no dolo ou na culpa – e um dano). Nessa tutela, é necessário restabelecer a situação pretérita, caso o dano não tivesse ocorrido. A tutela ressarcitória na forma específica é uma tutela que não corresponde monetariamente à lesão sofrida pelo demandante. A compensação pode advir através de uma atividade, dependendo do caso concreto, com o intuito de extirpar as consequências do fato danoso. Na ressarcitória na forma específica, usualmente, a parte atua com um fazer; na sentença, é de praxe que se estipule uma multa, ou que um terceiro execute o ato, sendo que os encargos ficam por conta do demandado. Pondera Marinoni a respeito: [...] no caso de direitos difusos (direito ao meio ambiente sadio, por exemplo) são frequentes as ordens de fazer objetivando o ressarcimento na forma específica. Portanto, as próprias necessidades sociais, concretizadas na prática forense, já impuseram o uso do artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor para que seja visualizado o ressarcimento na forma específica. (MARINONI, 2008, p. 95). A tutela do adimplemento da obrigação na forma específica está vinculada àquela advinda de uma obrigação contratual, envolta à necessidade de satisfação do crédito, não se atrelando a um dano. Essa tutela se diferencia da ressarcitória em virtude de advir da ocorrência de um dano, em função do inadimplemento de uma obrigação. É, ainda, diferente também da tutela contra o ilícito, já que inadimplemento e ilícito são questões diferentes. O magistrado pode ordenar que o obrigado haja conforme o contrato, além de poder se utilizar da multa (do artigo 461), possibilitando a tutela específica da obrigação inadimplida. 3.9.19 Quando a Tutela Inibitória recai sobre a Fazenda Pública O Estado Democrático de Direito tem o interesse público (primário), na busca pelo bem estar da coletividade, no âmago social. O grande problema, que vem ocorrendo na doutrina e nas justificativas dos procuradores do Estado é confundir interesse público com 197 interesse privado, ou enlear com o chamado interesse público secundário, que diz respeito, por exemplo, às questões patrimoniais e receitas daquele. Quando uma tutela inibitória (ou de qualquer ordem) recai sobre a Fazenda Pública, notar-se-á que privilégios desnecessários lhes são atribuídos, que não visam ao interesse social, mas sim a um interesse egoístico do Estado. Essa assertiva cai por terra quando: sustenta-se que o interesse público sobressai-se frente ao interesse privado. Argumento esse concernente a resquícios do Estado autoritário, por exemplo, quando o interesse de toda nação está calcado em um caso particular, regido por normas de ordem pública, não se deve prevalecer o “interesse público secundário”, pois haveria um confronto entre dois princípios de mesma nomenclatura (interesse público primário versos o secundário). Ou, ainda, quando se trata de valores contrapostos na concessão de uma tutela, o Estado não tem uma presunção absoluta de possuir valores superiores que os dos indivíduos. As questões concretas, valorativas, carecem sempre de argumentos de ordem constitucional devendo, o princípio constitucional da isonomia, ser sempre elevado. Os juristas devem tentar ao máximo, nas palavras de Marques e Bellinetti (2006, p. 81-82) “conciliar as técnicas do raciocínio jurídico com a justiça ou, ao menos, a aceitabilidade social da decisão”, completando, que “todo formalismo excessivo deve ser eliminado, os impedimentos e obstáculos à concessão da tutela jurisdicional justa, adequada e tempestiva devem ser de pronto rechaçados, sob a pecha de inconstitucionalidade [...]” (MARQUES; BELLINETTI, 2006, p. 81 e 82.) O processo precisa ser adequado à realidade social, cumprido os requisitos necessários à concessão da tutela inibitória. Sob as condições estudadas no presente trabalho, o Estado-juiz deve emitir uma ordem, em face da Fazenda Pública, para que faça ou deixe de fazer algo, sob pena de multa. 3.9.20 Multa ordenada pelo Estado-juiz A multa, já objeto de apreciação no presente estudo, tem, perante o demandado, primordialmente frente à Fazenda Pública, um caráter eminentemente psicológico e até mesmo profilático, com o intuito de se evitar que o ilícito seja praticado ou repetido. Existe doutrina que afirma que, quando a tutela inibitória recair sobre a atuação de um único servidor público, a multa deve incidir sobre esse serventuário. E, quando a Fazenda, de forma ilícita, nega a liberação da quantia empenhada (por exemplo, vinculada à construção de 198 uma obra que foi objeto de licitação) a multa, pelo descumprimento da ordem judicial, deverá recair sobre o Secretário da Fazenda Pública. As considerações, presentemente aduzidas, concernem igualmente à seara laboral, quando, por exemplo, norma social laboral estiver sendo lesionada, ou em eminência de ocorrer. Atualmente, os servidores integrantes da administração pública, mesmo o empregado público, não terão seus litígios julgados pela justiça do trabalho. Mas, não raro, empresas privadas são contratas pela Administração Pública (terceirização) e, usualmente, os empregados (diretos da tomadora de serviço terceirizado) têm seus direitos lesionados por essas entidades. Marques e Bellinetti (2006, p. 86) traz, além das acima apresentadas, outra hipótese interessante: quando se ingressa contra um município, uma ação inibitória, em que o magistrado ordena a obrigação de manter o funcionamento do sistema de transporte público, no meio rural, para as crianças estudarem. Sobre quem recairá o valor da multa? A solução dada por esse autor seria: a multa deverá recair sobre a autoridade pública que não tomou as providências plausíveis para o cumprimento da ordem judicial. Podendo, aquele valor, recair sobre os vereadores (que não votaram para que o dinheiro fosse incluído no orçamento do exercício financeiro seguinte), sobre o prefeito, o secretário municipal e dentre outros. A confirmar esse entendimento, a jurisprudência tem imputado a responsabilidade dos chefes do executivo, principalmente municipais, pelo descumprimento de ordem judicial, em diversos casos. Ver-se-á um exemplo da justiça mineira: Ementa: PREFEITO MUNICIPAL - PREVARICAÇÃO - ORDEM JUDICIAL DESCUMPRIMENTO - CRIME FUNCIONAL - PRÁTICA EM TESE PLAUSIBILIDADE DOS ARGUMENTOS - DENÚNCIA - REQUISITOS ESSENCIAIS - PREENCHIMENTO - ""IN DUBIO PRO SOCIETATE"" RECEBIMENTO. Estando regularmente oferecida em conformidade com os requisitos previstos no art. 41 do CPP e não sendo o caso de sua rejeição (art. 43 do CPP), a denúncia deve ser recebida. Na fase inicial do procedimento prevalece o brocardo ""in dubio pro societate"" em detrimento do ""in dubio pro reo"", atribuindo ao Ministério Público a oportunidade de provar a ocorrência dos fatos articulados na exordial acusatória. ""In thesi"", configura crime funcional, sujeito a julgamento pelo Poder Judiciário, negar execução à Constituição da República, praticando atos à revelia da impessoalidade e com sentimento pessoal, bem como deixar de cumprir ordem judicial, sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade de seu cumprimento, por escrito, à autoridade competente. Denúncia que se recebe. (MINAS GERAIS, 2003) (Grifou-se). É exatamente nesse sentido que reside o caráter profilático desse entendimento (Marinoni também leciona nesse sentido). É ilógico o argumento que prega a 199 irresponsabilidade do agente público, porque o ato teria sido praticado (ou não praticado) apenas pela pessoa jurídica de direito público. Ensina Bellinetti e Marques: Dessa maneira, evita-se o conluio de interesses entre as autoridades públicas e terceiras pessoas, interessadas no descumprimento da ordem, visando ao recebimento do valor previsto na multa arbitrada pelo Estado-juiz, evita-se ainda a desídia da autoridade pública, que se preocupará com a possibilidade de vir a ser responsável pelo pagamento da multa, envidando esforços para o seu cumprimento. (BELLINETTI; MARQUES, 2006, p. 86). A separação dos poderes é argumento comumente utilizado, sendo explicitado que o Poder Judiciário não pode intervir na Administração Pública. É bem verdade que esse princípio constitucional é cláusula pétria estabelecido no artigo 2º da Constituição da República. A concessão de uma tutela inibitória não ofende esse princípio, pois, todo o Estado de Direito está submetido ao próprio ordenamento jurídico. O Poder Judiciário simplesmente está exercendo a competência que lhe é constitucionalmente assegurada, ou seja, de julgar os litígios (exercendo a função jurisdicional). Esse princípio de separação dos poderes deve ser analisando, segundo os próprios comandos constitucionais, sob a ótica do princípio do balanceamento dos poderes. 3.9.21 Comissões de Conciliação Prévia x Tutela Inibitória A proteção inibitória de prevenção da prática, da continuação, ou repetição de uma conduta ilícita, antijurídica ou danosa, não pode se submeter, assim como as demais tutelas de urgência, à obrigatória passagem em órgãos administrativos, sob pena de os direitos materiais sociais terem sua proteção mitigada. Sendo interpretada, a submissão da demanda laboral à conciliação prévia, (quando houver na localidade), como sendo condição da ação (interesse de agir) ou como pressuposto processual, fica clara a constatação de um vício de inconstitucionalidade, por infringência ao disposto constitucional do artigo 5º, inciso XXXV, cujo comando é o da inafastabilidade da jurisdição. As Comissões de Conciliação Prévia devem ser vistas como opção da parte interessada e “jamais como condição ao exercício amplo e constitucional da inovação da tutela jurisdicional do Estado” (DELLEGRAVE NETO, 2000. p. 234). Nesse mesmo sentido, Estevão Mallet (2000, p. 445) preleciona que “a falta de tentativa de conciliação perante a comissão existente no âmbito da categoria ou na empresa não obsta o desenvolvimento do processo” não ocasionado, dessa forma, a extinção do processo sem julgamento do mérito 200 quando posto em litígio para apreciação do Poder Judiciário. Essas assertivas confirmam-se, primordialmente, em se tratando de tutelas de urgência. 3.10 Tutela Cautelar 3.10.1 Teoria Geral do Processo Cautelar A medida cautelar objetiva resguardar um direito ou o resultado útil de um processo. Através do direito de ação, constitucionalmente garantido, invoca-se esse mecanismo para proteger o processo. É um instrumento de proteção à tutela principal que pode ser de ordem cognitiva ou executória. Em princípio, a tutela cautelar, não se destina à satisfação de um direito em si, como a tutela antecipada ou a inibitória, mas a sua conservação. O Processo Cautelar tem natureza acessória ou instrumental, não sendo um fim em si mesmo. 175 A doutrina tradicional italiana, afirma que o processo cautelar se destina a dar “efetividade à jurisdição e ao processo” (MARINONI, 2008, p. 19). “O que define a cautelaridade não é a provisoriedade ou a circunstância de a tutela ser concedida no curso do processo de conhecimento, mas sim a função diante do direito material”, nas palavras de Marinoni (2008, p. 20). Em contrariedade à doutrina clássica, a jurisdição atual, possui a função de proteger os direitos, primordialmente, os de ordem fundamental e social (como é o caso dos direitos sociais laborais). O Estado contemporâneo e moderno possui o dever de proteger os direitos. O instituto da cautelar não abriga apenas o direito material, simplesmente considerado, mas também o direito à tutela do próprio direito. Exemplificando, o autor não teria somente o direito ao crédito trabalhista, mas também o poder de exigir esse crédito frente ao judiciário. Sabiamente, afirma Marinoni: O direito à tutela cautelar não advém do processo. A tutela cautelar não se destina a garantir a efetividade da ação e, por isso, não pode ser pensada como uma mera técnica processual necessária a lhe outorgar efetividade. O direito à tutela cautelar está situado no plano do direito material, assim como o direito às tutelas inibitórias e ressarcitórias. O titular do direito à tutela do direito – por exemplo, ressarcitória – também possui direito à tutela de segurança (cautelar) do direito à tutela do direito. [...] A tutela cautelar assegura a tutela de um direito violado ou, em outro caso, assegura uma situação jurídica tutelável, ou seja, uma situação jurídica a ser tutelada através do chamado processo principal. (MARINONI, 2008. P. 23). 175 Será visto, no Direito Comparado, que na Itália e na França, esta concepção de o processo cautelar não ser um fim em si mesmo, perdeu a razão de ser, via de regra. 201 Marinoni e Arenhart (2008, p. 27 e 28) sintetizam a tutela cautelar em duas formas: 1ª) a cautelar de segurança da efetividade da tutela do direito e; 2ª) segurança da situação tolerável. Mister a necessidade de que o direito material esteja exposto a perigo de dano, capaz de justificar a situação de urgência (que não se confunde com o requisito periculum in mora). 3.10.2 Características da Tutela Cautelar A doutrina dominante brasileira caracteriza a tutela cautelar como sendo: assessória, provisória, instrumental, revogável, autônoma, refere-se a uma situação substancial, assegurativa, não-satisfativa, aplicando ainda, obviamente a técnica da fungibilidade (para alguns doutrinadores a cautelar caracteriza-se também por ser fungível). Acessoriedade e provisoriedade: a cautelar é acessória a uma ação principal, e sua existência é temporária (artigo 796 do CP), pois só existe enquanto se aguarda a solução do processo de conhecimento ou o de execução, esses provimentos são os que, verdadeiramente, solucionam a lide. Argumentam que proferida a sentença, no processo principal, a cautelar perde a razão de ser 176. Instrumentalidade: a tutela cautelar tem o caráter instrumental por não possuir fim em si mesmo, devendo assegurar o resultado útil do processo. Alguns doutrinadores apontam que a medida cautelar seria secundária frente ao processo principal. Mas, essa argumentação não está concernente com a doutrina atual moderna, que afirma, com base no artigo 796 do CPC: que, nesse artigo, está exposta a possibilidade do procedimento cautelar ser incidente ou antecedente, a um processo principal. Coaduna com esse entendimento o fato do reconhecimento ou não do direito, discutido na ação principal, não estar vinculado à medida cautelar. Para a concessão da tutela cautelar, basta, com relação ao direito da ação principal, uma mera probabilidade de existência desse (fumus boni iures). “A segurança é prestada para a eventualidade do reconhecimento do direito material e, desta forma, para garantir que, na 176 Essa assertiva deve ser vista com cautela, pois, apesar de ser a regra geral, a doutrina moderna não admite que a parte vencedora, após a prolação da sentença de mérito, fique sem proteção, durante a tramitação dos recursos. Uma praxe italiana pode ser aplicada no Brasil: tem-se entendido que o juiz deve conservar a eficácia até o trânsito em julgado da sentença a ser proferida, no juízo do recurso. Lembrando que, a tutela cautelar somente encontra limites na sentença de improcedência do direito discutido da ação principal. Porém, em determinados casos (quando houver perigo de dano), mesmo diante da improcedência do pedido, existem chances de reforma, no Tribunal ad quem, o que, de certa forma, autorizaria o juiz a tomar a mesma atitude. 202 hipótese de procedência do pedido, a tutela do direito possa ser útil e efetiva”. (MARINONI; ARENHART, 2008, p. 36). Revogabilidade: a tutela pode ser revogada a qualquer tempo ou substituída por outras medidas, sem a formação da coisa julgada material (artigo 807 do CPC). Fungibilidade: presentes os requisitos, o juiz poderá deferir uma medida por outra (artigo 805 do CPC). Autonomia: mesmo que temporário e instrumental, guarda, o processo cautelar, existência própria, independe da procedência ou não do processo principal. Referibilidade: afirma Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2008, p. 36) que “na tutela cautelar há sempre referibilidade a uma situação substancial acautelada. Inexistindo referibilidade, não há direito acautelado, mas sim tutela satisfativa”. O conceito de referibilidade está consentâneo à noção de que a cautelar é assegurativa do direito tutelado. Em outros termos: a referência está ligada à situação tutelada na medida cautelar, mesmo que, em alguns casos excepcionais, não haja ação principal. 3.10.3 Elementos Jurídicos da Proteção Cautelar A doutrina dominante apresenta requisitos específicos da ação cautelar, pressupostos ou condições: primeiramente, referenda-se o periculum in mora, em que a cautelar, como medida de urgência, para resguardar um direito, não pode esperar a regular tramitação de um processo. Fumus boni iuris: é a plausibilidade de um direito a ser resguardado. A parte deve tentar convencer o juiz de que, ao final da ação, o direito lhe será concedido, já que o procedimento sumarizado da tutela cautelar é incompatível com uma dilação probatória exauriente. O magistrado, por sua vez, limitar-se-á a se pronunciar acerca apenas da probabilidade da concessão do direito, posteriormente (no procedimento ordinário, por exemplo) irá dar sua sentença, consentânea à tutela do direito, sendo sim, esta última prolação, capaz de fazer coisa julgada material. Pondera Schiavi: No nosso sentir, o perigo da demora e a fumaça do bom direito constituem próprio mérito da pretensão cautelar, não sendo apenas uma condição específica da ação cautelar ou pressuposto processual. Se estiverem presentes, pensamos que o juiz deverá julgar improcedente o pedido cautelar (SCHIAVI, 2008, p. 880). 203 Dessa forma, tais requisitos concernem ao deferimento do pedido e não apenas à regularidade do processo ou segurança. Interessante demonstrar que a cautelar é de cunho não preventivo. Diferentemente, da tutela inibitória (genuinamente preventiva) que visa à proteção de um direito, antes da ocorrência de um ilícito, ou seja, protege um direito ameaçado de lesão. O deferimento ou indeferimento de uma tutela cautelar depende da violação de um direito, por isso não exerce a função preventiva, mas repressiva. 3.10.4 Satisfatividade da Medida Cautelar Doutrinariamente, tem-se considerado, de forma majoritária, que a tutela cautelar não pode ser satisfativa, por ter como características a provisoriedade e a temporariedade, como acima já exposto. Marinoni explicita que a medida acautelatória não pode ser satisfativa, mas sim assegurativa, na medida em que: [...] para se definir a natureza da tutela lastreada em cognição sumária é necessário investigar a sua função, que pode ser satisfativa ou de segurança. Apenas a última possui natureza cautelar; a primeira constitui tutela antecipatória. De modo que, a “não-satisfatividade” é outro requisito da tutela cautelar. (MARINONI, 2008, P. 35). Mas, afinal, o que seria essa satisfatividade? Kazuo Watanabe (TEODORO, 2000, p. 419) expõe que “a satisfação dá-se através do adiantamento dos efeitos, no todo ou em parte, do provimento postulado”, ou seja, do direito material em litígio, o que se daria apenas em sede de medida antecipatória (tutela antecipada) ou através de cognição exauriente (processo de conhecimento). Para outros a satisfatividade só estaria na ação de conhecimento aduzida. Para Marinoni (2008), Cândido Rangel Dinamarco (2008), além de outros ilustres processualistas, a prestação jurisdicional satisfativa sumária não possui ligação com a tutela cautelar. A tutela que satisfaz realiza uma tarefa distinta da cautelar. “O direito referido é que é protegido (assegurado) cautelarmente. Se inexiste referibilidade, ou referência, a direito, não há direito acautelado” (MARINONI, 2008, p. 107). A tutela não poderia, por si só, antecipar a tutela de conhecimento. A tutela cautelar busca a viabilidade do provimento: [...] assim, se reafirmarmos que a tutela cautelar pode realizar o próprio direito (por exemplo a pretensão aos alimentos), estaremos incidindo em contradição, pois uma vez realizado o direito material, nada mais resta para ser assegurado. Ou seja, quando o direito é satisfeito nada é assegurado e nenhuma função cautelar é cumprida. (MARINONI, 2008, p. 109). 204 A tutela antecipada e a tutela inibitória, dentro desse conceito de satisfatividade 177 trazida pela doutrina majoritária, seriam medidas de urgência que poderiam satisfazer a parte o direito pretendido. Friede Reis pondera que a cautelar pode ser satisfativa, nos seguintes termos: No presente caso trazido à colação, como exemplo, resta indubitável que a concessão liminar da tutela cautelar, a requerimento da parte interessada ensejará a indiscutível satisfatividade da pretensão exordial. Todavia, resta esclarecer que, em nenhuma hipótese, a tutela acautelatória será tomada in casu, com esse propósito satisfativo (vedado em lei); o que ocorrerá, em essência, é um efeito de satisfatividade colateral (e, portanto, não intencional), derivado, por sua vez, do inconteste intuito de se prover uma tutela de segurança acautelatória, garantindo, em última análise, a inteireza do futuro pronunciamento judicial cognitivo, ainda que essa possa se encontrar relativamente esvaziada em termos práticos (porém, não teóricos). (REIS, 1999, p.7). (Grifou-se). Galeno Lacerda, citado por Arion Mazurkevi (2004, p. 67) explicita que a situação de fato, que corresponderia ao direito do demandante, não poderia ser criada pela medida cautelar, tal como a entrega de coisa e a extinção da hipoteca, no entanto, é cabível a satisfação do autor, quando se tratar de necessidades primárias, assim como ocorre com lides cujo objeto seja de caráter alimentar (Direito do Trabalho) e na seara de família. Assim, no 177 Data maxima venia, considera-se que o conceito de satisfatividade não está muito claro na doutrina dominante. Explicita-se, como anteriormente demonstrado, que a satisfação reside, eminentemente, na antecipação do todo, ou em parte, do direito discutido no mérito da ação principal. Considerando que a cautelar busca resguardar o processo, com a efetivação de um direito, que a parte tem de utilizar-se de um instrumento processual, nominado ou inominado, de sequestro de bens, por exemplo, caso o judiciário efetive o direito, de cunho instrumental, estar-se-ia diante da satisfação de um direito específico, de evitar que um bem, do devedor, pereça e, futuramente possa ser objeto de execução. Um exemplo, da possibilidade de uma cautelar satisfativa, seria aquele em que: Ministério Público ajuíza uma ação cautelar, para conseguir, do Poder Judiciário, a autorização para que o hospital possa fazer uma transfusão de sangue em um menor de idade (uma vez que a família não autorizou, em virtude de crenças religiosas). Quando da obtenção da cautelar, o direito à vida do menor, estaria garantido, e o Ministério Público teria cumprido o seu dever, de forma a satisfazer um direito fundamental. Parte da doutrina expõe que, nesse exemplo, seria cabível ajuizar uma ação de cognição, com um pedido, na inicial, de antecipação de tutela para se efetivar o dito direto. Porém, sabe-se que essa última hipótese é mais demorada que a primeira, podendo o menor perder a vida. O que se tem como foco, em situações como a presentemente mencionada, é o risco iminente de perecimento do direito. Lembrando, ainda, que a ação principal pode não ser proposta (após os 30 dias requeridos no artigo 806 do CPC), por iniciativa da parte que se viu satisfeita apenas com a concessão da medida acautelatória. Mas, existe, a possibilidade de dispensa da ação principal frente à natureza da medida cautelar, como é o caso da caução. Nesses dois casos, primordialmente no primeiro, não há satisfatividade? Parece que sim. É bem verdade que, com a reforma do CPC, em 1994, em que o legislador inseriu as novas redações dos artigos 273 e 461 (base para as tutelas inibitórias e de remoção do ilícito) a possibilidade de cautelar satisfativa, no sentido hoje utilizado pela doutrina majoritária, caiu. Pois, antes da alteração, era possível as tutelas inibitória e de remoção de ilícito, como cautelar inominada. Mesmo diante de todas essas considerações, não se vê praticidade nesse tipo de discussão, independentemente, da cautelar ser considerada de caráter satisfativo ou não, um direito será resguardo, seja em caráter incidental a um processo principal, seja preparatório. 205 Direito do Trabalho, cujas obrigações são de caráter vital, ocorre a antecipação provisória e satisfativa da prestação jurisdicional (o que não significa o prejulgamento definitivo). O ordenamento jurídico pátrio admite liminar deferida em ação cautelar de reintegração ao emprego (659 da CLT). Como bem lembra Carlos Henrique Bezerra Leite (2007, p. 1073) a jurisprudência majoritária laboral, em contrapartida, expõe que essa reintegração somente é efetivada após o trânsito em julgado da sentença (ou acórdão) definitiva, e não em sede de ação acautelatória. No entanto, acredita-se que o entendimento majoritário choca-se com o princípio constitucional do direito ao trabalho, além, da questão processual de que os recursos trabalhistas não possuem efeito suspensivo, via de regra (artigo 899 da CLT). In casu, a obrigação é de “fazer”, não existe penhora, e, nada impede, pelo contrário, o ordenamento protetivo laboral favorece a reintegração, satisfazendo (pelo menos em parte), nesse particular, o demandante. Esse exemplo demonstra que argumentos como: é incabível atribuir efeitos de satisfatividade a decisões cautelares que dependam de uma ação principal é, por demais, simplista. Por tanto, a afirmação taxativa da não satisfatividade do provimento acautelatória não se perfaz. 3.10.5 Poder Geral de Cautela do juiz do trabalho Analisando as redações dos artigos 798, do CPC e 799 da CLT, ver-se-á o poder geral de cautela do juiz, devendo, quando necessário, tomar medidas cautelares de ofício ou a requerimento das partes. Esse poder constitui um poder discricionário que deve ser exercido com indispensável prudência e em obediência aos critérios de conveniência e oportunidade. Arion Mazurkevi (2004, p. 73) argumenta que o poder geral de cautela do magistrado limita-se à “existência de meios típicos de tutela, previstos para a situação em espécie”. Sob a égide desse entendimento, caso exista, no ordenamento jurídico pátrio, meios específicos de tutela para a hipótese suscitada em juízo, de ordem cautelar ou não, o poder, ora em comento, não poderia ser exercido. O mesmo raciocínio se perfaz frente à cautelar inominada. 3.10.6 Ação Cautelar Inominada A autorização legislativa, para que o juiz possa deferir uma cautela atípica, encontrase nos artigos 798 e 799 do CPC. Com a redação desses artigos, é possível perceber que o legislador “reconheceu” que os institutos processuais, tipificados no ordenamento jurídico, 206 são insuficientes para abarcar todas as situações existentes no mundo fatídico, permitindo que a ação cautelar possa se adequar ao caso concreto. É pacífico, na melhor doutrina, que o princípio da “prévia definição das formas é uma garantia menos relevante do que a garantia de tutela cautelar adequada” (MARANONI; ARENHART, 2008, p. 99). Em outras palavras, a definição do procedimento a ser seguido em juízo, protegendo a parte do arbítrio estatal, é considerada um minus, em relação à adequação do provimento cautelar ao caso concreto, na busca da efetividade do provimento jurisdicional e ao respeito do direito fundamental de ação (previsto no artigo 5º, inciso XXXV da CR/88). Para viabilizar esse direito, o legislador brasileiro editou normas abertas, em diversos casos. Como bem pondera Marinoni (2008): o direito de ação, atualmente, vai muito além do que o direito à ação adequada ao plano do direito material. O legislador não se limitou, como não poderia deixar de ser, a positivar técnicas processuais adequadas para todo direito material, mas instituiu cláusulas gerais, bem como, técnicas processuais, regidas por conceitos indeterminados, com o objetivo de dar ao cidadão o direito de construção da tutela mais adequada ao caso. É exatamente, sobre esse fundamento que recai a teoria póspositivista. Com a principiologia constitucional, atrelada às normas de conceitos indeterminados, as mais inimagináveis situações cotidianas podem ser abarcadas e protegidas pelo ordenamento jurídico. 3.10.7 Tutela Cautelar concedida de ofício pelo juiz Em casos excepcionais, o juiz, está autorizado por lei (artigo 797 do CPC) a conceder medida cautelar, inaudita altera pars. Os casos excepcionais são aqueles em que o juiz concede a cautelar, quando não há tempo de ouvir as partes, em função de um risco, que seja capaz de colocar a efetividade do direito em perigo. Para a concessão dessa medida, todos os requisitos acautelatórios devem ser apresentados em juízo, como bem asseverou o desembargador mineiro Emerson Jose Alves Lage (TRT 3ª R. 00001-2011-102-03-00-0 RO, 23-09-2011), ao afirmar que, em uma decisão proferida em sede recursal, no Regional, para a concessão da acautelatória inominada, “o requerente deverá demonstrar que o direito substancial invocado é plausível, ou seja, que a pretensão requerida é razoável, e que existe um dano potencial iminente e irreparável”. Calamandrei e Chiovenda, citados por Marinoni e Arenhart (2008. p. 103), em tema de tutela cautelar, explicitaram que essa proteção é da jurisdição e não apenas do individuo, particularmente considerado, comparando, ainda, a possibilidade de cautelar, à contempt of 207 court americana, demonstrando que a soberania estatal não pode servir de entrave à utilidade do processo, em virtude da demora para a prolação de uma decisão final ou antecipatória. Esses ilustres processualistas pretenderam retirar o dogma absoluto do princípio do dispositivo, que regia a atuação do magistrado. Porém, na verdade, o instrumento cautelar não visa à garantia da jurisdição, mas sim a efetividade da tutela jurisdicional, ou seja, do direito material violado. Nesse interstício, o juiz pode conceder a tutela, de ofício, nos casos legais e frente às situações concretas, conforme o permissivo estabelecido no artigo 797, da CPC. Isto não quer dizer que, o magistrado pode, discricionariamente, estabelecer cautelar de officio, basta lembrar-se do limite constitucional, da necessidade de fundamentação dos atos jurisdicionais, do artigo 93, IX, da Constituição da República vigente. Caso haja algum dano, causado em função da medida cautelar, concedida de ofício pelo juiz, por óbvio, quando não confirmada sentença, o juiz não pode ser responsabilizado, nem o Estado, inicialmente, salvo quando agir com dolo ou fraude, e, desse ato ilícito, surgir uma obrigação de indenizar. São restritas a essas hipóteses, uma vez que, o juiz tem o dever de atuar, e, sendo um ser humano, está suscetível ao cometimento de equívocos, que são escusáveis em um Estado Democrático. A liminar concedente da tutela cautelar pode ser dada inaudita altera pars, conforme a orientação do artigo 804 do CPC, quando o motivo justificador for significante, ao ponto de fazer com que o juiz creia que o adiantamento de seu deferimento impossibilite o direito fundamental de ação, postergando, assim, o direito fundamental de defesa. Lembrando que a regra é a de ouvidoria da parte ex adversa, e, somente, em casos excepcionais, expressamente autorizados por lei, determinará o juiz medidas cautelares sem a audiência das partes. Quando o magistrado considerar razoável, poderá fazer justificação prévia 178 , na concessão da liminar, sem ouvir a outra parte, em situações mais complexas, em princípio sem a presença do réu (ou ouvindo o réu, antes da apresentação de defesa). É possível, ainda, o juiz exigir uma contra-cautela (caução), conforme o final do artigo 804, do CPC, frente à superficialidade dos fatos apresentados pelo autor, quando da probabilidade de ocorrência de um dano, em função da execução da medida cautelar. No Direito do Trabalho, ao que tudo indica, o juiz não deve exigir garantia de um trabalhador, por 178 A justificação prévia consiste no ato de o juiz buscar, junto ao autor da ação, esclarecimentos acerca dos fatos pontuados, que servem como base para a concessão de medida cautelar através de liminar, antes da oportunidade do réu apresentar defesa ou instruir a demanda, porém, se chamado à justificação, poderá intervir de forma extremamente sutil, tal como, contraditando testemunha. Nesse caso, não se tem um deferimento de liminar genuinamente inaudita altera parte, por haver certa interferência do réu. 208 exemplo, que, provavelmente, não terá condições de realizá-la, mitigando, assim, o direito fundamental de ação e o de efetividade da demanda processual. 3.10.8 Espécies de Medidas Acautelatórias (cabíveis no Processo do Trabalho) Existem, no ordenamento pátrio, as medidas nominadas e inominadas. As primeiras estão dispostas no CPC, as segundas não estão previstas nesse código processual, mas têm subsídio no, já falado, poder geral de cautela. Ambas podem ser preparatórias ou incidentais ao processo principal. 3.10.9 Procedimento das Cautelares no Processo do Trabalho No Processo do Trabalho, aplica-se, para a ação cautelar, o procedimento previsto no CPC. Essa possibilidade está definida na Instrução Normativa 27/05, artigo 1º do TST. A competência funcional para a ação cautelar é o juízo em que tramita a demanda principal, ou, se preparatória, em que essa deveria ser proposta, conforme o artigo 800, do CPC. No artigo 801, desse mesmo diploma, estão presentes os requisitos para a petição inicial da cautelar. Deve-se indicar o valor da causa, mas a citação do réu é dispensável (artigo 804 do CPC). Diante da decisão que concede ou denega a liminar da medida cautelar, não cabe recurso, no Processo do Trabalho, por se tratar de decisão interlocutória (893, da CLT). Ressalta-se que é plausível impetrar mandado de segurança, quando houver abuso do poder ou ilegalidade do magistrado. Sendo concedida ou não a liminar, o requerido será citado, para em 5 dias (prazo contado a partir da citação, em função dessa não ser necessariamente pessoal) contestar o pedido (artigo 802, do CPC). Caso não apresente defesa, serão considerados os fatos alegados pelo autor como verdadeiros (artigos 285 e 319, do CPC, assim o juiz decidirá em 5 dias). Cabe à parte reclamante propor a ação, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data da efetivação da tutela cautelar, quando essa for concedida em provimento preparatório (artigo 806 do CPC). A qualquer tempo, o instrumento acautelatório pode ser modificado ou revogado. A conservação dessa medida dar-se-á no prazo descrito e na pendência do processo principal. Cessa a eficácia da medida cautelar quando: a parte não propor a ação principal (cautelar preparatória); quando for executada fora do prazo de 30 dias e/ou; quando o juiz 209 declarar extinto o processo basilar, com ou sem julgamento do mérito (conforme o artigo 808 do CPC) A hipótese de indeferimento da medida cautelar não impede que a parte intente a ação principal, nem influi no julgamento dessa, salvo se o magistrado, no procedimento, acolher a alegação de decadência ou de prescrição do direito do reclamante. Sem prejuízo da tipificação de litigância de má-fé, a parte responde pelos prejuízos causados pela medida, se a sentença, no processo principal, for-lhe desfavorável; caso ocorra a cessação da eficácia da medida, em qualquer das hipóteses previstas no artigo 808, da normatividade processualista supracitada e/ou; no caso de o magistrado acolher, no procedimento cautelar, a alegação de decadência ou de prescrição do direito do autor. Ressalta-se que a responsabilidade do requerente pelos danos causados é objetiva e independente de culpa/dolo. Da sentença proferida no processo cautelar, é cabível o recurso ordinário (artigo 895 da CLT). 3.10.10 Das Medidas Cautelares em espécie (consentâneas ao Processo do Trabalho) O procedimento do Código de Processo Civil, por força do artigo 769 da CLT, aplicase ao processo trabalhista, amoldando-se à Justiça Especializada e aplicando-se os princípios informadores, tais como, o da celeridade, da concentração dos atos em audiência não fragmentada, da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias e dentre outros. Com relação à competência para a apreciação das cautelares, seguem as regras explicitadas no artigo 651, da CLT. Consentâneo aos requisitos da petição inicial da cautelar, aplicam-se as regras gerais, contidas no artigo 801, do CPC, observando, ainda, as regras do artigo 840 da CLT. A única ressalva que deve ser feita, frente a esse artigo do diploma processual cível, concerne ao inciso V, cuja redação dispõe como requisito: a especificação das provas que serão utilizadas. Sabe-se que as provas, via de regra, são produzidas na própria audiência, conforme o disposto no artigo 848 e seguintes da norma celetista. A defesa do reclamado deve ser apresentada em audiência, conforme a dicção do artigo 847, da consolidação, após a tentativa de conciliação. A segunda tentativa de composição é feita após as razões finais, e, caso não haja acordo, o magistrado proferirá sentença. Dessa decisão é cabível a interposição de recurso ordinário perante o Tribunal Regional do Trabalho, no prazo de 8 dias, ou em dobro quando a parte for à fazenda pública ou Ministério Público do Trabalho. Sinteticamente, estão, abaixo explicitadas, as medidas cautelares aplicáveis à seara trabalhista. 210 A) Arresto (artigo 813 a 821 do CPC) Com o arresto, objetiva-se a apreensão de bens do devedor, tanto quantos bastarem para uma futura execução por quantia certa. As hipóteses legais para a concessão dessa cautelar são: quando o devedor, sem domicílio certo, cujo desígnio é ausentar-se ou alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a obrigação no prazo estipulado; caso o devedor tenha domicílio, no entanto: a) se ausenta ou tenta ausentar-se furtivamente; b) caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; transfere ou tenta transferir os seus bens em nome de terceiros; ou comete qualquer outro artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar seus credores e; quando o devedor, que possui bens de raiz, intenta desfazê-los. A norma do artigo 808, da lei processual civilista, não é taxativa, outras hipóteses legais existem e podem ser objeto de arresto. Apesar de o arresto ser medida tipificada (CPC, artigo 813), não dispensa os requisitos gerais da ação cautelar, quais sejam: o fumus boni iuris e periculum in mora, os quais delineiam a atuação emergencial do Poder Judiciário (CPC, art. 798). Os requisitos específicos para a concessão do arresto são: I - prova literal da dívida líquida e certa e; II - prova documental ou justificação de alguns dos casos supramencionados. No Processo do Trabalho, a prova literal da dívida consiste nos títulos executivos judiciais e extrajudiciais estabelecidos nos artigo 876 da CLT. No Processo Laboral, a jurisprudência tem interpretado essa questão (da prova literal da dívida) com mais flexibilidade: o empregado pode juntar, na petição inicial do arresto, documentos que comprovem o inadimplemento do empregador de verbas trabalhistas. Ressaltam-se que os bens arrestados não integram a questão de ser ou não bem de família. É o que se extrai da decisão do TRT da 10ª Região (Distrito Federal e Tocantins) do relato da juíza Odélia França Noleto (01288-2010-002-10-00-8 RO, 10/10/2011): “Ação Cautelar. Arresto. Bem de Família. Demonstrados os requisitos fixados pelo art. 814 do CPC, além do imóvel objeto do pedido de arresto não integrar o conceito de bem de família, tornase imperiosa a concessão da cautela.” 211 B) Sequestro (822 a 825 do CPC) O Sequestro é medida que visa à apreensão e guarda de um bem, a fim de evitar o perecimento, dano ou extravio, quando houver discussão sobre sua posse ou propriedade. Interessante e valiosa a clara distinção exposta por Bezerra Leite: Não obstante o art. 823 do CPC mandar aplicar ao sequestro as normas concernentes ao arresto, existe nítida diferença entre esses dois institutos. É que o arresto incide apenas sobre bens alheios à obrigação discutida em juízo, ou seja, qualquer bem, tendo por objetivo assegurar o cumprimento da futura execução, enquanto o sequestro incide sobre os próprios bens que constituem o objeto da obrigação, tendo por escopo evitar o perecimento e o desaparecimento da coisa. Noutro falar, no sequestro objetiva-se preservar a coisa litigiosa e, no arresto, o cumprimento da obrigação. (LEITE, 2007, p. 1176). A medida, ora em comento, é de rara ocorrência no Processo do Trabalho, mas, por ser compatível com as peculiaridades dessa seara, merece comentários. O sequestro pode ser utilizado como instrumento preparatório ou incidental quando, por exemplo, o trabalhador e o empregador discutem a propriedade de determinada máquina ou ferramenta de trabalho e, há um fundado receio de danificação ou extravio desse bem, enquanto não houver a decisão judicial atribuindo a propriedade a um deles. C) Da busca e apreensão O instituto da busca e apreensão tem por objeto capturar pessoa ou coisa, quando houver receio de dano. No que concerne à competência material da Justiça do Trabalho, constitucionalmente assegurada no artigo 114 da CR/88, a busca e apreensão de pessoas não é possível, sendo somente cabível, então, frente às coisas, tal como: de documentos que são importantes para o trâmite do processo, que pode ser guardado em depósito ou com a parte interessada, ou ainda, frente à retenção indevida da CTPS, ferramentas de trabalho do empregado, ou outros bens que estiverem sendo objeto de sequestro ou arresto. A medida pode ser concedida pelo magistrado inauldita altera pars, sendo ao juiz facultada a designação de justificação prévia. No Regional Trabalhista Mineiro, Emília Facchini decidiu pela prisão do depositário infiel que, em sede de primeira instância teve em seu desfavor uma cautelar de busca e 212 apreensão, no entanto, fraudou a execução ao ser negligente com a coisa que fora apreendida, no entanto, deixada, por decisão judicial sob sua custódia, conforme a ementa: EMENTA: EMENTA - HABEAS CORPUS - DEPOSITÁRIO INFIEL - FRAUDE À EXECUÇÃO.Não se pode olvidar que o crédito trabalhista, por seu caráter alimentar, prefere a todos os demais. Assim, não socorre ao Paciente, a informação de que a coisa depositada foi entregue em cumprimento de ato judicial (Ação de Busca e Apreensão) alheio à vontade do depositário, ou que o mesmo perdera a disponibilidade sobre o bem objeto do depósito, com o objetivo de exonerá-lo dos compromissos legais. Isso porque o depositário judicial é auxiliar da justiça e tem função pública, cabendo-lhe, na guarda do bem penhorado, agir com diligência necessária à sua conservação e preservação, o que não ocorreu. Muito pelo contrário, o Paciente revelou-se negligente para com o encargo assumido, somente comunicando ao Juízo Trabalhista a entrega do bem por força do Auto de Busca e Apreensão quase dois meses após o ocorrido. Causa ainda maior espécie o fato da constatação pelo Juízo de origem de que o veículo encontra-se na empresa do qual o Paciente é sócio, camuflado, no intuito de confundir sua identificação. Tal atitude leva à conclusão de que o que existe é mesmo uma resistência do depositário em cumprir a obrigação legal decorrente do encargo assumido, em evidente fraude à execução, pelo que dúvida não resta quanto ao seu comportamento infiel, que o sujeita à prisão civil prevista no art. 5o. , inciso LXVII da Constituição Federal, bem assim nos diplomas legais aplicáveis ao Processo Trabalhista, combinado com o art. 769 da CLT. (MINAS GERAIS, 2004). D) Exibição (844 e 845 do CPC) O objetivo dessa medida é a exibição judicial de coisa móvel ou documento em poder de outrem, para o fim de propositura de futura ação principal. Essa medida cautelar preparatória aplica-se no Processo de Trabalho, quando, por exemplo: o empregado necessita da exibição de um documento que está em posse do empregador, para embasar futura reclamação trabalhista. A medida, ora em comento, só é cabível na forma preparatória de ação principal, uma vez que exibição incidental deixa de ter a natureza de cautelar. É cabível, quando existir procedimento administrativo para apuração de falta grave, a hipótese do empregado ajuizar cautelar preparatória de exibição de documentos para ter ciência do apurado e, futuramente, intentar ação trabalhista para se discutir a matéria. Exatamente nesse sentido, já decidiu Monica Sette Lopes, no Tribunal Regional de Minas Gerais: EMENTA: AÇÃO CAUTELAR - EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS - CABIMENTO - A instauração de procedimento para apuração de irregularidades pela Recorrente traduz-se em um fazer lícito, inerente ao poder regular do empregador juridicamente reconhecido. Contudo, todo poder conferido ao empregador pela ordem jurídica encontra nessa mesma ordem os limites a serem observados. Ao iniciar procedimento 213 para apuração de faltas, sem que pudesse a Recorrida participar, abusou a Recorrente do seu poder diretivo, ferindo princípios constitucionais caros ao Estado Democrático de Direito. A Recorrente não só tem o direito de ter ciência da acusação que contra ela se dirige, como também de defender-se dela. Isto justifica a procedência da medida cautelar destinada à exibição de documento. (MINAS GERAIS, 2011). E) Da produção antecipada de provas (746 a 851 do CPC) A produção antecipada de provas é medida cautelar preparatória, intentada antes da propositura da ação principal, que visa à produção de determinada prova, pois há fundado risco de que, quando da instrução processual da causa, a prova não seja mais passível de ser produzida. A produção antecipada da prova pode consistir em interrogatório da parte, inquirição de testemunhas, exame pericial e dentre outras. O risco iminente de alteração do estado de fato da coisa justifica o deferimento da cautelar de produção antecipada de provas. Nesse sentido, já decidiu a desembargadora Deoclecia Amorelli Dias: EMENTA: AÇÃO CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA PERICIAL. PRESSUPOSTOS. Dispõe o art. 849 do CPC que "havendo fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação, é admissível o exame pericial". Nesse sentido, ensina Manoel Antônio Teixeira Filho, em sua obra Ações Cautelares no Processo do Trabalho(LTr, 2ª edição), relativamente à Produção Antecipada de Prova Pericial, que "o pressuposto legal à realização de exame pericial, no processo de conhecimento, é a ausência ou insuficiência de conhecimentos técnicos do juiz em relação à coisa ou ao local a serem examinados (CPC, art. 420, par. único, I). No processo cautelar, o pressuposto é, além disso, o risco iminente de alteração da situação de estado de fato da coisa ou do local que serão objeto de perícia" (p. 351). Não havendo qualquer risco de alteração da situação de fato da coisa a ser periciada, não se justifica a utilização de cautelar para produção antecipada da prova, mormente quando o elemento probatório em questão encontra-se de posse da própria parte vindicante que se responsabiliza, por isso, com sua perfeita conservação. (MINAS GERAIS, 2010). F) Da justificação (861 a 866 do CPC) Quem pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica, seja para simples documento e sem caráter contencioso, seja para servir de prova em processo regular, exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção, artigo 861 do CPC. A justificação é medida cautelar compatível com o Processo do Trabalho, porém de raríssima aplicabilidade. O ajuizamento da própria reclamatória trabalhista já é o bastante para cumprir a medida em epígrafe, basta a breve leitura do artigo supracitado. Um exemplo seria a utilização dessa medida cautelar pelo empregado com o objetivo de comprovar seu tempo de 214 serviço, o que surtiria efeitos junto à Previdência Social, para a obtenção da aposentadoria. Bezerra Leite (2007, p. 1178) explicita, como exemplo, a comprovação, em sede de justificação, a existência dos fatos aludidos no artigo 483 da CLT (casos de rescisão indireta do contrato de trabalho – por culpa do empregador). G) Protestos, notificações e interpelações (867 a 873 do CPC) Em seara processualista laboral, o protesto é usado com mais frequência com o fito de interromper a prescrição (artigo 202, inciso II, do Código Civil), além de ser utilizado contra a alienação de bens pelo empregador, quando esse está na iminência de se tornar insolvente. Preleciona Schiavi: Valendo-nos do conceito de Nelson Nery Junior: Protesto é medida acautelatória de direitos. Por sua vez tem eficácia subordinada ao fato de corresponder à intenção de quem o maneja e à correspondência perfeita dos atos que se alega terem ocorrido. Interpelação é ato pelo qual se dá a conhecer a pretensão de exercer direito. Muitas vezes, a eficácia da cláusula penal depende de interpelação. Notificação é ato formal de comunicação que provoca a atividade positiva ou negativa de alguém e que, em alguns casos, contém também interpelação. (SCHIAVI, 2008, P. 921). No caso de não estarem presentes os requisitos do arresto, que são mais rigorosos, o magistrado, embasado no princípio da fungibilidade (artigo 805 do CPC), poderá convolar o arresto em protesto contra alienação de bens, na hipótese de o empregador estar à beira de se tornar insolvente. H) Do atentado (879 a 881 do CPC) O atentado concerne em medida cautelar incidental cujo fim de preservar a dignidade do processo, restaurando o estado de fato da lide em curso, além de prevenir dano de ordem processual, em razão de algum ato ilegítimo ou ilegal praticado por uma das partes. Conforme a dicção do artigo 879, do CPC: comete atentado a parte que, no curso do processo: viola penhora, arresto, sequestro ou imissão na posse; prossegue em obra embargada e; pratica outra qualquer inovação ilegal no estado de fato. As partes legítimas, no Processo do Trabalho, são: empregado e empregador, regra geral. O ato, apenas dessas partes, pode dar ensejo à ação cautelar, ora em comento. Portanto, o ato das demais partes, tais como, o juiz, advogado e serventuário não culmina em atentado. 215 O pedido, formulado na ação de atentado, tem que possuir finalidade cautelar em relação ao processo principal, configura-se a inadequação da via eleita, caso essa correlação não exista, impondo-se a extinção do processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art.267, VI, do CPC 179. 3.11 Tutelas de Urgência nas Ações Coletivas - meios eficazes de proteção dos direitos individuais trabalhistas da Constituição da República Como antes afirmado, acerca da legitimidade da proteção inibitória, qualquer cidadão, individualmente, pode defender, em juízo, o direito de não ser lesionado em seu patrimônio, ou até mesmo, moralmente. No entanto, é mais comum que os entes coletivos proponham a tutela inibitória em ações coletivas. Na atual conjuntura mercadológica, o empregado mesmo tendo conhecimento de que seus direitos estão sendo desrespeitados pelo empregador, continua trabalhando, sabendo que caso reclame, em juízo, ficará sem emprego. Reside aqui a importância das ações coletivas e da tutela metaindividual dos direitos sociais laborais, previstos na Constituição da República, intentadas por intermédio do Ministério Público do Trabalho e dos Sindicatos. No ordenamento jurídico pátrio, três ações são classificadas como coletivas: a ação civil pública, a ação popular e ação civil coletiva e, segundo uma moderna categorização, as ações propostas para a tutela de interesses individuais homogêneos (consoante ao artigo 81, III, do Código de Defesa do Consumidor). A defesa coletiva, em juízo, dos direitos dos trabalhadores pode ser realizada através das ações coletivas. O Código de Defesa do Consumidor brasileiro foi o grande inovador acerca da temática. As Class Actions, conforme o direito norte-americano, são ações de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos. A ação coletiva que melhor se enquadra ao Processo Laboral, em defesa conjunta dos direitos individuais constitucionais dos trabalhadores, é a ação civil pública. A Lei nº 7.347/85 disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Os direitos tuteláveis, por meio de ação coletiva são: os Direitos Difusos são aqueles cujos titulares não são determináveis ou determinados; os Direitos Coletivos são os 179 Nesse sentido, decisão do TRT da 3ª Região: HORTA, Denise Alves. Processo: 00682-2006-073-03-00-8 RO, 07-06-2007 (MINAS GERAIS, 2007). 216 transindividuais, de natureza indivisível, sendo os titulares, pessoas indeterminadas, mas determináveis, pois vinculadas numa relação jurídica base, como os contratantes de um plano de saúde, que se vêm obrigados a pagar aumento apartado da orientação legal ou que ofenda a cláusula geral de boa-fé objetiva e; o Direito Individual Homogêneo, previsto no art. 81, III, do CDC, é aquele cujo titular é identificável e cujo objeto é divisível, sendo o direito decorrente de origem comum. 217 4 TUTELAS DE URGÊNCIA NO DIREITO COMPARADO 4.1 Considerações Iniciais Na tentativa de melhor compreensão da temática, apresentada no presente estudo, é de suma importância a explicitação acerca das origens históricas dos procedimentos sumarizados e das tutelas emergenciais. No Estado romano, a atribuição do ius suum cuique tribuendi (“o direito de dar a casa um o seu próprio”), ou seja, de distribuir a justiça, era de competência pretoriana (do pretor, além do poder de suprir lacunas na lei). Por volta de 754 a 753 a. C. as relações jurídicas, no Direito Romano, pautavam-se por regras de solenidades e práticas politeístas dos habitantes da Urben. Esse Direito era revelado pelos Pontífices, advindos dos patriciados, que decidiam sobre a vida da plebe. A primeira sistematização, nesse direito, foi a Lei das Doze Tábuas (Lex Duodecim Tabularum), em que se normatizou a efetivação dos direitos na ordem privada. Cada direito possuía uma determinada actio, ou seja, forma de atuação em juízo (assim como no Brasil, atualmente, tem-se o artigo 75 do Código Civil). O procedimento solene era denominado de legis actiones, que se subdividia em in iure (a realização dos ritos sumarizados e das formas orais, em que determinadas palavras deveriam ser pronunciadas ao pretor, a título de exemplo, é exatamente o que acontece no casamento hoje, no Brasil – que é um dos ritos mais soles no Direito pátrio) e; apud iudicem (quando a matéria era levada ao iudex privatus – juízo privado). Existiam cinco tipos de legis actions, em que o litígio deveria se enquadrar: sacramentum, iudicis postulation (vel arbitrivis), conditio (estes três primeiros, atualmente, seriam ações declaratórias) manus iniectio e pignoris capio (seria o procedimento executório, na atualidade). As legis actions foram substituídas pelo processo formulário, originado das causas entre os estrangeiros e os romanos. No século II antes de Cristo, entre 149 e 130, adveio a Lex Aebutia, mas a completa abolição das legis actions, em sua forma originária, veio sob a égide de Augusto, em 17 a.C., frente às Leis Iulice iudiciorum privatorum e pubblicum. As fontes dos provimentos liminares, no Direito Romano, foram os interditos (interdicta, que significa interditos, no plural, ou interdictum, interdito, no singular). Esses instrumentos processuais concerniam em ordens dadas pelos pretores, para proteger as 218 questões de urgência, cuja criação consistia à consciência do pretor (como se fosse, hoje, o poder geral de cautela). Eram três os tipos de interditos: restituitórios (a ordem era de: “restituas”); exibitórios (“exhibeas”) e; proibitórios (“vim fieri veto”). O interdito era dado frente ao poder de imperium, e não sob a égide do in iure ou apud iudicem. Caso a parte não obedecesse, era aberta a fase do iudex (execução forçada). O pretor podia ordenar, como medida de urgência, por exemplo, o embargo do patrimônio de uma pessoa (missio in possessionem – in bona), ou ainda, de determinada coisa (missio in rem), com a finalidade de conservar os bens embargados. Existiam ainda as chamadas stipulationes praetoriae, frente à possibilidade de antecipação de tutela na obrigação de firmar contrato (ADAMOVICH, 2000). Dentro da concepção do imperium, o pretor podia adotar providências de natureza acautelatória em benefício da parte ofendida, preservando os bens, para uma futura execução. O ius civile romano não continha um capítulo sobre procedimentos cautelares, no entanto, os pretores, assim como os governadores provinciais, possuíam uma espécie de poder geral de cautela. Manuel Antonio Teixeira Filho (1996, P. 88), pondera que o nexum (o devedor como própria garantia do empréstimo) não pode ser considerado como o berço dos procedimentos acautelatórios. Mas, sim na pignoris capio (apreensão dos bens do devedor, sem precisar da autorização do magistrado, com o intuito de permitir a satisfação de um crédito). Ressalta-se que ambos os institutos estavam descritos na Lei das Doze Tábuas. O pretor tinha o poder de estabelecer uma caução (cautio dammi infecti), no caso de descumprimento desse imperium, o mesmo poderia imitir o requerente, na posse dos bens do requerido. Existia, ainda, um instituto chamado depósito ad sequester, semelhante ao sequestro, que consistia na realização da guarda de um bem, nas mãos de um terceiro de boa-fé, devendo esse conservar o bem e devolvê-lo ao vencedor do litígio. Após a queda do Império Romano, os bárbaros impuseram o seu direito aos povos conquistados. Dois sistemas antagônicos passaram, então a reger esses povos (o germânico e o romano). No Direito Romano, a execução dependia de um prévio processo de cognição, contrariamente ao Direito Germânico, em que a execução era de pronto promovida contra o devedor, que deveria, inicialmente, pagar ou prestar um juramento para que, somente assim, pudesse se defender. 219 Concernente ao sistema germânico, existia o direito longobardo, ou lombardos, (um dos tantos grupos germânicos que se instalaram no território do extinto Império Romano do Ocidente, especialmente na Península da Itália setentrional) que melhor dissipou os costumes germânicos, e teve um papel importante no direito que estava surgindo. Na penhora privada que adveio do direito longobardo, amplamente utilizada nessa época, não se exigia quaisquer tipos de prova contra o possível devedor, bastando, inicialmente, a palavra do credor. Alguns estudiosos afirmam que essa penhora deu origem ao arresto italiano. No direito carolíngio, 180 os bens, imóveis ou móveis, do devedor, eram arrestados por ato do conde (messio in bannum) e, após um ano, poderia se converter ao Estado o que restasse do pagamento ao credor. Esse instituto se aproxima do missio bona servendae (concedida ao credor) causa do direito romano. Nos séculos XII e XIII, era utilizada, como medida cautelar, a “captura” do devedor. No presente capítulo, pretende-se, de forma sucinta, abordar o tema da dissertação, sob a ótica do Direito Comparado e as novas realidades internacionais. Para tanto, determinados elementos dos ordenamentos jurídicos estrangeiros: alemão, espanhol, francês, italiano e português serão, aqui, comentados. O direito comparado sempre exerceu forte atração sobre os estudiosos brasileiros. No entanto, são raros os trabalhos de efetiva comparação entre os ordenamentos de outros países, primordialmente, com a utilização de variáves previamente selecionadas. Ou seja, é incomum o estudo de real natureza juscomparativa no Brasil. 4.2 Medidas de Urgência no Direito Alemão 181 O nazismo, movimento político nacional-socialista 182 , que colocava em cheque a questão das lutas de classes, sob a égide do poder da “raça ariana”, suprimiu os sindicatos da época, que foram substituídos pela Frente Alemã de Trabalho. Dentro da visão autoritária da época, os conflitos trabalhistas eram “resolvidos” nos limites territoriais da empresa, e pelo chefe, que deveria ser obedecido pelos subordinados. Foi instituído o Conselho de Confiança, 180 Carolíngios ou Carlovíngios é o nome da dinastia franca que sucedeu aos merovíngios, n ano de 751. O estudo acerca desse sistema é de extrema dificuldade. Além das barreiras linguísticas, poucos doutrinadores aventuram-se a escrever, mais aprofundadamente, sobre um ordenamemento de estruturação tão diversa do brasileiro. Dentre os doutrinadores, destaca-se o mineiro Antônio Álvares, em sua obra: “Convenção Coletiva do Trabalho perante o Direito Alemão”. Rio de Janeiro: Forense. 182 Terminologia utilizada na Alemanha. 181 220 cujos regulamentos das empresas passavam por esse órgão, e tinha o poder, até mesmo, de anular aquela norma interna. Passada a fase nazista, que marcou aquela região, foi publicada a Constituição Alemã, sob a égide de um Estado Federal, democrático e social. Nessa Lei Maior, dentre os tribunais pertencentes ao Poder Judiciário, adveio o Tribunal Federal do Trabalho. A organização judiciária alemã muito se difere da brasileira. Os tribunais trabalhistas são compostos de juízes togados e não togados (chamados de honorários). Esses últimos, uns são representantes dos trabalhadores e outros dos empregadores. Na primeira instância, tem-se três juízes: um togado e dois honorários (um representante dos trabalhadores e o outro dos empregadores). Atualmente, os procedimentos trabalhistas estão normatizados na Lei Orgânica Federal (artigos 46 a 98). O Processo Trabalhista alemão possui diferenças substanciais frente ao processo brasileiro. Não obstante às diversidades, ao que tudo indica, no estudo realizado, o processo alemão é ainda mais célere do que no direito pátrio, primordialmente, em virtude da supervaloração do princípio da oralidade. O processo laboralista é eminentemente oral, sendo as partes notificadas da audiência de conciliação com 10 dias de antecedência. Os demais atos são parecidos com o procedimento brasileiro, como por exemplo, na Alemanha também existe a audiência una. Interessante particularidade do sistema alemão consiste no fato de: a parte poder interpor com o chamado recurso de cassação da sentença, diretamente, sendo suprimida a apelação, caso as duas partes assinem e concordem. 4.2.1 A Tutela de Urgência no Direito Processual Alemão As medidas de urgência na Alemanha estão, eminentemente, voltadas para a garantia do credor, no entanto, não possuem o caráter de satisfatividade. A cautelosa normatização alemã denota uma preocupação, ainda maior do que a brasileira, com os prejuízos que uma medida de urgência pode gerar para a parte que a sofreu. O sistema processual civil alemão é regido, basicamente, pelo Código de Processo, o ZPO – Zivilprozeßordnung, que vigora com o texto datado de 1879, salvo algumas modificações. No Direito alemão, existem basicamente duas medidas de urgência e segurança, segundo Von Adamovich: 221 A Lei Processual Civil alemã (ZPO) reconhece, basicamente, duas espécies de tutela de urgência e segurança: o arresto, para demandas que se traduzam diretamente em pecúnia e as disposições, ou provimentos provisórios (einstweilige Verfügungen), para as pretensões que não se expressam diretamente em dinheiro. Ambas as formas estão reguladas juntamente com o Processo de Execução (§ 916 e seguintes). (VON ADAMOVICH, 2.000, p. 119). No site original da União Europeia, estão explicitadas diversas outras medidas de urgência, em caráter geral, que abaixo estão transcritas: 1.1. Arresto e privação da liberdade (artigo 916 e seguintes do Código de Processo Civil alemão – Zivilprozessordnung/ZPO) O arresto é efetuado por intermédio de execução forçada sobre os bens do devedor (artigo 928 do ZPO), a privação da liberdade traduz-se numa detenção ou em qualquer outro meio de restrição da liberdade individual, especificamente ordenado pelo Tribunal competente, o Arrestgericht (art. 933 do ZPO). [...] O arresto tem como consequência a confiscação (apreensão); tanto o devedor como o terceiro devedor deixam de poder dispor dos bens apreendidos. 1.2. Providência cautelar (art. 935 e seguintes do ZPO) Trata-se de uma medida provisória decretada pelo Tribunal no intuito de garantir um crédito ou assegurar o entendimento jurídico (Rechtsfrieden) entre as partes. [...] Tem por objetivo impedir que, através da alteração de uma situação existente, a satisfação dos direitos de uma parte seja comprometida ou consideravelmente obstruída. A providência cautelar regula o direito à restituição ou o direito de sujeição à obrigação de tolerar ou ainda o direito de agir (arts. 935, 938 e 940 do ZPO). As disposições aplicáveis ao arresto e à privação da liberdade são, no essencial, igualmente válidas para a providência cautelar (art. 936 do ZPO). 1.3. Pré-aviso de penhora (art. 845 do ZPO) O pré-aviso de penhora é uma medida de execução forçada privada a que o credor pode recorrer. 1.4. Execução de decisões declaradas executórias a título provisório (art. 708 e seguintes do ZPO). Trata-se da execução de decisões emanadas do Tribunal que ainda não transitaram formalmente em julgado. (UNIÃO EUROPEIA, 2011). Ressalta-se que a medida de privação da liberdade só pode ser decretada nos casos em que a segurança do crédito não possa ser garantida pelo arresto. Importante observar que, no pré-aviso de penhora, o credor (ou um oficial de justiça em seu nome), com base em um título executivo, pode remeter diretamente ao devedor, inicialmente. Porém, sua efetivação fica condicionada, após um mês de envio, ao despacho confirmador do Tribunal (art. 845, n.º 2, do ZPO). Dessa feita, o credor pode tomar a iniciativa de execução dos seus créditos ou quaisquer outros direitos. No ordenamento jurídico brasileiro, essa conduta de autotutela é reprimida. A competência em matéria trabalhista para julgar o pedido da medida de urgência é do juiz que seria competente para apreciar a ação principal. Mas, a execução das medidas cautelares provisórias é necessariamente reservada aos oficiais de justiça. 222 De maneira geral, a competência em matéria de arresto e de privação da liberdade pode ser exercida tanto pelo juiz da causa como pelo Tribunal de primeiro grau, em cuja área se encontre o objeto a ser arrestado ou a pessoa sobre o qual recairá a imposição de privação da liberdade. Porém, só o juiz da causa é competente para decretar uma providência cautelar. Interessante mencionar que os pedidos de arresto, de privação da liberdade ou de providência cautelar podem ser apresentados sem que seja necessária a representação por um advogado. O Presidente do Tribunal pode deferir a medida inaudita altera pars (§ 944, do ZPO). Existem duas fases distintas no processo cautelar: a primeira consiste na apreciação do pedido e deferimento (ou indeferimento) do mesmo e; a segunda na ratificação, em relação à execução coativa. Essa última fase é regulada pelo processo executivo da Lei Processual Civilista alemã (ZPO). Em sede trabalhista, existe uma medida cautelar específica: a prorrogação do emprego que é destinada a proteger o direito que o empregado tem de receber trabalho do empregador (é medida reintegratória). O empregador, também fazendo pedido cautelar, pode negar a manutenção do emprego, caso prove a total impossibilidade, seja por motivos econômicos, pessoais, ou até mesmo através do parecer do conselho de empregados. Existe, no ordenamento alemão, uma interessante medida cautelar: a concessão de férias, caso o empregado não tenha usufruído de suas férias, na forma legal. Essa medida é plenamente viável e compreensível, pois a normatividade relacionada às férias concerne à saúde do trabalhador. Existe ainda o arresto in persona, quando não for possível que recaia sobre o bem, e a parte ameaça fugir (§ 918). “A segurança pessoal de prisão só deve ter lugar se for necessário para assegurar a execução em risco o patrimônio do devedor para garantir”. 183 Do indeferimento do arresto, é cabível o recurso de Bescherde (compatível com o agravo de instrumento, no Brasil, porém com o prazo de duas semanas). Do deferimento, não cabe um recurso, mas uma espécie de pedido de reconsideração (Widerpruch). As partes podem recorrer de uma sentença desde que o valor do pedido, objeto de recurso, ultrapasse 600 euros. 183 “§ 918 Arrestgrund bei persönlichem Arrest - Der persönliche Sicherheitsarrest findet nur statt, wenn er erforderlich ist, um die gefährdete Zwangsvollstreckung in das Vermögen des Schuldners zu sichern” (ALEMANHA, 1879). 223 É importante informar que a execução do arresto e da privação da liberdade, assim como o despacho que prevê a medida cautelar, caduca no prazo de um mês, a contar do dia de pronúncia da sentença ou da data da sua notificação. A título de curiosidade, as custas, assim como no Brasil, são suportadas, pela parte condenada pelo Tribunal, ao seu pagamento (Entscheidungsschuldner), mas o requerente é também considerado responsável pelo fato de ter dado início ao processo. Os arrestos, as privações da liberdade ou as providências cautelares estão sujeitas ao pagamento de uma taxa judicial, nos termos da Lei das Custas Judiciais. A importância a ser paga depende do valor do litígio, o Tribunal avalia caso a caso, em função do interesse de que a medida cautelar se revesta para o requerente. 4.3 Medidas de Urgência no Direito Espanhol 4.3.1 Considerações Iniciais / Organização Judiciária Espanhola Na Espanha, não existe uma Justiça Especializada laboral, como no Brasil. Os espanhóis permitem que exista apenas a especialização em sede de seções nos Tribunais. A criação do processo civil naquele país também teve forte inspiração chiovendiana, primordialmente, frente aos princípios, desenvolvidos pelo ilustre operador do direito, Chiovenda. No ano de 2.000, foram introduzidas profundas reformas na Ley de Enjuiciamento civil. Pondera Angel Blasto Pellicer (1996), que a doutrina não se atém como deveria, para o processo cautelar no Direito do Trabalho e, é exatamente por esse motivo que escreve sobre o tema em tela, explicitando que as razões para o descaso, seriam: [...] se el objetivo fundamental de culquier medida cautelar reside em la necessidad de adoptar decisiones que tiendan a asegurar el resultado de um processo in curso o a punto de iniciarse, ante el peligro que, para la efectividade práctica de uma ulterior sentencia, puede suponer el transcurso de tiempo necessario para cumplir los trámites que impone cada procedimento, parece que el processo laboral el peligro es, em teoria, menor. (PELLICER, 1996, p.24) As medidas cautelares seriam instrumentos para se fazer justiça no processo principal e, segundo Pellicer (1996, p. 67): “[...] no puedem ser consideradas como um fin em sí mismas”, acrescenta, ainda, em ocasião posterior, na mesma obra, que “[...] la pendencia de 224 un proceso principal opera como conditio sine qua non de la medida cautelar” e, “[...] no hay proceso cautelar autónomo, no existe cautela sino en relacion a otro proceso que lhamamos principal” (PELLICER, 1996, p. 69), salvo a medida cautelar preparatória, que necessitará de um processo futuro. Essa noção está exatamente contrária ao moderno movimento de estabilização do procedimento cautelar. Frente à nítida desigualdade originária, entre o trabalhador e o empregador, o STC (Superior Tribunal Constitucional) espanhol, já decidiu no sentido de existir um direito processual de cautela (“derecho de cautela”), que consiste em um dos meios de defesa do trabalhador. Esse direto estaria inserido naquela possibilidade de reação do trabalhador, diante dos abusos cometidos por parte do empregador, (no Brasil, a doutrina denomina esse poder de jus resistentiae), na verdade, seria um contraponto ao poder do empregador de modificar, unilateralmente, o contrato de trabalho (no direito pátrio, jus variandi). Quando do exercício desse poder pelo empregador, o juiz (Estado) está autorizado a aplicar uma das medidas cautelares, abaixo explicitadas. Os princípios norteadores do processo laboral espanhol são quase os mesmos no Direito do Trabalho brasileiro, segundo aquele autor: [...] un modelo de processo judicial basado en los antedichos principios de concentración, immediatez, oralidad y celeridad en el que la eliminación de trámites innecessarios y la aplicación prática de tales principios, configuram un proceso abierto, ágil y rápido que trata de evitar la dilación muchas veces perseguida por la parte contractualmene más fuerte. (PELLICER. 1996, p. 24). É exatamente por essa razão que, na Espanha, assim como no Brasil, as medidas cautelares são compatíveis com o processo trabalhista, frente ao risco da lentidão processual (questão também verificada nos tribunais espanhóis) provocar um dano irreparável. As Leis processuais espanholas são eivadas de princípios que geram a efetividade da tutela judicial (justo processo). Angel Blasto Pellicer (1996) preleciona que a Lei Trabalhista Espanhola (“la base 16 de la Ley 7/1989, de 12 de abril, de Bases Del Procedimento Laboral”) é concisa, com relação ao procedimento cautelar. No dia 12 de dezembro de 2011, entrou em vigor a nova Lei da Jurisdição Social, aprovada no dia 10 de outubro do mesmo ano. A jurisdição de ordem social concerne às pretensões pertencentes ao ramo social do Direito, tanto na vertente individual como coletiva, incluindo as matérias que versem sobre Direito do Trabalho e Seguridade Social. Os 225 princípios regentes do processo, na jurisdição social, são: imediação, oralidade, concentração e celeridade. 184 O Processo do Trabalho espanhol é regulado, especificamente, pela Lei de Procedimento Laboral (“la Ley de Procedimiento Laboral”) Real Decreto Legislativo 2/1995. A tentativa de conciliação é requisito prévio obrigatório, via administrativa, antecedente ao ajuizamento de qualquer demanda laboral, exceto em alguns casos, tais como: matéria acerca do gozo das férias, impugnação de convênios coletivos (diplomas negociais coletivos) e impugnação do estatuto de sindicatos. Existe mais de um órgão conciliador na Espanha, são os mesmos: Serviço de Mediação, Arbitragem e Conciliação, da Direção Geral do Trabalho e das Direções Provinciais (O Instituto de Mediação Arbitragem e Conciliação é regulado pelo Real Decreto 2756/1979), Orgãos que assumem essa competência mediante acordo inter-profissionais e convênios coletivos. O organismo mais relevante é o chamado SIMA (Serviço Inter-confederado de Mediação e Arbitragem, criando pelo Acordo de Solução Extrajudicial de Conflitos Laborais). Anteriormente ao ajuizamento da ação, a parte deve intentar a chamada Reclamação Administrativa Prévia (“Reclamacíon Administrativa Previa” – artigo, 69 da LPL). Somente em caso de não resolução, via administrativa, que é possível a propositura da ação laboral, perante o ente jurídico público. Não é necessária a reclamação administrativa onde estiver excluída a necessidade de prévia conciliação, por exemplo, no caso de impugnação acerca das férias. A processualística trabalhista na Espanha subdivide-se em Processo Ordinário e em Processo Especial. No Brasil, essa subdivisão é denominada de ritos processuais. Sobre o Processo Ordinário recai a maioria das ações trabalhistas. Esse instrumenta, primordialmente, os conflitos consentâneos aos contratos de trabalho. O Processo Especial é aplicável às matérias específicas. Existem diferenciações substanciais, entre os dois processos, primordialmente no que tange a forma de iniciá-lo. As matérias especiais segundo a lei, acima exposta, são: Dispensa por motivo disciplinar (artigo 103 e siguientes LPL); Sanções (artigo 114 e 115 LPL); Reivindicação salarial contra o Estado (artigo 116 a 118 LPL); Rescisão contratual por razões objetivas (artigo 120 a124 LPL); Férias (artigo 125 y 126 LPL); Matéria Eleitoral (artigo 127 a 136 LPL); Classificação 184 No artigo 74 da referida Lei está disposto que: “1. Los jueces y Tribunales del orden jurisdiccional social y los secretarios judiciales en su función de ordenación del procedimiento y demás competencias atribuidas por el artículo 456 de la Ley Orgánica del Poder Judicial, interpretarán y aplicarán las normas reguladoras del proceso social ordinario según los principios de inmediación, oralidad, concentración y celeridad. 2. 2. Los principios indicados en el apartado anterior orientarán la interpretación y aplicación de las normas procesales propias de las modalidades procesales reguladas en la presente Ley.” (ESPANHA, 2011). 226 profissional (artigo 137 LPL); Transferência e modificação substancial das condições de trabalho (artigo 138 LPL); Intervalos para amamentação e redução de horário por motivos familiares, artigo 138 bis); Processo acerca da Seguridade Social (artigo 139 a145 LPL); Processos iniciados ex officio (artigo 146 a 150 LPL); Convenções Coletivas (artigo 151 a160 LPL); Reclamação acerca Convênios Coletivos (artigo 161 a164 LPL); Impugnação e modificação acerca de estatutos dos sindicatos (artigo 165 a 174 LPL) e; Tutela dos Direitos à Liberdade Sindical e das liberdade pública (artigos 175 a 182). Em matéria trabalhista, a competência territorial se divide entre: Tribunal do Trabalho (“Juzgado de lo Social”), cujo âmbito é provincial , sediado na Capital provincial; Divisão social nos TJS (“Sala de lo Social de los TSJ” – Tribunais Superiores de Justiça), com sede nas comunidades autônomas 185 ; Divisão Social no AN (“Sala de lo Social AN” – Audiência Nacional), sede: Madrid e o âmbito é nacional; Divisão social do TS (“Sala de lo Social TS”), sede: Madrid e o âmbito é nacional. 4.3.2 Antecipação de Tutela no Ordenamento Espanhol A exemplo de diversos ordenamentos jurídicos, o Direito Espanhol, carece de uma normatividade específica acerca da antecipação de tutela, inclusive, diversos doutrinadores elogiam a processualística brasileira, consoante ao tema. A legislação espanhola preferiu a terminologia “jurisdição sumária” (“juicio sumario y medidas cautelares” da LEC), enquanto técnica a produzir resultados similares ao procedimento cautelar. A essência da jurisdição sumária é a limitação do âmbito objetivo da coisa julgada. É um processo autônomo, além de ter o seu objeto limitado. A obtenção de qualquer tutela de caráter provisório, lato sensu, cujas vertentes podem ser: conservatório, assecuratório, satisfatório, inovatório, convocatório, antecipatório dentre outras possibilidades, regra geral, acaba por se resumir ao procedimento cautelar. Ou seja, na Espanha, não existe uma diferenciação precisa entre tutela antecipatória, cautelar e inibitória, como na avançada legislação brasileira. Em verdade, o processo cautelar é inflexível. Prova dessa assertiva concerne à redação do artigo 721, da “ley del enjuiciamiento civil”: Sob sua responsabilidade, todas as partes, principal ou reconvencional, podem solicitar ao Tribunal, conforme as disposições constantes nesse Título, a adoção de medidas cautelares, que considerarem necessárias para assegurar a efetividade da 185 A Espanha é formada por dezessete cidades autônomas, cada uma possui a sua capital. Salvo as Islas Canarias que possuem duas capitais: Santa Cruz de Tenerife e Las Palmas de Gran Canari. 227 tutela judicial, que poderá ser consedida na sentença da respectiva jurisdição. (ESPANHA, 2000). 186 As medidas cautelares não podem ser decretadas de ofício, salvo certos casos estabelecidos em lei (para os procedimentos especiais). A nova lei processual unificou o sistema, delimitando as cautelares nominadas e as inominadas. A respeito preleciona o professor Francisco Ramos Méndez (2000): El juicio es una sucesión de actos con dimensión temporal. Debido a las limitaciones del juicio humano es necesario consumir un espacio de tiempo para definir el derecho: su creación en el juicio no es un acto instantáneo, sino que se realiza a través de lo que gráficamente denominamos processus iudicii. Por otro lado, el juicio tiene una indudable vocación de eficacia. Su finalidad no estriba meramente en la obtención de un pronunciamiento jurisdiccional sino también en que éste se cumpla. Para paliar de alguna manera los riesgos de la tardanza de una resolución definitiva, que puedan hacer ilusorio el pronunciamiento jurisdiccional, hay que arbitrar un sistema de protección. Surge así el concepto de medida cautelar. La medida cautelar es el remedio arbitrado por el derecho para obviar de alguna manera los riesgos de la duración temporal del juicio, en orden a su eficacia. Su mecanismo operativo es hasta cierto punto sencillo: El juicio eficaz es el que otorga una completa satisfacción jurídica a las partes. No se limita a la mera “declaración” del derecho, sino que se prolonga incluso en una eventual fase de ejecución para cumplir en todo su alcance el pronunciamiento jurisdiccional. Sólo cuando la sentencia ha sido cumplida por completo alcanza su plena eficacia. Como esta meta se vislumbra ciertamente lejana al inicio del juicio, la solución idónea estriba en anticiparla o al menos asegurarla de alguna manera. La medida cautelar anticipa provisionalmente la ejecución o asegura su éxito, desde el propio momento inicial del juicio. (MENDEZ, 2000, p 3) O sistema cautelar espanhol passou a ser um preceito único, sumarizado, que serve de base para todos os que pleiteiam uma tutela provisória, de urgência. É um processo que passou a simplificar certas situações que permitem uma tutela provisória. 4.3.3 Processo Cautelar Espanhol A normatividade pertinente à matéria de cautelar na Espanha concerne ao disposto na Lei Processual Civil (“Ley de Enjuiciamiento Civil”), do ano de 2000, especificamente no Livro III, cujo título prevê: “la ejecución forzosa y de las medidas cautelares”. Anteriormente a essa nova codificação, a norma processual regente datava de 1881. A doutrina espanhola, há muito, vinha criticando o fato de a lei ser tão antiga e, não obstante as numerosas reformas subsequentes, a necessidade de uma norma mais atual era latente. 186 Bajo su responsabilidad, todo actor, principal o reconvencional, podrá solicitar del Tribunal, conforme a lo dispuesto en este Título, la adopción de las medidas cautelares que considere necesarias para asegurar la efectividad de la tutela judicial que pudiera otorgarse en la sentencia estimatoria que se dictare. 228 Oretellis Ramos Manuel, autor espanhol, expõe que “el processo cautelar es la justa respuesta a uma necessidad creada por el próprio processo como instrumento del ejercicio de la potestad jurisdicional” (PELLICER, 1996, p.21). Por ser a tutela jurisdicional, um direito fundamental dentro de um Estado Democrático de Direito, são necessários, para a sua eficácia, mecanismos jurídicos e técnicos que assegurem o pronunciamento rápido do poder judiciário, reside aqui a necessidade das medidas cautelares, cosoante à doutrina espanhola. Segundo Pellicer (1996, p. 22) “[...] un pronunciamiento judicial efectuado tarde em el tiempo puede equivaler en la práctica a uma ausência de tutela judicial”, além de garantir a efetividade do processo principal, bem como, do pronunciamento desse no futuro. 187 Conforme a supracitada Constituição, todas as pessoas têm direito à efetiva proteção dos Tribunais no exercício dos seus legítimos direitos e interesses e em nenhum caso pode ocorrer a ausência de defesa. Além disso, todos têm direito ao juiz ordinário previamente determinado por lei (princípio do juiz natural); a um advogado da defesa e assistência, para ser informado das acusações contra eles (contraditório); a um julgamento público, sem demora (aqui a grande questão do tempo do processo) e com plenas garantias (ampla defesa); a utilizar os meios de comunicação e provas relevantes para a sua defesa e; a não testemunhar contra si próprios, para não confessar culpa e da presunção de inocência (princípio do estado de inocência). O citado artigo da Constituição espanhola traz diversas informações em um só item. Já o constituinte brasileiro optou por trazer tais matérias de forma apartada e mais detalhadamente, em incisos, no artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988. 187 Nesse sentido, tem-se, na Constituição da Espanha, o artigo 24 em que se definiu: “Artículo 24 1. Todas las personas tienen derecho a obtener tutela efectiva de los jueces y Tribunales en el ejercicio de sus derechos e intereses legítimos, sin que, en ningún caso, pueda producirse indefensión. 2. Asimismo, todos tienen derecho al Juez ordinario predeterminado por la ley, a la defensa y a la asistencia al letrado, a ser informados de la acusación formulada contra ellos, a un proceso público sin dilaciones indebidas y con todas las garantías, a utilizar los medios de prueba pertinentes para su defensa, a no declarar contra sí mismos, a no confesarse culpables y a la presunción de inocencia. La ley regulará los casos en que, por razón de parentesco o de secreto profesional, no se estará obligado a declarar sobre hechos presuntamente delictivos.” (ESPANHA, 1978). 229 4.3.3.1 Natureza jurídica da tutela cautelar O tratamento jurídico dado às medidas cautelares espanholas é fragmentado, por isso, estabelecer a natureza do processo é tarefa árdua para os doutrinadores, principalmente no Processo Trabalhista. O processo cautelar espanhol é um processo em si mesmo, ou seja, diferencia-se do processo cognitivo e executório. Essa afirmativa não é unânime da doutrina espanhola. Certos estudiosos expõem que o processo cautelar, na verdade, seria incidente ao processo declarativo, ou, uma medida para assegurar a execução. Frente à tutela cautelar tem-se, ainda, outra questão: reconhecer esta proteção como um direito substantivo (direito substancial de cautela). Conforme julgamento do Tribunal Constitucional Espanhol, a tutela judicial não concerne apenas às medidas cautelares que assegurem o efetivo cumprimento e resolução definitiva de um processo (principal), explicitando que: “El processo cautelar es, em este sentido, el instrumento mediante el que los órgaos jurisdiccionales ejercen la fundamentación constitucionalmente encomendada de otorgar tutela judicial asegurando que el fallo de otro proceso se cumpla.” (PELLICER. 1996, p. 27). Dessa feita, a tutela cautelar seria um instrumento do qual os órgãos jurisdicionais espanhóis efetivam a fundamentação constitucional concernente à tutela judicial, a assegurar o processo principal. 4.3.3.2 Características e Pressupostos Frente à lacuna legal existente no ordenamento jurídico espanhol, com relação ao instituto da cautelar, a doutrina tenta criar uma dogmática própria do regime geral, para facilitar a interpretação das normas. As características são: a) Intrumentalidad (instrumentalidade): as medidas cautelares não são apenas, pura e simplesmente, instrumentais frente à ação principal, mas também servem ao direito material em litígio, antecipando os efeitos constitutivos da decisão. No entanto, a medida cautelar existe em função de um processo principal, caso esse seja extinto, aquela se extinguirá também. A medida cautelar caracteriza-se por sua temporariedade. b) Urgencia (urgência): A urgência é uma característica fundamental para o instituto cautelar. Nas palavras do ilustre doutrinador espanhol: “La urgencia es el fundamento 230 de determinadas consecuencias y efecto que acompañan com caráter geral el régimen jurídico de lãs medidas cautelares, concretamente de su adopción inaudita parte y de la necessidade de finanza.” (PELLICER, 1996, p.35). c) Jurisdiccionalidad (jurisdicionalidade): referente à possibilidade de modificação da medida cautelar, conforme o entendimento explicitado por Pellicer (1996, p.36): “en definitiva, la firmeza de la resolución que otorga tutela cautelar no obsta a la deducción de que ésta puede ser, rebus sic standibus, modificada en el sentido señalado.” A base dos pressupostos do procedimento cautelar na Espanha é a mesma adotada pelo ordenamento jurídico e doutrina brasileira, quais sejam: o fumus boni iuris e; periculum in mora, pendência a um processo principal; a necessidade de caução (“la fianza o contracautela” – pressuposto complementar – para evitar que, quando na realidade fatídica e de direito, o demandado é a parte que teria razão, esse ficaria sem uma garantia). 4.3.3.3 As medidas cautelares no âmbito do Direito do Trabalho espanhol (Ley de Procedimento Laboral) No segundo livro da “Ley de Procedimento Laboral” (LPL), existem dispositivos concernentes às “medidas precautorias”, (artigo 78 e 79), que não são as medidas cautelares, salvo a medida prevista nesse último artigo, sobre o chamado embargo preventivo. A prática antecipada de prova não visa assegurar o resultado do processo, e sim, evitar que, no futuro, não se possa produzir uma prova no processo. Existem diferenças entre as medidas cautelares, as diligências preliminares (atos de jurisdição voluntária, que o demandante está facultado a executar, tal como exibição de documentos) e prova antecipada (realização da prova antes de seu tempo processual habitual – que é uma medida assecuratória e não cautelar). Importante ressaltar que existem, no ordenamento espanhol, as chamadas medidas assecuratórias (asseguram os bens do trabalhador, o crédito de caráter alimentar) que não são cautelares, quais sejam: prática antecipada de uma prova 188 (que não visa assegurar o resultado de um processo principal, mas sim o contraditório – artigos 76.2 e 78 da LPL – na prática antecipada de um prova, não existe nem mesmo um processo); consignação para 188 Esse entendimento não é unânime da doutrina, Adamovich aponta em sua publicação que a prática antecipada de provas tem caráter cautelar (VON ADAMIVICH, 2000, p. 110). 231 recorrer (“consignaciones para recurrir” – artigo 228 da LPL 189 - é como se fosse um depósito recursal – que evita recursos meramente protelatórios, facilita a execução e dentre outras vantagens) e a; “ejecución provisional” (o título da execução não adquiriu “firmeza”, ou seja, não se tornou título executivo, em função da pendência de um recurso. Pellicer (1996) explicita que Calamandrei entendeu que essa execução teria caráter, eminentemente, cautelar, o que não estava consentâneo com a própria sistemática da LPL e da LEC, do caráter alimentício do objeto da demanda e do caráter autônomo do procedimento). Observar-se-á que os dois últimos institutos são instrumentos próprios do processo de execução. Existem as medidas cautelares preparatórias (confissão do presumido demandado, exame de documentos livros e contas e exame prévio de testemunhas) e; medidas precautórias (prática antecipada de provas e embargos preventivo ou arresto). No processo do Trabalho, existe uma série de medidas cautelares que podem ser classificadas da seguinte forma: A) O embargo preventivo (ou arresto): É a busca de bens do empresário como garantia do processo. Esse procedimento cautelar está subordinado a um processo principal. Tem-se, ainda, o embargo preventivo especial (artigo 141.1 LPL 190), em que está previsto a contrição de bens dos empresários, em processos cujo objeto seja acidente do trabalho, (o empresário espanhol tem 4 dias para entregar a documentação de cobertura do risco do acidente do trabalho) e as enfermidades profissionais. Na legislação espanhola, tem-se o embargo preventivo ordinário, previsto no artigo 79 da LPL 189 190 191 191 . O embargo preventivo do demandado “Artículo 228. Cuando la sentencia impugnada hubiere condenado al pago de cantidad, será indispensable que el recurrente que no gozare del beneficio de justicia gratuita acredite, al anunciar el recurso de suplicación o al preparar el recurso de casación, haber consignado en la oportuna entidad de créditos y en la Cuenta de Depósitos y Consignaciones abierta a nombre del Juzgado o de la Sala de instancia, la cantidad objeto de la condena, pudiendo sustituirse la consignación en metálico por el aseguramiento mediante aval bancario, en el que deberá hacerse constar la responsabilidad solidaria del avalista. El resguardo de consignación en metálico o, en su caso, el documento de aseguramiento quedará bajo custodia del Secretario, que expedirá testimonio de los mismos para su unión a los autos facilitando el oportuno recibo” (ESPANHA, 1995). “Artículo 141. 1. Si en las demandas por accidente de trabajo o enfermedad profesional no se consignará el nombre de la entidad gestora o, en su caso, de la Mutua de Accidentes de Trabajo y Enfermedades Profesionales de la Seguridad Social, el Juez, antes del señalamiento del juicio, requerirá al empresario demandado para que en plazo de cuatro días presente el documento acreditativo de la cobertura de riesgo. Si transcurrido este plazo no lo presentará, vistas las circunstancias que concurran y oyendo a la Tesorería General de la Seguridad Social, acordará el embargo de bienes del empresario en cantidad suficiente para asegurar el resultado del juicio.” (ESPANHA, 1995). “Artículo 79. 1. El órgano judicial, de oficio o a instancia de parte interesada o del Fondo de Garantía Salarial, en los casos en que pueda derivarse su responsabilidad, podrá decretar el embargo preventivo de bienes del demandado en cuantía suficiente para cubrir lo reclamado en la demanda y lo que se calcule para las costas de ejecución, cuando por aquél se realicen cualesquiera actos de los que pueda presumirse que pretende situarse en Estado de insolvencia o impedir la efectividad de la sentencia. 2. El órgano judicial podrá requerir al solicitante del embargo, en el término de una audiencia, para que presente documentos, información testifical o cualquier otra prueba que justifique la situación alegada. Em los casos en que pueda 232 rebelde, que está regulado pelo artigo 183.2 (LPL): o demandado “rebelde” 192 , ou seja, aquele que deu causa ao fim do processo; na petição, o demandante, pode requerer o embargo de bens móveis e imóveis, nos processos seguintes sem o comparecimento daquele. Importante salientar que os embargos, em epígrafe, diferenciam-se, substancialmente, do chamado embargo executivo, adotado no processo de execução. Admitese que o embargo preventivo seja de ofício. Não é cabível recurso frente à decisão denegatória dos embargos. B) As medidas cautelares no processo de tutela dos direitos de liberdade sindical e outros direitos fundamentais – Consentâneo aos artigos 14 c/c 175 a 182, da LPL 193, 53.2 da Constituição da Espanha; C) A disposição prevista no artigo 131.1 c): em processo especial de impugnação de laudo arbitral, em matéria de eleição sindical, que permite o juiz suspender a petição da parte, em meio ao procedimento eleitoral, frente às causas justificadas (por exemplo, fraude); D) Confissão do presumido demandado: Segundo o artigo da Lei de Procedimento Laboral: DE LOS ACTOS PREPARATORIOS Y MEDIDAS PRECAUTORIAS SECCIÓN 1. ACTOS PREPARATORIOS Artículo 76. 1. Quien pretenda demandar, podrá solicitar del órgano judicial que aquél contra quien se proponga dirigir la demanda preste declaración acerca de algún hecho relativo a la personalidad de éste y sin cuyo conocimiento no pueda entrarse en juicio. (ESPANHA, 2011). E) Exame de documentos, livros e contas: quando esses se mostrarem indispensáveis para fundamentar uma demanda judicial (artigo 77 do diploma laboral): Artículo 77. 192 193 derivarse responsabilidad del Fondo de Garantía Salarial, éste deberá ser citado a fin de señalar bienes. (ESPANHA, 1995). - Segundo o que está estabelecido na Ley de Procedimiento Civil: “DE LA AUDIENCIA AL DEMANDADO REBELDE: Artículo 183. A los procesos seguidos sin que haya comparecido el demandado, les serán de aplicación las normascontenidas en el Título V del Libro II de la Ley de Enjuiciamiento Civil, con las especialidades siguientes:1. No será necesaria la declaración de rebeldía del demandado que, citado en forma, no comparezcaal juicio.2. A petición del demandante se podrá decretar el embargo de bienes muebles e inmuebles en lonecesario para asegurar el suplico.Ley Procedimiento Laboral - 503. El plazo para solicitar la audiencia será de tres meses desde la notificación de la sentencia en elBoletín Oficial correspondiente en los supuestos y condiciones previstos en el artículo 501 de laLey de Enjuiciamiento Civil.4. La petición se formulará ante la Sala de lo Social del Tribunal Superior de Justicia correspondienteo del Tribunal Supremo, en su caso.5. La audiencia al demandado se sustanciará ante el órgano que conoció del litigio en instancia.6. En ambos supuestos se seguirán los trámites del proceso ordinário”. (ESPANHA, 1995). O título deste capítulo é: “DE LA TUTELA DE LOS DERECHOS DE LIBERTAD SINDICAL”. (ESPANHA, 1995). 233 1. En todos aquellos supuestos en que el examen de libros y cuentas o la consulta de cualquier outro documento se demuestre imprescindible para fundamentar su demanda, quien pretenda demandar podrá solicitar del órgano judicial la comunicación de dichos documentos. Cuando se trate de documentos contables podrá aquél acudir asesorado por un experto en la materia, que estará sometido a los deberes que puedan incumbirle profesionalmente en relación con la salvaguardia del secreto de la contabilidad. Las costas originadas por el asesoramiento del experto correrán a cargo de quien solicite sus servicios. 2. El órgano judicial resolverá por auto, dentro del segundo día, lo que estime procedente, adoptando, em su caso, las medidas necesarias para que el examen se lleve a efecto sin que la documentación salga del poder de su titular. (ESPANHA, 2011). F) Exame prévio de testemunhas: A redação do artigo 76 itens 2 e 3 é extremamente específica e demonstra certa exemplificação de possíveis fatos: 2. Asimismo, quien pretenda demandar o presuma que va a ser demandado podrá solicitar previamente examen de testigos cuando por la edad avanzada de alguno de éstos, peligro inminente de su vida,proximidad de una ausencia a lugar con el que sean imposibles o difíciles las comunicaciones, o cualquier otro motivo grave y justificado, sea presumible que no va a ser posible mantener su derecho por falta de justificación. 3. Contra la resolución judicial denegando la práctica de estas diligencias no cabrá recurso alguno, sin perjuicio del que en su día puedan interponerse contra la sentencia. (ESPANHA, 2011). Esse último item aplica-se para todas as medidas no âmbito laboral, destarte, não cabe recurso contra a decisão judicial que denega a prática das supracitadas diligências. G) Prática antecipada de provas (medida “precautória”): é diferente da oitiva de testemunha, que não possui caráter cautelar, além de ser mais abrangente, por ser medida cabível a antecipação da produção de outras provas. SECCIÓN 2. MEDIDAS PRECAUTORIAS - Artículo 78. Si las partes solicitasen la práctica anticipada de pruebas que no puedan ser realizadas en el acto del juicio, o cuya realización presente graves dificultades en dicho momento, el Juez o Tribunal decidirá lo pertinente para su práctica en los términos previstos por la norma que regule el medio de prueba correspondiente. Contra la resolución denegatoria no cabrá recurso alguno, sin perjuicio del que, por este motivo, pueda interponerse en su día contra la sentencia. (ESPANHA, 2011). No Direito espanhol, existem ainda medidas cautelares específicas, fundamentadas no artigo 727, do Código de Processo Civil, que, diante a compatibilidade de suas naturezas, podem ser aplicadas no processo do trabalho. A primeira dessas medidas é o embargo preventivo de bens, para assegurar a execução de sentenças condenatórias à entrega de determinada quantia em dinheiro, fruto ou rendas, bem como de coisas fungíveis. É cabível, ainda, o embargo preventivo, como medida idônea para os demais casos, além dos legalmente 234 previstos, não havendo outras previsões específicas para a hipótese e, sendo inclusive, menos oneroso para o demandado. A intervenção ou administração judicial de bens produtivos consiste em outra medida, constante no artigo supracitado, cabível quando, a sentença condenatória à entrega de título de propriedade (usucapião, por exemplo), direito de usufrutuário, ou de qualquer outro interessando, incluindo o trabalhador, na manutenção da melhor produtividade, sendo o bem imóvel/imóvel (um estabelecimento comercial) garantia executória primordial. O depósito de coisa móvel é plausível quando se pretende uma demanda específica (entrega de coisa certa), estando o bem na posse do demandado. A ordem judicial de cessação provisória de uma atividade é a abstenção temporária de realização de uma conduta ou a proibição temporária de interromper ou deixar de realizar um serviço é uma medida cautelar, na ordem civil, aplicável ao processo do trabalho. Segundo Alberto José Lafuente Torralba (2008, p. 95), essas medidas, acima explicitadas, são meramente exemplificativas, nas próprias palavras desse ilustre doutrinador: “[...] se trata, como vemos, de uma norma maleable, pesada para adaptar-se a la rica casuística que puede plantear-se [...]”. A prova dessa assertiva está consentânea ao texto normativo, do item 2, desse artigo: 726 - 2.ª No ser susceptible de sustitución por otra medida igualmente eficaz, a los efectos del apartado precedente, pero menos gravosa o perjudicial para el demandado.2. Con el carácter temporal, provisional, condicionado y susceptible de modificación y alzamiento previsto en esta Ley para las medidas cautelares, el Tribunal podrá acordar como tales las que consistan en órdenes y prohibiciones de contenido similar a lo que se pretenda en el proceso, sin prejuzgar la sentencia que en definitiva se dicte. (ESPANHA, 2011). Essas medidas podem perfilhar tanto na esfera assecuratória, quando antecipatória dependendo da matéria e do caso concreto. 4.3.4 Medidas Cautelares Inespecíficas (indeterminadas) As medidas cautelares (as “inespecíficas”) estão regulamentadas no artigo artículos 585 y 586, antigo 1.485, (da NLEC) da LEL (Ley de Enjuiciamiento Civil - Ley 1/2000, de 7 de enero). Essas normas aplicam-se ao processo do trabalho por expressa disposição da LPL. As doutrinas espanholas não se atêm muito para essas medidas, mas, são aplicáveis, por óbvio, segundo as peculiaridades principiológias do Direito Laboral. A possibilidade de cabimento reside, primeiramente, na aplicação subsidiária da Lei Processual Civil à Lei 235 Laboral. Tem-se ainda o argumento de que é garantia constitucional que o demandante tenha, em mãos, a possibilidade de utilizar medidas que tendem a assegurar a efetividade da resolução judicial. Notadamente, essas medidas são necessárias, nos casos em que, frente ao objeto da futura demanda, exista impossibilidade de se converter monetariamente o provável resultado, ou seja, é incabível converter o objeto do litígio em valor pecuniário. Diante a essa interpretação, os juízes estão amparados pela norma do artigo 74 da LPL 194 . Além disso, essas medidas contribuem para que o empregado possa se fazer valer do jus resistentiae. As medidas inespecíficas são aplicáveis em pretensões condenatórias, constitutivas e declarativas. A medida adequada será adotada pelo juiz conforme as circunstâncias do caso concreto. É possível lastro instrutivo mínimo, sumarizado, (o magistrado chama as partes para uma dilação probatória mínima) antes de o juiz decidir-se acerca da medida. Consoante aos artigos supracitados: 4.3.5 O Processo Cautelar na “Ley Reguladora de la Jurisdicción Social - Ley 36/2011, de 10 de Octubre” No Título I do segundo livro (“Do Processo Ordinário e das Modalidades Processuais”), da Lei Reguladora da Jurisdição Social, na Seção três, estão regulamentadas as medidas cautelares específicas, aplicáveis ao processo cuja matéria seja social, incluindo assim, o Direito do Trabalho. Consoante ao exposto no artigo 79, dessa norma: Las medidas cautelares que resulten necesarias para asegurar la efectividad de la tutela judicial que pudiera acordarse en sentencia se regirán por lo dispuesto en los artículos 721 a 747 de la Ley de Enjuiciamiento Civil con la necesaria adaptación a las particularidades del proceso social y oídas las partes, si bien podrá anticiparse en forma motivada la efectividad de las medidas cuando el solicitante así lo pida y acredite que concurren razones de urgencia o que la audiencia previa puede comprometer el buen fin de la medida cautelar. (ESPANHA, 2011). As medidas cautelares que são necessárias para a efetividade da tutela jurisdicional são regidas, em sua essencialidade, pelas normas pertinentes à matéria, constantes na Lei Processual Civil (acima comentadas). Ouvidas as partes, a decisão pode ser antecipada à 194 “Artículo 74. 1. Los Jueces y Tribunales del orden jurisdiccional social interpretarán y aplicarán las normas reguladoras del proceso laboral ordinario según los principios de inmediación, oralidad, concentración y celeridad. 2. Los principios indicados en el número anterior orientarán la interpretación y aplicación de las normas procesales propias de las modalidades procesales reguladas en la presente Ley”. (PORTUGAL, 2000). 236 audiência prévia, quando assim for requerido, em razão de comprovada urgência que possa comprometer a efetividade da medida liminar. Em se tratando de processo que verse sobre impugnação, frente aos atos da administração pública, a adoção de medidas cautelares é regida pela mesma seção daquela norma, bem como, pela Lei nº 29/1998. Para a efetividade da medida de urgência, o legislador espanhol optou por isentar os trabalhadores, representados por seus sindicatos, e os beneficiários da previdência, quando ostentam representação coletiva de seus interesses, assim como as associações representativas dos trabalhadores autônomos, da prestação de caução, garantias e indenizações relacionadas às medidas de caráter cautelar. O Tribunal, ex officio ou a requerimento da parte interessada, pode declarar o congelamento dos bens do réu em quantidade suficiente para garantir o que foi reivindicado no pedido e calculados para os custos de execução, quando da realização de quaisquer atos do demandado que possam comprometer a eficácia da sentença ou quando estiver em situação de insolvência (tudo devidamente comprovado pela parte interessada).195 Interessante disposição protetiva dos direitos individuais dos trabalhadores, encontra-se no artigo 79, item 7, da lei em epígrafe: En lo procesos en los que se ejercite la acción de extinción del contrato de trabajo a instancia del trabajador con fundamento en el artículo 50 del Estatuto de los Trabajadores en aquellos casos en los que se justifique que la conducta empresarial perjudica la dignidad o la integridad física o moral de trabajador, pueda comportar una posible vulneración de sus demás derechos fundamentales o libertades públicas o posibles consecuencias de tal gravedad que pudieran hacer inexigible la continuidad de la prestación en su forma anterior, podrá acordarse, a instancia del demandante, alguna de las medidas cautelares contempladas en el apartado 4 del artículo 180 de esta Ley¸ con mantenimiento del deber empresarial de cotizar y de abonar los salarios sin perjuicio de lo que pueda resolverse en la sentencia. (ESPANHA, 2011). Na hipótese de rescisão indireta do contrato de trabalho, em que a atitude empresarial denotar prejudicialidade à dignidade ou a integridade física ou moral do trabalhador, podendo haver a lesão aos direitos fundamentais do obreiro, poderá o juiz adotar medidas de urgência, sem prejuízo dos salários. 195 196 196 Embargo na Lei espanhola significa congelamento dos bens do demandado. Conforme a norma: “Artículo 50. Extinción por voluntad del trabajador.-- 1. Serán causas justas para que el trabajador pueda solicitar la extinción del contrato: a) las modificaciones sustanciales en las condiciones de trabajo que redunden en perjuicio de su formación profesional o en menoscabo de su dignidad; b) la falta de pago o retrasos continuados en el abono del salario pactado; 237 4.3.6 A Estabilização da Demanda de Urgência no Direito Espanhol As inovações na Ley de Enjuiciamento Civil, especificamente as realizadas no ano de 2.000, em relação às medidas de urgência e o efeito potencialmente estável, vieram para relativizar a necessidade de vinculação de uma medida de urgência a um processo declarativo. Na exposição de motivos da LEC, está explicitado que a instrumentalidade, a acessoriedade e a provisoriedade seguem como parâmetro ainda central da tutela cautelar: XVIII En cuanto a las medidas cautelares, esta Ley las regula en un conjunto unitario de preceptos, del que sólo se excluyen, por las razones que más adelante se dirán, los relativos a las medidas específicas de algunos procesos civiles especiales. Se supera así una lamentable situación, caracterizada por escasas e insuficientes normas, dispersas en la Ley de 1881 y en otros muchos cuerpos legales. El referido conjunto de preceptos no es, empero, el resultado de agrupar la regulación de las medidas cautelares que pudieran considerarse «clásicas», estableciendo sus presupuestos y su procedimiento. Esta Ley ha optado por sentar con claridad las características generales de las medidas que pueden ser precisas para evitar que se frustre la efectividad de una futura sentencia, perfilando unos presupuestos y requisitos igualmente generales, de modo que resulte un régimen abierto de medidas cautelares y no un sistema de número limitado o cerrado. Pero la generalidad y la amplitud no son vaguedad, inconcreción o imprudencia. La Ley se apoya en doctrina y jurisprudencia sólidas y de general aceptación. (ESPANHA, 2011). El «fumus boni iuris» o apariencia de buen derecho, el peligro de la mora procesal y la prestación de caución son, desde luego, factores fundamentales imprescindibles para la adopción de medidas cautelares. La instrumentalidad de las medidas cautelares respecto de la sentencia que pueda otorgar una concreta tutela y, por tanto, la accesoriedad y provisionalidad de las medidas se garantizan suficientemente con normas adecuadas. Se procura, con disposiciones concretas, que las medidas cautelares no se busquen por sí mismas, como fin exclusivo o primordial de la actividad procesal. Pero ha de señalarse que se establece su régimen de modo que los justiciables dispongan de medidas más enérgicas que las que hasta ahora podían pedir. Se trata de que las medidas resulten en verdad eficaces para lograr, no sólo que la sentencia de condena pueda ejecutarse de alguna manera, sino para evitar que sea ilusoria, en sus propios términos. Aunque necesarias para conjurar el «periculum in mora», las medidas cautelares no dejan de entrañar, como es sabido, otros peligros y riesgos. De modo que es preciso también regular cuidadosamente, y así se ha pretendido en esta Ley, la oposición a las medidas cautelares, su razonable sustitución, revisión y modificación y las posibles contracautelas o medidas que neutralicen o enerven las cautelares, haciéndolas innecesarias o menos gravosas. Las medidas cautelares pueden solicitarse antes de comenzar el proceso, junto con la demanda o pendiente ya el litigio. Como regla, no se adoptan sin previa contradicción, pero se prevé que, en casos justificados, puedan acordarse sin oír al c) cualquier otro incumplimiento grave de sus obligaciones por parte del empresario, salvo los supuestos de fuerza mayor, así como la negativa del mismo a reintegrar al trabajador en sus anteriores condiciones de trabajo en los supuestos previstos en los artículos 40 y 41 de la presente ley, cuando una sentencia judicial haya declarado los mismos injustificados. 2. En tales casos, el trabajador tendrá derecho a las indemnizaciones señaladas para el despido improcedente.” (ESPANHA, 1995). 238 sujeto pasivo de la medida que se pretende. En dichos casos, se establece una oposición inmediatamente posterior. En la audiencia previa o en la oposición, pero también más tarde, puede entrar en juego la contracautela que sustituya la medida cautelar que se pretende o que ya se haya acordado. Frente a alguna posición partidaria de atribuir el conocimiento y resolución acerca de las medidas cautelares a un órgano jurisdiccional distinto del competente para el proceso principal, la Ley opta por no separar la competencia, sin perjuicio de que no implique sumisión, respecto del proceso, la actuación de la parte pasiva en el procedimiento relativo a medidas solicitadas antes de la interposición de la demanda. Esta opción no desconoce el riesgo de que la decisión sobre las medidas cautelares, antes de la demanda o ya en el seno del proceso, genere algunos prejuicios o impresiones en favor o en contra de la posición de una parte, que puedan influir en la sentencia. Pero, además de que ese riesgo existe también al margen de las medidas cautelares, pues el prejuicio podría generarse en la audiencia previa al juicio o tras la lectura de demanda y contestación, esta Ley se funda en una doble consideración. Considera la Ley, por un lado, que todos los Jueces y Magistrados están en condiciones de superar impresiones provisionales para ir atendiendo imparcialmente a las sucesivas pretensiones de las partes y para atenerse, en definitiva, a los hechos probados y al Derecho que haya de aplicarse. Y, por otra, no se pierde de vista que las medidas cautelares han de guardar siempre relación con lo que se pretende en el proceso principal e incluso con vicisitudes y circunstancias que pueden variar durante su pendencia, de suerte que es el órgano competente para dicho proceso quien se encuentra en la situación más idónea para resolver, en especial si se tiene en cuenta la posibilidad de alzamiento y modificación de las medidas o de su sustitución por una equitativa contracautela. Todo esto, sin contar con la menor complejidad procedimental que comporta no separar la competencia. (ESPANHA, 2011). A adoção de medidas prévias apresenta-se como uma resposta jurisdicional extremamente excepcional. Ao que tudo indica, o legislador espanhol preocupou-se muito com a efetividade processual (a concretizar o comando constitucional previsto no artigo 24), mas tratou a matéria com muito rigorismo. Ao se fazer a leitura do artigo 730, da Lei Processual Civilista, ver-se-á que é praticamente impossível, exegeticamente falando, que o magistrado espanhol defira uma medida cautelar que tenha efeito autônomo: Artículo 730. Momentos para solicitarlas medidas cautelares. 1. Las medidas cautelares se solicitarán, de ordinario, junto con la demanda principal. 2. Podrán también solicitarse medidas cautelares antes de la demanda si quien en ese momento las pide alega y acredita razones de urgencia o necesidad. En este caso, las medidas que se hubieran acordado quedarán sin efecto si la demanda no se presentare ante el mismo Tribunal que conoció de la solicitud de aquéllas en los veinte días siguientes a su adopción. El Tribunal, de oficio, acordará mediante auto que se alcen o revoquen los actos de cumplimiento que hubieran sido realizados, condenará al solicitante en las costas y declarará que es responsable de los daños y perjuicios que haya producido al sujeto respecto del cual se adoptaron las medidas. 3. El requisito temporal a que se refiere el apartado anterior no regirá en los casos de formalización judicial del arbitraje o de arbitraje institucional. En ellos, para que la medida cautelar se mantenga, será suficiente con que la parte beneficiada por ésta lleve a cabo todas las actuaciones tendentes a poner en marcha el procedimiento arbitral. 239 4. Con posterioridad a la presentación de la demanda o pendiente recurso sólo podrá solicitarse la adopción de medidas cautelares cuando la petición se base en hechos y circunstancias que justifiquen la solicitud en esos momentos. Esta solicitud se sustanciará conforme a lo prevenido en el presente capítulo. (Grifou-se). (ESPANHA, 2011). A respeito dessa temática, afirma José Afonso Lafuente Torralba (2008): Estando las medidas cautelares tan firmemente amarradas al processo principal, em el Derecho español no cabe utilizarlas como procesos autonomos, com efectos potencialmente definitivos. [...] En consecuencia, las medidas antecipatórias no son suscetibles de proporcionar uns regulación ad futurum de los interesses em conflicto; dicha regulación solo puede emanar del proceso declarativo al que se halla instrumentalmente ligadas. (TORRALBA, 2008, p. 97 E 98). O legislador espanhol não adotou a estabilidade como uma possível exceção, não por desconhecer, no Direito Comparado, as experiências vividas; na verdade, apostou em um processo declarativo mais simplificado (frente à tutela sumária), para manter e não necessitando da postergação do contraditório. Na exposição de motivos da LEC, no item II, está a explicação para a adoção da nova sistemática: Con todas sus disposiciones encaminadas a estas finalidades, esta nueva Ley de Enjuiciamiento Civil se alinea con las tendencias de reforma universalmente consideradas más razonables y con las experiencias de más éxito real en la consecución de una tutela judicial que se demore sólo lo justo, es decir, lo necesario para la insoslayable confrontación procesal, con las actuaciones precisas para preparar la sentencia, garantizando su acierto. (ESPANHA, 2011). Vê-se certo receio, por parte do legislador espanhol, em não positivar institutos que não tiveram ainda uma larga experiência prática, como é o caso da estabilização da tutela antecipada e da cautelar, que só agora, nos últimos anos, é que se podem notar, no Direito Comparado, algumas experiências positivas. Deve-se levar em consideração que as reformas substanciais na Espanha deram-se, apenas, no ano 2.000. A preocupação, com a efetividade normativa constitucional das normas laborais existe, no entanto, a demora do processo gera prejuízos à parte hipossuficiente. Atualmente, a Espanha vem enfrentando crise econômica que refletiu (e continua refletindo), sobremaneira, no mundo do trabalho. O governo espanhol elaborou programas de reformas necessárias para a sociedade. Uma das temáticas abordadas no estudo realizado, a “Pobreza e Inclusión Social” passou a ser, nos últimos anos, uma preocupação do Estado. A situação de vulnerabilidade social foi intensificada pela atual crise europeia. O quadro de destruição do emprego e o elevado número de pessoas que estão vivendo abaixo do nível de pobreza são questões amplamente discutidas. Atualmente, a crise e o novo quadro econômico 240 do país têm elevado a preocupação com as temáticas acerca da efetivação das normas constitucionais relacionadas à própria dignidade humana, saúde, educação, processo justo e célere, trabalho e dentre outros, ou seja, de reestruturação social. A confirmar essa assertiva, o governo criou o “Plan Nacional de Acción para la Inclusión Social 2011-2013”, além de outros planos específicos setoriais, todos com a mesma finalidade: inclusão social. 4.4 Medidas de Urgência no Direito Francês 4.4.1 Considerações Iniciais / Organização do Poder Judiciário Francês 197 O Direito e o Processo Francês possuem uma normatização trabalhista avançada. O Código do Trabalho (“Code du travail”) contém nove livros, sendo que do primeiro ao terceiro, são impostas as normas de direito material. A partir do Livro V, as normas concernem à resolução dos conflitos perante os Conselhos (“La Résolution des litiges le conseil de prud’hommes”). No título V, desse mesmo capítulo, têm-se as regras acerca do procedimento nos Conselhos (“Tittre V: Procédure Devant Conseil le Prud’hommes”). Existem ainda normas relativas ao Direito Coletivo e Comunitário (relacionados aos estrangeiros que trabalham no território francês). Estudar o Processo Civil francês não é algo habitual na doutrina brasileira. Explicita José Carlos Barbosa Moreira (2007): Nossa moderna doutrina só episodicamente a ele se refere, e escassa tem sido sua influência na legislação pátria. O fato não deixa de ser curioso, na medida em que contrasta com o que entre nós se passa noutros setores do direito. A nosso ver, dois fatores concorrem para essa situação: a) a base normativa do processo civil francês, o Código Napoleônico de 1806, subsistiu, com algumas reformas, até o fim do século XX [...]; b) até época relativamente recente, a doutrina processual francesa, com raras exceções, manteve-se fechada sobre si mesma, impermeável, ou quase, ao intercâmbio com a de outros países [...]. (MOREIRA, 2007, p. 60-61) Na Lei 2.002 - 1.113, foi instituída a juridiction de proximité, com o intuito de reduzir as distâncias, até mesmo psicológicas, existentes entre o povo e a justiça. Os juízes de proximité não integram a carreira judiciária, mas são nomeados para uma carreira de sete anos. A competência dessa instituição ficou circunscrita às causas cíveis de pequena monta e às contravenções penais. 197 As normas francesas, códigos, Constituição e etc, podem ser mais facilmente encontradas no site Legifrance, que é um serviço público especializado na difusão do direito, na França. 241 No entanto, a doutrina francesa passou a criticar as sucessivas reformas que vêm ocorrendo no ordenamento. Mesmo que o propósito do legislador seja dar mais efetividade e celeridade ao processo, primordialmente com a eliminação das formalidades supérfluas (assim consideradas por alguns), as reformas não estão trazendo as soluções, tanto almejadas pela doutrina (efetividade e celeridade). Essa crítica francesa se enquadra perfeitamente ao perfil das modificações brasileiras. O intuito do legislador francês foi, nas palavras de Humberto Theodoro Junior. (2008, p. 136) atuar “[...] no campo da sumarização do procedimento cognitivo (e não da cautelaridade) para realizar a tutela de urgência satisfativa”. Uma das mudanças francesas mais significativas foi o aumento dos poderes dos magistrados, alijando o paradigma do adversary system, entre a iniciativa das partes (advogados), e o juiz apenas “administrando” o feito. À semelhança com o sistema alemão de organização do Poder Judiciário, na França, existem 3 (três) juízes, de primeira instância, especializados (inseridos no chamado Conselho – “Conseil de Prud’hommes”), um que representa os empregados e outro que representa os empregadores, sendo que todo os magistrados que compõem os Conselhos são eleitos. Os empregados que são autorizados, pela legislação francesa a votar (especificamente o artigo 1441-34, do Código Laboral) podem sair no horário de trabalho, quando há eleição (sem qualquer prejuízo aos salários). Cada Conselho possui 5 (cinco) seções que são autônomas, subdividindo-se conforme a atividade do empresário (indústria e agricultura, exemplificadamente). O empregado pode peticionar, encaminhando o litígio para a seção competente. A forma de citação e os procedimentos formais estabelecidos para o processo são semelhantes às normas brasileiras. No ato citatório, é indicado o objeto da demanda, bem como a advertência de que, se o suposto devedor não aparecer, diversas provisões de caráter executório podem ser tomadas na primeira audiência. A representação em juízo é mais ampla que no Brasil, caso o empregado não possa comparecer por doença ou impedimento familiar, pode ser substituído, momentaneamente, por um colega empregado, delegado de representação sindical ou pelo cônjuge. O legislador francês é extremamente preocupado com a efetividade dos provimentos trabalhistas, pois, após a primeira audiência, de caráter conciliatório, o magistrado poderá implementar medidas de urgência, que só poderão ser impugnadas após a decisão de mérito. Na França, a normatização do poder geral de cautela foi um avanço, pois a função do juiz, como afirmava o próprio barão de Montesquieu, era mínima, por possuir apenas o papel 242 de “boca da lei”, ou seja, somente pronunciava a lei (“bouche que pronnonce lês paroles de la loi”). Após a tentativa de conciliação, em audiência, estando todos presentes, devidamente representados, ouvidas as partes, pode o Conselho reputar a matéria em litígio, de alta complexidade, delegando (compartilhando) a responsabilidade de julgamento para um ou mais conselheiros, a examinar mais aprofundadamente o caso. Posteriormente essa análise, os autos voltam para o Conselho, que deliberará sobre a matéria por maioria absoluta. Subsequente a esse fato, e produzidas as provas, a instrução do feito é encerrada. A decisão é prontamente exequível frente às verbas salariais e indenizatórias, até o limite de nove salários do empregado. Torna-se definitiva a execução quando findo prazo de recurso. Dessa forma antecipa-se o recebimento de pelo menos parte da condenação, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. 4.4.2 Medidas de Urgência na França – A Estabilização da Tutela de Urgência – Référé prud'homal O Direito Francês possui uma normatização avançada concernente às tutelas de urgência e segurança, com o instrumento denominado référé prud'homal (consagrado nos artigos 808 a 811; 848 a 850; 872 a 873-1 do Código de Processo Civil Francês). As Ordonnances de référé estão previstas nos artigos 484 a 492-1 do Código de Processo Civil francês. No Código do Trabalho, o référé está regulamentado nos artigos L1456-1 e seguintes. Todos esses référés são comandos (medidas) de urgência para a tutela dos Direitos que não podem esperar o regular trâmite processual, sob pena de perecimento. No Código de Processo Civil Francês, está disposto, especificamente no artigo 808, que o magistrado pode, nos casos emergencias, ordenar medidas de salvaguarda processual do Direito, posto em litígio. No artigo 809, desse mesmo código, o juiz deve adotar medidas de prevenção ou de reabilitação necessárias, tanto para evitar danos iminentes, quanto para barrar atos manifestamentes ilegais. No caso da existência da obrigação não ser seriamente contestável, pode ser concedida ao credor uma provisão, ou determinada a execução da obrigação, mesmo que se trate da obrigação de fazer (consoante ao exposto nesse mesmo artigo). Essas medidas abrangem todos aqueles casos que não possuem especificidades legais (conforme o artigo 810 do CPC francês). 243 Anteriormente à decisão de mérito, é possibilitado ao magistrado, a pedido de quaisquer das partes, realizar uma prévia audiência, fixando ao réu prazo para defesa. Essa decisão é impugnável por meio de recurso. Assim, esses artigos estabelecem um poder geral de cautela do juiz, o que fundamenta as medidas de urgência na França. Nesse sentido, as próprias normas referem-se “aos poderes do magistrado”. O juiz das medidas provisórias (juge des référés) pode ordená-las, em caso de urgência diante: do pagamento de uma provisão, expulsão, proibição de fazer algo sob pena de multa, conservação de um meio de prova e dentre outras. Nos artigos 848 a 850 da Lei Processual Civil, estão previstas as “Les ordonnances de référé devant le juge d'instance”, ou seja, as medidas cautelares perante ao juiz de primeira instância. Consoante à competência do Tribunal Distrital, poderá o juiz ordenar medidas cautelares (atípicas) de urgência, dentro de sua jurisdição, a evitar “danos iminentes ou barrar atos manifestamente ilegais” (conforme a terminologia legal). Conforme o artigo 850, o juiz distrital tem competência para julgar as causas trabalhistas pertinentes aos contratos de trabalho, que recaírem sobre sua jurisdição. Conforme as previsões impostas no artigo 872, do mesmo código, em qualquer caso de medida de urgência, o juiz poderá expedir liminar, dentro do limite competencial do Tribunal. Segundo o disposto no artigo 491, daquele código de processo, o juiz poderá impor astreintes, pelo descumprimento da medida. O procedimento do référé possui, de forma ampla, a característica da autonomia, frente ao processo principal, diferentemente do procedimento cautelar no Brasil. Entretanto, esse procedimento francês ainda guarda o caráter de provisório, por isso tem também como característica a ausência de coisa julgada. Pondera Adamovich: As medidas provisórias no Direito francês podem ser de três espécies a) medida provisória d´attente; que se dá antes do ajuizamento ou no curso da demanda; b) medida antecipatória da decisão final (référé provision); e c) medida antecipatória da execução que, em verdade, é uma forma de execução provisória. (VON ADAMOVICH, 2000, p. 132). Para que seja concedida a tutela antecipatória (provision) no processo francês, basta que o direito do demandante seja evidente. No Direito brasileiro, além da evidência do direito é necessário provar a insustentabilidade da defesa do réu. No que tange ao processo do trabalho, existe uma medida de urgência que se aplica aos empregados dispensados por motivos econômicos, esse ato da empresa é analisado pelo 244 Judiciário, conforme o Decreto 87.452/87, e a medida é a de reintegração (o artigo L1456-1 do Código do Trabalho remete a regulamentação para esse Decreto). A conciliação deverá ser realizada em um mês e, frustrada essa, a instrução não poderá durar mais que três meses. O julgamento final não poderá demorar mais do que seis meses. Na França, existe um regime especial para as providências cautelares, que podem ser de dois tipos: 1) O arresto (saisie conservatoire), que permite arrestar, a título preventivo, certos bens corpóreos (mobiliário, veículo, etc.), incorpóreos (somas de dinheiro, direitos de sócios ou valores mobiliários) ou de créditos (contas bancárias, rendas, etc.) e; 2) A penhora judicial sobre imóveis, um fundo de comércio, quotas de sociedades ou valores mobiliários (inscrição de hipoteca provisória e penhora de partes sociais e de valores mobiliários). Para a apreciação da medida emergencial, será competente o juiz da execução, do Tribunal da instância maior, ou o magistrado do local do domicílio do devedor. Essa regra é aplicável às medidas provisórias e cautelares (as tutelas de urgência). O consequente pedido, acerca do instrumento de urgência, frente ao judiciário, é cabível à parte fazê-lo a título pessoal, ou seja, sem advogado. Consentâneo às medidas cautelares, a urgência não constitui uma condição imprescindível. O credor necessita de demonstrar que existem circunstâncias que podem pôr em risco a cobrança de sua dívida (exemplo, má-fé do devedor que oculta os seus ativos, multiplicação de credores e dentre outras hipóteses). A providência cautelar trabalhista deve ser tomada no prazo de três meses a contar da decisão do juiz que a autoriza. Se o credor não iniciou ainda um procedimento com vista a obter o reconhecimento do seu crédito, deve fazê-lo no mês seguinte à adoção da medida. A tutela cautelar deve ser comunicada ao devedor no prazo máximo de oito dias. O recurso cabível à decisão não terá suspensivo. 4.5 Medidas de Urgência no Direito Italiano 4.5.1 Considerações Iniciais / Organização Judiciária Italiana A resolução dos conflitos italianos, no Poder Judiciário, é posto sob a égide da jurisdição comum e da jurisdição especial. A primeira é composta pela seara cível e penal. A especial concerne à solução de conflitos nos Tribunais administrativos; Tribunal de Contas; Tribunais militares e no Tribunal Constitucional. A competência originária, desse último, 245 circunscreve-se ao controle de constitucionalidade das leis, conflitos de competências e a apreciação das acusações contra o Presidente da República. O Processo do Trabalho Italiano está contido na seara civil, de jurisdição comum, não existindo, portanto, uma justiça especializada. A magistratura comum é competente para instruir e julgar as causas trabalhistas. Existem os tribunais singulares (um só juiz atuando, salvo os casos especificados em lei) e os tribunais coletivos, de composição coletiva. Na seara cível, existem, ainda, os Tribunais de Recurso, o Tribunal de Cassação, os Tribunais Comuns nos casos previstos pela lei e o Tribunal de Menores. Todos esses últimos são órgãos colegiados. A ordem de julgamento das causas laborais é: na primeira instância, o Tribunal (atuação de um magistrado singular); na segunda, o Tribunal de Recurso (que aprecia as decisões dos tribunais de primeira instância) e; na última instância, o Tribunal Supremo de Cassação. Essa instância maior tem a função de garantir o cumprimento e a interpretação uniforme da lei, além de regular os conflitos de competência. Acerca do Processo do Trabalho, a primeira norma processual laboral, publicada na Itália, foi a lei de número 295, de 15 de julho de 1893, em que foram criados os collegi di probiviri, para a tentativa prévia e obrigatória de conciliação, no meio industrial. No regime fascista, esses colégios de conciliação foram suprimidos, frente ao Régio Decreto de número 471, do dia 26 de fevereiro de 1928. Nesse período, os litígios de matéria laboral foram entregues ao juiz de primeiro grau (o pretor) e ao Tribunal, dependendo do valor de alçada. (ADAMOVICH, 2000). No Régio Decreto de número 1.073 de 21 de maio de 1934, o legislador preferiu unir o rito laboral ao processual civil, sendo acrescentados ao Processo do Trabalho os princípios da imediatidade e concentração. Nos anos sessenta, a Itália sofreu uma nova crise do sistema processual vigente. Foi editada a Lei nº 604/1966 sobre dispensas individuais, sendo dada, ao pretor, a competência, em razão da matéria (e não mais em razão do valor) de decidir sobre a legitimidade desse ato. O dito dispositivo adveio para dar efetividade ao artigo 1º da Constituição que definia, e ainda define, o trabalho como bem essencial (bene essenziale). (ADAMOVICH, 2000). Na Lei nº 533, de 14 de julho de 1973, foi editado o novo processo trabalhista, com base no Código de Processo Civil de 1918, em que Chiovenda presidia a comissão desse. Foram, no processo laboral, consagrados os princípios da oralidade, imediatidade e a concentração dos atos processuais em audiência una. A competência, para o julgamento de matéria trabalhista, passou a ser exclusivamente do juízo de primeiro grau. 246 Mister ressaltar que, no Código de Processo Civil Italiano, existem, no Título IV, Livro II, “Processo de Cognição", normas processuais específicas de direito do trabalho (Norme per le controversie in materia di lavoro – Regras relativas aos litígios trabalhistas), do artigo 409 a 473. Recentemente, a Itália sofreu diversas reformas legislativas, primordialmente, sob a égide do governo de Silvio Berlusconi. O Direito do Trabalho sofreu um repentino processo de precarização e flexibilização. A relação de emprego praticamente desapareceu, em virtude da criação, por meio de lei, da chamada parassubordinação. Proto Pisani (2010) na primeira parte do encontro de 03 de maio de 2010, da “Magistratura Democrática” (La prima parte del convegno del 3 maggio 2010 di Magistratura Democratica, AGER e AGI con l'intervento di Proto Pisani), afirmou, categoricamente, que à base das relações laborais (incluido o conflito e sua resolução, no poder judiciário) deve-se elevar a princiologia (ou, nas palavras do estudioso, “valores”) elencada no artigo 41 (Título II) da Constituição Italiana (de 27 de dezembro de 1947): L'iniziativa economica privata è libera. Non può svolgersi in contrasto con l'utilità sociale o in modo da recare danno alla sicurezza, alla libertà, alla dignità umana. La legge determina i programmi e i controlli opportuni perché l'attività economica pubblica e privata possa essere indirizzata e coordinata a fini sociali. (ITÁLIA, 1947). Esse artigo prevê que a iniciativa privada é livre, no entanto, deve destinar-se aos fins sociais, não podendo atuar contrariamente ao bem comum, à liberdade, segurança e diginidade humana. No entanto, esses valores vêm sendo subjugados, uma vez que a Itália sofre, na atualidade, uma crise completa do mercado de trabalho, havendo repercussões gerais acerca desse problema. 4.5.2 Tutela Antecipada e a Tutela Inibitória / Poder Geral de Cautela do Juiz A doutrina e jurisprudência italianas, cientes da necessidade de dar efetividade às medidas de caráter de urgência, fundamentam a técnica antecipatória e acautelatória no artigo 700 da codificação processual. Nesse país, não houve a inserção, na lei processual, no que concerne à da tutela antecipada, enquanto norma específica. Está exposto, no CPC italiano que: 247 Sezione V: DEI PROVVEDIMENTI D'URGENZA - Art. 700 Condizioni per la concessione Fuori dei casi regolati nelle precedenti sezioni di questo capo, chi ha fondato motivo di temere che durante il tempo occorrente per far valere il suo diritto in via ordinaria, questo sia minacciato da un pregiudizio imminente e irreparabile, puo' chiedere con ricorso al giudice i provvedimenti d'urgenza, che appaiono, secondo le circostanze, piu' idonei ad assicurare provvisoriamente gli effetti della decisione sul merito. (ITÁLIA, 2011). Nessa regra, está exposto que: fora os demais casos regularizados no Código de Processo Italiano, a parte que tiver fundadas razões para temer que, durante o tempo necessário para exercer o seu pedido na forma (via) ordinária, esse seja ameaçado por um iminente e irreparável prejuízo, pode pedir por recurso junto do Tribunal, ou ao juiz, medidas (providências) de urgência mais adequada a garantir os efeitos de uma decisão provisória sobre o mérito. Existe, no ordenamento jurídico brasileiro, normatividade semelhante (precisamente nos artigos 789 e 799 do CPC), designando poder geral de cautela ao juiz. Mesmo antes da Lei nº 533/73, em matéria laboral, já se aplicavam as medidas de urgência. A base normativa, o fundamento, portanto, da tutela antecipada, na Itália, é o artigo supracitado, que trata da ação cautelar inominada. Como afirma, acertadamente, Marinoni (2009, p. 201) “a marca da tutela antecipada, na doutrina italiana, é a provisoriedade, e não a função que é desempenhada pela tutela jurisdicional no plano do direito material”. A tutela cautelar, nesse ordenamento, é tratada com mais rigorismo técnico do que a antecipação. Ao que tudo indica, o sistema italiano necessita, de uma mudança legislativa, no sentido de criar uma norma específica para a tutela antecipada, primordialmente, frente à morosidade dos processos que lá tramitam. Importante ressaltar que, não raro, os processos laborais que, para o Brasil, são de trâmite rápido, primordialmente, na Justiça Especializada Trabalhista, na Itália, em média, duram 10 anos. Dessa feita, necessitam de urgente concretização frente aos meios processuais de efetivação dos direitos individuais trabalhistas (as tutelas de urgência). A saída, para esse problema, encontrada pela doutrina, foi desprezar o direito material para sustentar a possibilidade de obtenção da tutela antecipada. Esse fato não poderia ocorrer no ordenamento pátrio, mesmo por que não seria necessário, já que, no Brasil, existe norma específica. A jurisprudência e a doutrina têm nas mãos um papel importante para tornar o processo um instrumento de proteção e efetivação dos direitos fundamentais. Segundo o entendimento de Proto Pisani: 248 È poi da considerare che il processo a cognizione piena, proprio in quanto per sua definizione garantista, há uma sua durata necessária nel tempo e questa esigenza di fare bene può entrare talvolta in conflito com I’ esigenza di fare presto, specie là dove la durata del processo a cognizione piena possa essere di per sé causa di um pregiudizio irreparabile (o anche soltando grave) a chi è costretto a servirsi del processo à causa del diviento di autotutela privata. (PISANI, 2006, P. 53). A jurisprudência aplica o artigo, 700 do CPC, por exemplo, para os casos de reintegração provisória no posto de trabalho, em caso de transferência arbitrária ou ilegalidade na dispensa. No âmbito Direito Coletivo, aplica-se frente ao abuso do direito de greve. Na Itália, a jurisprudência vem se mostrando mais progressista que a doutrina, afirmando que o processo laboral já é por si só de caráter sumário e célere, não necessitando de medidas civilistas assecuratórias de urgência. Sendo que a aplicação indiscriminada das medidas cíveis de urgência acabaria por obstruir a jurisdição, como afirma Crisanto Mandrioli (1995, p.515). O que, notoriamente é uma falácia, basta analisar a demora processual. Podem ser deferidas, pelo juízo competente italiano, medidas cautelares antes ou durante o processo “principal” de que são instrumentais. Além disso, relativamente ao seu conteúdo, podem classificar-se como procedimentos especificados (o que, no Brasil, é chamado de típicos), ou seja, procedimentos em que o conteúdo está preestabelecido em lei, e não especificados (atípicos), no âmbito dos quais a lei atribui ao Tribunal a determinação do conteúdo mais adequado, em função do direito que é chamado a tutelar pelo requerente, sendo essa conduta, permitida pelo artigo 700, do CPC italiano, acima comentado. Com o advento desse artigo, surgiram alguns problemas de interpretação com relação ao conceito ali normatizado: o de provimento de urgência. Pondera Humberto Theodoro a respeito: [...] tornou-se largamente difundida a aplicação dos “provvedimenti d’urgenza” com o escopo de realizar, com antecipação, os efeitos da sentença de mérito, ou seja, com a imediata satisfação da pretensão, no todo ou em parte. Alguns problemas delicados surgiram na tentativa de adequar o provimento cautelar às particularidades da tutela de mérito. O primeiro deles foi o da compatibilização com os princípios inerentes ao contraditório, ampla defesa e coisa julgada, cuja observância antecede a composição do mérito da causa. (THEODORO, 2008, págs. 140 e 141). Concernente à tutela inibitória, na Itália, quando se depara com uma situação de eminente necessidade de proteção, sem se olvidar, ainda, da própria violação do direito, a base normativa para a aplicação dessa técnica é também o artigo 700 do Código de Processo. Aplica-se a norma que alicerça a cautelar inominada “con funzione non cautelare”. A Lei Processual Italiana carece de norma semelhante ao artigo 461, do CPC, já que, diferentemente do ordenamento processual brasileiro, não se pode ordenar sob pena de multa. Não possuindo, 249 assim, o ordenamento italiano, instrumentos processuais de proteção, que abriria ensejo à tutela inibitória. A ordem jurídica em epígrafe carece de norma que proteja o “perigo” de forma preventiva. Essa atitude legislativa vai contra aos atuais desígnios de um ordenamento jurídico moderno, voltado para a preocupação com o cidadão e seus direitos fundamentais. No Direito Italiano, não existe ação inibitória cognitiva, por falta de previsão legal, como é afirmado pela doutrina. Na prática, a tutela inibitória é postulada, na Itália, à base do artigo 700, da lei processualista, bem como o artigo 24 da Constituição, que garante a todos a tutela jurisdicional efetiva, tempestiva e adequada ao caso concreto. Quando concedida a tutela cautelar, pode-se estar diante de uma antecipação de tutela, inibitória ou uma cautelar, propriamente dita, todas sobre a pecha de “cautelar”. E, mesmo quando possuir satisfação de seu direito, a parte, é obrigada a dar continuidade à ação de conhecimento em função da técnica processual, já que, naquele país, a tutela cautelar não possui satisfatividade, e está calcada na provisoriedade. Há, portanto, certo anacronismo na evolução das tutelas de urgência naquele ordenamento. O que não ocorre no Direito brasileiro, como antes, explicitado. Ao se buscar “inspiração” no Direito Italiano, tem-se que levar em consideração que, nesse ordenamento, a realidade normativa e prática é outra. Na Itália, as mudanças legislativas e dogmáticas, acerca das tutelas de cognição sumária, urgentes, são mais do que necessárias. Os contornos das tutelas de urgência necessitam ser traçados. A concluir, acerca dessa temática, Edoardo Ricci (1997) afirma que não enxerga com bons olhos a união indiscriminada dos provimentos de urgência, afirmando que: [...] a separação teórica entre provimentos antecipatórios e provimentos cautelares nem sempre é advertida na Europa com a mesma precisão que é adverida na doutrina brasileira. Mas, as minhas convicções levam-me a compartilhar, sobre este tema, das orientações da doutrina brasileira (RICCI, 1997, p. 92). Marinoni e Arenhart (2008) aduzem que, no Brasil, não existem razões para confusão entre as formas tutelares de urgência, primordialmente entre a cautelar e a inibitória, demonstrando que: A confusão entre as ações inibitória e de remoção do ilícito com a ação cautelar deriva do fato de que todas se identificam pela preventividade. Porém, quem não separa ilícito (ato contrário ao direito) de dano, obviamente não pode entender que as ações inibitória e de remoção do ilícito têm como pressuposto a probabilidade de ilícito (inibitória) e a sua prática (remoção do ilícito), enquanto que a ação cautelar requer a probabilidade do dano. (MARINONI, 2003, P.3). 250 Relacionado à ação inibitória, que é voltada contra a probabilidade do ilícito, o problema acaba sendo o mesmo. Na ação inibitória, a prova deve incidir somente sobre a probabilidade do ilícito, no entanto, recairá sobre a probabilidade do dano, apenas quando existir “identidade cronológica entre o ilícito e o dano” (MARINONI, 2003, P.3). Nessa hipótese, o autor (e não o réu) tem a chance de argumentar acerca da probabilidade do dano. O réu não pode contra-argumentar afirmando que não há probabilidade de dano (que é consequência do ilícito), quando o autor alegar somente probabilidade de ilícito. O resultado dessa “confusão” italiana, acerca dos instrumentos processuais de tutela de urgência, é a falta de efetividade de direitos, incluindo os individuais trabalhistas, e a falta de esforço legislativo a modificar essa realidade. A falta de objetiva distinção entre os institutos leva a uma compreensão da matéria apenas sobre o enfoque processual, desconsiderando o direito material, sem importar com o resultado concebido pela tutela. A normatividade acerca da tutela antecipada, cautelar e inibitória, vem colocando o Brasil, em um papel de destaque no cenário mundial, frente a excelência da doutrina, de boas decisões, e, primordialmente, da normatividade pertinente. A classificação e identificação prática dos institutos geram a visualização do problema (a ser solucionado pelo Estado), sob uma perspectiva do direito material. Essa preocupação é de suma importância para a efetivação dos direitos, afastando-se da visão meramente processual do direito. Essa é exatamente a grande dificuldade da doutrina clássica (primordialmente a europeia). 4.5.3 Procedimento Cautelar no Direito Italiano O procedimento cautelar italiano está normatizado no Código de Processo Civil de 1940 (conferido pelo Régio Decerto de 28 de outubro de 1940), onde foram impostas recentes alterações, especificamente, em 01 de setembro de 2011. No Direito Italiano, assim como no Brasil, a normatividade processual trabalhista não prevê diversos institutos civilistas, dentre eles as medidas de urgência (cautelar, tutela inibitória e antecipatória). Necessitando, para tanto, da aplicação do princípio da subsidiariedade frente às normas consentâneas ao Processo Civil. Diferentemente do Brasil, o legislador italiano caminhou no sentido de sumarizar o procedimento cautelar satisfativo, sendo criado um regime diferenciado para as medidas com tendência à satisfatividade do feito. No Brasil, criou-se o princípio da fungibilidade para a resolução do problema da institucionalização das medidas cautelares, como antes exposto. 251 Quando da criação da normatividade jurídica laboral italiana, tinha-se o entendimento de que os institutos cíveis não poderiam ser aplicados ao processo trabalhista. Frente à nítida necessidade de aplicação de tais institutos, à seara laboral, as argumentações para a não aplicação foram consideradas infundadas, prevalecendo a interpretação (e a positivação do princípio da subsidiariedade) de que se aplicam. A doutrina e a jurisprudência passaram a aplicar, dentre os institutos de rito simplificado, o procedimento monitório, o sequestro das duas espécies “judiciário” e o “conservativo” e a produção antecipada de provas (istruzione preventiva). 4.5.4 Procedimento Cautelar Específico no Ordenamento Jurídico Italiano Proto Pisani (2006), ilustre doutrinador italiano, entende que as medidas cautelares assumem não só a função de garantia da efetividade da tutela jurisdicional, mas também, a função de efetivar o princípio da economia processual. Na Itália, assim como em diversos ordenamentos jurídicos, a evolução da tutela cautelar adveio como resposta aos problemas trazidos com a demora na resolução dos conflitos levados a juízo, ou seja, com o atraso da resposta da atividade jurisdicional. A tutela cautelar “deixou de ser mero instrumento do processo declarativo, para emancipar-se desse e converter-se em uma alternativa mais rápida e de resultados mais imediatos.” (ALBERTO JOSÉ LAFUENTE TORRALBA, 2008, P. 78). Chiarloni, citado por José Lafuente (2008), afirma que na reforma italiana, o legislador equivocou-se em não distinguir, à época das recentes reformas, as medidas de caráter conservativo das medidas antecipatórias. O procedimento cautelar italiano sofreu, desde o Régio Decreto de número 1443, de 28 de outubro de 1940 (publicação do Código Civil Italiano), modificações substanciais. Com a Lei nº 477/92, que entrou em vigor em 1993, especificamente em 1º de janeiro, houve a uniformização dos procedimentos cautelares (artigos 669-bis a 669quaterdecies), exceto a produção antecipada de provas. Os elementos comuns às medidas cautelares são, notadamente, a simplificação e a rapidez das formas processuais, o seu caráter provisório e a sua relação instrumental com um litígio. Essa relação instrumental não pode mais ser tratada de forma absoluta. Mediante a, já citada, reforma de 1990, submetida à revisão em 2005, foi implementada no Código de Processo Civil Italiano, uma sistematização orgânica e unitária, relativa ao procedimento cautelar, que foi, no entanto, definido como “uniforme”. 252 Conforme a nova sistemática processual, que constitui o modelo de base de todos os instrumentos cautelares (quer previstos pelo próprio Código de Processo, quer regulados por leis específicas), é prevista, em determinados casos, a possibilidade de a medida adotada provisoriamente não ser seguida por um processo e, consequentemente, por uma medida no âmbito de um processo ordinário. Nesses casos, por conseguinte, o instrumento cautelar acaba por constituir, de fato, um meio de tutela exclusivo e estabilizado (por exemplo, no caso de uma pessoa ser obrigada a observar uma medida e fazê-lo espontaneamente; o mesmo é previsto expressamente nos processos em matéria de sociedades comerciais e de intermediação financeira e de crédito, regulados por uma Lei nº de 2003). Levando esta tendência normativa em consideração, o estudo neste subitem será frente à sistematização tradicional, ou seja, pondo em relevo a provisoriedade da matéria. A competência em matéria laboral para a interposição da cautelar é definida segundo a regra de que o juiz será aquele que poderia conhecer do mérito da ação principal (artigos 669-ter e 669-quater). Ver-se-á a redação desses artigos: Art. 669 ter Competenza anteriore alla causa Prima dell'inizio della causa di merito la domanda si propone al giudice competente a conoscere del merito. Se competente per la causa di merito e' il conciliatore, la domanda si propone al pretore. (Itália, 1940). Se il giudice italiano non e' competente a conoscere la causa di merito, la domanda si propone al giudice, che sarebbe competente per materia o valore, del luogo in cui deve essere eseguito il provvedimento cautelare. A seguito della presentazione del ricorso il cancelliere forma il fascicolo d'ufficio e lo presenta senza ritardo al presidente del Tribunale o al pretore dirigente il quale designa il magistrato cui e' affidata la trattazione del procedimento. Articolo aggiunto dall'art. 74, L. 26 novembre 1990, n. 353. (ITÁLIA, 2011). A forma explicitada pela lei para a postulação do procedimento cautelar, chamado de “recurso”, deve ser oferecido à chancelaria do juiz competente. Para a maioria dos doutrinadores italianos, existe uma espécie de direito substancial de cautela, porém qualquer que seja a posição teórica assumida “[...] fica cada vez mais evidente que o resultado da proteção cautelar não se liga exclusivamente ao resultado de um processo, mas, além disso, tem efeitos e consequências na situação substancial”. (BATISTA, 2006. p. 34 e 35). No artigo 669-sexis, está explicitado o procedimento de forma geral, em que o juiz poderá despachar confirmando, modificando ou revogando os provimentos antes deferidos. O juiz competente poderá deferir o pedido, inaudita altera pars, devendo marcar a data para a audiência, em prazo peremptório de 15 dias. Dentro desse mesmo lapso temporal, ordenará, ainda, em prazo não superior a 8 dias, a notificação do demandado. Nesse 253 documento, deverá haver a discriminação do teor do Decreto de concessão da medida. Ou seja, o prazo para a defesa é de 7 dias. Observar-se-á a redação desse artigo: Art. 669 sexies Procedimento Il giudice sentite le parti, omessa ogni formalita' non essenziale al contraddittorio, procede nel modo che ritiene piu' opportuno agli atti di istruzione indispensabili in relazione ai presupposti e ai fini del provvedimento richiesto, e provvede con ordinanza all'accoglimento o al rigetto della domanda. Quando la convocazione della controparte potrebbe pregiudicare l'attuazione del provvedimento, provvede con Decreto motivato assunte ove occorra sommarie informazioni. In tal caso fissa, con lo stesso Decreto, l'udienza di comparizione delle parti davanti a se' entro un termine non superiore a quindici giorni assegnando all'istante un termine perentorio non superiore ad otto giorni per la notificazione del ricorso e del Decreto. A tale udienza il giudice, con ordinanza, conferma, modifica o revoca i provvedimenti emanati con Decreto. Nel caso in cui la notificazione debba effettuarsi all'estero, i termini di cui al comma precedente sono triplicati. Articolo aggiunto dall'art. 74, Legge 26 novembre 1990, n. 353. (ITÁLIA, 2011). Caso o juiz defira o provimento concessivo (o pedido da medida cautelar), antes da propositura da ação principal, deverá, em um prazo não superior a 30 dias, fixar um termo para o ajuizamento dessa ação. Caso o juiz negue o provimento, a parte pode fazer novo pedido (“re-proposta”), na hipótese de modificação das circunstâncias de fato e de direito alegados no pedido anterior. Assim como no Direito brasileiro, se a parte não propuser a ação principal, no prazo fixado pelo juiz, a medida de urgência perde sua razão de ser. A medida perderá sua eficácia também se: o processo principal for extinto, quando: a) a caução estabelecida pelo juiz não for prestada; b) o direito seja declarado inexistente por sentença (italiana ou estrangeira), mesmo que não tenha transitado em julgado, ou, ainda com laudo arbitral contrário; c) a parte que requereu a medida, e teve seu pedido deferido, pelo laudo arbitral, não requereu sua exequibilidade, frente ao juízo italiano; d) a parte que requereu a medida, e teve seu pedido deferido, ou seja, foi beneficiada, em sentença estrangeira ou laudo arbitral estrangeiro, mas não solicitou, frente ao Poder Judiciário Italiano, a executoriedade da sentença ou do laudo. Importante ressaltar que a declaração de ineficácia da medida é dada pelo juiz competente, que proferiu a decisão cautelar. Da decisão, tanto de concessão como de rejeição da medida cautelar, pode ser interposto recurso, para o Tribunal, por qualquer das partes (segundo o interesse, isto é, em relação ao tipo de providência adotado), no prazo de 10 dias, a contar da notificação da providência, cuja decisão será proferida por um colegiado de juízes (“in camera di consiglio”). O recurso, em regra, não tem efeito suspensivo, mas o relator pode assim 254 determinar, em caso de risco de grave dano, ou que, na hipótese de a parte beneficiada pela decisão prestar caução. 4.5.5 Medidas Cautelares (procedimentos específicos) No sistema processual civilista italiano, estão previstos diversos institutos, que podem ser incluídos na categoria das medidas cautelares ou provisórias. Tais medidas são definidss com base em seu caráter finalístico, frente às seguintes características: a) caráter antecipatório: é antecipar, a título provisório ou em caso de urgência, o conteúdo possível ou os efeitos de uma decisão, que será tomada na sequência de um processo ordinário; atributo estabilizador: seria “conservar”, precisamente, uma determinada situação de fato, até a eventual conclusão do processo principal, de modo a garantir que tal processo produza os efeitos práticos que de outra forma seriam inúteis, devido a uma alteração do estado de fato em curso, ou; o caráter preventivo ou conservatório: pois existem direitos (situações materiais) em perigo de prejuízo, no curso de uma demanda (consoante o tipo de medida). As medidas cautelares típicas do processo comum são, no direito italiano: o arresto, a produção antecipada de provas, a restituição provisória da posse, o embargo de obra nova, providências de instrução preventiva, suspensão da eficácia da sentença impugnada executiva a título provisório, providências provisórias durante um processo de separação de pessoas, alimentos provisórios, imposição ou retirada de selos, providências temporárias a favor de menores abandonados, inibição de concentração da propriedade de jornais, inibição de atos de concorrência desleal, ordem de não aplicar cláusulas incorretas ou vexatórias em contratos celebrados entre empresas, providências temporárias a favor de menores abandonados, intimação de publicar uma retificação de algo já publicado em jornais diários ou em publicações periódicas ou transmitido pela rádio ou pela televisão, atribuição de um montante como adiantamento da compensação de danos, suspensão de deliberações sociais, ordem de inspeção dos atos de uma sociedade de capitais e, providências cautelares adotadas pelo Tribunal num processo de insolvência. O Arresto (Sezione II: Del Sequestro) está normatizado no artigo 670, do Código de Processo Italiano, podendo ser de duas espécies: a) judiciário (“Sequestro giudiziario”): de bens (móveis, imóveis, empresas e dentre outros), quando a propriedade ou a posse de tais bens é controversa, a medida garante, nesse caso, a guarda do bem, ou seja, a preservação do objeto (por exemplo, de livros, registros ou outros papéis) e; b) Arresto preventivo (“sequestro conservativo”): assegurar a garantia genérica de bens (móveis ou imóveis) ou de 255 quantias em dinheiro (ao contrário do sequestro no Direito brasileiro), medida a favor do credor, quando esse tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito; essa medida foi também admitida, recentemente, contra a pessoa que não cumpra a obrigação de alimentos a favor do cônjuge separado. O sequestro deve ser executado dentro de trinta dias, a partir do seu deferimento, conforme o artigo 675 do CPC italiano. Observar-se-á as redações dos artigos, do Código de Processo italiano, concernentes a esta matéria: Art. 670 Sequestro giudiziario Il giudice puo' autorizzare il sequestro giudiziario: 1) di beni mobili o immobili, aziende o altre universalita' di beni, quando ne e' controversa la proprieta' o il possesso, ed e' opportuno provvedere alla loro custodia o alla loro gestione temporanea; 2) di libri, registri, documenti, modelli, campioni e di ogni altra cosa da cui si pretende desumere elementi di prova, quando e' controverso il diritto alla esibizione o alla comunicazione; ed e' opportuno provvedere alla loro custodia temporanea. Art. 671 Sequestro conservativo Il giudice, su istanza del creditore che ha fondato timore di perdere la garanzia del proprio credito, puo' autorizzare il sequestro conservativo di beni mobili o immobili del debitore o delle somme e cose a lui dovute, nei limiti in cui la legge ne permette il pignoramento. (ITÁLIA, 2011). Conforme o artigo 686 da norma processual italiana, o recurso cabível é o reclamo. A produção antecipada de provas é medida cautelar típica do processo comum, e, conforme a doutrina italiana, aplica-se ao processo laboral. No Processo do Trabalho Italiano, admite-se essa tutela de urgência, frente à aplicação subsidiária do artigo 692, do CPC. Chiovenda (VON ADAMOVICH, 2000, p. 88) critica, expondo que a aplicação da medida de produção antecipada de provas importa na derrogação dos princípios da concentração e da imediatidade, que são fundamentais na processualística laboral. É aplicável frente ao fundado receio de faltar uma ou mais testemunhas ou, ainda, diante da deterioração de lugar ou coisas (artigos 692 e 696, respectivamente). No artigo 698, está prevista uma questão relevante: o deferimento antecipado de prova não prejudica as questões relativas à admissibilidade ou relevância e, ainda, não impede a sua renovação no juízo de mérito. Mister ressaltar que as demais medidas cautelares, abaixo relacionadas (são específicas do CPC), ao que tudo indica, não se aplicam, pela sua natureza, ao processo trabalhista italiano. A Restituição provisória da posse (“Provvedimenti a difesa del possesso”): quando se quer defender a posse de um bem contra uma ameaça ou um impedimento e, ainda, quando se requer que o bem seja restituído quando dele se tenha desfeito. 256 O Embargo de obra nova (“Sezione II: Dei Procedimenti di Denunicia di nuova opera e di danno temuto”): contempla a conservação do estado de fato, posto em perigo pela obra nova (de outrem) ou pela ameaça de um dano a coisa própria. 5º) Providências de instrução preventiva (Sezione IV: Dei Procedimenti di istruzione preventiva): têm caráter estritamente processual em função da prova. O Tribunal pode, em qualquer momento do processo, ordenar, mediante despacho fundamentado o interrogatório das testemunhas. É uma inquirição de caráter técnico ou uma inspeção judicial, quando for urgente obter elementos imediatos de prova, devido ao fundado receio de que tal diligência possa, por qualquer razão, tornar-se impossível numa fase posterior ao processo. A Suspensão da eficácia da sentença impugnada executiva a título provisório: constitui uma providência cautelar em sentido lato, dado que a decisão de primeira instância tem, por Lei, força executiva a título provisório. O Tribunal de segunda instância que verifica a existência de motivos graves pode suspender o seu efeito executório. As providências transitórias durante um processo de separação de pessoas: medidas de caráter tanto pessoal como patrimonial, destinam-se a situações de conflito entre os pais que possam prejudicar os filhos, por vezes privados do controle e de meios de subsistência adequados. Os alimentos provisórios (“Ordine di corrispondere un assegno alimentare”): o seu destinatário é a pessoa obrigada a pagar uma quantia a título de pensão de alimentos, quando o litígio está ainda em curso. No Brasil, essa medida, na seara de Direito de Família possui natureza de antecipação de tutela. A imposição ou retirada de selos: medidas susceptíveis de serem adotadas em litígios entre pessoas que pretendem invocar os seus direitos sobre bens que pertenceram a pessoas falecidas. A inibição de concentração da propriedade de jornais: medida adotada a pedido da autoridade para a comunicação social, na pendência da decisão quanto ao fundo de um processo. A inibição de atos de concorrência desleal: medidas contra quem exerce atividades em violação da legislação sobre a concorrência (violação das normas em matéria de marcas, atos de desvio de clientela, etc.). A ordem de não aplicar cláusulas incorretas ou vexatórias em contratos celebrados entre empresas: providências tomadas a pedido de associações de consumidores e das câmaras de comércio, com vista a uma decisão que verifique o caráter abusivo das cláusulas contratuais. 257 As providências temporárias a favor de menor abandonado é medida cautelar aplicável na pendência de uma decisão sobre o mérito relativa à guarda de menores. A intimação de publicar uma retificação de algo já publicado em jornais diários ou em publicações periódicas ou transmitido pela rádio ou pela televisão: medida associada a um processo, que deve necessariamente existir, sobre a divulgação de notícias falsas. A atribuição de um montante como adiantamento da compensação de danos: medida a favor de uma pessoa que sofreu danos num acidente rodoviário e que se encontra em estado de necessidade, quando um exame sumário determinar a responsabilidade do demandado. A suspensão de deliberações sociais: procedimento cautelar adotado quando uma deliberação de uma sociedade de capitais é contrária à lei ou aos estatutos da sociedade. A ordem de inspeção dos atos de uma sociedade de capitais: medida tomada a pedido, pelo menos, de um décimo dos representantes do capital social, que é instrumental em relação à decisão do processo sobre a responsabilidade dos administradores sociais. As providências cautelares adotadas pelo Tribunal em um processo de insolvência: providências de conteúdo diverso, que têm por objetivo salvaguardar os interesses dos credores que intervieram no processo de insolvência. 4.5.6 A ordem de reintegração do trabalhador ilegitimamente dispensado A reintegração do trabalhador que é ilegitimamente dispensado tem natureza jurídica controvertida na doutrina italiana. A razão lógica para que esse tópico seja tratado de forma apartada das medidas cautelares tipificadas no ordenamento jurídico italiano, consiste no fato de que, parte da doutrina entende possuir, esse instituto, natureza cautelar, sendo, ainda, possível a aplicação da medida sob a égide do artigo 700 do CPC italiano. Outros estudiosos consideram que o instituto possui natureza de provimento antecipatório dos efeitos executivos da sentença final (sendo pronunciada a ilegitimidade no curso do processo de conhecimento). A ordem de reintegração pode ser impugnada de imediato, frente ao juízo que a pronunciou. A ordem pode, ainda, ser revogada na própria sentença terminativa de feito. Conforme a lei laboral italiana (Lei nº 300/70): Articolo 18 – “parágrafo”, 8º, 9º e 10º: Reintegrazione nel posto di lavoro. [...] L'ordinanza di cui al comma precedente può essere impugnata con reclamo immediato al giudice medesimo che l'ha pronunciata. Si applicano le disposizioni dell'articolo 178, terzo, quarto, quinto e sesto comma del codice di procedura civile. L'ordinanza può essere revocata con la sentenza che decide la causa. 258 Nell'ipotesi di licenziamento dei lavoratori di cui all'articolo 22, il datore di lavoro che non ottempera alla sentenza di cui al primo comma ovvero all'ordinanza di cui al quarto comma, non impugnata o confermata dal giudice che l'ha pronunciata, è tenuto anche, per ogni giorno di ritardo, al pagamento a favore del Fondo adeguamento pensioni di una somma pari all'importo della retribuzione dovuta al 198 lavoratore. [...] (ITÁLIA, 2011). Preleciona Giorgio Treglia (1993) a respeito dessa tutela específica, que essa norma prevê uma medida ampla para a reintegração do trabalhador em seu posto de labor: La norma de qua troverà, inoltre, ampio spazio di applicazione pei i provvedimenti di reintegrazione nel posto di lavoro [...], atteso che dottrina e giurisprudenza ammettono ormai definitivamente, como è noto, la possibilità di assicurare, in via d’urgenza, gli effetti della decisione ex. art. 18 Stat. lav. (TREGLIA, 1993, p. 410) Na própria norma processual supracitada, existe a possibilidade de o juiz determinar uma multa diária pelo descumprimento da ordem judicial, no valor de um salário do empregado. 4.5.7 A ordem para pagamento de somas não contestadas A ordem ao empregador de pagar ao trabalhador um montante, a título provisório, consiste em medida adotada até o limite dos montantes não contestados ou verificados a título definitivo, em um Processo de Direito do Trabalho. Essa ordem não é medida cautelar, mas é uma tutela de urgência, ou mais especificamente, uma tutela de segurança, semelhante à decisão interlocutória brasileira. A “ordenança” para o pagamento de somas não contestadas ou o pagamento de parcelas devidas que os magistrados entendam já provadas, são exequíveis de pronto, consoante ao exposto na própria lei, conferindo à medida, eficácia executória. Artigo 423. (Ordinanze per il pagamento di somme) (ordem para o pagamento de somas). Il giudice, su istanza di parte, in ogni stato del giudizio, dispone con ordinanza il pagamento delle somme non contestate. Egualmente, in ogni stato del giudizio, il giudice puo', su istanza del lavoratore, disporre con ordinanza il pagamento di una somma a titolo provvisorio quando 198 No artigo 22 está previsto: “Trasferimento dei dirigenti delle rappresentanze sindacali aziendali. Il trasferimento dall'unità produttiva dei dirigenti delle rappresentanze sindacali aziendali di cui al precedente articolo 19, dei candidati e dei membri di commissione interna può essere disposto solo previo nulla osta delle associazioni sindacali di appartenenza. Le disposizioni di cui al comma precedente ed ai commi quarto, quinto, sesto e settimo dell'articolo 18 si applicano sino alla fine del terzo mese successivo a quello in cui è stata eletta la commissione interna per i candidati nelle elezioni della commissione stessa e sino alla fine dell'anno successivo a quello in cui è cessato l'incarico per tutti gli altri.” (ITÁLIA, 1940). 259 ritenga il diritto accertato e nei limiti della quantita' per cui ritiene gia' raggiunta la prova. Le ordinanze di cui ai commi precedenti costituiscono titolo esecutivo. L'ordinanza di cui al secondo comma e' revocabile con la sentenza che decide la causa. (ITÁLIA, 2011). Conforme a disposição acima citada, o Tribunal, a pedido de uma das partes, em qualquer estado do processo (instrução processual), por despacho (ordenança), é cabível ao juiz ordenar o pagamento de montantes não contestados. Além disso, em cada fase do processo, o Tribunal pode, a pedido do empregado, por fim, ordenar o pagamento de uma quantia, a título provisório, já estando provado o direito (do empregado), ou ainda, das parcelas daqueles que, na mesma proporção da prova, julgue devidos. O despacho proferido constitui título executivo e é revogável, podendo ser esse ato realizado no acórdão que decide o próprio caso. Ou seja, sua tramitação ocorre no mesmo processo e não em autos apartadados. 4.5.8 Procedimento Monitório (de Injunção) no Direito Italiano O procedimento monitório não é medida cautelar, porém, pode ser inserido dentro dos procedimentos de caráter sumário, até mesmo pela sistemática do CPC italiano, e naquela principiologia que afirma a necessidade de se reduzir a morosidade nos processos (princípio da celeridade). Esse procedimento está previsto nos artigos 633 e seguintes, do Código de Processo Civil italiano, sob o título de “Del Procedimento Di Ingiunzione” (Título Quarto, Capítulo I). Está estabelecido no artigo 633: Art. 633.(Condizioni di ammissibilita') Su domanda di chi e' creditore di una somma liquida di danaro o di una determinata quantita' di cose fungibili, o di chi ha diritto alla consegna di una cosa mobile determinata, il giudice competente pronuncia ingiunzione di pagamento o di consegna: 1) se del diritto fatto valere si da' prova scritta; 2) se il credito riguarda onorari per prestazioni giudiziali o stragiudiziali o rimborso di spese fatte da avvocati, procuratori, cancellieri, ufficiali giudiziari o da chiunque altro ha prestato la sua opera in occasione di un processo; 3) se il credito riguarda onorari, diritti o rimborsi spettanti ai notai a norma della loro legge professionale, oppure ad altri esercenti una libera professione o arte, per la quale esiste una tariffa legalmente approvata. L'ingiunzione puo' essere pronunciata anche se il diritto dipende da una controprestazione o da una condizione, purche' il ricorrente offra elementi atti a far presumere l'adempimento della controprestazione o l'avveramento della condizione. [L'ingiunzione non puo' essere pronunciata se la notificazione all'intimato di cui all'art. 643 deve avvenire fuori dalla Repubblica o dei territori soggetti alla sovranità italiana.] (1) 260 (1) Comma abrogato dal Dlgs. 231/2002. (2) N º revogado pelo Decreto. 231/2002. (ITÁLIA, 2011). A pedido de credor de determinada quantia em dinheiro ou certa quantidade de coisas fungíveis, ou quem tem direito a entrega de um determinado bem móvel, o Tribunal é competente para expedir uma liminar de pagamento ou de entrega de coisa, nos casos acima arrolados pela lei. Esse procedimento encontra aplicação em matéria de Direito laboral, frente a um crédito trabalhista, bem como os pressupostos dos artigos 633 e 634, do CPC italiano, notadamente, uma prova escrita de uma soma em dinheiro, ou de uma determinada quantia de coisas que sejam fungíveis, ou, ainda, a obrigação do devedor de entregar determinada coisa móvel (conforme o início do artigo supracitado). A competência do pretor é territorial, devendo o mesmo emitir uma ordem de pagamento ou a entrega de coisa. As sentenças trabalhistas, na prática, não se beneficiam desse procedimento, pois dependem de liquidação. O devedor pode se defender através da oposição (artigo 641 e 645, do CPC italiano), que pode ser proposta no prazo máximo de 40 dias, após a data da notificação da ordem. No Processo do Trabalho, o prazo é de 20 dias, conforme dispositivo trabalhista da Lei nº 533. A oposição nem sempre suspende a ordem injuntiva, conforme o artigo 648, daquele diploma processual, que prevê a autorização provisória da execução, pelo magistrado, em decisão impugnável, caso em que o pedido da oposição não esteja fundado em prova escrita ou que seja de pronta solução. No ordenamento brasileiro, não existe esta previsão. 4.5.9 Ordem de reintegração no posto de trabalho de dirigentes sindicais quando dispensados sem justa causa O procedimento em epígrafe é cautelar, todavia, não está tipificado no CPC italiano, mas sim na Lei nº 300/1970, artigo 18, parágrafo 7º. Nell'ipotesi di licenziamento dei lavoratori di cui all'articolo 22, su istanza congiunta del lavoratore e del sindacato cui questi aderisce o conferisca mandato, il giudice, in ogni stato e grado del giudizio di merito, può disporre con ordinanza, quando ritenga irrilevanti o insufficienti gli elementi di prova forniti dal datore di lavoro, la reintegrazione del lavoratore nel posto di lavoro. (ITÁLIA, 2011). 4.6 A Estabilização da Demanda de Urgência no Direito Italiano 261 A estabilidade das demandas cautelares e antecipatórias não é um fato isolado na Itália, pelo contrário, guarda similitude com diversas experiências de países como a Alemanha e a França. As últimas reformas no Código de Processo Civil italiano trouxeram uma inovação com relação às medidas cautelares antecipatórias: 1º) no artigo 669, 6º comma, em que os provimentos de urgência (“provvedimenti d’urgenza”) foram positivados na lei e, o caráter de acessoriedade dos provimentos de urgência, frente ao processo principal (de mérito) quase desapareceram. O legislador italiano utilizou-se do instituto référé francês, para sumarizar o procedimento cautelar de desígnio satisfativo. A redação do artigo 669, 6º comma, é extremamente importante dentro dessa quebra de paradigma: Art. 669-octies. (1) - (Provvedimento di accoglimento) 1 - L'ordinanza di accoglimento, ove la domanda sia stata proposta prima dell'inizio della causa di merito, deve fissare un termine perentorio non superiore a sessanta giorni (2) per l'inizio del giudizio di merito, salva l'applicazione dell'ultimo comma dell'articolo 669-novies. 2 - In mancanza di fissazione del termine da parte del giudice, la causa di merito deve essere iniziata entro il termine perentorio di sessanta giorni (2). Il termine decorre dalla pronuncia dell'ordinanza se avvenuta in udienza o altrimenti dalla sua comunicazione. 3 - Per le controversie individuali relative ai rapporti di lavoro alle dipendenze delle pubbliche amministrazioni, escluse quelle devolute alla giurisdizione del giudice amministrativo, il termine decorre dal momento in cui la domanda giudiziale è divenuta procedibile o, in caso di mancata presentazione della richiesta di espletamento del tentativo di conciliazione, decorsi trenta giorni. (3) 4 - Nel caso in cui la controversia sia oggetto di compromesso o di clausola compromissoria, la parte, nei termini di cui ai commi precedenti, deve notificare all'altra un'atto nel quale dichiara la propria intenzione di promuovere il procedimento arbitrale, propone la domanda e procede, per quanto le spetta, alla nomina degli arbitri. (4) 5 - Le disposizioni di cui al presente articolo e al primo comma dell'articolo 669novies non si applicano ai provvedimenti di urgenza emessi ai sensi dell'articolo 700 e agli altri provvedimenti cautelari idonei ad anticipare gli effetti della sentenza di merito, previsti dal codice civile o da leggi speciali, nonche' ai provvedimenti emessi a seguito di denunzia di nuova opera o di danno temuto ai sensi dell'articolo 688, ma ciascuna parte puo' iniziare il giudizio di merito. (5) 6 - L'estinzione del giudizio di merito non determina l'inefficacia dei provvedimenti di cui al primo comma, anche quando la relativa domanda e' stata proposta in corso di causa. (5) 7 - L'autorita' del provvedimento cautelare non e' invocabile in un diverso processo. (1) Articolo aggiunto dalla Legge 26 novembre 1990, n. 353. (2) Parole così modificate dal D.L. 35/2005 con decorrenza dal 1 marzo 2006. (3) Comma così da ultimo modificato dal Dlgs. 29 ottobre 1998, n. 387. (4) Comma aggiunto dalla Legge 5 gennaio 1994, n. 25. (5) Comma aggiunto dal D.L. 35/2005 con decorrenza dal 1 marzo 2006. (ITÁLIA, 2011). 262 As inovações trazidas no CPC italiano podem desvincular a finalidade dos provimentos satisfativos, até mesmo da extinção do processo de mérito, não lhes reconhecendo autoridade para prevalecer em outros processos (artigo 669 - octies). Alberto José Lafuente Torralba (2008) resume, de forma precisa, a estabilização da demanda cautelar “antecipatória” e as possíveis condutas que podem ser tomadas pelas partes, após o deferimento dessa medida. Oportunidade em que, as partes irão valorar e analisar as vantagens e desvantagens de se iniciar um processo cognitivo, gastando energia, tempo e dinheiro. O beneficiário da medida irá decidir se já está satisfeito com o procedimento ou não. Enquanto parte vencida analisará se convém ajuizar uma ação para reverter sua situação ou não. Assim, a estabilidade da demanda encontra-se na satisfatividade e no afastamento do critério de provisoriedade da demanda cautelar e da demanda antecipada. A medida deixa de ser meramente instrumental para tornar-se defintiva. [...] las medidas cautelares antecipatórias, dentro del sistema italiano, se configuram no solo como medidas instrumentales respecto de la tutela declarativa, sino que, al mismo tiempo, cuando concurram las condiciones necessárias y las partes presten su aquiescencia, puedem substituir a la sentencia y cumplir uma función equiavalente a ella. Uma vez adoptadala medida cautelar, cada parte deberá realizar sus proprias valoraciones y decidir si le interesa, o no, iniciar um processo declarativo, com los gastos de energia, tiempo y dinero que éste comporta, en particular, el beneficiario de la medida apreciará si le conviene darse por satisfecho con el resultado obtenido em via cautelar y renunciar a la verificación plena de su derecho mediante uma sentencia com forza de cosa juzgada. Y a parte vencida apreciará si le interessa arrisgarse a entablar um juicio y esforzarse por desvirtuar las valoraciones sumarias hechas por el juez al conceder la cautela. (TORRALBA, 2008, págs. 80 e 81). O caráter tradicional de acessoriedade e instrumentalidade (no sentido de servir à efetividade do processo principal) das tutelas de urgência foi relativizado no sistema italiano. É como afirma Alberto José Lafuente Torralba (2008, p. 78.) “estas reglas respondem al clásico principio de instrumentalidad de las medidas cautelares, que ligam su suerte a la processo declarativo cuyo resultado tienden a asegurar”. A tutela cautelar, assim como a antecipatória, deixou de ser eminentemente preparatória para a ulterior prestação definitiva jurisdicional, não mais garantindo a eficácia do provimento final do processo principal, e sim se tornando o próprio instrumento para a prolação da decisão do Poder Judiciário. Aqui reside o caráter estabilizador da demanda. Essa relativização do princípio da acessoriedade da demanda cautelar suscita algumas questões que devem ser, por ora, explicitadas: o âmbito de aplicação, a posição processual que o prejudicado assume no processo e, a delimitação dos efeitos da medida cautelar (TORRALBA, 2008, p. 78.) 263 A) o âmbito de aplicação da regra da instrumentalidade (acessoriedade) atenuada: na lei italiana (CPC), não se estabeleceu medidas capazes de adquirir autonomia. O legislador limitou-se a regularizar uma regra em branco, deixando para a jurisprudência resolver o problema. Essa questão foi amplamente criticada pela doutrina italiana. Segundo parte desses estudiosos, (de forma restritiva), entender que as medidas antecipatórias seriam aquelas destinadas a produzir efeitos irreversíveis, dotadas de autonomia, prescindido de uma ação principal, e, caso essa seja intentada, não passará de uma confirmação do que preteritamente se adotou na cautelar. Já outros autores, de forma extensiva, demonstram que a cautelar não antecipa totalmente a decisão, sempre que assegurar o resultado final da decisão judicial. Mas, é majoritário o entendimento de que o artigo 700 do CPC autoriza o juiz a deferir medidas cautelares de caráter antecipatório (satisfativo) ou conservativo. No caso de oposição à execução, o legislador italiano deu um passo à frente, com relação à estabilização dos efeitos das medidas cautelares, facultando ao oponente que conseguiu a suspensão do processo executivo, que solicite a “extinção do embargo”. B) A posição das partes frente ao deferimento das medidas cautelares: quem sofreu os efeitos da demanda cautelar, na posição de réu, poderá, caso se sinta prejudicado, entrar com uma ação cognitiva, mas agora, na posição de autor. Essa inversão de papéis traz um ônus complicado para o autor (destinatário passivo da medida) da ação cognitiva posterior à cautelar. Proto Pisani tem exatamente essa preocupação. Alberto José Lafuente Torralba (2008) faz o seguinte questionamento: Reproduciendo aqui el interrogante formulado por Proto Pisani, cundo el processo declarativo sea iniciado por el destinatario pasivo de la medida, ¿ la carga de la prueba pesará sobre éste, que se verá em el trance de tener que probar la inexistencia del derecho verificado a nivel de fumus, o por el contrario – como sería más razoable pero más difícil de sostener em ausencia de uma norma expressa – sobre el demandado formal que há solicitado y obtenido la medida cautelar? La primeira interpretación, que postulauna inversión de la carga de la prueba, supone um gravamen excesivo para la parte vencida en el procedimento cautelar y, por ello, algunos autores se han apresurado a achar que la “instrumentalidad atenuada” implica para el destinatário de la medida la carga de introducir la litis, pero dana más, y por lo tanto no puede trastornar las respectivas posiciones de las partes em el processo declarativo. (TORRALBA, 2008, p. 79) Assim, o autor da ação cognitiva deverá produzir provas no sentido de desmentir aquelas realizadas pelo autor da medida de urgência. 264 C) Efeitos da decisão que autoriza a medida cautelar: primeiramente a autoridade de uma medida cautelar não é invocada em um processo diverso (art. 669-octies, comma 8º), já que a decisão prolatada foi baseada em um juízo de verossimilhança e não de certeza. Além do mais, a eficácia da medida cautelar pode ser destruída em um processo futuro. A concessão da tutela solicitada, em sede de cautelar, não comporta um caráter absolutamente definitivo, pois qualquer das partes poderá, em um processo de conhecimento, reproduzir o litígio, ou seja, discutir as mesmas questões que foram objeto da ação cautelar. À medida cautelar que possui, hodiernamente, caráter executório, o legislador optou por propiciá-la certa estabilidade, porém, mesmo diante dessa característica, não é idônea para produzir coisa julgada. “La estabilización definitiva de sus efectos tendrá lugar, únicamente, uma vez transcorridos los plazos de prescrición por la ley material”. (TORRALVA, 2008, p.84). A falta de coisa julgada (res iudicata) não importa em temporariedade, pelo contrário, as medidas antecipatórias, se dirigem à resolução dos conflitos de um modo potencialmente estável, porém, não vinculam o juiz de uma futura ação congnitiva. A estabilidade não se afirma apenas diante do instituto da coisa julgada, mas também, nos demais efeitos benéficos que podem trazer, tais como, economia processual, gastos de tempo e dinheiro pelas partes dentre outros. Vê-se, pela própria leitura do artigo supra transcrito, que a ação cautelar preparatória não produz coisa julgada material, podendo, perfeitamente, a parte acionar novamente o judiciário, em sede de processo ordinário, de cognição plena. Na Itália, notadamente, existe um provimento cautelar potencialmente autônomo, que acabou por se tornar uma tutela sumária não definitiva. O cidadão italiano que se vê frente a um litígio, portanto, dependendo da matéria e do objeto de demanda, pode optar por uma ação ordinária de cognição exauriente ou um procedimento antecipatório cautelar sumário e célere, sem a formação de coisa julgada material. Insta salientar, para que não reste dúvida, que a estabilização na forma acima explicitada, na cautelar antecipatória, deferida ou não com base no artigo 700, do CPC italiano, possui um procedimento específico autônomo, que não necessita de um processo principal, como antes analisado, porém, as cautelares típicas, estudadas em capítulo pretérito, necessitam de um processo principal. 265 4.7 Medidas de Urgência no Direito Português No sistema processual português, incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos fatos de que lhe é lícito conhecer, isto é, apenas quanto aos fatos alegados pelas partes no processo. A doutrina entende que essa norma, especificamente o artigo 265, n. 3, do Código de Processo Civil português, concatena certo poder geral de cautela dado ao magistrado português. 4.7.1 Considerações Iniciais / Organização Judiciária do sistema português Em Portugal, diversos códigos de processo de trabalho foram editados, diferentemente do Brasil, que não promulgou nenhum. O atual Código de Processo do Trabalho Português entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2000, DL n.º 480/99, de 09 de Novembro. Em virtude do aumento exponencial de processos nas últimas décadas, nesse país, o legislador editou inúmeras normas, alterando a organização judiciária, primordialmente, na redistribuição da competência entre os tribunais e juízes. Exemplificadamente, tem-se o recente Decreto-Lei n.º 74/2011, de 20 de junho de 2011, posteriormente modificado pelo Decreto-Lei n.º 113-A/2011 de 29 de novembro de 2011. Essa norma alargou as comarcas de Lisboa e da Cova da Beira o regime do novo mapa judiciário, de forma a ampliar o uso de novas formas de coordenação e gestão, bem como de apoio reforçado aos magistrados. O novo mapa judiciário (criado pela Lei nº 52/2008, de 28 de agosto) é uma meta do governo português, para redistribuir as competências entre as diversas jurisdições. Consentânea à categoria dos Tribunais, existem Tribunais Judiciais de primeira e de segunda instâncias, o Supremo Tribunal de Justiça e o Tribunal Constitucional. Os tribunais judiciais de segunda instância são, em regra, os tribunais da Relação e, nesse caso, designamse pelo nome do município em que se encontram instalados. Os tribunais judiciais de 1.ª instância são, via de regra, os tribunais de comarcas e, nesse caso, são designados pelo nome da circunscrição em que se encontram instalados. Além do Tribunal Constitucional, existem as seguintes categorias de tribunais: a) O Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais judiciais de primeira e de segunda instância; b) O Supremo Tribunal Administrativo e os demais tribunais administrativos e fiscais e; c) O 266 Tribunal de Contas. Poderão, ainda, existir Tribunais Marítimos, Tribunais Arbitrais e Julgados de Paz. Os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais. Para efeitos de divisão judiciária, o território português divide-se em distritos judiciais e comarcas, quais fazem parte integrante, nos termos da divisão territorial legal, exemplificadamente: Distritos judiciais - Distrito judicial do Norte: Sede: Porto. Circunscrições: Alto Tâmega, Alto Trás-os-Montes, Ave, Baixo Tâmega-Norte, Baixo Tâmega-Sul, Cávado, Entre Douro e Vouga, Grande Porto-Norte, Grande Porto-Sul, Médio Douro, Minho-Lima, Porto e Trás-os-Montes; Distrito judicial do Centro - Sede: Coimbra. Circunscrições: Baixo Mondego-Interior, Baixo Mondego-Litoral, Baixo Vouga, Beira Interior Norte, Beira Interior Sul, Cova da Beira, Dão-Lafões, Serra da Estrela, Médio Tejo e Pinhal Litoral; Distrito judicial de Lisboa e Vale do Tejo - Sede: Lisboa. Circunscrições: Açores-Angra do Heroísmo, Açores-Ponta Delgada, Grande Lisboa-Oeste, Grande LisboaEste, Grande Lisboa-Noroeste, Lisboa, Lezíria do Tejo, Madeira e Oeste. São comarcas: Açores-Angra do Heroísmo. Distrito judicial: Lisboa e Vale do Tejo. Circunscrição: Municípios: Calheta (São Jorge), Angra do Heroísmo, Corvo, Horta, Lages das Flores, Lages do Pico, Madalena, Santa Cruz das Flores, Santa Cruz da Graciosa, São Roque do Pico, Velas e Vila da Praia da Vitória. Açores-Ponta Delgada - Distrito judicial: Lisboa e Vale do Tejo. Circunscrição: Municípios: Lagoa, Nordeste, Ponta Delgada, Povoação, Ribeira Grande, Vila do Porto e Vila Franca do Campo. Alentejo Central - Distrito judicial: Alentejo. Circunscrição: Municípios: Alandroal, Arraiolos, Borba, Estremoz, Évora, Montemor-o-Novo, Mora, Mourão, Portel, Redondo, Reguengos de Monsaraz, Vendas Novas, Viana do Alentejo e Vila Viçosa. O Supremo Tribunal de Justiça tem competência em todo o território português. Esse Tribunal é o órgão superior da hierarquia dos tribunais judiciais, sem prejuízo da competência própria do Tribunal Constitucional. A Organização do STJ português compreende-se em secções de julgamento de matéria cível, penal e em matéria social. Frente à especialização das sessões, o Supremo tem competência para julgar as mesmas matérias dos juízos do trabalho, em sede recursal, na sessão social. Aos Juízos do trabalho compete (“Competência Civil”): 199 199 Conforme a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, de número Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto. 267 a) as questões relativas à anulação e interpretação dos instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho que não revistam natureza administrativa; b) questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas, com vista à celebração de contratos de trabalho; c) questões emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais; d) questões de enfermagem ou hospitalares, de fornecimento de medicamentos emergentes da prestação de serviços clínicos, de aparelhos de prótese e ortopedia ou de quaisquer outros serviços ou prestações efectuados ou pagos em benefício de vítimas de acidentes de trabalho ou doenças profissionais; e) ações destinadas a anular os atos e contratos celebrados por quaisquer entidades responsáveis com o fim de se eximirem ao cumprimento de obrigações resultantes da aplicação da legislação sindical ou do trabalho; f) questões emergentes de contratos equiparados por lei aos de trabalho; g) questões emergentes de contratos de aprendizagem e de tirocínio; h) questões entre trabalhadores ao serviço da mesma entidade, a respeito de direitos e obrigações que resultem de atos praticados em comum na execução das suas relações de trabalho ou que resultem de ato ilícito praticado por um deles na execução do serviço e por motivo deste, ressalvada a competência dos tribunais criminais quanto à responsabilidade civil conexa com a criminal; i) questões entre instituições de previdência ou de abono de família e seus beneficiários, quando respeitem a direitos, poderes ou obrigações legais, regulamentares ou estatutárias de umas ou outros, sem prejuízo da competência própria dos tribunais administrativos e fiscais; j) questões entre associações sindicais e sócios ou pessoas por eles representados, ou afetados por decisões suas, quando respeitem a direitos, poderes ou obrigações legais, regulamentares ou estatutárias de uns ou de outros; l) processos destinados à liquidação e partilha de bens de instituições de previdência ou de associações sindicais, quando não haja disposição legal em contrário; m) questões entre instituições de previdência ou entre associações sindicais, a respeito da existência, extensão ou qualidade de poderes ou deveres legais, regulamentares ou estatutários de um deles que afete o outro; n) execuções fundadas nas suas decisões ou noutros títulos executivos, ressalvada a competência atribuída a outros tribunais; o) questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido cumulese com outro para o qual o juízo seja diretamente competente; p) questões reconvencionais que com a ação tenham relações de conexão referidas na alínea anterior, salvo no caso de compensação, em que é dispensada a conexão; q) questões cíveis relativas à greve; r) questões entre comissões de trabalhadores e as respectivas comissões coordenadoras, a empresa ou trabalhadores dessa; s) questões relativas ao controlo da legalidade da constituição e dos estatutos de associações sindicais, associações de empregadores e comissões de trabalhadores; t) demais questões que por lei lhes sejam atribuídas. (PORTUGAL, 2008). Os Tribunais da Relação são os tribunais de segunda instância e designados pelo nome do município em que se encontram instalados. Em cada distrito judicial há um ou mais tribunais da Relação. Os tribunais da Relação compreendem secções em matéria cível, em matéria penal, em matéria social (Direito do Trabalho e Direito Previdenciário), em matéria de família e menores e em matéria de comércio e de propriedade intelectual. Funcionam sob a direção de um presidente, em plenário e por secções. 268 Os Tribunais da Relação têm competência no respectivo distrito judicial. Em matéria cível, a alçada dos Tribunais da Relação é de € 14.963,94 e a dos Tribunais de primeira instância é de € 3.740,98. Os Tribunais Judiciais de primeira instância são os Tribunais de Comarca e, designamse pelo nome da circunscrição em que se encontram instalados. Compete aos Tribunais de Comarca preparar e julgar os processos relativos a causas não abrangidas pela competência de outros tribunais. Os tribunais de comarca são tribunais de competência genérica e especializada, incluído matéria de Direito Laboral. Consoante à competência internacional da jurisdição trabalhista portuguesa, aos tribunais compete julgar os casos em que a ação pode ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial estabelecidas no Código de Processo Português, ou que tenham sido praticados em território português, no todo ou em parte, os fatos que integram a causa de pedir na ação. Igualmente, serão competentes os tribunais nos casos de transferência, para outros Estados, de trabalhadores contratados por empresas estabelecidas em Portugal e; as questões relativas a conselhos de empresas europeias. Acerca da competência interna, em regra, as ações devem ser propostas no Tribunal do domicílio do réu. As entidades empregadoras ou seguradoras, bem como as instituições de previdência, consideram-se também domiciliadas no lugar onde tenham sucursal, agência, filial, delegação ou representação. No Código de Processo do Trabalho, existem, ainda, regras competenciais específicas, frente à complexidade da causa, como é o caso dos acidentes do trabalho. Nessa hipótese, as ações de acidentes de trabalho ou de doença profissional devem ser propostas no Tribunal do lugar onde o acidente ocorreu ou onde o doente trabalhou pela última vez, em serviço susceptível de originar a doença. Se o acidente ocorrer no estrangeiro, a ação deve ser proposta em Portugal, no Tribunal do domicílio do sinistrado. 4.7.2 Processo do Trabalho Português No Direito processual português, especificamente no Código de Processo laboral, existe a previsão de um processo comum, e dos processos de tutela específica. Na seara das regras pertinentes aos processos comuns, estão as disposições gerais, consentâneas: aos deveres do juiz, das modificações da instância, cumulação subjetiva de pedidos, admissibilidade e oportunidade de reconvenção, “apensação” de ações, desistência e transação, produção antecipada de provas, prova da subsistência da justa causa de rescisão, 269 capacidade e legitimidade das partes, capacidade dos menores, trabalho coletivo e legitimidade das associações representativas. Para ambos as espécies processuais, primordialmente, para o comum, existe o prenúncio de uma série de atos processuais contínuos minuciosos. O processo português possui uma formalidade detalhada, o que vai contra a principiologia de sumarização e celeridade processuais, rechaçada em diversos ordenamentos jurídicos no mundo. Apesar de haver o processo eletrônico, a demora é inevitável, frente ao formalismo exacerbado. O Capítulo II, daquela norma processual, concerne ao processo declarativo comum. Para as ações, em geral, é obrigatória e tentativa prévia de conciliação presidida pelo Ministério Público. Essa regra não se aplica aos seguintes casos, exemplificadamente: questões emergentes de relações de trabalho subordinado, bem como as relativas ao respectivo contrato e as questões emergentes de contratos de aprendizagem. Não ocorrendo a primeira conciliação, nos moldes acima especificados, distribuída a petição inicial, a peça é remetida ao Ministério Público, para tentativa conciliatória prévia, no prazo de 20 dias. Esse órgão tem poderes para fazer com que as partes cumpram com o acordo realizado. Frustrada a primeira, entretanto, na hipótese de haver ainda chances de uma nova conciliação, as partes podem requerer conjuntamente, nova audiência a qual se realizará no prazo máximo de 10 dias. Homologado o acordo, o mesmo é reduzido ao “auto” (a termo, no direito brasileiro) pelo Ministério Público que o remeterá para homologação judicial. Se no prazo de 30 dias não for possível, por qualquer razão, realizar a tentativa de conciliação ou obter o acordo das partes, é elaborado auto em que se especificam as razões que obstaram à conciliação das partes, o qual é juntado ao processo. No Brasil, a tentativa de conciliação é realizada na própria audiência, na presença do juiz, e, se for caso, há o acompanhamento do Ministério Público. Frustrada a tentativa de acordo, segue a audiência. Não é necessária a exigência de feitura de um laudo, expondo os motivos da frustração negociativa, no direito pátrio, o fato de a negociação restar frustrada é apenas mencionado na ata da audiência. No despacho preliminar, após as tentativas conciliatórias (obrigatória e a facultativa), o juiz, não sendo o caso de indeferimento da inicial, mandará emendar ou esclarecer a peça processual. No Brasil, a petição, quando for o caso, é indeferida de pronto, antes de qualquer audiência. Na hipótese de emenda, a parte tem o prazo máximo de 10 dias para fazê-lo. 270 A parte ré tem 15 dias para apresentar sua resposta: contestação, exceção ou reconvenção, no Processo Laboral Português. Existe, ainda, no sistema português, a hipótese de despacho saneador que é diferente do preliminar, acima exposto. Findo os articulados o juiz tem 10 dias para proferir o despacho saneador. Após a resolução dessas questões preliminares, a instrução, discussão e julgamento da causa são de competência do Tribunal singular, exceto nas causas de valor superior à alçada dos Tribunais de Primeira Instância, em que não tenha sido requerida a gravação da audiência. Nas ações em que seja admissível recurso ordinário, pode as partes requerem a gravação da audiência (no prazo de especificação de provas) ou o Tribunal determiná-la de ofício. Dentro do prazo de 10 dias, as partes podem recorrer do despacho saneador, reclamar da matéria de fato (exposta pelo juiz) e/ou apresentar o rol de testemunhas e demais provas que pretendam produzir. É possível que, quando da apresentação desse recurso, a parte obtenha efeito suspensivo. Estando a ação em condições de prosseguimento, o juiz designa data para a audiência de discussão e julgamento, a qual deve ter lugar no prazo de 30 dias. Ressalta-se que o limite máximo de testemunhas é dez. De acordo com o artigo 36 do Código de Processo laboral, na hipótese de cumulação inicial de pedidos, ou sendo aditados novos pedidos, pode o número de testemunhas ser de cinco por cada pedido, mas sem exceder o total de vinte. Em se tratando de reconvenção, pode cada uma das partes oferecer até dez testemunhas para a prova dos fatos dela constantes e da respectiva defesa. Às partes, é defeso apresentar mais de três testemunhas para cada fato alegado, não se contando as que declarem nada saber. Considera-se que esses limites numéricos da prova testemunhal são bem elevados, primordialmente, se as mesmas forem ouvidas em audiência. As partes devem comparecer pessoalmente à audiência, no dia e hora marcada ou, justificar sua falta, podendo ser representadas por mandatário judicial com poderes específicos para confessar, desistir ou transigir na ação. Caso contrário aplica-se a pena de confissão. Realizada a “chamada legal” 200 é aberta a audiência, que pode ser adiada por acordo entre as partes ou, se houver um fundamento legal, em um prazo não superior a 20 dias. Na audiência, perante o Tribunal, faz-se uma nova tentativa conciliatória. 200 Conforme a dicção do artigo 39 item 1, que, no Brasil, diz respeito ao apregoamento das partes. 271 No curso do processo, durante a fase probatória, se surgirem fatos novos relevantes, mesmo não sendo articulados, o Tribunal pode ampliar a instrução. Abre-se, assim, mais prazo (5 dias) para as partes apontarem quais provas irão produzir. Finda a fase probatória e não havendo razões para a interrupção da audiência, é dada a palavra aos advogados das partes para, por tempo não superior a uma hora, apresentarem as suas alegações finais (acerca da matéria de fato e de direito). Encerrada a audiência de discussão e julgamento, a sentença é proferida no prazo de 15 dias. Para as decisões de primeira instância é cabível, em 10 dias, recurso para a segunda instância, sem efeito suspensivo, em princípio. Os prazos para o magistrado não são peremptórios e, diante de tamanha formalidade processual, não raro os processos trabalhistas demoram 10 anos para serem extintos com a resolução de mérito. Existem demandas laborais, em que, não raro mesmo com a utilização da cautelar frente ao “despedimento” individual (abaixo exposta), a demora processual causou mais prejuízos do que a própria dispensa ilícita. 4.7.3 Tutelas de Urgência em Portugal No Direito português, a tutela cautelar engloba todos os procedimentos de urgência, sejam conservativos ou satisfativos. Diferentemente do Brasil, que exclui da tutela cautelar as medidas que antecipem os efeitos da sentença de mérito ou que evitem a ocorrência do próprio ato contrário ao direito, sem se cogitar do dano (tutela inibitória). Todavia, sabendo da dificuldade de aplicação e visualização das diferenças futuras dentro de um processo, o legislador brasileiro optou por inserir no ordenamento jurídico a possibilidade de fungibilidade entre as medidas, conforme os requisitos estabelecidos. Optou, ainda, por positivar regras menos fechadas para abarcar situações não tipificadas. O procedimento cautelar, atualmente, está regulado no Código de Processo Civil português, nos artigos 381 a 427, bem como no Código de Processo laboral artigo 25 e seguintes (com algumas peculiaridades em relação ao procedimento comum), tanto para as cautelares específicas, quanto para as cautelares inespecíficas. O procedimento cautelar é sempre dependente de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado, podendo ser instaurado como preliminar ou como incidente de ação declarativa ou executiva, conforme a dicção do artigo 383, item 1, do CPC português. No artigo 381 do referido diploma processual, estão demonstradas, com primor, as características da cautelar: 272 ARTIGO 381.º (Âmbito das providências cautelares não especificadas) 1. Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado. 2. O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor. 3. Não são aplicáveis as providências referidas no nº 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na secção seguinte. 4. Não é admissível, na dependência da mesma causa, a repetição de providência que haja sido julgada injustificada ou tenha caducado. (PORTUGAL, 2011). No procedimento cautelar português, existe a normatização de procedimentos cautelares, exclusivamente aplicados na seara trabalhista: “suspensão de despedimento coletivo”; “suspensão de despedimento individual” e a proteção da segurança, higiene e saúde no trabalho. Logicamente, os procedimentos cautelares não se encerram nesses dispositivos laborais, havendo a expressa previsão da aplicação subsidiária do processo civil nos litígios trabalhistas (no artigo 1º) 201, além dos procedimentos cautelares não especificados. Os procedimentos cautelares não especificados são aqueles que não estão regulados na legislação (Código de Processo do Trabalho e Código de Processo Civil) e cuja matéria seja específica do foro trabalhista. As cautelares inespecíficas podem ter como fundamento, por exemplo, a modificação do horário de trabalho, a inadaptação do trabalhador ao posto de trabalho ou a sua transferência para outro local de labor. Consoante ao exposto no site da Ordem dos Advogados Portuguesa, do Conselho Distrital de Évora a partir de 1 de Janeiro, do ano de 2012, o Código de Processo de Trabalho (CPT) passará a contar com novos processos especiais, com natureza urgente. Acontece que, no dito código, existem procedimentos especiais, ações que estão sujeitas a prazos processuais mais curtos e que correm durante as férias judiciais. Esses processos não são tutelas de urgência, mas sim ações consideradas de natureza emergencial, que, presentemente, merecem comentários. As ações especiais previstas no código são: ações emergentes de contrato de trabalho; ações emergentes de acidentes de trabalho ou de doença profissional; ações emergentes de despedimento coletivo; ações de liquidação e partilha de bens de instituições de previdência e associações sindicais e outras em que sejam requeridas essas instituições ou 201 No artigo primeiro está disposto que: “O processo do trabalho é regulado pelo presente Código. 2 - Nos casos omissos recorre-se sucessivamente: a) À legislação processual comum, civil ou penal, que directamente os previna; b) À regulamentação dos casos análogos previstos neste Código; c) À regulamentação dos casos análogos previstos na legislação processual comum, civil ou penal; d) Aos princípios gerais do direito processual do trabalho; e) Aos princípios gerais do direito processual comum. 3 - As normas subsidiárias não se aplicam quando forem incompatíveis com a índole do processo regulado neste Código”. (PORTUGAL, 2011). 273 associações; processo para a efetivação de direitos resultantes de acidente de trabalho; ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento; processo de impugnação de despedimento coletivo; processo do contencioso de instituições de previdência, abono de família, associações sindicais, associações de empregadores ou comissões de trabalhadores; ação de anulação e interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho. As novas ações, que a partir de 2012 entraram em vigência são: ação de impugnação da regularidade e licitude (ajuizada pelo trabalhador quando da comunicação por escrito da decisão de despedimento individual); ação de impugnação da confidencialidade de informações ou da recusa da sua prestação ou da realização de consultas (no âmbito coletivo); ação de tutela dos direitos de personalidade do trabalhador (proteção contra ofensas ilícitas, físicas ou morais, à pessoa do trabalhador). Nessa ação, protege o trabalhador da confidencialidade de mensagens e de acesso à informação, e limita o ato do empregador em exigir testes e exames médicos, ou de utilização de meios de vigilância à distância (celulares, smartfones e dentre outros meios). E, por último, ações relativas à igualdade e não discriminação em função do sexo. Essas ações de urgência específicas são poderosas armas de proteção dos direitos sociais individuais e coletivos dos trabalhadores portugueses. No Brasil, as tutelas de urgência circunscrevem-se à demanda cautelar, antecipatória e inibitória. Em Portugal, além da cautelar (que engloba a antecipação de tutela, como antes afirmado) existem os chamados processos especiais de natureza de urgência. 4.7.3.1 A Suspensão de Despedimento Individual Na Constituição da República Portuguesa, especificamente, no artigo 53, é positivada a proibição de dispensa sem justa causa (“segurança no emprego”), sem ressalvas. Esse comando normativo é semelhante à disposição constitucional brasileira, artigo 7º, inciso I, que possui uma exceção que gera dúbia interpretação 202 . Segundo a dicção da Lei Maior de Portugal: 202 No artigo 7º, inciso I, da Constituição da República BrasiLeira, está positivada a proteção contra a dispensa desmotivada ou sem justa causa, porém, a interpretação dada pela doutrina e jurisprudência majoritárias concerne à ineficácia desse direito fundamental, afirma-se que o artigo tem eficácia limitada à publicação de uma Lei complementar que a defina. 274 CAPÍTULO III - Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores - ARTIGO 53.º (Segurança no emprego) É garantida aos trabalhadores a segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos. (PORTUGAL, 2011). Na tentativa de exercer esse direito, o empregado tem que levar em juízo um parecer da Comissão de Trabalhadores, fundamentando que sua “despedida” foi sem justa causa, ou seja, abusiva, além dos demais requisitos de qualquer procedimento cautelar (fumus boni iuris e periculum in mora). Acerca dos pressupostos da medida cautelar, em epígrafe, citou Nelson Carneiro (2009), juiz de direito do Tribunal da Relação de Lisboa, as seguintes jurisprudências: A suspensão do despedimento só pode ser requerida quando seja indiscutível a existência do contrato de trabalho, e a existência de um despedimento em sentido próprio, assumido como tal pela entidade patronal - Ac. Rel. Lisboa de 1999.06.16, CJ,Tomo 3.º, pág. 172. A providência cautelar de suspensão do despedimento não é o meio processual adequado para discutir e decidir questões como a qualificação da relação contratual existentes entre as partes, a forma de cessação dessa relação, a falta de motivação do contrato de trabalho a termo e a sua conversão em contrato de trabalho sem termo Ac. Rel. Lisboa de 1999.06.16, CJ, Tomo 3.º, pág. 172. O procedimento cautelar da suspensão de despedimento só é admissível se na respectiva petição inicial se configurarem os seguintes dois pressupostos: 1.º - A inquestionável existência dum contrato de trabalho entre o requerente e o requerido. 2.º - A existência de um inequívoco despedimento do trabalhador levado a cabo pela entidade patronal – Ac. Rel. Coimbra de 2004.01.22, CJ, Tomo 1.º, pág. 57. (CARNEIRO, 2009, p. 20). Em Portugal, toda despedida tem que passar por um processo interno disciplinar, e é obrigatório a empresa manter toda a documentação consentânea a esse ato. Esse procedimento é eminentemente documental e a empresa tem que apresentar, em juízo, os documentos da despedida. O processo comum aplica-se, no que tange às cautelares, de forma integral. As particularidades laborais estão estabelecidas na Lei Processual Trabalhista. No ato de recebimento do requerimento inicial, é designado dia para a audiência final. A oposição, quando admitida, é realizada na própria audiência. A decisão é fundamentada de forma sucinta e ditada para ser lavrada a termo em ata. O não comparecimento não é causa para adiamento da audiência. Na cautelar de suspensão de despedimento individual, o juiz designa data para a audiência, que deverá ocorrer no prazo de 15 dias, após a apresentação do requerimento inicial (sob pena de deferimento imediato da medida cautelar, na hipótese de não apresentação injustificada). Na hipótese de inocorrência de processo disciplinar, é sempre cabível a 275 oposição do requerido. Havendo processo disciplinar, o juiz ordena a apresentação, em juízo, da documentação desse processo, que é apensado aos autos. É cabível às partes a apresentação de quaisquer meios de provas, admitidas em direito, salvo se o despedimento tiver sido precedido de processo disciplinar, caso em que, é apenas permitida a explicitação de prova eminentemente documental. O Tribunal pode, ex officio, determinar a produção de outras provas que considere indispensáveis à decisão. Na audiência final, as partes devem comparecer pessoalmente, do contrário, a providência é prontamente indeferida. Na hipótese de não comparecimento da parte demandada, a providência é julgada procedente, salvo se tiver sido apresentado o processo disciplinar. Diante do processo disciplinar, é cabível ao juiz decidir com base nos elementos constantes daquele documento e na prova que determinar, ex ofício. No primeiro momento da audiência, o juiz tentará a conciliação. Frustrada a tentativa de acordo, o magistrado ouve as partes, ordena a produção de provas e, subsequentemente, profere a decisão. Dependendo da complexidade da causa, a decisão pode ser proferida no prazo de 8 dias, se não tiverem decorrido mais de 30 dias a contar da entrada do requerimento inicial. Frente à inexistência de processo disciplinar, a suspensão do despedimento é decretada, entretanto, mesmo existindo, pode o Tribunal declará-lo nulo. O processo judicial não tem efeito suspensivo ou interruptivo sobre o contrato laboral, devendo o empregador juntar recibo de pagamento dos salários. Da decisão, é cabível recurso denominado “agravo” para a Relação, cujo efeito é meramente devolutivo. Se aceito, nessas circunstâncias, no ato de interposição, deve, o recorrente depositar no Tribunal a quantia correspondente a seis meses do vencimento do recorrido. Essa última medida foi posta pelo legislador com o intuito de evitar recursos meramente protelatórios. 4.7.3.2 A Suspensão de Despedimento Coletivo O procedimento, para essa medida cautelar, é praticamente o mesmo da suspensão de despedimento individual. As diferenças são que, apresentado o pedido da providência cautelar de suspensão da dispensa, o juiz ordena a citação da entidade patronal para se opor, no prazo de 10 dias. Nesse mesmo prazo, a entidade coletiva deve juntar os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades do despedimento coletivo. 276 4.7.3.3 Proteção da segurança, higiene e saúde no trabalho A providência cautelar nominada, dirigida à proteção da segurança, higiene e saúde no trabalho visa prevenir ou combater situações que ponham em risco os direitos sociais constitucionais do trabalhador à saúde, higiene e segurança no ambiente laboral, previstos no artigo 59, da Constituição da República Portuguesa. Essa situação não está consentânea ao perigo natural da atividade, mas sim às circunstâncias que agravem injustificadamente o processo produtivo, durante a exposição do trabalhador. Consoante ao exposto pela jurisprudência portuguesa, não é qualquer situação que ensejará a medida cautelar e sim àquelas que coloquem em perigo iminente os interesses. Na peça inicial o interessado deverá relatar, pormenorizadamente, os fatos, sendo cabível a dilação probatória, primordialmente, de produção de prova técnica, com a inspeção, in loco, da autoridade competente, a esclarecer a realidade. Recebido o laudo técnico, o juiz marca audiência final. A parte que não puder comparecer, poderá se fazer representar por mandatário com poderes especiais (conforme o artigo 32º, nº 2, do CPT). A parte pode apresentar oposição (defesa), que deverá ser explicitada até o início da audiência final, apresentando, ainda, nos meios de defesa e de prova. Após a produção de provas e realizadas as diligências complementares, caberá ao magistrado proferir decisão, cabendo recurso, no prazo de 10 dias. Indeferida a medida cautelar, o recurso irá para o Tribunal nos próprios autos e com efeito suspensivo. Na hipótese de deferimento, o recurso sobe em separado, com efeito meramente devolutivo ( segundo os artigos 83º e 83º-A do CPT). É notório que com tantas formalidades no procedimento cautelar, até mesmo, com dilação probatória (com feitura de prova técnica) a medida de urgência pode perder seu efeito. 4.7.4 Ações Cautelares Nominadas do Processo Comum No Código de Processo Civil português, estão previstas cautelares inominadas, dos artigos 393 a 427, quais sejam: restituição provisória da posse, suspensão de deliberações sociais, alimentos provisórios, arbitramento de reparação provisória (de dano moral ou material), arresto, embargo de obra nova e arrolamento. 277 No processo laboral, aplicam-se o arresto, arrolamento e o arbitramento de reparação provisória 203 , quando não existir medida antecipatória específica em caso de processos especiais tais como: os processos emergentes de acidente de trabalho e de doença profissional. O credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor, que concerne em apreensão judicial de bens. Existe limite legal ao arresto: o arrestado não pode ser privado dos rendimentos exclusivamente indispensáveis à sua subsistência e de sua família. A parte interessada pode requerer essa medida e deverá, em sua peça processual, aduzir os fatos que tornam provável a existência do crédito e justificam o receio invocado. No mesmo documento, demonstrará uma relação dos bens que devem ser apreendidos, com todas as indicações necessárias à realização da diligência. Esse pedido deverá ser comprovado. O juiz poderá decretar o arresto, sem ouvir a parte ex adversa. Caduca, essa medida, quando, transitada em julgado a ação de cumprimento de sentença, o credor, insatisfeito, não promover execução dentro dos dois meses subsequentes, ou se, promovida a execução, o processo ficar sem andamento durante mais de 30 dias, por negligência do exequente. O arresto pode ser requerido, pelo Ministério Público, contra tesoureiros ou quaisquer funcionários ou agentes do Estado ou de outras pessoas coletivas públicas. Na hipótese de arrolamento, a parte interessada pode requerê-lo, havendo justo receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de documentos. Finda a fase sumária de produção de provas necessárias, convencido, o juiz ordenará as providências frente à hipótese de sério risco de perecimento do direito do demandante. O arbitramento de reparação provisória concerne em antecipação de créditos de natureza pecuniária, requerida pelo lesado, sob forma de renda mensal. É medida cautelar, dependente da ação de indenização fundada em morte ou lesão corporal. O cabimento, na seara laboral, dessa medida cautelar está ligado às situações de acidentes de trabalho geradoras de indenização ou pensão consentânea à incapacidade laborativa, quando não abarcada pelas regras específicas de antecipação de tutela, do processo especial acerca do acidente do trabalho, acima comentado. 203 Segundo parte da doutrina portuguesa essas são as cautelares aplicáveis ao processo laboral. Entretanto, para essa última hipótese, como existe processo especial, a aceitação de sua aplicação não é unânime. 278 4.7.5 Condenação extra vel ultra petitum A condenação extra vel ultra petitum significa a condenação além do pedido aduzido na inicial e pode ser considerado como um poderoso instrumento de efetivação dos direitos sociais constitucionais. No artigo 74, do Código Laboral Português, está previsto que: O juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 514.º do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho (PORTUGAL, 2011). Essa possibilidade processual confere à apenas ao Juiz do trabalho 204 o poder de garantir a prevalência da Justiça Material sobre a Justiça Formal. O mesmo está previsto, para os julgamentos nos Tribunais, no artigo 42 do Código de Processo do Trabalho, cuja redação anuncia: “O Tribunal deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diferente do dele, sempre que isso resulte da aplicação à matéria de facto de preceitos inderrogáveis das leis ou regulamentos” (PORTUGAL, 1982). A doutrina e a jurisprudência portuguesa consideram que, para a aplicação do princípio, ora em análise, é necessário que o contrato de trabalho esteja vigendo, dada a situação de subordinação jurídica, em que se encontra o trabalhador, relativamente à entidade empregadora. Vejamos jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça a respeito: [...] É certo que, no âmbito do processo laboral, são reconhecidos ao juiz especiais poderes inquisitórios atribuindo-lhe a lei o poder-dever de diligenciar pelo apuramento da verdade material, relegando para um plano mais secundário a denominada “justiça formal”, atenta a natureza dos interesses conflituantes. [...] Igualmente o uso do poder de condenação extra vel ultra petitum, consagrado no artigo 74.º do CPT, que constitui uma das mais significativas limitações ao princípio do dispositivo, ao impor ao juiz o dever de condenar para além ou em objecto diferente do pedido, quando isso resulte de aplicação, à matéria provada ou aos factos de que possa servir-se, de preceitos interrogáveis, como decorrência natural do princípio da irrenunciabilidade de determinados direitos subjectivos do trabalhador, está limitado pela causa de pedir. O legislador estabeleceu aqui uma verdadeira especialidade face ao processo civil comum [no âmbito do qual a sentença não pode condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que se pedir, sendo nula se o fizer – artigo 661.º, n.º 1 e 668, n.º 1, alínea e), ambos do CPC] ao impor ao juiz a obrigação de definir o direito material fora ou para além dos limites constantes do pedido formulado, mas não estabeleceu igual especialidade no que diz respeito à causa de pedir. 204 No processo civil, mantém-se o principio da proibição do julgamento extra vel ultra petitum - artigo 264.º do CPC português. 279 O juiz laboral pode condenar ultra petitum, mas, sempre, no âmbito da causa de pedir delineada pelo autor. É esta que traça os limites da actividade cognitiva do Tribunal, funcionando aqui em pleno o princípio do dispositivo. Apenas podem, eventualmente, ser considerados na acção laboral factos que extrapolam a causa de pedir enunciada na petição inicial se, no momento próprio (cfr. os artigos 60.º, n.º 2 e 28.º do CPT), o autor cumular uma nova causa de pedir, provocando uma decisão do juiz a admiti-la e cumprindo-se o contraditório. (Supremo Tribunal de Justiça - Processo: 08S3530 Nº Convencional: JSTJ000 Relator: VASQUES DINIS - Nº do Documento: SJ20090514035304, 14/05/2009). (PORTUGAL, 2011). (Grifou-se). A causa de pedir, portanto, é um limite à aplicação do princípio, ora em análise. É necessário que seja sempre garantido o exercício do contraditório à parte, que irá ser diretamente afetada com a condenação para além do pedido. Outras questões de suma importância, já julgadas pela jurisprudência: perante os direitos indisponíveis, não se aplica o disposto no artigo 74, do CPT; assim como para as ajudas de custo e abonos para despesas de viagem, porque a sua fixação depende da vontade das partes e; é princípio aplicável tanto para trabalhador quanto para a empresa. O Tribunal Constitucional já decidiu ser a matéria constitucional, que não fere o artigo 13, da Constituição da República Portuguesa (princípio da dignidade social e da igualdade). (PORTUGAL, 1994). 4.8 Tendências acerca do Direito Estrangeiro É possível afirmar, categoricamente, que nenhum sistema no mundo é completamente eficiente. Para se conquistar a eficácia na tutela jurisdicional, mister a criação de mecanismos preventivos de autocomposição (ex. as Comissões de Conciliação Prévias), mecanismos que garantam a futura satisfação do credor, medidas de urgência (normatizadas em forma de princípios e regras gerais e abstratas) para infindáveis casos concretos e, sobretudo, sumarização do processo, privilegiando o princípio da celeridade, sem esbarrar na dignidade humana, e nas garantias fundamentais processuais: ampla defesa, contraditório, entre outras. A efetivação deve se sobrepor à sistematização, ou seja, ao formalismo, assim como ocorre no sistema português. O juiz tem que ter poderes para fazer valer aquelas garantias constitucionais, o magistrado não pode ser apenas a boca da lei. O problema da não efetivação dos direitos materialmente assegurados e processualmente asseverados reside, não só em questões como a insuficiência de magistrados 280 ou no abuso do réu (violador do direito), mas, sobretudo, do excesso de formalismo da normatização brasileira e da cultura em que este país está enraizado. Quando é comparada a legislação brasileira com a estrangeira, diversas medidas que lá fora são tomadas, o operador do direito argumenta que ferem os direitos fundamentais processuais do contraditório e da ampla defesa. Mas, será que, na prática, feririam mesmo? Existem doutrinas no mundo que afirmam que determinados tipos de reforma não compensam frente às garantias processuais. Alberto José Lafuente Torralba (2008), criticando a nova sistemática italiana, acerca da estabilização da demanda de urgência, por exemplo, explicitou que houve a descaracterização da tutela cautelar, pois, a essência desse procedimento reside na instrumentalidade e na acessoriedade. Esse mesmo doutrinador expõe que juiz, ao deferir uma medida de natureza cautelar, acaba por regular interesses supostamente lesionados, por um tempo indeterminado, podendo gerar prejuízos frente a uma sentença favorável. Argumenta ainda que, essa tutela de urgência, potencialmente estável, infringe as garantias processuais (contradición y defesa). Indaga, ainda, que como pode o judiciário, frente a um mero juízo de probabilidade, um exame superficial, portanto, uma análise imperfeita do caso em litígio, decidir e, futuramente, estabilizar a demanda? Torralba (2008, p, 103) termina sua obra expondo a seguinte frase: “En el Derecho, como casi todo em la vida, el camino más lhano no siempre es el que conduce a la meta deseada”. José Roberto Freire Pimenta (2004. p.248), ilustre professor, em passagem de seu texto sobre as tutelas de urgência no processo do trabalho, resume a conclusão, no direito brasileiro, de todo o estudo comparatístico, presentemente realizado: Os grandes princípios constitucionais do processo são em si mesmos perenes, mas nem por isso devem ser cultuados como fetiches, nem a sua leitura a de ser estanque no tempo. As garantias constitucionais do contraditório, do devido processo legal, da ampla defesa, etc. são parâmetros a serem observados na construção e prática da lei processual, mas devem ser interpretados segundo as necessidades do tempo e os legítimos valores da sociedade a que servem. Acima de todos eles, paira a garantia do acesso à justiça, também oferecida em sede constitucional (artigo 5º, inc. XXXV). Quando para a efetividade e necessária tempestividade for necessário infringir mediante simples arranhões alguns desses princípios, ou interpretá-los sem os radicalismos estagnários de uma leitura tradicionalista e conservadora, que isso seja feito, porque assim caminha, a História das instituições e assim covém à boa ordem jurídica e aos objetivos da justa pacificação pelas vias do processo. (PIMENTA, 2004. p. 248). 281 Quando de uma alteração, o medo de abusos em sua aplicabilidade, pelos operadores do direito, primordialmente pelo juiz, não pode servir de desculpa para a não adoção dessas reformas, na busca pela efetividade e celeridade processuais. Como observa o ilustre professor José Roberto, citando o exemplo utilizado por Humberto Theodoro Júnior: Assim como não se recusa o bisturi ao cirurgião de urgência, por simples temor de vir a ser mal utilizado, também não se pode negar ao juiz um amplo poder de antecipar, providências e de tomar medidas preventivas. [...] Em suma, a ampla e firme adoção desses modernos mecanismos processuais na esfera trabalhista em nosso país servirá de instrumento para uma mudança na qualidade das relações entre o capital e o trabalho (tornando-as menos discriminatórias e elevando-as para patamar mais civilizado) e, desse modo, para a maior efetividade do próprio Direito Material brasileiro. Paralelamente, a própria atuação da Justiça do Trabalho, será grandemente ampliada em áreas de imensa relevância social e constitucional, contribuindo para que esta deixe de ser considerada uma mera “justiça dos desempregados e dos acertos de contas”, com baixos índices de celeridade e de efetividade, resgatando sua elevada e exclusiva função constitucional de, com efetividade, dizer e concretizar o direito controvertido, nas relações de trabalho subordinado. (PIMENTA, 2004. p. 246-249). E, por fim, uma última citação a ser aqui suscitada é a posição de Adamovich para a revista “Trabalho e Doutrina”, de que codificar não é a solução para a resolução dos problemas de um ordenamento jurídico: É tarde demais para falarmos em um Código de Trabalho, ou mesmo em um Código de Processo do Trabalho. A Era das Codificações já é passada. Os Poderes Legislativos não têm mais ocasião de responder senão aos imperativos conjunturais das sucessivas crises. Escrever obras legislativas largas e de aspirações duradouras como os códigos é tarefa que não se adéqua ao ritmo da vida pós-moderna. As reformas setoriais, ao estilo das “novelas”, são a solução mais factível. (VON ADAMOVICH, 2000, p. 148-151). Diante ao exposto, não basta alterar a legislação, assim como foi visualizado no direito comparado, é necessário uma atuação conjunta dos operadores do direito no desígnio de dar efetividade ao direito laboral e cível e celeridade à seara processualística desses ramos do Direito. 282 5 CONCLUSÃO Os Direitos Sociais concernem a uma conquista de proteção ao homem, na busca pela justiça social, perante o sistema capitalista. Desrespeitar essa normatividade é quebrar o pacto de proteção da dignidade do ser humano, primordialmente, frente às duras crises vivenciadas por toda a coletividade, na atual fase pós-moderna. A Constituição da República Federativa do Brasil dirime um projeto de bem- estarsocial, elencado nos artigos 6º, 7º e 8º. Essa assertiva rechaça-se perante o princípio de uniformidade constitucional, com exemplo no comando estabelecido no artigo 170, cuja redação prevê que: a ordem econômica brasileira tem por fim assegurar a todos a existência digna, consoante aos ditames de justiça social, pautando-se na valoração do trabalho humano e na livre iniciativa. No artigo 193, da Lei Maior, está estabelecido que a ordem social terá como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais. A República Federativa do Brasil, conforme o primeiro artigo da Constituição, é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamento, além de outros preceitos: a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, incisos III e IV, respectivamente. Como se procurou demonstrar no introito da presente dissertação, o capital sempre discerniu o Direito do Trabalho, que corresponde às normas protetivas do trabalhador, como uma contradição interna do sistema. Legitimamente, esse ramo jurídico sustenta o modo de produção vigente e para se desenvolver, de forma concreta e longínqua, necessita de efetivar normas fundamentais. O obreiro, para exercer o labor, carece de contrapartidas sociais, quais sejam: educação, saúde, lazer, convívio social, meio ambiente de trabalho saudável e dentre outros direitos. O modelo de Estado, preconizado no ordenamento constitucional pátrio, necessita de concretização objetiva, realizada através da atuação dos poderes públicos. As ditas normas não podem ser transmitidas de forma retórica. A sobrevivência do próprio sistema depende da efetivação dos direitos sociais, para um país democrático que almeja o real desenvolvimento coletivo, em oposição à concentração do poder econômico, nas mãos de um ínfimo grupo. O caráter vital das verbas trabalhistas, a síndrome do descumprimento da normatividade laboral, o conceito de “mercadoria” designado ao trabalhador, a inflação, a diminuição da qualidade de vida, o baixo salário mínimo, a má distribuição de renda, primordialmente com os baixos salários, em geral; a elevada carga tributária (que onera as empresas e diminui o nível de vida do próprio cidadão); a precarização e a flexibilização das 283 normas trabalhistas, a existência da empregabilidade, a quebra da solidariedade entre os trabalhadores; as crises econômicas e; o enfraquecimento dos sindicatos. Importante ressaltar que os ditos fatores concerniram-se em metas implementadas e alcançadas na sociedade brasileira, pelo neoliberalismo. Esses são fatores que elevam a necessidade de efetivação dos direitos sociais, para que o sistema não sucumba pelas próprias forças, ao massacrar aquela classe que, de forma geral, o sustenta. O desrespeito deliberado e inexplicável às normas sociais individuais, constitucionalmente asseveradas, representa incontestável dano social. É de praxe que alguns maus empregadores, ao promoverem a dispensa de seus empregados, paguem verbas rescisórias de forma incorreta; esperando, com isso, que esses trabalhadores ajuízem uma ação laboral. Tratando-se de uma estratégia do negócio, com essa prática, os maus empregadores pretendem ganhar tempo e a possibilidade de um provável acerto através de um acordo judicial, muitas vezes abaixo do valor real devido. Há estudos que citam a possibilidade de que o Processo de Trabalho possa, nesses casos, ser um “bom negócio” para o empregador. Ocorrendo uma demora processual, possibilita-se que essa ”tradição empresarial” aumente a insegurança na relação capital/ trabalho. No Brasil, o processo virtual poderia ser uma solução plausível para a falta de agilidade na tramitação das demandas trabalhistas. Consistiria em fase revolucionária nos procedimentos judiciais, proporcionando mais celeridade, praticidade, além de comodidade, para todos os sujeitos envolvidos. Nesse sentido, recentemente, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), no dia 17 de janeiro, do corrente ano, instalou novo Processo Judicial Eletrônico Nacional na Vara trabalhista de Caucaia, no estado do Ceará. Essa é a segunda jurisdição a ter o sistema virtual. A unidade pioneira foi a Vara do Trabalho de Navegantes, em Santa Catarina. À luz da Hermenêutica constitucional moderna, cabe ao intérprete da norma não atuar contrariamente à aplicação do princípio da razoabilidade, mas sim, contribuir com a construção de um sistema justo e racional, na busca pela efetivação dos direitos sociais individuais dos trabalhadores brasileiros. O que significa ampliar a aplicação prática dos institutos, ora estudados, com primor, da tutela inibitória, em virtude das características já apresentadas. O processo justo e célere é, ainda, dependente da atuação responsável dos envolvidos. Na busca pela verdade processual, é patente a necessidade de apreensão da consideração de que o processo não é de “propriedade” do advogado, do autor e do réu, do serventuário ou do juiz, e sim da sociedade, que clama por justiça diante dos conflitos, postos 284 sob a égide do Poder Judiciário. A justiça, durante todo o tempo, precisa assegurar a sua credibilidade perante a coletividade, os atores envolvidos na tramitação processual ficam com a responsabilidade maior que é de cumprir suas funções para a sociedade e pela sociedade, resolvendo os interregnos. A falta de estabilidade no emprego contribui para que a Justiça do Trabalho seja criticada por alguns doutrinadores, como sendo a “justiça dos desempregados”. Não raro, os direitos sociais individuais já foram lesionados, não cabendo, portanto, a medida inibitória, mas sim a de cunho ressarcitório. Apesar de existir a proteção contra a dispensa arbitrária ou sem justa causa, comando do artigo 7º, inciso I, da Constituição da República (item 1.2), a jurisprudência e a doutrina dominantes retiraram a eficácia plena dessa ordem social. O processo, enquanto instrumento de efetivação do direito substancial, precisa ser, cada vez mais aperfeiçoado. Conclusão essa, extraída tanto da ordem interna, quanto dos exemplos trazidos dos ordenamentos estrangeiros estudados. Os mecanismos processuais pelos quais são concretizadas as normas, enfocando-se as tutelas emergenciais, são instrumentos de suma importância a preencher os percalços concernentes ao ordenamento e ao próprio judiciário, que ensejam à morosidade e injustiças processuais, in concreto. No âmbito da jurisdição laboral, a necessidade de rápida e justa resolução de conflitos se justifica, sobremaneira, em virtude da natureza do objeto, posto em litígio. Em arremate, o que se pretendeu, com a exposição apresentada, em torno da peculiar e complicada relação entre tempo, processo, direitos sociais individuais e as tutelas de urgência, foi reafirmar que esses meios tutelam tais direitos, amenizando os efeitos inexoráveis do tempo no processo laboral. Deduz-se que, a partir do estudo apresentando, a cautelar deve ser analisada como instrumento processual de efetivação dos direitos subjetivos e não meramente como meio de proteção da tutela jurisdicional. Considerar o fumus boni iures de caráter puramente processual, sendo analisada apenas a condição eventual de existência da ação principal que será interposta, seria uma leitura feita com o intuito de concretizar o direito material envolvido. A tutela antecipatória, que se destina a satisfazer o direito, antes de proferida a decisão final e a tutela inibitória que se designa a proteger o direito, sem mesmo se cogitar da ocorrência de um ato antijurídico, são poderosos instrumentos de efetivação da norma laboral; no entanto, pouco utilizadas no âmbito jurídico-trabalhista. A jurisprudência brasileira é comedida quando da concessão de uma tutela antecipada ou inibitória. Os desacertos, as arbitrariedades e o perigo de abusos não devem 285 ensejar em uma postura paralisante do judiciário e do próprio advogado, tornando a regra processual letra quase morta no ordenamento. A morosidade na tramitação dos processos, perante o Poder Judiciário, pressupõe que o magistrado trabalhista tome uma postura progressista no uso dos instrumentos de efetivação dos direitos sociais. Os seres humanos estão suscetíveis a cometer erros, mas essa possibilidade não deve ser escusa para o não cumprimento da responsabilidade social inerente à atividade. O sistema predispõe de instrumentos, tais como as tutelas de urgência, para sua auto-correção. Essa foi a técnica utilizada pelo prudente doutrinador, ao acrescentar e modificar o artigo 273 do CPC. A busca por uma certeza absoluta, dentro do processo, afigura-se como uma ideologia utópica e descabida, por essa razão, o juízo de probabilidade apresenta-se como suficiente para a concessão de uma medida emergencial. Vale salientar que, a antecipação de tutela não é uma técnica a ser aplicada de forma indiscriminada, transformando-se em uma panaceia judicial. Possui limitações (como as expostas no Capítulo II), assim como todos os institutos processualistas, podendo ser modificada e revogada a qualquer tempo. Dessa feita, os institutos emergenciais, meios de sumarização processual, trazem ínsita a questão da efetividade processual, na resolução, mesmo que anódina, do problema “tempo” processual. É cediço que o Judiciário Trabalhista caracteriza-se pela celeridade, seriedade, além da valorização dos juízes, no Brasil. Não podendo olvidar que, apesar disso, não é um sistema perfeito e necessita de instrumentos sumarizados, para diminuir os efeitos contraproducentes do tempo sob o provimento final. Importante salientar que, se mudanças substanciais não forem realizadas, a justiça tende a não conseguir acompanhar o volume dos litígios sociais. A ciência moderna e contemporânea necessita de abster-se da visão puramente interna do processo, considerando uma análise constitucional desse, além da sensibilidade para o próprio direito material tutelado e posto à resolução de seu conflito, sob a égide da jurisdição estatal laboral. O manejo indiscriminado das medidas de urgência, bem como, de outros institutos pode acarretar prejuízos indeléveis para o Direito Substancial. A compreensão extralegal e interdisciplinar dos processos por parte dos juízes é de suma importância para a modernização da Justiça do Trabalho. Um exemplo singular é a procura pelo aprimoramento técnico-profissional de formação dos magistrados e servidores, junto às Escolas Judiciais, dos Tribunais Regionais do Trabalho, na busca por uma percepção mais próxima das realidades sociais, primordialmente, a mostrar o Direito e a prática, em um 286 julgamento mais consciente e voltado para os escopos da Constituição da República Federativa do Brasil. A proposta, aqui realizada, é a consideração da visão sistêmica do ordenamento. O Direito Processual possui escopos sociais e políticos, além dos jurídicos. Nesse sentido, o trabalho, ora realizado, teve a preocupação de enfocar os direitos sociais individuais, garantidos na Lei Maior, além dos meios processuais de urgência existentes na normatividade brasileira. Considerou-se de suma importância, além disso, a exemplificação desses mesmos instrumentos, existentes em ordens jurídicas externas. Esses ordenamentos, como demonstrado, possuem equívocos, muitas vezes, mais graves do que os existentes no Brasil, no entanto, o impacto para o trabalhador do descumprimento de um direito social individual, em um país desenvolvido, é significativamente diferente. A atuação concreta e incisiva da Justiça laboral, consoante ao exposto nos artigos 273, 287 e 461 do Código Processual Civil, exemplificadamente, evitaria a autotutela praticada pela parte hipersuficiente. Essa síndrome de descumprir a norma laboral e o desrespeito com o processo (a má-fé dos atores processuais) ensejam certas vedações ao Poder Judiciário de proteger e atuar no sentido de coibir eficazmente, de forma justa e célere, a lesão aos direitos sociais trabalhistas, imediatamente após a sua prática, ou mesmo antes do cometimento de um ato contrário ao direito. Esse “poder” que o economicamente mais forte tem, causa notória desigualdade entre as partes contratantes e certa impunidade, o que incentiva a reiteração da prática de ilícitos, gerando uma gama, demasiadamente grande, de demandas judiciais na seara trabalhista. Coibindo essa praxe, a Justiça Especializada, cuja competência encontra-se enraizada no artigo 114 da Lei Maior, poderá exercer, também através das medidas de urgência, sua função de forma mais eficaz, célere e justa, na busca pela pacificação nas relações sócio-laborais. 287 REFERÊNCIAS ADAMOVICH, Eduardo Henrique von. A crise do processo do trabalho e a tutela de urgência: uma visão histórico-comparativa. Revista do Trabalho e Doutrina, Rio de Janeiro, n. 24, p. 148-151, 2000. ADAMOVICH, Eduardo Henrique Raymundo von . A tutela de urgência no processo do trabalho: uma visão histórico-comparativa. Idéias para o caso brasileiro. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. v. 1. ARENHART, Sérgio Cruz. Perfis da tutela inibitória coletiva. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. (Coleção Temas Atuais de Direito Processual Civil, v.6). AROUCA, José Carlos. O futuro do direito sindical. Revista LTR, São Paulo, Ano 71, n. 06, jun. 2007. ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Primeira Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho. Disponível em: http://ww1.anamatra.org.br/003/00301015.asp?ttCD_CHAVE=94584. Acesso em: 09 de mar. de 2011. BAHIA, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: 0093400-30.2008.5.05.0291, ac. nº 006605/2010, Relatora Marama Carneiro, Diário de Justiça, 24 de mar. de 2010. BARROS, Alice Monteiro. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006. BRASIL, Tribunal Regional do Trabalno. Processo 0088600-70.2004.5.05.0461 RO, 18/09/2007, Diário de Justiça, 29 de abr.de 2007. BATISTA, Ovídio. Do processo cautelar. São Paulo: Forense.: 2006 BEDAQUE, José Roberto dos Santos Bedaque. As formas diferenciadas de tutela no processo civil Brasileiro. Disponível em: <www.professorgodoy.com.br/artigos/formas tutela.pdf>. Acesso em: 12 de mar. de 2009. BEDAQUE, José Roberto dos Santos Bedaque. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência. 3. ed.. São Paulo: Malheiros, 2003. BIAVATI, Paolo. I prodimenti civili semplificati e accelerati: il quadro europeo e i riflessi italiani. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, Milano, v. 56, p. 751-775, 2002. BRANCO, Ana Paula Tauceda. O ativismo judiciário negativo investigado em súmulas editadas pelo Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: <http://www.nucleo trabalhistacalvet.com.br/artigos/O-Ativismo-Judiciario %20 Negativo-investigado-emSumulas-editadas-pelo-TST-VERSAO-DEFINITIVA.pdf>. Acesso em: 18 de ago. de 2011. 288 BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho, de 01 de maio de 1943. Diário Oficial da União, Brasília, 01 de maio de 1943. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em 05 de maio de 2011. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 20 de abr. de 2011. BRASIL. Lei no 10.101, de 19 de novembro de 2000. Dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 20 dez. 2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ leis/L10101.htm>. Acesso em: 20 abr. 2012. BRASIL. Lei nº 7.716, de 05 de janeiro de 1989. Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Diário Oficial da União, Brasilia, 05 de janeiro de 1989. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7716.htm. 21 de mar. de 2011. BRASIL. Decreto 3680, de 01 de dezembro de 2000. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções Gratificadas do Ministério da Integração Nacional, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasilia, 01 de dezembro de 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3680.htm. Acesso em: 18 de abr. de 2011. BRASIL. Decreto 611, de 21 de julho de 1992. Dá nova redação ao Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 357, de 7 de dezembro de 1991, e incorpora as alterações da legislação posterior. Diário Oficial da União, Brasilia, 21 de julho de 1992. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/19901994/D0611.htm. Acesso em 01 de jun. de 2011. BRASIL. Decreto 1.255, de 29 de setembro de 1994. Promulga a Convenção nº 119, da Organização Iternacional do Trabalho, sobre Proteção das Máquinas, concluída em Genebra, em 25 de junho de 1963. Diário Oficial da União, 29 de setembro de 1994. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D1255.htm. Acessado em: 25 de jun. de 2011. BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Processo: 185.659/SP. Relator: Nilson Neves, Diário Oficial de Justiça, 26 de jul. de 2000. BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. Processo: AIRR - 86740-71.2009.5.03.0022. Relator: Carlos Alberto Reis de Paula. Diário Oficial de Justiça, Diário de Justiça, 18 de mar. de 2011. BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Processo: AG-RC - 195136/2008-000-00-00. Relator: Carlos Alberto Reis de Paula, Diário Oficial de Justiça, 20 de mar. de 2009. BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Processo: RR-124900-66.2008.5.09. 0562 e RR123800-13.2007.5.09.0562. Relatora: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Diário Oficial de Justiça, Brasília, 30 de jul. de 2010. 289 BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. Processo: 549-22.2010.5.15.0000. Relator: Pedro Paulo Manus, Diário Oficial de Justiça, 30 de nov. de 2011. CARRION, Valentim. Comentário à Consolidação das Leis do Trabalho. 32 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. CARNEIRO, Nelson. Código de processo do trabalho anotado: compilações legislativas verbojurídico. Lisboa, 2009. Disponível em: http://www.verbojuridico. com/download/ codigoprocessotrabalho.pdf. Acessado em: 18 de nov. de 2011. CATHARINO, José Martins. Compêndio universitário de direito do trabalho. São Paulo: Editora Jurídica e Universitária, 972. v. 2. CESARINO JÚNIOR, Antônio Ferreira. Direito social. São Paulo: LTr, 1980. CHIARELLI, Carlos Gomes. Trabalho na Constituição. São Paulo: LTr, 1989. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro. Forense: 2007. COLUCCI, Viviane; LEITE, Roberto Basilone. Proibição do trabalho na infância e na adolescência: uma questão de direitos humanos. In: MAIOR, Jorge Luiz Souto et al. Direitos Humanos: essência do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2007. p. 264-279. CRETELLA JUNIOR, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. v.2. DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2007. DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Inovações na legislação trabalhista: aplicação e análise crítica. São Paulo LTr, 2000. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direto do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTR, 2007. DELGADO, Maurício Godinho. Jornada especial de trabalho: turnos ininterruptos de revezamento. In: BARROS, Alice Monteiro de (Coord.). Curso de direito do trabalho: estudos em memória de Célio Goyatá. 3. ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 330-342. DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS. Pesquisa acerca da negociação da PLR. (DIEESE). Disponível em: <http://www.dieese.org.br/esp/estpesq22 _plr.pdf>. Acesso em: 22 de abr. de 2011. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentaliade do processo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. v.7. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentaliade do processo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. 290 DITTRICH, Lotario. Il provvedimento d'urgenza. In: TARZIA, Giuseppe. Il nuovo processo cautelare. Padova, CEDAM, 1.993. p. 145-205. ESPANHA. Ley de procedimiento laboral. Disponível em: http://www.aragon.ccoo.es /comunes/temp/recursos/3/58656.pdf. Acesso em 25 de ago. de 2011. ESPANHA. Ley del enjuiciamiento civil. Disponível em: http://www.aragon.ccoo.es /comunes/temp/recursos/3/58656.pdf. Acesso em 28 de ago. de 2011. ESPÍRITO SANTO. Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 0964.1996.002.17.00.9, Maria Francisca dos Santos Lacerda, Diário de Justiça do Trabalho, 25 de mar. de 2002. ESPÍRITO SANTO. Tribunal Regional do Trabalho. Processo: MS 000048236.2010.5.05.0000, Relatora: Dalila Andrade, Diário de Justiça do Trabalho, 24 de ago. de 2010. ESPÍRITO SANTO. Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 01548-2007-008-03-00-6, Relatora: Alice Monteiro de Barros, Diário de Justiça do Trabalho, 12 de fev. de 2009. FRANÇA. La Constitution. Disponível em: <http://www.legifrance.gouv.fr/Droitfrancais/Constitution>. Acesso em 25 de abr. de 2011. FRANÇA. Code du travail. Disponível em: <http://www.legifrance.gouv.fr/Droitfrancais/Code du travail>. 18 de ago. de 2011. FRANÇA. Code de procédure civile. Disponível em: <http://www.legifrance.gouv.fr/Droitfrancais/Code/ Code de procédure civile>. Acesso em 20 de ago. de 2011. FRIEDE, Reis. Tutela cautelar e tutela antecipada: distinções fundamentais. Revista de Direito, Rio de Janeiro, v.3, n. 5, jan /jun. 1999. Disponível em: <http://www.camara.rj.gov. br/setores/proc/revistaproc/revproc1999/revdireito1999A/est_ tutelacaut.pdf>.Acessado em: 12 de jul. de 2011. GIGLIO, Wagner. Liminar para reintegrar dirigente sindical. Revista LTR, v. 60, n. 7, p. 884, jul.1996. GRINOVER, Ada Pellegrini. Tutela jurisdicional nas obrigações de fazer e não fazer: reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva. 1996. GURGEL, Christianne. A negociação coletiva e os conflitos de trabalho. Disponível em: <http://www.bahiaja.com.br/colunistatexto.php?idArtigoColunista =79>. Acessado em: 10 de jun. 2011. HADDAD, Alaor. Salário mínimo: aspectos constitucionais. In: ROMITA, Arion Sayão. (Coord.) Curso de direito constitucional do trabalho. São Paulo: LTR, 1991. p. 198-205. ITÁLIA. Codice di procedura civile. Disponível em: <http://www.altalex.com/index.php? idnot=33723>. Acesso em: 10 de out. de 2011. 291 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2007. LEITE, Liliane de Freitas. Ação cautelar no processo do trabalho. Jornal Trabalhista Consulex, São Paulo, v. 25, n.1204, p.9-10, jan. 2008. LIBEMAN, Eurico Tullio. Manual de direito processual civil. Tradução e notas de Cândido Rangel Dinamarco. Rio Janeiro: Ed. Forense, 1984. MAIOR, Jorge Luiz Souto. Curso de direito do trabalho: a relação de emprego. São Paulo: LTr, 2008. v. 2. MAIOR, Jorge Luiz Souto. Proteções jurídicas em face da cessação da relação de emprego. In: CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; MAIOR, Jorge Luiz Souto. (Org.). Curso de direito do trabalho. São Paulo: Ltr, 2008. v.2, p. 226-238. MAIOR, Jorge Luiz Souto. Direito social, direito do trabalho e direitos humanos. In: SILVA, Alessandro da et al. Direitos humanos: essência do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2007. p. 17-37. MAIOR, Jorge Luiz Souto. O que é direito social? In: CORREIA, Marcos Orione Gonçalves. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr, 2007. MALLET, Estêvão. Primeiras linhas sobre as comissões de conciliação. Revista LTR, São Paulo, v. 64, n. 4, p. 439-445, 2000. MANDRIOLI Crisanto. Corso di Dirittio Porcessuale Civili. 10. ed. Turim: G. Giappichelli, 1995. MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação de Tutela. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória e tutela de remoção do ilícito. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 272, 5 abr. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto. asp?id=5041>. Acesso em: 29 mar. 2009. MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Processo Cautelar. São Paulo: LTr, 2008. v. 4. MARQUES, Elmer da Silva; BELLINETTI, Luiz Fernando. A Antecipação da Tutela Inibitória em Face da Fazenda Pública e o Destinatário das Medidas Coercitivas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. MARTINS, Sérgio Silveira. Participação nos lucros ou resultados: oportunidade ou desafio para o movimento sindical? Revista de Administração Contemporânea, Curitiba, v. 4, n. 3, Sept./Dec. 2000. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1415-65552000 000300004& script=sci_arttext. Acesso em: 10 de mar. de 2011. MAZURKEVIC, Arion. A Medida Cautelar Satisfativa e a Tutela Antecipatória. Revista do TRT da 15ª R, Campinhas, n. 24, jun. 2004. 292 MELO, José Tarcísio de Almeida. Direito Constitucional do Brasil. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. MENCHINI, Sergio. Nueve Forme di Tutela e nuovi modi de risoluzione delle controversie: verso il superamento della necessita dell1accertamento com autorità di giudicato. Rivista Di Diritto Processuale, Itália, v. 61, p. 869-902, 2006. MÉNDEZ, Francisco Ramos. Las Medidas Cautelares em El Proceso Civil Espanõl. Disponível em: www.rya.es/.../las_medidas_cautelares_en_el_pr. Acessado em: 10 de nov. de 2011. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO - 5204/91. Relator: Marcus Moura Ferreira, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 04 de jul. de 1992. MINAS GERAIS Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO - 1816/01. Relator: Eduardo Augusto Lobato, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 05 maio de 2001. MINAS GERAIS. Tribunal Regional do Trabalho. Processo RO 0000886-17.2010.5.03.0106. Relator: Milton Vasques Thibau de Almeida. Diário da Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 16 dez. 2010. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 01251-2008-040-03-00-0. Relator: Emerson José Alves Lage, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 23 mar. de 2009. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO: 00962-2005-015-03-00-4. Relator: Jose Miguel de Campos, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 26 de nov. de 2005. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: AP - 4551/01. Relatora: Alice Monteiro de Barros, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 05 de nov. 2001. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO: 00135-2006-004-03-00-8, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 21 de abr. de 2007. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 000012316.2010.5.03.0106, Relator: Márcio Ribeiro do Valle, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 14 de mar. de 2011. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 8682/2001 – 02804/2002. Relator: Juiz João Cardoso, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 19 de mar. de 2002. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 01308-2009-000-03-00-2, 2009. Relator: Jesse Claudio Franco de Alencar, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 17 de nov. de 2009. 293 MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: 01856-2001-109-03-00-0 RO. Relator: Luiz Ronan Neves Koury, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 23 nov. de 2003. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: 00066-2007-062-03-00-4 RO. Juíza conv. Taísa Maria Macena de Lima, Diário de Justiça do Trabalho, 11 de abr. de 2008. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho.Processo: 00917-2004-069-03-00-0. Relator: Luiz Otávio Linhares Renault, Diário de Justiça do Trabalho, 15 de jun. de 2006. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: HC - 13/97. Relator: José Roberto Freire Pimenta, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 20 out. de 1997. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. Process: 1.0000.00.334991-7/000, Relator: Tibagy Salles, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 31 out. de 2003. MINAS GERAIS, Tribunal Regional do Trabalho. 00401-2004-000-03-00-5 HC, Relatora: Emília Facchini, Diário de Justiça do Trabalho, Belo Horizonte, 29 de abr. de 2004. MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Civil. São Paulo: 2002. t. 22. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Notas sobre as recentes reformas do processo civil francês. Revista de Processo, São Paulo, v. 150, p. 60-61, 2007. MAZURKEVIC, Arion. A Medida Cautelar Satisfativa e a Tutela Antecipatória. Revista do TRT da 15ª Região, Campinhas, n. 24, jun. 2004. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. NETTO, José Paulo. BRAZ, Marcelo. Economia Política: uma introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2007. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: http://unicrio.org.br/img/DeclU_D_Humanos VersoInternet.pdf. Acessado em: 03 de Março de 2011. ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Convenção 144. Disponível em: www.oit.org.br. Acesso em 08 de março de 2011. ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Convenção 119. Proteção das Máquinas. Disponível em: www.oit.org.br. Acesso em 08 de março de 2011. PADOVA, Elena Merlin. Le Misuri Provvisore e Cautelari Nello Spazio Giudiziario Europeo. Rivista di Diritto Processuale, Itália, v. 57, p. 759-804, 2002. 294 PAULA, Alexandre Ribas de. Centralização Política Promovida por Rotário, no Século VII, por Intermédio da Codificação do Direito Penal dos Lombardos. Acessado em: 01 de novembro de 2011. Disponível em: http://www.brathair.com/revista/numeros /05.02.2005/ longobardos.pdf. Acessado em: 05 de abr. de 2011. PELLICER, Angel Blasto. Las Medidas Cautelares En EL Processo Laboral. Madrid: Civitas, 1996. PIMENTA, José Roberto Freire. Tutelas de Urgencia no Processo do Trabalho: o potencial transformador das relações trabalhistas das reformas do CPC. Revista do TRT da 15ª Região, São Paulo, n. 24, 2004. PISANI, Andrea Proto. Verso a la residualità del processo a congnizione piena. Roma: IL Foro Italiano, 2006. PISCO, Claudia de Abreu Lima. Medidas Urgentes no Processo do Trabalho. Resumido por Abigail Vieira Lopes Gomes. Revista Synthesis, n. 39, 2004. POZZOLO, Paulo Ricardo. Ação inibitória no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2004. POCHMANN, Marcio. Política social na periferia do capitalismo: a situação recente no Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 12, n. 6, dez. 2007. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S1413-81232007000600010&lng= pt&nrm=iso> . Acesso em 11 mar. 2011. doi:10.1590/S1413-81232007000600010. Acessado em: 10 de mar. de 2011. PORTUGAL. Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, de número Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto. Disponível em http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/Leis/Lei _busca_art_velho.php?nid=1009&artigonum=1009A0118&diplomaversao=Lei+n.%BA+520 008 %2C+de+28+de+Agosto. Acesso em: 05 de nov. de 2011. PORTUGAL. Código de Processo do Trabalho. Disponível em: www.cite.gov.pt/pt/ legis/Cod_Proc_Trab_2010.html. Acesso em 12 de out. de 2011. PORTUGAL. Código de Processo Civil. Disponível: www.portolegal.com/CPCivil.htm. Acesso em: 19 de nov. 2011. PORTUGAL. Código do Trabalho. Disponível em: www.legix.pt/docs/CodTrabalho2009. pdf. Acesso em: 25 de out. de 2011. RENAULT, Luiz Otávio Linhares, VIANA, Márcio Túlio. (Coord.) Discriminação. São Paulo: LTr, 2000. RICCI, Edoardo. A tutela antecipatória brasileira vista por um italiano, in Genesis. Tradução de José Rogério Cruz e Tucci. Revista de Direito Processual Civil, Curitiba, v. 6, 1997, SALARIO minimo. Disponível em: <http://www.salariominimo.com.br>. Acesso em: 05 de mar. de 2011. 295 SALVANECH, Laura: DITTRICH, Lotario. Il provvedimento d'urgenza. Il nuovo processo cautelare. a cura di Giuseppe Tarzia. Padova: CEDAM, 1993. SANTA CATARINA, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO: 04245-2004-026-1200-5, Relatora: Ione Ramos, Diário de Justiça do Trabalho, Florianópolis, 13 de set. de 2005. SÃO PAULO, Tribunal Regional do Trabalho. Processo: RO 01393-2010-015-10-00-3. Relatora: Flávia Simões Falcão, Diário de Justiça do Trabalho, São Paulo, 12 out. de 2011. SÃO PAULO, Tribunal Regional do Trabalho de Campinas. Processo: RO 038826/2000. Juiz José Antônio Pancotti, Diário de Justiça do Trabalho, Campinnas, 18 de fev. de 2002. SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: LTr, 2008. TALAMINI, Eduardo, WAMBIER, Luiz Rodriguez, ALMEIDA, Flávio Renato Correia de. Curso Avançado de Processo Civil: v. 3: Processo Cautelar e Procedimentos Especiais. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. TALAMINI, Eduardo. As tutelas típicas relativas e deveres de fazer e não fazer e a via geral do artigo 461 do CPC. Revista de Processo, v. 97, p. 173-181, 2000. TEIXEIRA FILHO, Manuel Antonio. As Ações Cautelares no Processo do Trabalho. 4 ed. São Paulo: LTr, 1996. TEIXEIRA FILHO, Manuel Antonio. Curso de Processo do Trabalho: perguntas e respostas sobre assuntos polêmicos em opúsculos específicos: n. 2, antecipação de tutela e liminares. São Paulo: LTr, 1996. THEODORO JUNIOR, Humberto. Tutela Antecipada. Evolução. Visão Comparatista. Direito brasileiro e direito europeu. Revista de Processo, São Paulo, v. 157, mar. 2008. TORRALBA, Alberto José Lafuente. La evolucíon de la tutela cautelar desde uma pespectiva internacional: hacia la autonomia de las medidas antecipatórias. Revista de Processo, v. 156, n. 3, p. 77-103, fev. 2008. TREGLIA, Giorgio. L’attuazione dei Provvedimenti. Il nuovo processo cautelare. a cura di Giuseppe Tarzia. Padova: CEDAM, 1.993. p. 402 a 415. VON ADAMOVICH, Eduardo Henrique. A Tutela de Urgência no Processo do Trabalho: uma visão histórico-comparativa, ideias para o caso brasileiro. Rio de Janeiro: RENOVAR, 2000. VIANA, Márcio Túlio. Remuneração e Salário. In: MAIOR, Jorge Luiz Souto; CORREIA, Marcos Orione Gonçalves. Curso de Direito do Trabalho: v. 2: direito individual do trabalho. São Paulo: LTr, 2008. p. 105-211. 296 VIANA, Márcio Túlio. Salário-Família. In: BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho: estudos em Memória de Célio Goyatá. 3. ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 252-269. VIANA, Márcio Túlio. A proteção social do trabalhador no mundo globalizado: o direito do Trabalho no limiar do século XXI. Revista LTr, v. 63, n. 07, p. 63-07, Jul. 1999. ZAMBALDI, Carla Fonseca, Cantilino, AMAURY; SOUGEY. Sintomas obsessivocompulsivos na depressão pós-parto: relatos de casos. Revista de Psiquiatria do. Rio Grande do Sul, v.30, n.2, p.155-158, ago 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S010181082008000300012&lng=pt&nrm=iso. Acesso em:7 de jun. de 2011. ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de Tutela e Colisão de Direito Fundamentais/Reforma do Código de Processo Civil. Coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. 1996.